3. Compatibilidade da Justiça Restaurativa com o Direito Positivo Brasileiro
Nos países do sistema common law, onde a justiça restaurativa primeiramente aflorou, há cerca de três décadas, o sistema jurídico é mais receptivo à derivação de casos para a justiça restaurativa (restorative diversion), principalmente pela grande discricionariedade do promotor em processar ou não (prosecutorial discretion), segundo o princípio da oportunidade.
Naquele sistema há, então, grande abertura para o encaminhamento de casos a programas alternativos mais autônomos, ao contrário do nosso, que era e continua sendo mais restritivo, em virtude do princípio da indisponibilidade da ação penal pública
Todavia com as inovações da Constituição de 1988 e o advento, principalmente, da Lei 9.099/95, abre-se uma pequena janela, no sistema jurídico brasileiro, ao princípio da oportunidade, permitindo certa acomodação sistêmica do modelo restaurativo em nosso país, mesmo sem mudança legislativa, nos casos de crime de ação penal de iniciativa privada e de ação penal pública tanto condicionada como incondicionada.
Nos crimes de ação penal de iniciativa privada, sendo disponível e estando inteiramente a critério do ofendido a provocação da prestação jurisdicional, é possível para as partes optarem pelo procedimento restaurativo e construírem um outro caminho, que não o judicial, para lidar com o conflito.
O mesmo se dá no tocante à ação penal pública condicionada à representação do ofendido, e mesmo, talvez, quando depender de requisição do Ministro da Justiça.
Mas a abertura existente para uma maior reflexão sobre a justiça restaurativa como política criminal, estaria, acredita-se, no espaço de consenso aberto a partir de 1988, na área criminal.
A Constituição prevê, no art. 98, I, a possibilidade de conciliação e transação em casos de infrações penais de menor potencial ofensivo.
Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;
Com essa inovação da constituição de 1988, pode-se dizer que o princípio da oportunidade passou a coexistir com o princípio da obrigatoriedade da ação penal.
A lei dos juizados especiais cíveis e criminais regula o procedimento para a conciliação e julgamento dos crimes de menor potencial ofensivo – é nela onde está a principal janela - com a composição civil (artigo 74 e parágrafo único), a transação penal (76) e a suspensão condicional do processo (artigo 89).
Nos termos da referida lei, tanto na fase preliminar de conciliação quanto durante o procedimento contencioso é possível a derivação para o processo restaurativo, sendo que, nos crimes de ação penal privada e pública condicionada, há a possibilidade de despenalização por extinção da punibilidade através da composição civil, e, nos casos de ação penal pública, utilizando-se o encontro para, além de outros aspectos da solução do conflito, se discutir uma sugestão de pena alternativa adequada, no contexto do diálogo restaurativo [11].
A metodologia restaurativa poderá, assim, ser empregada na conciliação e na transação penal, a partir do espaço de consenso por ela introduzido, que permite o diálogo restaurativo, inclusive ampliado para contemplar outros conteúdos – emocionais, por exemplo - trazidos pelas partes e que podem ser colocados.
Com efeito, dizem os artigos 72 e 73:.
Art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.
Art. 73. A conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob sua orientação.
Parágrafo único. Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados, na forma da lei local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os que exerçam funções na administração da Justiça Criminal.
Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.
Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.
Do Procedimento Sumaríssimo
Art. 79. No dia e hora designados para a audiência de instrução e julgamento, se na fase preliminar não tiver havido possibilidade de tentativa de conciliação e de oferecimento de proposta pelo Ministério Público, proceder-se-á nos termos dos arts. 72, 73, 74 e 75 desta Lei.
Com base nos dispositivos acima pode o juiz encaminhar o caso a um núcleo de justiça restaurativa, na fase preliminar ou mesmo durante o procedimento sumaríssimo, se não houver sido tentada a conciliação naquela primeira oportunidade, porque tais dispositivos, interpretados extensivamente e com base na diretriz hermenêutica do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, são normas permissivas e que legitimam a ilação de que esse procedimento pode ser encaminhado a um núcleo de justiça
r estaurativa, para oportunizar a possibilidade de composição civil e de transação penal, num procedimento restaurativo que pode ser conduzido por um mediador ou facilitador, que atuaria como uma espécie de conciliador restaurativo [12].
Outra abertura para práticas restaurativas é o instituto da suspensão condicional do processo, para crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano.
Releva notar que nesse caso – suspensão condicional do processo – amplia-se o elastério de crimes contemplados para serem alcançados os crimes de médio potencial ofensivo, pois o instituto da suspensão não se limita apenas aos crimes de menor potencial ofensivo cuja pena máxima seja de 2 anos (ou 4 anos nos casos de delitos contra idosos). Um crime de estelionato, por exemplo, cuja pena varia de um a quatro anos, pode ser objeto de suspensão condicional do processo.
Diz o citado art. 89, da lei 9.099/95:
Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).
§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições:
I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;
II - proibição de freqüentar determinados lugares;
III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz;
IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.
§ 2º O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.
§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano.
§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta.
§ 5º Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade.
§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.
§ 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo prosseguirá em seus ulteriores termos.
Portanto, também para as situações que admitam a suspensão condicional do processo pode ser feito o encaminhamento ao núcleo de justiça restaurativa, pois a par das condições legais obrigatórias para a suspensão do processo, o § 2o permite a especificação de outras condições judiciais - tais condições poderiam perfeitamente ser definidas no encontro restaurativo.
Também nos crimes contra idosos, o processo restaurativo é possível, por força do art. 94, da Lei n. 10.741/03 – o Estatuto do Idoso – que prevê o procedimento da Lei 9.099/95 para crimes contra idosos cuja pena privativa de liberdade não ultrapasse 4 anos.
Os casos indicados para uma possível solução restaurativa, segundo critérios estabelecidos, após parecer favorável do Ministério Público, seriam encaminhados para os núcleos de justiça restaurativa, para avaliação multidisciplinar e, convergindo-se sobre sua viabilidade técnica, se avançaria nas ações preparatórias para o encontro restaurativo
Concluído o procedimento restaurativo no núcleo, o caso seria retornado ao Ministério Público, com um relatório e um acordo restaurativo escrito e subscrito pelos participantes. A Promotoria incluiria as cláusulas ali inseridas na sua proposta, para homologação judicial, e se passaria, então, à fase executiva, com o acompanhamento integral do cumprimento do acordo, inclusive para monitoramento e avaliação do programa.
4. O impacto da Justiça Restaurativa no Sistema de Justiça Criminal Brasileiro – Os desafios para os Operadores Jurídicos
A intervenção dos operadores jurídicos nas práticas restaurativas requer uma sensibilização e uma capacitação específica, para lidar com os conflitos deontológicos e existenciais na sua atuação, pois estarão, por um lado, jungidos à sua formação jurídico-dogmática e a seus estatutos funcionais e, por outro, convocados a uma nova práxis, que exige mudança de perspectiva.
Essa mudança exigirá deles o convívio com o pluralismo jurídico, com o senso jurídico comum e com o compartilhamento de decisões com a vítima, o infrator e pessoas das famílias e comunidades - os verdadeiros donos do conflito.
Terão que transcender a "velha opinião formada sobre tudo" - e o receituário legal formal inscrito numa moldura afixada na sólida e velha parede do poder.
Mas, ao mesmo tempo, não podem descurar dos seus conhecimentos técnicos para assegurar a subsistência jurídica do procedimento e dos atos desse procedimento.
Obviamente o procedimento restaurativo, para subsistir juridicamente, jamais poderá contrariar os princípios e regras constitucionais e infraconstitucionais – violando o princípio da legalidade em sentido amplo, vale dizer, o rule of law.
E deve satisfazer as condições para que seja reconhecida sua existência, validade, vigência e eficácia jurídica, pois do contrário o procedimento e seus atos resultarão, naturalmente, inexistentes, nulos ou ineficazes, portanto inaptos para irradiar efeitos no mundo jurídico.
É forçoso reconhecer que, à primeira vista, o ato de um juiz desviar o curso legalmente previsto de um processo penal para um meio alternativo ou um promotor deixar de oferecer a denúncia, ou de propor uma transação penal ou uma suspensão condicional do processo e permitir que o procedimento seja conduzido num outro forum gera uma crise constitucional que requer pronta intervenção para restaurar a força normativa da Constituição e o estado de legalidade democrática.
Afinal, existe todo um intrincado conjunto de normas indisponíveis de Direito Constitucional, Penal e Processual Penal, expressos em princípios e regras cogentes e atrelados a direitos e garantias fundamentais indisponíveis e, também, ao interesse público, que seriam violados com semelhante conduta de tais autoridades, que inclusive se exporiam a conseqüências e sanções graves decorrentes de error in procedendo et in judicando, considerando-se que não há previsão explícita, na lei, da possibilidade de encaminhamento do processo e julgamento de uma infração penal a um procedimento alternativo com as características do processo restaurativo.
E os operadores do sistema estão vinculados a essas normas, que se expressam por princípios e regras inderrogáveis, tais como o do devido processo legal, que se não for observado, um outro princípio, ainda maior – o princípio da legalidade – estará também sendo violado, numa ruptura que o sistema responde com efetivos mecanismos de controle.
E mais: a validade de qualquer acordo oriundo de um procedimento restaurativo, construído ao arrepio da Constituição e das leis, seria nulo de pleno direito, pois, segundo o Direito Civil, para validade - o ato jurídico requer que o seu objeto seja lícito - além de possível e determinado (ou determinável), os agentes sejam capazes, inclusive para exercer plenamente a opção pela via restaurativa, e a forma seja a prescrita ou não defesa em lei (art. 104, do Código Civil).
Mas todos essas preocupações e temores serão infundados se observadas boas práticas jurídicas, pois o que ocorre, com a justiça restaurativa, é um procedimento que combina técnicas de mediação, conciliação e transação permitidas no contexto sistemático da legislação, com a diferença que se usará a metodologia restaurativa, mediante a participação da vítima e do infrator no processo decisório, quando isso for possível e for essa a vontade das partes.
É muito importante que, ao aprovarem o acordo restaurativo, ou não – e se não o aprovarem a decisão terá que ser fundamentada - o promotor, o advogado [13] e o juiz procurem empregar toda a sua diligência e conhecimentos para evitar produzir um ato insustentável juridicamente.
Felizmente, se falharem o juiz, o promotor e o advogado, o sistema assegura sempre ao prejudicado o acesso ao judiciário caso ocorra lesão ou ameaça de lesão a direito – art. 5º, XXXV, da Constituição - ou seja, tanto a vítima, como o infrator – inclusive através de advogados – como o Ministério Público, de ofício ou a requerimento do interessado, poderá questionar o acordo restaurativo em juízo, se manifestamente carente de requisitos essenciais de existência, validade ou eficácia.
Certas advertências deontológicas devem ser consideradas ao lidarem os operadores jurídicos e as autoridades com a justiça restaurativa, no regime da legislação vigente brasileira.
A primeira delas é no sentido de que as autoridades tenham presente que o procedimento restaurativo, além de ser estritamente voluntário, não é, pelo menos por enquanto, expressamente previsto na lei como um devido processo legal no sentido formal.
Portanto, a aceitação, pelas partes, do procedimento restaurativo, por essa razão, não pode ser imposta, nem direta, nem indiretamente.
Outro ponto importante é que as partes devem ser informadas, de forma clara, que trata-se de uma ferramenta alternativa posta à disposição delas, e sua aceitação, que pode ser revogada a qualquer momento, deverá ser sempre espontânea.
Por outro lado, devem ser rigorosamente observados todos os direitos e garantias fundamentais de ambas as partes, a começar pelo princípio da dignidade humana, da razoabilidade, da proporcionalidade, da adequação e do interesse público. Certos princípios fundamentais aplicáveis ao direito penal formal, tais como o da legalidade, intervenção mínima, lesividade, humanidade, culpabilidade, entre outros, devem ser levados em consideração.
Também é de ser considerado que na fase preparatória afigura-se aconselhável que a equipe interdisciplinar decida sobre a conveniência de se consultar primeiramente o acusado ou a vítima, pois é muito importante não criar expectativas e tensão entre acusado e vítima. Em função do risco de uma revitimização, usualmente consulta-se primeiro o acusado e posteriormente a vítima.
Os operadores da justiça restaurativa - mediadores ou facilitadores – devem, também, ser adequadamente capacitados, devendo ser preferencialmente ser psicólogos ou assistentes sociais, mas nada impede – e quiçá possa ser melhor – que sejam pessoas ligadas à da comunidade, cuidadosamente selecionadas, com perfil adequado, e muito bem treinadas para a missão, pois mediadores ou facilitadores que pertençam à mesma comunidade da vítima e do infrator, que tenham a mesma linguagem, certamente encontrarão maior permeabilidade nos protagonistas para as práticas restaurativas.
É, outrossim, de primordial relevância que o encontro restaurativo transcorra num ambiente informal, mas estruturado, tranqüilo e seguro, devendo os mediadores ou facilitadores estar rigorosamente atentos, observando se não há qualquer indício de tensão ou ameaça que recomende a imediata suspensão do procedimento restaurativo, como em casos de agressividade ou qualquer outra intercorrência psicológica, para se evitar a re-vitimização do ofendido ou mesmo a vitimização do infrator, no encontro.
Outra questão sensível é a do desequilíbrio econômico, psico-social, e cultural entre as partes envolvidas nos processos restaurativos.
Vítimas e infratores que se sentem estigmatizados, traumatizados, fragilizados, tais como pessoas econômica, social e culturalmente desfavorecidas – os PPPs [14], crianças, mulheres, idosos, negros, mestiços em geral, homossexuais, artesãos com aparência de vadios, mendigos, dependentes químicos, - têm que ter sua condição considerada e serem assistidas, no procedimento restaurativo, em sua condição de desvantagem e desamparo, para que sua fragilidade e vulnerabilidade não levem à costura de acordos contrários à ética e aos princípios restaurativos.
Como a implementação da Justiça Restaurativa envolve gestão concernente à administração da Justiça, é também fundamental que as partes tenham o direito de terem um serviço eficiente (princípio constitucional da eficiência – art. 37), com facilitadores realmente capacitados e responsáveis, com sensibilidade para conduzir seu trabalho, respeitando os princípios, valores e procedimentos do processo restaurativo, pois é uma garantia implícita dos participantes a um, digamos, devido processo legal restaurativo.
Na análise jurídica do que as partes decidirem sobre como querem restaurar os traumas produzidos pelo conflito e como desenham um plano restaurativo para atender as necessidades identificadas no encontro restaurativo, o operador do Direito – promotor, advogado e juiz – deve também estar sensível ao fato de que o que ali se construiu tem como fundamento não aquela ilusória "verdade real" que pretende ter alcançado o processo criminal formal, mas uma verdade consensual, frente à impossibilidade cognitiva da verdade.
A esse respeito, colhe registrar oportuna reflexão de Silvina e Silvana Paz (Paz, 2005: 133/134), em Mediação Penal – Verdade – Justiça Restaurativa :
Nestes últimos tempos vêm aparecendo propostas que podem significar a possibilidade de mudar a verdade material por uma verdade consensual. Isto se denota pela idéia de considerar o consenso como uma forma alternativa para a solução de casos especiais, evitando a pena, simplificando ou acelerando a sua imposição ou pactuando a sua extensão.
Esta verdade consensual vai ter a total aceitação e desenvolvimento dentro do processo de mediação penal que, como processo comunicativo, vai nos levar a verdade do acontecido, com seus sentimentos e conseqüências que afetam as partes e toda a comunidade.
No que toca ao método jurídico a ser empregado, na construção e na validação dos acordos restaurativos, é primordial que o operador jurídico esteja aberto e vá para além do normativismo dogmático e tenha uma perspectiva crítica, com o uso da abordagem tópico-retórica ao invés do uso de silogismos lógicos baseados na pretensão de que a aplicação do Direito é um ato cognitivo.
É importante a percepção que a resolução restaurativa dos conflitos se dá numa perspectiva volitiva – mediada – que possibilite a construção compartilhada do razoável.
Do contrário, será inevitável, na dinâmica do encontro restaurativo, a tensão entre o Direito dos iniciados e o senso jurídico comum das pessoas da comunidade.
Com o uso do método tópico-retórico, segundo Cláudio Pereira de Souza Neto "ao invés do mediador trazer ao debate um conhecimento que ele monopoliza, buscará construir argumentativamente, junto com as partes, o arcabouço normativo em que se fundamenta a conciliação". [15].
Arremata o citado autor que com esse compartilhamento corresponde ao ideal habermasiano de diálogo, num ambiente onde transitam as falas de todos os envolvidos, que devem ter assegurado o direito de participar, questionar, expressar e defender suas opiniões, desejos e necessidades e não ser impedido por qualquer tipo de coação ou constrangimento interno ou externo para exercer esses direitos, que em última análise, é o direito humano de expressão e participação (Sousa Neto, 2001:81/98).
E o mais importante, talvez: os núcleos de justiça restaurativa deverão atuar em íntima conexão com a rede social de assistência, com apoio dos órgãos governamentais, das empresas e das organizações não governamentais, operando em rede, para encaminhamento de vítimas e infratores para os programas indicados para as medidas acordadas no plano traçado no acordo restaurativo.
Essa conexão é requisito essencial para a idoneidade de um programa restaurativo comprometido com metas de inclusão social.
Do contrário, não se poderá exigir nem do infrator nem da vítima o cumprimento do plano restaurativo traçado, se o programa restaurativo – o setor público e o terceiro setor conveniado - nada implementaram.
E o princípio da seriedade?