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A legítima defesa

Agenda 01/03/1999 às 00:00

Quando comecei a discernir sobre o direito, concluí que direito é bom senso e que tudo que o nosso bom senso possa ditar, a lei prevê.

Como forma de prevenir a convivência pacífica entre seus componentes e evitar que cada um tenha a iniciativa de dizer sobre o seu próprio direito, quando o precisar defender, o Estado legisla e assim está ditando a forma mediante a qual se deve mover o seu povo.

Se existe um direito sobremaneira reconhecido, é a legítima defesa. Reconhecemo-la desde a atitude de engatinhar mais célere da criança que quer fugir do colo do próprio pai, se o chão lhe parece mais atraente, quando quer brincar, até o empunhar de uma arma, para defender com ela, a ameaça da própria vida, ou de terceiro.

Assim, posso defender meu patrimônio, minha honra, minha vida, sempre que forem indevidamente ameaçados por quem quer que seja. Este direito está assegurado por lei, no mesmo diploma em que são tipificadas outras condutas consideradas como crime, ou seja, no Código Penal. Neste diploma, está prevista a exclusão de ilicitude da conduta humana, quando o agente se defende: "não há crime quando o agente pratica o fato: em legítima defesa".

Consoante o art. 25 do Código Penal Brasileiro, "entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem".

Reconhecida esta hipótese, reconheceu-se a inexistência de crime, logo, não haverá pena.

Entretanto, a lei fixa o limite da ação de quem se defende, prevenindo que o agente responderá pelo excesso doloso ou culposo que vier a cometer, acrescentando que a emoção ou a paixão não excluem a imputabilidade penal.

Certa feita, deparei-me com um caso de um rapaz que atormentou a vida da família inteira e da vizinhança, durante o dia todo. No final da tarde, quando partia mais uma vez, para agredir a própria irmã, foi interceptado pelo cunhado que desferiu-lhe violento golpe de machado na cabeça. Com certeza, teria bastado um único golpe para ocorrência do evento morte. Mas o laudo de exame cadavérico descreveu que a cabeça da vítima estava esfacelada. Ocorreu o excesso culposo e por este deve responder o agente.

Na militância do Tribunal do Júri, sob o pálio de que o Advogado pode usar de todos os recursos em defesa de seu cliente, muitas vezes se vêem esforços hercúleos no sentido de convencer os Jurados de que o Réu agiu em legítima defesa. E quando estes resolvem "dar uma de bonzinhos", acabam admitindo e via de conseqüência, invalidando o julgamento.

Sim, invalidam o julgamento, porque mediante o recurso do Ministério Público, certamente, o Tribunal de Justiça que reverá a decisão à luz da prova, decidirá por mandar o absolvido a novo júri, quase sempre, "porque o julgamento não correspondeu ou não se respaldou na prova dos autos".

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Neste sentido, o Defensor da Sociedade, que é o Promotor de Justiça, deve pugnar no sentido de que os Juízes de Fato que os jurados naquela oportunidade são, atentem para a verdade e não queiram ter gasto seu precioso tempo, quando devem deixar tudo o que fazem para estar ali. Afinal de contas, um júri significa mobilização de vinte e um jurados, mais sete suplentes, um Promotor de Justiça, um Juiz de Direito, serventuários, representantes da força pública, enfim, todo um aparato que não deve ser repetido por erro. Precisamos considerar isto.

Servir ao júri é servir a democracia. O júri continua sendo uma das maiores expressões da liberdade de um povo. Destinado ao julgamento dos crimes dolosos contra a vida, reserva à sociedade o direito de penalizar aquele que a fere, ceifando a vida de algum dos seus componentes.

Por isto, quem for convocado diga presente, está exercendo uma das maiores expressões de cidadania, sendo distinguido entre tantos, pois, ser jurado é pressuposto de reconhecimento de idoneidade moral e boa reputação.

Todos devem instruir-se um pouco sobre o significado e a importância de ser jurado e quando no exercício de tal prerrogativa, se a tese do Advogado for de legítima defesa, atentem se foi mesmo, ou seja, se efetivamente o agente se defendia, se defendia terceiro, em investida atual ou iminente, se os meios usados eram mesmo necessários e se não ocorreu excesso doloso ou culposo.

Para não ter que repetir um julgamento. E para tanto é só ficar com a verdade. 

Sobre a autora
Marlusse Pestana Daher

promotora de Justiça no Espírito Santo, radialista, jornalista, escritora, especialista em Direito Penal e Processual Penal, membro da Academia Feminina Espírito Santense de Letras, ex-dirigente do Centro de Apoio Operacional às Promotorias do Meio Ambiente e do Patrimônio Histórico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DAHER, Marlusse Pestana. A legítima defesa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 29, 1 mar. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/989. Acesso em: 23 dez. 2024.

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