Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Responsabilidade jurídica pelo fogo, aceiros e danos ambientais

Agenda 08/06/2022 às 08:00

Prestes a iniciar mais uma temporada de estiagem pelo país, que se apresentam cada vez mais severas, muitos questionamentos e demandas jurídicas acompanharam a época das secas, principalmente sobre o controle do fogo.

Prestes a iniciar mais uma temporada de estiagem pelo país, que se apresentam cada vez mais severas, muitos questionamentos e demandas jurídicas acompanharam a época das secas, principalmente sobre o controle do fogo com a necessidade de fazer aceiros para se defender das queimadas sem receber penalizações ambientais pela fiscalização.

Isto porque, na prática, para fazer os aceiros é necessário derrubar algumas árvores, com objetivo de proteger até mesmo áreas de preservação permanentes (APP), como diz o ditado fogo de morro acima e água de morro abaixo são de difícil controle e morros são APPs.

O aceiro é aquele espaço desbastado de vegetação, que se abre em torno das propriedades rurais para impedir a propagação do fogo, realizado durante operações de prevenção ou combate ao incêndio nas propriedades rurais, utilizando ferramentas ou tratores, isolando as vegetações para que não haja passagem do fogo. O aceiro também pode ser feito pela queima controlada, autorizada por lei, a depender da época, podendo também estar proibida durante a estiagem, o que é muito comum.

O Código Florestal determina no artigo 38 a proibição do uso de fogo na vegetação, criando uma exceção no seu inciso II para a queima controlada em unidades de conservação, mediante plano de manejo e aprovação do órgão gestor, para garantir proteção e manejo local, onde hajam características ecológicas associadas à ocorrência do fogo, como no cerrado.

O Decreto Federal nº 2.661/1998 também proíbe uso do fogo, criando permissões a partir do seu artigo 2º na atividade definida como queima controlada mediante prévia autorização no órgão ambiental local, preenchendo uma série de requisitos determinados pelo artigo 3º como a definição das técnicas, equipamentos e mão de obra; reconhecimento da área; enleiramento dos resíduos da vegetação a serem queimados; aceiros de non mínimo três metros de largura, permitida ampliação para os casos de propagação do fogo fora dos limites estabelecidos; estabelecimento de cronograma; aviso aos vizinhos e acompanhamento até extinção do fogo.

Este citado decreto, frequentemente, é suspenso por outros decretos, por prazos de até 120 dias, como se viu em 2019, 2020 e 2021 (até 28/outubro), devido aos riscos trazidos pela estiagem, situação que pode ocasionar crime ambiental e multas ambientais para quem descumpre, conforme prevê o artigo 41 da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998) e artigo 58 do Decreto Federal nº 6.514/2008.

Caso ocorram incêndios em propriedades rurais, a recomendação é sempre comunicar imediatamente às autoridades, realizando boletim de ocorrência, ata notarial e laudos periciais e demais provas capazes de comprovar que ocorreu de maneira incidental.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

E em caso de fiscalização, o próprio Código Florestal, no artigo 38, §§ 3º e 4º determina que, em caso de apuração de responsabilidade pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou particulares, a autoridade competente deverá comprovar o nexo de causalidade entre a ação do proprietário ou qualquer preposto e o dano efetivamente causado, determinando ainda como necessário o estabelecimento de nexo causal na verificação das responsabilidades por infração pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou particulares.

Esta determinação é nada menos do que a confirmação sobre a responsabilidade objetiva característica das infrações administrativas ambientais e crimes ambientais, já que, por lei, depende da comprovação de autoria (conduta), nexo causal e o dano para que se possa atribuir responsabilidade a alguém.

Com relação aos aceiros, para evitar quaisquer outros mal entendidos sobre a prática em meio a um incêndio, além de cumprir as sugestões ditas acima, vale ainda consultar o que diz o órgão ambiental de cada estado, pois as regras podem sofrer variações, como por exemplo, no Mato Grosso do Sul, onde a resolução do licenciamento ambiental dispensa de licenciamento os aceiros preventivos e em caso de queima controlada, feito o devido comunicado ou proposta técnica no órgão ambiental. E no estado vizinho, Mato Grosso, um decreto estadual também dispensa de autorização pela Secretaria de Meio Ambiente a construção e manutenção de aceiros.

Finalmente, é importante comentar as diferenças entre queimada ou queima controlada de incêndio, pois a primeira é uma situação autorizada por lei,; e a segunda, de acordo com o dicionário é o fogo que se propaga com intensidade, do qual, se comprovada a ação humana, nos termos da lei, cabe punição administrativa ou criminal.

As queimadas em áreas rurais não são assunto recente, pois de acordo com relatos dos bandeirantes Orlando Villas Bôas e Claudio Villas Bôas no livro A Marcha para o Oeste: a epopeia da Expedição Roncador-Xingu, foi através do fogo que foram encontrados indígenas no centro-oeste brasileiro, antes mesmo da existência dos produtores rurais, pois os índios ateavam fogo como prática cultural.

É necessário diferenciar as condutas permitidas por lei, das ilegais, as boas práticas das atividades comprovadamente poluidoras, dar nomes aos bois e entender o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas, a definição de meio ambiente feita pela legislação.

Sobre o autor
Pedro Puttini Mendes

Advogado, Consultor Jurídico (OAB/MS 16.518, OAB/SC nº 57.644). Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Sócio da P&M Advocacia Agrária, Ambiental e Imobiliária (OAB/MS nº 741). Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Colunista de direito aplicado ao agronegócio para a Scot Consultoria. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA), Membro Consultivo da Comissão de Direito Ambiental e da Comissão de Direito Agrário e do Agronegócio da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco. Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil pela Anhanguera (2011). Cursos de Extensão em Direito Agrário, Licenciamento Ambiental e Gestão Rural. PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA: "Pantanal Sul-Mato-Grossense, legislação e desenvolvimento local" (Editora Dialética, 2021), "Agronegócio: direito e a interdisciplinaridade do setor" (Editora Thoth, 2019, 2ª ed / Editora Contemplar, 2018 1ª ed) e "O direito agrário nos 30 anos da Constituição de 1988" (Editora Thoth, 2018). Livros em coautoria: "Direito Ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988" (editora Thoth, 2018); "Direito Aplicado ao Agronegócio: uma abordagem multidisciplinar" (Editora Thoth, 2018); "Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul - explicada e comentada" (Editora do Senado, 2017).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!