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COMPLIANCE DIGITAL, E O PAPEL DAS BIG TECHS NAS ELEIÇÕES

As Big Techs exercem um papel preponderante na realização do compliance digital durante o período eleitoral.

Agenda 16/08/2022 às 15:26

Sem o aperfeiçoamento das medidas, como o prazo mínimo para retirada do conteúdo falso, o trabalho da justiça eleitoral será o mesmo que enxugar gelo.

 

As eleições mal começaram e o trabalho de compliance digital para retirada das fake News mais parece uma tarefa de enxugar gelo, pois não bastam apenas as ótimas intenções das big techs, se os adoradores de mentiras continuam espalhando e acreditando nas mentiras que compartilham.

Em que pese o avanço no combate a essa desinformação, por parte da justiça eleitoral e da sociedade civil organizada, o amor por mentiras e por mentirosos parece ter fincado raízes profundas na falta de consciência do coletivo delirante que propaga mentiras.

Certo do tamanho do desafio o TSE já estendeu seus braços para as grandes empresas de tecnologia, na compreensão de que isoladamente e sem o apoio desses atores sociais pouco vai conseguir fazer, para evitar que mentiras contaminem a boa informação no pleito, elemento essencial para formação do voto consciente.

Os representantes do Twitter, TikTok, Kwai, Telegram, Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp) e Google (YouTube), LinkedIn e Spotify já tiveram reunidos com o TSE no aperfeiçoamento dessas medidas preventivas e corretivas.

Recentemente, pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência & Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), da Universidade Federal da Bahia, já destacaram que as big techs já implementaram a maioria das ações acordadas com o TSE, porém na prática, têm demorado demais para analisar conteúdos, processar denúncias e, assim, aumentar a transparência nas redes sociais para combater a desinformação, no popular enxugando gelo, na medida que não conseguem acompanhar a dinâmica do processo eleitoral.

Nesse momento não há prazo definido para que as empresas de tecnologia analisem e removam, quando for o caso, uma postagem com conteúdo enganoso, logo sem esse prazo claro imagine o tamanho do estrago? Considerando que quanto mais tempo uma publicação de teor duvidoso permanece no ar, maior será seu alcance. Consequentemente, qualquer ação de restauração da verdade dos fatos demandará muito mais esforço, e com menos chances de ser bem-sucedida, e assim a falta de escrúpulos se beneficia da desinformação.

Sir Francis Bacon, afirmava que: conhecimento é poder, a frase continua atual e desde sempre o uso e controle da informação, que fosse conhecimento e não apenas barulho pode sedimentar o controle de muitas gerações.

Ao deter e manipular de forma conveniente a informação muitas guerras foram vencidas e eleições levaram aos governos governantes despreparados com o falso ar da mudança.

Para Viktor Mayer-Schonberger, um defensor da privacidade, estamos vivenciando agora nada menos do que uma redistribuição do poder da informação dos fracos para os poderosos. Se todos soubéssemos tudo sobre todos os outros, seria uma coisa; no entanto, algo muito diferente ocorre quando entidades centralizadas sabem muito mais sobre nós do que nós sabemos uns sobre os outrose, às vezes, mais do que sabemos sobre nós mesmos. Se conhecimento é poder, assimetrias de conhecimento são assimetrias de poder. Logo o controle dos instrumentos digitais de propagação de conteúdo, é um grande aliado para construção da desinformação que rouba tempo e conduz inocentes entre outros.

Ne ano completamos 10 anos que o Facebook, abriu seu capital, e logo no livro de ofertas da sua oferta pública inicial (IPO) havia alguns documentos que podem ser considerados verdadeiros tesouros do desenho da sociedade da desatenção.

Nessa nova economia onde seus dados e seu tempo são a moeda de troca, onde ter mais tempo seu, implica em ter mais dados seus, e não importa se você perde seu tempo lendo mentiras, o que vale é reter sua atenção.

No Formulário S-I de registro do livro de oferta, já encontramos uma carta de Mark Zuckerberg onde ele fala sobre o novo mundo que as Big Tech estavam criando e a importância das redes sociais, notadamente do Facebook na criação desse novo mundo.

Pelas palavras de Zuckerberg O mundo estava no precipício da transformação, uma transformação tão profunda quanto a ocasionada pela chegada da impressão séculos atrás. A tecnologia anterior levou a uma transformação completa de muitas partes da sociedade, e agora a nossa sociedade chegará a outro ponto crítico.

Mais adiante no mesmo documento ele também escreve O Facebook não foi originalmente criado para ser uma empresa. Na verdade, foi originalmente construído para realizar uma missão social.

Para ele as tecnologias passadas e seus inventores tinham alterado a forma como a sociedade era organizada, e agora o Facebook faria o mesmo. Ambição pouca é bobagem, quando o mercado de capitais lhe estimula independentemente do seu resultado financeiro, projetando apenas o seu futuro, um futuro onde a sua empresa pretende reescrever a história, de uma sociedade voltada e dirigida pela informação, onde ele (Meta) e suas redes sociais serão responsáveis pelo seu fluxo informacional.

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Informação que circula ditando e dirigindo a sua atenção, e logo todo conteúdo que tome o seu tempo e a sua atenção interessam, independentemente da qualidade do conteúdo, se ele é verdadeiro ou falso, pois prender sua atenção, mesmo que tanta informação mentirosa gere exclusivamente desatenção, para aquilo que realmente importa, o Facebook e as demais redes sociais não se importam com isso.

Uma nova economia baseada na informação, seja ela verdadeira ou falsa, ao ponto de criarmos as Fake News, verdadeiras máquinas de consumir seu tempo e sua atenção.

Logo, não se aborreça se o seu amigo vive compartilhando Fake News, saiba que ele não está só e muito menos é minoria, espalhar inverdades é um dos grandes problemas desse novo mundo digital, e por certo não iremos arder na fogueira santa das redes sociais.

O fato é tão significativo que cientistas do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) produziram um fantástico estudo sobre a matéria. Por esse estudo concluiu-se que as notícias falsas se espalham 70% mais rápido que as verdadeiras e alcançam muito mais gente, isso mesmo, as mentiras são turbinadas. Os cientistas que produziram o estudo, analisaram todas as postagens que foram verificadas por 6 agências independentes de checagem de fatos e que foram disseminadas no Twitter desde 2006, quando a rede social foi lançada, até 2017. E nos 11 anos de conteúdo estudado foram mais de 126 mil postagens replicadas por cerca 3 milhões de pessoas.

Segundo esse o estudo, as informações falsas ganham espaço na internet de forma mais rápida, mais profunda e com mais abrangência que as verdadeiras.

Os cientistas concluíram que cada postagem verdadeira atinge, em média, mil pessoas, enquanto as postagens falsas mais populares aquelas que estão entre o 1% mais replicado atingem de mil a 100 mil pessoas, eita maldade escorrendo sô.

No entanto, os padrões de disseminação das informações falsas que foram detectados foram os mesmos em diversos países, ou seja não é preferência de ninguém, logo não precisamos ter complexo.

Claro que espalhar mentiras tem seu foco preferido, ou a crença no pior, que no caso sempre recai sobre os políticos, pois de acordo com o estudo, quando a notícia falsa é ligada à política, o alastramento é três vezes mais rápido.

As pesquisas também identificaram a força dos robôs, social bots, que curiosamente tem o mesmo efeito ao acelerar uma notícia falsa ou verdadeira. Logo concluímos que as notícias falsas se espalham mais que as verdadeiras porque os humanos, e não os robôs gostam de divulgá-las.

E qual o perfil de quem espalha as notícias falsas majoritariamente? Bem não são as que tem mais seguidores, mas sim as pessoas menos populares, será que movidas pela necessidade de ganharem popularidade? Um bom estudo para psicologia, eu imagino.

Sem dúvida a democracia se constrói com muita informação, mas preferencialmente com informação de qualidade, e quanto mais ajudamos um colega a identificar uma falsa notícia mais colaboramos para a consolidação do Estado de Direito.

O ataque puro e simples, através de Fake News as instituições e a pessoas públicas sem uma justa e correta razão em nada contribui para o desenvolvimento.

Afinal a energia que se perde demonstrando os equívocos que a desinformação cria, além do tempo é por demais um dispêndio desnecessário. A internet é um mundo que se abre, o caminho a percorrer é você que escolhe, o que faz com seu tempo e com tanta informação.

No último pleito municipal, a  OEA já havia elogiado medidas adotadas pelo TSE para conduzir a eleição durante a pandemia e também os esforços da Justiça Eleitoral na criação de mecanismos para tentar controlar as notícias falsas. O trabalho brasileiro, segundo a OEA, é de utilidade para os demais países da região.

Evidentemente que todo regramento de meios de comunicação, sejam eles redes sociais ou a mídia tradicional, sempre no traz inúmeros receios, pois não são poucos os dirigentes que estão se valendo desse expediente.

Definitivamente o debate é muito mais complexo, porque não afeta diretamente o Estado, mas atores privados como as redes sociais. Essas plataformas são empresas que têm um modelo de negócio e que determinam regras de convivência.

Perdemos a capacidade de entender que a ofensiva também faz parte da liberdade de expressão. Não há direito de não se ofender, o limite é que haja um dano aos direitos de terceiros.

Ao mesmo tempo abre-se um novo debate, qual o direito do vizinho ou colega de rede social tem de tomar o seu tempo com as mentiras compartilhadas? Quem deve arcar com o seu prejuízo ao ler e perder tempo com a desinformação?

 

Sobre o autor
Charles M. Machado

Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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