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A exclusão do ICMS da base de cálculo da PIS e COFINS e o demonstrativo de resultado do exercício

Agenda 13/04/2022 às 14:00

Resumo: O presente artigo tem como objetivo demonstrar que o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal sobre o conceito de faturamento e receita bruta, assim como, a determinação de que o ICMS deverá ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS, influenciará na construção do demonstrativo do resultado do exercício DRE, tendo em vista que este documento que compõe as demonstrações financeiras da organização empresária tem a obrigatoriedade legal de demonstrar a receita bruta e o valor dos tributos sobre ela incidentes. Utilizando-se do método dedutivo partindo-se de uma premissa geral, ou seja, a análise da constitucionalidade da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e Cofins, para uma premissa particular, que é o reflexo conceitual no demonstrativo do resultado do exercício do empresário. Dessa abordagem, concluir-se-á que os confeccionadores do DRE deverão estar atentos ao conceito de receita bruta e faturamento, assim como considerar a exclusão o ICMS da base de cálculo da PIS e COFINS.

Palavras-chave: COFINS, PIS, ICMS, faturamento, receita bruta, DRE, demonstrativos financeiros.

Abstract: The present work aims to demonstrate that the understanding reached by the Supreme Court about the concept of turnover and gross revenue, as well as the determination of the ICMS should be excluded from the basis of calculation of PIS and COFINS, will influence on construction of the statement of income for the year DRE, since this document that comprises the financial statements of the organization manager has the legal obligation to show the gross revenue and the value of taxes on it incidents. Using the deductive method assuming a general premise, that is, the analysis of the constitutionality of the exclusion of the ICMS calculation base of the PIS and Cofins, for a particular premise, which is reflected in the conceptual statement of income for the year of the entrepreneur. This approach, concluded that the makers of the DRE should be aware of the concept of gross revenue and billing, as well as consider deleting the ICMS calculation base of the PIS and COFINS.

Keywords: ICMS, PIS, COFINS, billing, gross revenue, DRE, financial statements.

  1. INTRODUÇÃO

O Direito Tributário é um dos ramos jurídicos de Direito Público mais complexos do Ordenamento Jurídico Brasileiro, dotado de legislação espaça, grande produção normativa e o embate entre o Sistema Tributário utilizado antes da vigência da Constituição Federal de 1988 e o novo sistema trazido pela Carta Cidadã.

Como resultado desse cenário, a produção jurisprudencial dos tribunais superiores é farta no sentido de buscar a solução das lacunas e apresentar para os cidadãos uma interpretação ideal corretiva dessas imperfeições. Não é raro, portanto, que os entendimentos esposados pelo Superior Tribunal de Justiça, guardião da legislação infraconstitucional, e pelo Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, influenciem no sistema jurídico e contábil de uma organização empresária.

Desse cenário, nasceu o objetivo central deste trabalho em analisar como o entendimento vinculante sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal, de que o ICMS não compõe a base de cálculo das contribuições PIS e COFINS, poderá influenciar no conceito de receita bruta, aplicado no Demonstrativo do Resultado do Exercício, instrumento este utilizado nas demonstrações financeiras do empresário.

Para satisfazer essa necessidade, a presente pesquisa utilizar-se-á do método dedutivo, partindo-se de uma premissa geral, ou seja, a análise da constitucionalidade da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e Cofins, para uma premissa particular, que é o reflexo financeiro no demonstrativo do resultado do exercício do empresário.

A reunião de informações também se dará através da pesquisa em livros, sites, artigos científicos, periódicos, julgamentos do Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça e análise da composição do demonstrativo do resultado do exercício.

Abordar-se-á a construção jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sobre o conceito de faturamento, receita bruta e receita líquida, assim como, sobre a exclusão do ICMS da composição da base de cálculo das contribuições do PIS e COFINS. Ao fim, será possível entender quais foram os argumentos favoráveis e contrários ao voto vencedor e o profundo debate que se instaurou ao redor do tema.

Examinar-se-á a influencia da conclusão alcançada pelo Supremo Tribunal Federal a respeito do conceito de faturamento e receita bruta, assim como, a sistemática que deverá ser adotada quando da avaliação do valor do ICMS, PIS e Cofins no demonstrativo do resultado do exercício.

Toda essa construção buscará a solução para o questionamento: O conceito de faturamento e receita bruta estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal, com a exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições PIS e Cofins influenciará no demonstrativo do resultado do exercício?

O tema é audacioso e em mesma proporção é o esforço intelectual e físico para se atingir os objetivos traçados. Contudo, mesmo que dotado de uma mistura de sentimentos de euforia e frustração, sabe-se que nas mínguas linhas deste artigo, não é possível traduzir com a beleza dos detalhes aquilo que foi construído ao longo dos anos por vários estudiosos do Direito e das Ciências Contábeis. Assim, sabendo das limitações e da impossibilidade de esgotamento do tema, encheu-se o coração com a esperança de se produzir um estudo satisfatório frente aos critérios de avalição.

  1. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS

Notável é que sendo o ICMS um imposto indireto, o empresário embute seu valor na composição do preço da mercadoria ou serviço e o repassa ao comprador. A somatória do pagamento dos preços compõe a receita bruta que, logo, forma o faturamento do empresário. Portanto, dentro do faturamento existe o valor do ICMS que foi repassado ao comprador e será destacado para a Fazenda Pública Estadual ou do Distrito Federal.

Como a base de cálculo da PIS e da COFINS é o faturamento, as contribuições incidem sobre o próprio ICMS, isto é, há incidência das contribuições sobre o imposto que, certamente, não terá ingresso de valores ao patrimônio do empresário.

Roque Antonio Carrazza (2015, p. 703) bem pontua que:

O punctum saliens é que a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS leva ao inaceitável entendimento de que os sujeitos passivos destes tributos “faturam ICMS”. A toda evidência, eles não fazem isto. Enquanto o ICMS circula por suas contabilidades, eles apenas obtêm ingressos de caixa, que não lhes pertencem, isto é, não se incorporam a seus patrimônios, até porque destinados aos cofres públicos estaduais ou do Distrito Federal.

Em continuidade, destaca Roque Antonio Carrazza (2015, p. 704):

A parcela correspondente ao ICMS pago não tem, pois, natureza de faturamento (e nem mesmo de receita), mas de simples ingresso de caixa (na acepção supra), não podendo, em razão disso, compor a base de cálculo quer do PIS, quer da COFINS.

Ademais, se a lei pudesse chamar de faturamento o que faturamento não é (e, a toda evidência, empresas não faturam ICMS), cairia por terra o rígido esquema de proteção ao contribuinte, traçado pela Constituição.

Realmente, nos termos da Constituição, o PIS e a COFINS só podem incidir sobre o “faturamento”, que, conforme vimos, é o somatório dos valores das operações negociais realizadas. A contrario sensu, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo destes tributos.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal discutiu profundamente o tema da exclusão do ICMS da base de cálculo da PIS e COFINS. Dois recursos extraordinários tornaram-se referências sobre a vexata quaestio[2], sendo em 2014, quando do julgamento do RE 240.785 e em 2017, através do RE 574.706, este último sob o manto da repercussão geral.

No julgamento do RE 240.785, de relatoria do i. Ministro Marco Aurélio, o tema sobre o ICMS compor o faturamento recebeu argumentos conflitantes entre duas correntes de posicionamentos entre os Ministros. No julgamento os Ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Carlos Britto, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence votaram pela exclusão do ICMS da base de cálculo da PIS e COFINS, sendo vencidos os Ministros Eros Grau, Gilmar Mendes e Carmen Lúcia (STF, RE 240785, 2014, p. 107/108).

O relator i. Ministro Marco Aurélio, em seu voto, delineou o alcance não somente do conceito de faturamento, mas também o papel do ICMS em relação às contribuições PIS e COFINS. Desta forma, torna-se importante o destaque de alguns excertos desse voto que serviu de base para a elucidação da vexata quaestio, quando do posterior julgamento com repercussão geral do RE 574.706.

Em seu voto, o i. Ministro Marco Aurélio (STF, RE 240785, 2014, p. 6) assim dispôs:

A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo. A conclusão a que chegou a Corte de origem, a partir de premissa errônea, importa a incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade da Federação. No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI. Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ‘b’ do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal.

Em brilhante abordagem, concluiu o i. Ministro Marco Aurélio (STF, RE 240785, 2014, p. 8):

(...) com razão maior, entender que a expressão “faturamento” envolve, em si, ônus fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da mercadoria. (...) Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso de qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         

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Não somente o Ministro Marco Aurélio adotou essa argumentação, mas também foi reforçado pelo i. Ministro Ricardo Lewandowski, ao afirmar que o faturamento sempre foi entendido pela doutrina, e mesmo pela prática comercial, como a receita oriunda da venda de mercadorias ou da prestação de serviços. O ICM não integra, a meu juízo, à receita da empresa a nenhum título; ela não integra o valor da operação (STF, RE 240785, 2014, p. 14).

Além desse posicionamento, o i. Ministro Cezar Peluso, também explanou que o valor do ICMS seria destacado para efeito de controle da transferência para o patrimônio público, sem que isso se incorporasse ao patrimônio do contribuinte. Além disso, acentuou que se trata de um trânsito puramente contábil, significando que isso, de modo algum, compõe o produto do exercício das atividades correspondentes aos objetivos sociais da empresa, que é o conceito de faturamento (STF, RE 240785, 2014, p. 38).

Os argumentos traçados acima, além de construírem a profundidade do conceito de faturamento, trouxeram o reconhecimento de que o sistema tributário nacional, no seu viés constitucional, não aceitaria que um imposto indireto como o ICMS compusesse a base de cálculo das contribuições PIS e COFINS, por não compor o patrimônio do contribuinte e, simplesmente, transitar por sua contabilidade e ser entregue a Fazenda Estadual na sequência.

Os argumentos contrários a essa tese foram apresentados no RE 240785, pelos i. Ministros que se opuseram a esse entendimento. Neste momento, não cabe entrar nesses fundamentos, a título de economia argumentativa, até mesmo porque, nos parágrafos seguintes, ao abordar o RE 574.706, com repercussão geral, esses argumentos divergentes serão repetidos a medida de suas importâncias.

Nos idos de 2017, restou concluso novamente ao Supremo Tribunal Federal, o Recurso Extraordinário nº 574.706, de relatoria da i. Ministra Cármen Lúcia, agora sob o mando da repercussão geral, o tema da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, além da definição do faturamento. O resultado do julgamento foi favorável para se excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS e trouxe reflexos a forma de constituição da base de cálculo dessas contribuições. Cabe aqui, analisar a discussão ocorrida nesse recurso.

Em seu voto no RE 240785, a i. Relatora Ministra Carmén Lúcia voltou no sentido de que o conceito de faturamento não seria constitucional, julgando o recurso improcedente. Contudo, no julgamento do RE 574.706, seu voto fundamentou no sentido da não inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições. Seu voto foi vencedor e acompanhado de outros Ministros.

Como fundamentação, a i. Ministra Carmén Lúcia assim dispôs (STF, RE 574706, 2017, p. 26):

Enfatize-se que o ICMS incide sobre todo o valor da operação, pelo que o regime de compensação importa na circunstância de, em algum momento da cadeia de operações, somente haver saldo a pagar do tributo se a venda for realizada em montante superior ao da aquisição e na medida dessa mais valia, ou seja, é indeterminável até se efetivar a operação, afastando-se, pois, da composição do custo, devendo ser excluído da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.

Contudo, é inegável que o ICMS respeita a todo o processo e o contribuinte não inclui como receita ou faturamento o que ele haverá de repassar à Fazenda Pública.

Com esses fundamentos, concluo que o valor correspondente ao ICMS não pode ser validamente incluído na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.

Por fim, propôs como tese de seu voto o verbete de que o ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS (STF, RE 574706, 2017, p. 27).

Em voto contrário ao posicionamento da relatora, o i. Ministro Edson Fachin, asseverou que o fundamento dominante do voto vencedor no julgamento do RE 240.785, do i. Ministro Marco Aurélio, foi no sentido de que o conceito de faturamento estaria restrito à quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços (STF, RE 574706, 2017, p. 33).

Não obstante esse posicionamento, o nobre julgador entendeu que o conceito de faturamento residiria na tradução da somatória de receitas resultantes das atividades empresariais, e não apenas da venda de bens e serviços correspondentes a emissão de faturas (STF, RE 574706, 2017, p. 37).

De forma oposta que a maioria, esse voto divergente asseverou que (STF, RE 574706, 2017, p. 39/40):

Logo, embora não haja incremento patrimonial, o valor relativo ao ICMS destacado e recolhido referente a uma operação concreta integrará a receita efetiva do contribuinte, pois gerará oscilação patrimonial positiva, independentemente da motivação do surgimento da obrigação tributária ou da destinação final desse numerário ao Estado em termos parcial ou integral, após devida compensação não automática na qual se considera a técnica da não cumulatividade, como, por exemplo, pela metodologia de conta gráfica, por sua vez expressamente referida no libelo da demanda veiculado no mandado de segurança impetrado pela parte Recorrente.

Por fim, concluiu que o faturamento, espécie do gênero receita bruta, engloba a totalidade do valor auferido com a venda de mercadorias e a prestação de serviços, inclusive o quantum de ICMS destacado na nota fiscal. Que se constata que a tributação se dá em relação ao preço da operação final, embora neste esteja incluído o numerário de ICMS destacado, devido e recolhido (STF, RE 574706, 2017, p. 40).

Por fim, o i. Ministro propôs que seu entendimento fosse sumulado da seguinte forma (STF, RE 574706, 2017, p. 45):

O valor do ICMS, destacado na nota, devido e recolhido pela sociedade empresária, compõe seu faturamento, submetendo-se à tributação pelas contribuições ao PIS e à COFINS, por ser integrante do conceito de receita bruta, base de cálculo das referidas exações.

O i. Ministro Marco Aurélio, ao analisar o conteúdo do voto acima resumido, destacou que a Constituição não sofreu alterações desde o pronunciamento do RE 240.785, mas que somente teria ocorrido a alteração na configuração dos membros do Supremo Tribunal Federal, o que não justificaria a releitura da interpretação constitucional feita no julgamento daquele recurso (STF, RE 574706, 2017, p. 46).

Ainda, destacou que tanto faz considerar faturamento – como previsto no artigo 195, inciso I, da Constituição Federal -, como receita bruta, porque, desenganadamente, o contribuinte não fatura e não tem, como receita bruta, tributo, ou seja, o ICMS (STF, RE 574706, 2017, p. 46).

Em voto também contrário ao posicionamento da relatora, o i. Ministro Luiz Roberto Barroso (STF, RE 574706, 2017, p. 52) ponderou que:

Há decisão expressa do Supremo nesse sentido. E o Superior Tribunal de Justiça manteve íntegra uma jurisprudência que já vinha desde o tempo do Tribunal Federal de Recursos, e, ainda recentemente, o STJ, endossando esse entendimento, julgou legítima a inclusão do ISS e do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS, sob o argumento de que o conceito de receita e faturamento compreende os tributos que incidem sobre o consumo, uma vez que eles passam a compor o patrimônio do contribuinte, assim como todos os outros custos que compõem os preços das mercadorias.

Considerou o nobre julgador que o ICMS não poderia ser destacado, pois compõe o preço do produto assim como qualquer outro gasto que o contribuinte teria, por exemplo, energia elétrica, água, salários e outros. Que se tal sistemática fosse invertida, estar-se-ia tributando o lucro. Em seu argumento (STF, RE 574706, 2017, p. 53):

De um dinheiro que qualquer empresa arrecada, arrecadou cem, uma fração desses cem vai para pagar tributos; outra fração vai para pagar os empregados; outra fração vai para pagar os fornecedores. Portanto, se nós formos fatiar a receita bruta ou o faturamento para excluir, da incidência, tudo aquilo que seja despesa, então, estamos tributando lucro.

O papel do contribuinte nessa situação não seria a de um mero arrecadador e repassador de ICMS, porque ele não retém na fonte. Recai sobre o contribuinte a prerrogativa de dar o destino do montante pago pelo consumidor, que não envolve ser inteiramente utilizado para quitar o valor de ICMS embutido na mercadoria (STF, RE 574706, 2017, p. 54/55).

Nesse sentido, exemplificou o i. Ministro (STF, RE 574706, 2017, p. 55):

Por exemplo: ele pode utilizar este valor para investir no mercado financeiro até que chegue a data do efetivo recolhimento; ele pode compensar créditos com outras operações do estabelecimento; ele pode simplesmente descumprir obrigação tributária e ficar com o dinheiro. Não é fato que o contribuinte seja um mero repassador desse tributo, com todas as vênias.

Por fim, alertou sobre o possível efeito negativo que o entendimento já firmado no RE 240.785 e exposto anteriormente, poderia causar ao sistema tributário nacional (STF, RE 574706, 2017, p. 56):

Só que, agora, diante da decisão do Supremo no Recurso Extraordinário nº 240.785, os tribunais inferiores e o próprio STJ já estão mudando essa orientação e excluindo da base de cálculo, outros tributos, inclusive o ISS. Portanto, uma decisão como a nossa pode produzir um efeito sistêmico que eu, neste momento, consideraria imprevisível.

Em mesma conclusão, mas por viés diferente, o i. Ministro Dias Toffoli argumentou que (STF, RE 574706, 2017, p. 94):

Em suma, o ônus financeiro do ICMS transferido, por meio do preço convencionado da mercadoria ou do serviço, para dentro da receita ou do faturamento está abrangido pela materialidade do PIS/COFINS.

O texto constitucional, em sua redação originária, estabelece a possibilidade da instituição de contribuições sociais incidentes, dentre outras hipóteses, sobre “o faturamento” (art. 195, I). Após a EC nº 20/98, a Constituição passou a possibilitar a incidência sobre “a receita ou o faturamento” (art. 195, I, b). Ou seja, a Carta Federal nunca disse que as contribuições deveriam incidir necessariamente sobre “o faturamento líquido” ou sobre “a receita líquida”. Portanto, em relação às bases de cálculo das referidas contribuições, sempre houve um virtuoso espaço para o legislador transitar. O entendimento prevalecente no RE nº 240.785 acabou por aproximar o conceito de faturamento ao de receita líquida, contrariando a tradicional jurisprudência da Corte, que sempre equiparou “faturamento” a “receita bruta”. Esse entendimento, aliás, parte de noções de faturamento já aceitas pela Corte, as quais envolvem não só o “emitir faturas”, mas também o resultado econômico das operações empresariais do agente econômico, assim compreendido como “receita bruta das vendas de mercadorias e mercadorias e serviços, de qualquer natureza”, entendimento esse consagrado no RE nº 150.764, Relator o Ministro Ilmar Galvão, e na ADC nº 1, Relator o Ministro Moreira Alves.

O i. Ministro buscou afastar o argumento de que o ICMS comportaria mero trânsito contábil, sem compor o patrimônio do contribuinte. Em seu argumento (STF, RE 574706, 2017, p. 97):

Por fim, em relação às alegações de que haveria mero trânsito contábil do ICMS nas escritas da parte recorrente e de que ela apenas antecipa os valores relativos ao imposto na qualidade de substituta, a insurgência também não merece acolhimento. Como exposto, a parte recorrente, no tocante às mercadorias por ela vendidas e aos serviços por ela prestados, atua como verdadeira contribuinte do ICMS. Responde ela por débito tributário próprio, e não de terceiro. Como bem lembrou o Ministro Eros Grau no RE 240.785, o ICMS não funciona como um imposto retido.

Por seu turno, o i. Ministro Gilmar Mendes manteve seu posicionamento sobre a matéria, em síntese, defendendo que o valor do ICMS fica disponível ao contribuinte ao entrar em seu caixa e pode ser aplicado em outros investimentos. Também, que referido valor compõe o preço da mercadoria e, logo, o faturamento, assim como outros custos que não são desconsiderados da base de cálculo dessas contribuições. Assim, votou pela improcedência do recurso e manutenção do imposto na base de cálculo das contribuições (STF, RE 574706, 2017, p. 109).

Posicionamento que acompanhou o voto vencedor da relatora, de lavra do i. Ministro Celso de Mello, destacou que o valor pertinente ao ICMS é repassado ao Estado-membro (ou ao Distrito Federal), dele não sendo titular a empresa, pelo fato, juridicamente relevante, de tal ingresso, não se qualificar como receita que pertença, por direito próprio, à empresa contribuinte (STF, RE 574706, 2017, p. 185).

Ainda em sua explanação, discorreu que a noção conceitual de receita compõe-se da integração ao mesmo para efeito de sua configuração, de 02 (dois) elementos essenciais, tais como: a) que a incorporação dos valores faça-se positivamente, importando em acréscimo patrimonial; e b) que essa incorporação revista-se de caráter definitivo (STF, RE 574706, 2017, p. 185).

Por fim, concluiu o nobre Ministro que como o ICMS transita pelo patrimônio do contribuinte, não o integrando, para depois ser entregue a Fazenda Pública Estadual ou do Distrito Federal, não poderá compor a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS, por não se tratar de receita bruta (STF, RE 574706, 2017, p. 195).

Conforme exposto nos parágrafos acima, o entendimento clássico que vinha sendo adotado pelo Supremo Tribunal Federal sofreu alterações, as quais explanadas nos excertos acima, com a conclusão de que o ICMS não compõe o faturamento do contribuinte e, portanto, não deve compor a base de cálculo das contribuições da PIS e COFINS.

O posicionamento sedimentado no RE 574.706, o qual confirmou o que foi julgado no RE 240.785, quebrou paradigmas anteriores e trouxe reflexos na interpretação da forma de composição da base de cálculo da PIS e COFINS, com a exclusão do ICMS e a abertura da discussão sobre a possibilidade de exclusão de outros tributos que também compõem essa base de cálculo.

Portanto, o debate sobre os reflexos do entendimento de que tributos que não integram o patrimônio do contribuinte, os quais devem ser entregues posteriormente a Fazenda Pública, não podem ser entendidos como a receita bruta que perfaz o faturamento, ainda gerará a exclusão de outros que atualmente compõem a base de cálculo das contribuições, como exemplo, o caso do imposto sobre serviços de competência dos Municípios.

Por certo que a sistemática de apuração das contribuições a ser executada pela organização empresária passará por alterações que deverão ser consideradas no Demonstrativo do Resultado do Exercício (DRE), principalmente no que diz respeito à receita bruta. Dessa disposição, passa-se a análise da composição desse demonstrativo, através do que dispõe a literatura e exemplos práticos, no intuito de explorar ainda mais o tema tratado neste estudo.

  1. A COMPOSIÇÃO DA RECEITA BRUTA PARA O DEMONSTRATIVO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO

Sobre o que é Demonstrativo do Resultado do Exercício, cabe destacar a importante lição trazida pelos professores André Luis Fernandes Limeira, Carlos Alberto dos Santos Silva, Carlos Vieira e Raimundo Nonato Souza Silva (2015, p. 34):

Essa demonstração apresentará informações relativas a um determinado período de apuração, enquanto no balanço patrimonial a informação corresponde ao dia da apresentação. Na demonstração do resultado, a informação corresponde ao intervalo de tempo entre os dois balanços. Na DRE, encontraremos todos os elementos que se caracterizam como receitas e despesas reconhecidas dentro do período. O confronto entre as receitas e as despesas evidenciará o resultado da entidade no respectivo momento da apuração. O resultado, quer dizer, o lucro ou o prejuízo do exercício será determinado pela diferença entre as receitas reconhecidas menos as despesas incorridas.

Para o professor José Carlos Marion (2009, p. 98):

A demonstração do resultado do exercício é um resumo ordenado das receitas e despesas da empresa em determinado período, normalmente 12 meses. É apresentada de forma dedutiva (vertical), ou seja, das receitas subtraem-se as despesas e, em seguida, indica-se o resultado (lucro ou prejuízo).

A DRE pode ser simples para micro ou pequenas empresas que não requeriam dados pormenorizados para a tomada de decisão, como é o caso de bares, farmácias, mercearias. Deve evidenciar o total de despesa deduzido da receita, apurando-se, assim, o lucro sem destacar os principais grupos de despesas.

A DRE completa, exigida por lei, fornece maiores minúcias para a tomada de decisão: grupos de despesas, vários tipos de lucro, destaque dos impostos etc.

O artigo 187, incisos, da Lei 6.404/1976, traz as informações que devem ser apresentadas na demonstração do resultado do exercício. Veja-se a redação do artigo:

Art. 187. A demonstração do resultado do exercício discriminará:

I – a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos e os impostos;

II – a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços vendidos e o lucro bruto;

III – as despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das receitas, as despesas gerais e de administrativas, e outras despesas operacionais;

IV – o lucro ou prejuízo operacional, as outras receitas e as outras despesas;

V – o resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda e a provisão para o imposto;

VI – as participações de debêntures, empregados, administradores e partes beneficiárias, mesmo na foram de instrumentos financeiros, e de instituições ou fundos de assistência ou previdência de empregados, que não se caracterizem como despesa;

VII – o lucro ou prejuízo líquido do exercício e seu montante por ação do capital social.

§ 1º Na determinação do resultado do exercício serão computados:

  1. As receitas e os rendimentos ganhos no período, independentemente da sua realização em moeda; e
  2. Os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, correspondentes a essas recitas e rendimentos.

Como bem destaca o art. 187, inciso VII, acima posto, ao final da demonstração é obrigatória a indicação do lucro ou do prejuízo líquido do exercício e seu montante por ação de capital.

O quadro abaixo bem exemplifica a construção do Demonstrativo do Resultado do Exercício, com os diversos grupos de contas integrantes de sua estrutura (LIMEIRA, et al., 2015, p. 35/36):

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Quadro 01, Fonte: (LIMEIRA et al., 2015, p. 35/36)

Além do exemplo acima, José Carlos Marion também apresenta outro, didaticamente ilustrativo para este estudo (MARION, 2015, p. 113/114):

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Quadro 2, Fonte: (MARION, 2015, p. 113/114)

Além dessas especificações sobre a DRE, o i. Ministro Dias Toffoli, em seu voto no RE 574.706, ponderou que o artigo 187, da Lei 6.404/1976 (STF, RE 574706, 2017, p. 209):

Por sua vez, o art. 187, I, da Lei das Sociedades por Ações, referido no voto do Ministro Cezar Peluso no julgamento dos RE nº 346.08, 358.273, 357.95, 390.840, no meu entender, é norma direcionada para uma contabilidade comercial, e em nenhum momento, refere que o ônus financeiro do ICMS não integraria a receita bruta da empresa. O que o dispositivo diz é que a Demonstração do Resultado do Exercício – DRE (um dos vários demonstrativos contábeis de uma companhia deverá discriminar certas rubricas, como a “receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos e os impostos”. E discriminar não significa dizer que a receita bruta deva ser apresentada já sem os impostos, até porque, se isso acontecesse, não se trataria mais de receita bruta.

Veja-se que na construção do DRE, a receita bruta não leva em consideração o abatimento de impostos que incidem sobre ela e que são embutidos na composição de cada preço de cada mercadoria ou serviço. Simplesmente, leva-se em consideração todos os custos, inclusive impostos, para a sua formação.

Na lição de José Carlos Marion (2009, p. 99/100), o conceito de receita bruta assim pode ser entendido:

A receita bruta é o total bruto vendido no período. Nela estão inclusos os impostos sobre vendas (os quais pertencem ao governo) e dela não foram subtraídas as devoluções (vendas canceladas) e os abatimentos (descontos) ocorridos no período.

Impostos e taxas sobre vendas são aqueles gerados no momento da venda; variam proporcionalmente à venda, ou seja, quanto maior for o total de venda, maior será o imposto.

Na verdade, os impostos sobre vendas não pertencem à empresa, mas ao governo. Ela é uma mera intermediária (veículo de arrecadação) que arrecada impostos junto ao consumidor e recolhe ao governo; por isso, não devem ser considerados como receita real da empresa.

O nobre professor destaca que não obstante a empresa servir de arrecadadora do Estado, os impostos e taxas compõem a receita bruta para interesse da DRE, mesmo que os valores arrecadados não sejam considerados como receita realmente incluída no patrimônio do empresário.

O item 30.1.1, do Manual de Contabilidade Societária, elaborado pela FIPECAFI, ao trabalhar com o conceito de receita bruta não exclui o ICMS em questão (MARTINS, 2013, p. 568):

A Lei nº 6.404/76, em seu art. 187, itens I e II, estabelece que as empresas deverão, na Demonstração do Resultado do Exercício, discriminar ‘a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, dos abatimentos e dos impostos’ e ‘a receita líquida das vendas e serviços’.

Dessa forma, a contabilização das vendas deverá ser feita por seu valor bruto, inclusive impostos, sendo que tais impostos e as devoluções e abatimentos deverão ser registrados em conta devedoras específicas, as quais serão classificadas como contas redutoras das vendas.

Diante da consideração no DRE sobre o conceito de receita bruta, o i. Ministro Dias Toffoli destacou que (STF, RE 574.706, 2017, p. 210):

(...) se nós considerarmos que o conceito de receita bruta a ser adotado seria o constante da Lei das Sociedades por Ações (uma lei de direito privado ou de direito comercial), chegaríamos ao seguinte raciocínio: a) o art. 187, I, da Lei das Sociedades por Ações não exclui do conceito de receita bruta o ônus financeiro do ICMS relativo às vendas realizadas pela companhia; b) se a contribuição ao PIS e a Cofins incidem sobre a receita bruta a que se refere o art. 187, I, da Lei das Sociedades por Ações, então, inevitavelmente, essas contribuições incidem sobre o ônus financeiro (repassado para o preço da mercadoria ou do serviço) do ICMS relativo às vendas realizadas pela companhia. Se partirmos para excluir a parcela relativa à despesa com o pagamento do ICMS, devemos ter em conta que o raciocínio deve valer para os demais tributos (como o IPI e o ISS), já que eles, de igual modo, constituem parcelas dedutíveis da receita bruta.

O novo posicionamento do Supremo Tribunal Federal, expressado no entendimento vencedor do RE 574.706, de que o ICMS não compõe o faturamento do empresário, logo a receita bruta, provoca alteração na forma de se compreender a composição da DRE, pois nesta, conforme se viu, a receita bruta considera todos os custos, inclusive o próprio imposto. Logo na sequência, da receita bruta, desconta-se os impostos e contribuições incidentes sobre a venda, ou seja, os mesmos que foram incluídos na receita bruta anteriormente.

Seguindo o raciocínio aplicado pelo Supremo Tribunal Federal, o ICMS deverá ser retirado da receita bruta, o que resultará na redução da base de cálculo para a PIS e Cofins, logo também, resultará na redução do valor dessas contribuições, na própria DRE.

O conflito entre a interpretação do que compõe a receita bruta para o Supremo Tribunal Federal e as normas de contabilidade até então aplicadas, gerarão dúvidas aos profissionais contabilistas e advogados, pois ainda não se tem um posicionamento claro de como proceder perante essa alteração.

Como bem adverte o i. Ministro Dias Toffoli (STF, RE 574706, 2017, p. 211):

Em outras palavras, caso esta Suprema Corte adote o entendimento de que o ICMS não integra a base de cálculo do PIS/Cofins, a meu sentir, se estará alterando a definição, o conteúdo e o alcance do conceito de receita bruta adotado tanto no direito tributário como no direito privado e já largamente utilizado na jurisprudência da Corte.

Atualmente, o referido recurso ainda não transitou em julgado, pois em 19.10.2017, a Fazenda Nacional interpôs o recurso de embargos de declaração, onde alega omissões e contradições, conforme excerto do recurso (STF, RE 5745706, 2017, 3):

Destaque-se, ademais, que deixaram os votos vencedores de analisar a similitude entre o presente caso e os REs 212.209 e 582.461, ou de apontar qualquer ponto que justificasse a adoção de solução diversa nas hipóteses. Da mesma forma, a corrente predominante, não rechaçou a incidência sobre o caso do conceito de receita bruta, reiteradamente suscitado pelos votos vencidos, insculpido no art. 12 do DL 1.598/77. Também foi relegada definição acerca de modulação de efeitos da citada decisão para um momento posterior – apreciação de embargos de declaração a serem interpostos pelas partes. Observe-se que, além de estar configurada omissão da corrente vencedora quanto aos referidos pontos (suscitados no acórdão e nas contrarrazões), tratando-se de uma Corte Constitucional, cujas decisões se legitimam mediante um processo de deliberação racional do colegiado, em que o argumento de cada um é considerado, para ser acolhido ou refutado pelos demais, é indispensável que tais questões sejam analisadas pelos votos-vencedores, mesmo que isso seja dificultado pelo procedimento de votação adotada na Corte.

Como bem ponderou o recurso de embargos de declaração, os efeitos modulatórios do acórdão ainda não foram fixados pela e. Suprema Corte. Ao modular os efeitos da r. decisão embargada, o i. Supremo Tribunal Federal aplicará um dos efeitos previstos no art. 27, da Lei 9.868/1999:

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Assim, a Fazenda Nacional busca a modulação dos efeitos ex nunc[3], o qual atrai a aplicação do entendimento da Suprema Corte somente a partir do trânsito em julgado do r. acórdão, o que ainda não ocorreu.

Portanto, tanto a comunidade contábil como jurídica permanecem a espera de uma definição pela Suprema Corte de como proceder nessa situação.

Também, esse novo posicionamento, caso a modulação de efeitos seja diferente do que pedido pela Fazenda Nacional, demandará que o Comitê de Pronunciamentos Contábeis edite novo pronunciamento para que todos possam se orientar. Nessa mesma linha, a própria Receita Federal, para que erros possam ser evitados e, por conseguinte, o endividamento desnecessário do contribuinte.

Como as informações lançadas na DRE são necessárias para a tomada de decisões estratégicas para a organização empresarial, elas devem ser lançadas com fidedignidade à composição da receita bruta do empresário e os valores auferidos das contribuições do PIS e COFINS. Portanto, equívocos levarão a planejamentos errôneos e, logo, prejuízos financeiros.

  1. CONCLUSÃO

O Poder Judiciário, em um avanço sistêmico, passou a ter a seu dispor instrumentos de vinculação de suas jurisprudências, fazendo com que a interpretação sobre um dispositivo de lei seja aplicada em todos os tribunais. Como exemplo desses instrumentos, podem ser citadas as súmulas vinculantes, os recursos especiais repetitivos, os recursos extraordinários com repercussão geral e os incidentes de demandas repetitivas. Através deles, os tribunais superiores impõem sua interpretação sobre todos os outros tribunais e, consecutivamente, essa sistemática repercute no planejamento da iniciativa privada.

Assim, tribunais como o Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça passaram a determinar a interpretação das normas constitucionais e infraconstitucionais do país. Com a concentração de grandes poderes nas mãos de poucos, a sociedade passou a depender do posicionamento dessas cabeças pensantes, mais do que a produção legislativa exercida pelo Poder Legislativo e a execução da Norma pelo Poder Executivo.

Nesse cenário foi o julgamento do tema da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS, assim como, a construção constitucional do conceito de faturamento assumir os contornos da receita bruta.

Referida matéria teve seu início de julgamento na década de 90, com a continuidade até o ano de 2018 e ainda pendente de definição sobre a modulação de efeitos do r. acórdão que reconheceu a exclusão do imposto da base de cálculo das contribuições e sedimentou o conceito de faturamento, previsto na Constituição Federal, à semelhança do de receita bruta.

O r. acórdão vencedor gerou uma mudança profunda na jurisprudência desses tribunais superiores, de 2ª e 1ª instâncias e na atividade operacional interna corpus da organização empresarial.

O trato com o conceito de receita bruta passou a ser interpretado com a ausência do imposto estadual que, lembre-se de passagem, para algumas situações compõe 29% (vinte e nove por cento) do valor da prestação do serviço de comunicação e fornecimento de mercadoria energia elétrica no Estado do Paraná, serviço e produto essenciais para evolução da humanidade.

O imposto estadual, na antiga configuração jurisprudencial e legislativa, compunha a base de cálculo utilizada pelas contribuições sociais da PIS e COFINS, isto é, tinha-se a incidência de contribuição sobre imposto, o que, naturalmente, resultava num aumento do valor dessas exações a ser recolhido aos cofres públicos.

Com a nova interpretação, dever-se-á retirar o imposto do total da receita bruta (faturamento) para que a base de cálculo das contribuições possa ser pronta para a incidência dessas duas exações. Assim, ao assentar que o conceito de faturamento deve abster-se da inclusão do imposto, conforme foi discutido no capítulo terceiro, o procedimento contábil de construção dos documentos que compõe os demonstrativos financeiros, dentre eles, o demonstrativo do resultado do exercício deverá levar em consideração o conceito de receita bruta fixado não em lei, mas na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Os demonstrativos financeiros deverão se adaptar a nova conjuntura, pois possuem a função de retratar informações fidedignas, principalmente sobre a carga tributária e a receita bruta. Ao continuarem a considerar que o imposto compõe a receita bruta, propagarão a informação de um valor não condizente com a realidade empresarial, com o impacto da carga tributária e, por conseguinte, apresentarão uma composição do lucro desfocada da nova realidade.

Como é de notório conhecimento, o empresário vive hoje de um lado pressionado pela exacerbada produção normativa da Receita Federal que, por outro lado, é abalada pela criação de novos comandos por parte das interpretações do Poder Judiciário. Saber se posicionar num espaço onde se possa amar gregos e troianos, proporcionará farol em meio a uma tempestade das várias que o pequeno barco ou transatlântico da empresa poderá se guiar e não colidir com as rochas da tributação.

Portanto, sem a capacidade e competência de se esgotar o tema aqui tratado, mas com o espírito de um pesquisador instigado e desafiado pela evolução (positiva ou negativa) das causas que envolvem os empresários brasileiros perante o Poder Judiciário, o presente trabalho alcançou seu objetivo, ou seja, o de discorrer sobre as alterações que vieram e ainda estão por vir, frutos da interpretação vinculante da Suprema Corte Brasileira e instigar uma discussão sadia sobre o assunto.

  1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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_______. Código Tributário Nacional – Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966. Brasília 1966. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>. Acessado em 03.07.2018.

_______. Lei Kandir – Lei Complementar 87, de 13 de setembro de 1996. Brasília 1996. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp87.htm. Acessado em 14.08.2018.

_______. Decreto Lei 1.598, de 26 de dezembro de 1977. Brasília 1977. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del1598.htm#art12. Acessado em 15.08.2018.

_______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 240785 MG, Relator(a): Min. Marco Aurélio, julgado em 08/10/2014, DJe-246 DIVULG 15/12/2014 PUBLIC 16/12/2014 EMENT VOL-02762-01 PP-00001.

_______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 574706 RG, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 24/04/2008, DJe-088 DIVULG 15-05-2008 PUBLIC 16-05-2008 EMENT VOL-02319-10 PP-02174.

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LIMEIRA, André Luis Fernandes. SILVA, Carlos Alberto dos Santos. VIEIRA, Carlos. SILVA, Raimundo Nonato Souza. Gestão Contábil Financeira. Série Gestão Empresarial. 2ª ed. Rio de Janeiro: FGV, 2015.

MARION, José Carlos. Contabilidade Básica. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2009.

MARTINS, Eliseu et al. Manual de Contabilidade Societária. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2013.

 

[1] ........

[2] Questão debatida; controvertida (Enciclopédia Jurídica, 2014).

[3] Ex nunc: de agora; a partir do presente (Enciclopédia Jurídica, 2014).

Sobre o autor
Peter Emanuel Pinto

Advogado tributarista da sociedade Pinto & Bowens Advogados Associados (OAB/PR 5.745). Pós-graduado em MBA com ênfase em Finanças, Controladoria e Auditoria, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) (2018); Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio (2017); Pós-graduado em Direito Tributário pelo IBET de Curitiba-PR (2011); Graduado em Direito pelo Centro de Ensino Superior de Campos Gerais (2009); Professor de Direito Tributário pelo Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais - Cescage; Professor de Direito Aplicado ao Agronegócio na Pós-Graduação pelo Cescage; Presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB de Ponta Grossa-PR, gestão 2016-2018; Conselheiro da OAB Subseção de Ponta Grossa – PR, gestão 2019-2021; Membro do Conselho Municipal de Contribuintes de Ponta Grossa – PR 2018-2021; Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Tributário, Empresarial e Médico.

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