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Breves considerações sobre o artigo Ministrocracia - o supremo tribunal individual e o processo democrático brasileiro

Agenda 29/08/2022 às 09:19

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O ARTIGO MINISTROCRACIA - O SUPREMO TRIBUNAL INDIVIDUAL E O PROCESSO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO

SÍNTESE DOS ARGUMENTOS DO TEXTO EM ANÁLISE

De largada, para que se entenda um pouco o que significa ministrocracia, trago um vídeo com animação e situações nas quais atuam os ministros do STF[1], segundo os autores do artigo ora enfrentado:

https://www.youtube.com/watch?v=w5y_nWo9zsA

Cuida-se de artigo versando sobre os poderes entregues individualmente a cada ministro da Suprema Corte do país, destacando situações nas quais os ministros, de forma individual, proferem decisões que acabam por representar o Supremo Tribunal Federal, revelando que um Ministro pode ter mais poder a turma e o colegiado, criando-se situações singulares e que geram especulações, reclamações e comentários pejorativos.

Os autores do artigo discorrem sobre as mais variadas críticas acerca da conduta dos ministros, no âmbito de suas decisões e mesmo fora dos autos, quando concedem entrevistas, sinalizando sobre determinado caso concreto, revelando o seu entendimento sobre outros assuntos, podendo estes posicionamentos interferir, influenciar, a posição política das casas legislativas, como uma espécie de sinalização pessoal ou da corte sobre certos assuntos e matérias.

O artigo discorre e aponta para várias situações constatadas e tantas outras possíveis de acontecer, mas que não se tem constatações inequívocas, claras, de que ocorreram, tratando-se, pois, de considerações sobre possibilidades e que podem interferir na política.

O texto é muito amplo e traz possibilidades, algumas conjecturas, de modo que se trata de uma belíssima discussão posta pelos autores à reflexões e, assim, procurarei fazer algumas considerações sobre o tema, sobre os amplos poderes concedidos aos ministros do STF, estendendo-as aos Tribunais e Juízos singulares de primeira instância, nos quais decisões monocráticas refletem o que acontece na Suprema Corte do país.

Depreende-se do artigo que várias decisões são tomadas, monocraticamente, sem o referendo do pleno da corte e, por vezes, sem a participação da turma, surtindo efeitos no mundo jurídico, alterando, por vezes, posições das casas legislativas, decretos, decisões presidenciais e suspensão de leis discutidas pelo plenário da Câmara do Deputados e pelo Senado Federal.

O texto em análise aponta para recentes casos de decisões efêmeras, precárias, as denominadas decisões monocráticas, concedendo-se liminares, com as reações da sociedade política, da sociedade civil e da imprensa, destacando os efeitos e a extensão prática destas decisões.

Tece várias possibilidades e motivos pelos quais estas decisões são proferidas, destacando manobras adotadas pelos ministros, pedindo vistas, demorando para levar o seu voto, decisões da presidência do supremo, concedendo-se e até mesmo cassando decisões de ministros da própria corte, caracterizando ativismo judicial.

Os autores do artigo constroem a narrativa à luz de decisões judiciais, de casos ocorridos, de posicionamentos da classe política acerca do ativismo judicial do STF, apontando situações antagônicas, como a de que uma decisão monocrática, em sede de liminar, pode ter mais forma que a decisão colegiada, proferida por vários ministros, conforme citado no vídeo ilustrativo, de autoria dos autores do texto, com o link transcrito acima para acesso.

Aduzem que os Tribunais constitucionais, com o caso do Supremo Tribunal Federal, se considerados tribunais desta natureza, é admitir que eles assumem papel decisório no cenário político e que o comportamento estratégico dos seus atores, dentro e fora dos tribunais, pode ser decisivo, compreendendo-se atuação fora dos tribunais as manifestações em entrevistas e em debates.

Entendem que Tribunais constitucionais podem ter um impacto legislativo direto e formal sobre as decisões legislativas, alterando e tomando para si, de certa forma, os poderes inerentes ao Poder Legislativo, atuando como uma espécie de legislador, num verdadeiro ativismo judicial.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O TEXTO EM ANÁLISE E CASOS EXEMPLIFICATIVOS

Nesse particular, podemos apontar, e. g., a liminar decidida pelo Ministro Gilmar Mendes, ao impedir que o ex presidente Lula tomasse posse ao cargo de Ministro de Estado, indicado pela ex presidente Dilma Rousseff, tratando-se, a meu ver, de intromissão nos poderes outorgados ao presidente, pela Constituição Federal, mediante decisão precária, efêmera, sendo de alto impacto e repercussão a decisão, interferindo diretamente na composição dos órgãos do Estado.

Assim, decisões com essa magnitude, deveriam, a meu ver, ser tomadas pelo plenário da corte, mesmo que como medida de urgência, ou seja, deveria o ministro Gilmar, ao ser sorteado para a ação, submetê-la de imediato ao plenária da corte.

Decisões dessa natureza representam um claro ativismo judicial, justificando-se as críticas emanadas da imprensa, da classe política e toda a sociedade, mas que estarão cada vez mais presente na vida política, exercendo, de forma endógena(dentro do caso concreto), poderes jurisdicionais, porque, uma vez provocado, terá que decidir e esta decisão, como vem ocorrendo de forma crescente, aumentará ainda mais.

Se de um lado, cabe ao Poder Judiciário analisar conflitos jurídicos surgidos e a ele submetidos, por outro lado, não se pode ignorar que certas decisões, considerando-se os reflexos a serem causados, não deveriam ser tomadas de forma monocrática, devendo-se, a meu ver, ser submetida ao crivo da turma ou do pleno da Corte, sob pena de se tornar um ministro em superministro, decidindo em nome de toda a corte.

Há casos em que estas decisões são tomadas de forma monocrática e o julgador não submete a matéria à turma ou ao plenário, ou então, retarda a submissão de sua decisão, tornando-se efetivas, ao longo do tempo, e, quando analisadas pelo plenário da casa ou pelas turmas, por vezes, perde o sentido, não sendo modificadas, posto que os efeitos da decisão monocrática, precária e temporária, são consideráveis e, caso se modifiquem as decisões, criar-se-iam situação esdrúxulas, sendo, pois, mantidas.

Não se pode negar que todas as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre questões polêmicas e de grande repercussão, mesmo que tomadas de forma colegiada, geram e gerarão comentários contrários, discordando delas, mas, seguramente, com maior segurança jurídica e com menor desprezo(no sentido de aceitação moral), visto que decisões judicias, concorde-se, ou não, devem ser cumpridas, existindo as vias legais para que se possa recorrer delas.

Vários são os recursos possíveis e utilizados pelos ministros da Suprema Corte para adiar decisões ou manter decisões concedidas liminarmente, afetando e muito o mundo político, como, e. g., o pedido de vistas de julgamentos iniciados, como ocorreu recentemente com o decreto de armas do Presidente da República, no qual, após os votos dos Ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Alexandre de Moraes, todos no sentido de suspender ou anular o decreto, o Ministro Kassio Nunes Marques pediu vistas e o julgamento foi paralisado até que este ministro apresente o seu voto, diga-se, sem data para tanto, podendo-se, pois, protelar e retardar por tempo indeterminado o resultado do julgamento.

Sobre esse citado caso, reputo importante destacar que este ministro foi indicado para o Supremo pelo Presidente Jair Messias Bolsonaro, o autor do decreto em análise, cuja decisão a ser prolatada pelo Supremo pode até mesmo interferir no processo eleitoral do ano que vem, posto que, se o Presidente sofrer derrota neste julgamento, e, a meu ver, tudo indica que sofrerá, perderia um pouco de força política, do seu capital eleitoral, em sua campanha a reeleição, de modo que atuações como esta podem ser de caráter político, visando, de certa forma, a impedir que o Presidente da República sofra essa derrota em período desfavorável.

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Contudo, não se pode assegurar que este pedido de vistas tenha sido para proteger o Presidente da República, podendo ser pelo fato de realmente o ministro não se sentir seguro ou não estar convencido sobre a matéria, necessitando de mais tempo para refletir sobre o tema e proferir a sua decisão, mas, para que se possa, ao menos passar essa impressão à sociedade, deve o ministro apresentar logo seu voto e não deixar para momento posterior às eleições de 2022, pois, se assim o fizer, reforça-se a idéia de que o pedido de vistas objetivou proteger o Presidente de República que o indicou para ocupar o cargo na Suprema Corte.

Há, ainda, para esquentar um pouco mais a discussão sobre esse caso, a questão dos notórios problemas existentes entre o Ministro Alexandre de Moraes e o Presidente da República, acrescentando que o Presidente da República, em ato, a meu ver, antidemocrático, chegou a sustentar no último dia 07 de setembro que não mais cumpriria ou respeitaria decisões, segundo ele, fora das quatro linhas da constituição, de sorte que este pedido de vistas pode ter o propósito de evitar que se aumente este desgaste.

Temos presenciado, também, em decisões recentes, desta natureza, que ministros decidem o destino do país, alterando a composição de ministérios, como ocorreu na decisão da lavra do então Ministro Marco Aurélio, nos autos da ação de descumprimento de Preceito constitucional, ADPF número 402, proposta pelo Partido Rede Sustentabilidade, na qual questionava-se se réus em ação penal, perante o Supremo Tribunal Federal, poderiam ocupar cargos que estão na linha de sucessão presidencial, destacando-se que o Ministro relator julgando a medida cautelar requerida no bojo desta ação, concedeu a liminar e afastou do cargo de Presidente do Senador Federal o Senador Renan Calheiros.

A ADPF ajuizada sustentava que o referido Senador respondia processo penal, perante o STF, pela prática do crime de peculato.

O relator da ADPF, o Ministro Marco Aurélio, invocando o artigo 86, § 1o, da Constituição Federal, concedeu a liminar, assentando que Renan Calheiros estava na linha sucessória para ocupar o cargo de presidente da República, nos termos do artigo 80, da mesma Carta, invocando, ainda, como precedente, a decisão prolatada na ação cautelar número 470, na qual foi o então Deputado Federal Eduardo Cunha afastado do cargo de presidente da Câmara dos Deputados, porque também respondia processo penal perante o Supremo e também estava na linha sucessória para ocupar o cargo de Presidente da República, no caso de o presidente e o vice se ausentarem do país ou se afastarem por outros problemas.

O fato é que esta decisão causou forte repercussão entre os Poderes.

Renan Calheiros esquivou-se do oficial de justiça que pretendia intimá-lo da decisão e a mesa diretora do Senado Federal se recusou a cumprir a decisão, decidindo, solenemente, que aguardaria a decisão do colegiado, ou seja, não cumpriria a decisão monocrática do Ministro Marco Aurélio.

Sobre essa parte, urge destacar que a decisão da Mesa Diretora do Senado, no sentido de não cumprir a decisão liminar, alegando que aguardaria a decisão do pleno da Corte, é uma das poucas vezes em que o parlamento descumpriu uma ordem do Supremo Tribunal Federal, porque, a meu ver, se tratava de um cacique politico, de um parlamentar de alta influência na casa.

A decisão do Ministro Marco Aurélio provocou certo mal estar entre os ministros do STF, sob o entendimento de que uma decisão altamente relevante e de forte repercussão e consequências, deveria ser prolatada pelo plenário da casa, chegando-se ao ponto de o ministro Gilmar Mendes chamar o seu par(o ministro Marco Aurélio) de inimputável e que, no nordeste se diz que não se corre atrás de doido porque não se sabe para onde ele vai.

Diante da forte repercussão causada pela decisão, a ministra Carmem Lúcia, presidente da Corte, levou ao plenário da casa a medida cautelar apresentada na ADPF 402 para referendo do pleno, iniciando-se o julgamento pelo relator, ministro Marcio Aurélio, que confirmou a sua decisão, mantendo-se a liminar concedida, mas, por maioria, decidiu a corte que o Senador poderia continuar no seu cargo de presidente do Senado, mas não poderia assumir o cargo de presidente da República.

Apenas para registrar a forma de votação deste caso, o Ministro relator, Marco Aurélio, foi seguido pelos Ministros Edson Fachin e Rosa Weber.

Note-se que a decisão da maioria da corte se mostra bem mais razoável à aquela do ministro Marco Aurélio, posto que, uma coisa é chefiar uma das casas do Congresso e a outra é o exercício da presidência da República, ou seja, pode o chefe de uma das casas continuar na presidência, mesmo respondendo a processo perante o STF, mas não pode exercer a presidência da república.

Parece-me que esta ação ajuizada pretendia bem mais do que se anunciou; pretendia, à pretexto de que Renan Calheiros era réu em processo penal no STF, não poderia chefiar, presidir, o Senado Federal, invocando-se, contudo, a idéia de que ele não poderia estar na linha de sucessão do Presidente da República.

Poderia, a meu ver, a ação ter objetivado penas impedir que Renan Calheiros sucedesse o Presidente da República, sem que fosse preciso deixar o cargo de Presidente do Senado.

Outro caso, de forte impacto, foi a decisão do Ministro Gilmar Mendes, impedindo, por decisão monocrática, em sede de liminar, que o ex presidente Lula tomasse posse como Ministro indicado pela Presidenta Dilma Rousseff, numa, digo eu, simples canetada, quando, a meu ver, deveria ter submetido a matéria, dada à sua relevância, com urgência, ao plenário da Corte, pois, se assim o fizesse, e a decisão fosse no sentido do que ele decidiu isoladamente, certamente, não se teria questionamentos de que o Ministro procurou prejudicar o Governo, prejudicar o ex presidente Lula, etc., porquanto estaríamos diante de uma decisão colegiada.

Demais disso, pensamos que se trata de matéria interna corporis e não poderia o Poder Judiciário interferir numa decisão do Poder Executivo, baseado em gravação ilícita, pois, conforme admitido posteriormente pelo então juiz Sérgio Moro, o período das escutas já havia expirado quando ele tornou pública essa gravação, feita após o término do período concedido judicialmente para as escutas, mas que foi ignorada pelo ministro Gilmar Mendes, impedindo que o ex presidente Lula tomasse posse como ministro de Estado.

Acresça-se que o então Juiz Sérgio Moro foi censurado posteriormente pelo STF, por ter vazado esta gravação ilícita e que não foi utilizada como prova no processo penal, consoante a decisão do plenário do Supremo.

Várias outras e recentes decisões tomadas, decididas monocraticamente, ocorreram e que mudaram o rumo da política, barrando decretos, tratando-se verdadeiramente de decisões legislativas, ou seja, fizeram as vezes de quem detém o poder de criar e ditar normas, legislando.

A decisão monocrática de Ministros, ajustadas a certas situações, criam, e. g., situações esdrúxulas, como a que adotada pelo Ministro Ricardo Lewandowiski, juntamente com os Senadores da República, que, ao presidir a sessão de julgamento do impedimento da Presidente Dilma, após ser decidido pela cassação do mandato, ele decidiu fatiar a decisão para impedir que ela se tornasse inelegível, quando a decisão que a afastou definitivamente já traz implícita a sua inelegibilidade, ou seja, foi cassada, mas não se tornou inelegível por 8 anos.

O Ministro, em artigo publicado na folha de São Paulo, edição do dia 29 de setembro de 2016, asseverou que o impedimento da Presidente Dilma foi um tropeço da democracia, atribuindo ao elevado número de partidos políticos, sustentando, ainda, que o STF tem culpa nisso, ao não impor cláusula de barreiras(para a criação e participação de partidos políticos).

Depreende-se da decisão tomada pelo Ministro Lewandowiski, aliado ao seu pronunciamento feito na matéria citada acima, que ele decidiu pelo fatiamento da decisão do impedimento, por questões pessoais, por acreditar que não deveria ter ocorrido o impedimento, tratando-se, a meu ver, de matéria interna corporis do parlamento, no qual ele presidiu a sessão por força constitucional, mas a decisão não é dele, mas sim, dos parlamentares.

Evidencia-se que uma decisão, pode-se dizer, monocrática, pois sugerida pelo ministro, acaba por interferir e modificar o resultado de um julgamento histórico, permitindo-se que uma presidente da República, cassada, continuasse elegível, contrariando-se o entendimento de que, com a perda do mandato, os direitos políticos, automaticamente, seriam suspensos pelo período de 08(oito) anos, como ocorreu no impedimento do Presidente Fernando Collor de Mello.

Outra recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, por uma de suas turmas, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, anulou todos os processos que tramitavam na 13a Vara Federal Criminal de Curitiba, em face do ex presidente Lula, sob o fundamento de imparcialidade do então juiz, Sérgio Moro, sendo, posteriormente, analisada e confirmada pelo plenário, mas que, diante da decisão inicial da turma, ignorou-se que esta matéria já tinha sido amplamente analisada pelas instâncias ordinárias, ou seja, pelo juiz de origem, pelo Tribunal Regional Federal e até mesmo pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, transitando a condenação em julgado.

Vale dizer, em sede de habeas corpus, mediante decisão da uma das turmas do Supremo, resolveu-se anular a condenação do ex presidente e de todos os processos contra ele em andamento, tornando-o elegível.

O alcance e magnitude desta decisão, a meu ver, tomada em momento indevido, ignorando-se todas as análises das instâncias ordinárias e do STJ, modificou toda a movimentação política, pois, o ex presidente Lula, até então inelegível por conta das condenações, passa a ser elegível, apresentando-se como candidato à presidência da república, nas eleições de 2022.

No mesmo sentido, a decisão do ministro Edson Fachin, ao reconhecer a incompetência da 13a Vara Federal Criminal de Curitiba, para os casos envolvendo ex presidente Lula, anulando-se sentenças, sendo os processos retomados a partir da denúncia, remetendo os autos para uma das Varas Federais de Brasília, tornando, assim, como na decisão do ministro Gilmar Mendes, o ex presidente elegível.

De outra parte, é certo que a operação lava jato rompeu o sistema político partidário brasileiro, constando corrupções sistêmicas, arraigadas em todo os níveis de governo, decretando-se prisões, antes inimagináveis, de pessoas com forte influência no sistema político brasileiro, de grandes empresários, donos de renomadas empreiteiras, revelando, ao mesmo tempo, que os partidos políticos perderam a predominância, ao deixarem de atenderem aos desejos de reforma da sociedade.

Sobre essa parte, destaque-se que os partidos políticos, mesmo após a avalanche provocada pela operação lava jato, ainda não perceberam que o país precisa de líderes capazes de mobilizar a sociedade para uma nova causa, conforme declarou o ex Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso[2], em entrevista ao site P Entrevista, no dia 22-04-2017.

A operação lava jato, por meio da polícia Federal, Ministério Público Federal e o MM. Juízo da 13a Vara Federal Criminal de Curitiba, abalaram os Poderes da República, com decisões emanadas por um juízo singular, evidenciando como um único juiz pode alterar completamente o cenário político brasileiro.

Posteriormente, com as revelações feitas pelo Intercept Brasil, mesmo inadmitidas pelo juiz e pelo ministério público, ficou evidente que o juiz se ajustou com o órgão da acusação para produzir provas, fundamentar as suas decisões, orientando o ministério público como deveria requerer algo para que ele pudesse decidir em desfavor dos averiguados, investigados e acusados, num verdadeiro e inconcebível ajuste ilegal e imoral.

Todas estas ocorrências, ligadas a operação lava jato, incluindo-se as conversas reveladas pelo Intercept Brasil, demonstra que os poderes entregues a um único juiz, sobretudo quando este julgador se afasta da inafastável imparcialidade, devem ser revistas, criando-se mecanismos de análise colegiada de decisões importantes e de alto impacto, como as que ocorreram com a operação lava jato, e, de outra parte, inegável o ativismo judicial.

Tratando-se de decisão e manifestação, a meu ver, inoportuna e indevida de um magistrado, tivemos, recentemente, conforme revelado pelo site Papo de Mãe, parceiro da UOL[3], um caso de um juiz, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, em audiência de um processo envolvendo violência doméstica, zombou da Lei Maria da Penha, chegando ao ponto de asseverar que:

Vamos devagar com o andor que o santo é de barro. Se tem lei Maria da Penha contra a mãe eu não tô nem aí. Uma coisa eu aprendi na vida de juiz: ninguém agride ninguém de graça.

Qualquer coisinha vira lei Maria da Penha. É muito chato também, entende? Depõe muito contra quemeu já tirei guarda de mãe, e sem o menor constrangimento, que cerceou acesso de pai. Já tirei e posso fazer de novo.

Pois é, quando a cabeça não pensa, o corpo padece. Será que vale a pena ficar levando esse negócio pra frente? Será que vale a pena levar esse negócio de medida protetiva pra frente?.

Quem batia não me interessa'. Mãe, se São Pedro se redimiu, talvez o pai possa. Ele pode ser um figo podre, mas foi uma escolha sua e você não tem mais 12 anos.

Para a corregedoria de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o caso é grave e aponta para violação da Lei Orgânica da Magistratura e do Código de Ética da categoria. Conforme decisão do Corregedor Geral de Justiça, Desembargador Ricardo Anafe:

Ante a aparente gravidade das condutas, a exigir providências urgentes no sentido especialmente de obter cópia integral da audiência realizada e completa identificação de seus participantes, determino a instauração, de ofício, por esta Corregedoria Geral de Justiça, de expediente de apuração preliminar,

O certo é que inúmeras decisões monocráticas do STF, tem desagradado o parlamento federal, seja porque discordam ideologicamente das decisões, seja porque afetam interesses de parlamentares, criando-se, digo eu, uma espécie de levante das casas legislativas, com reiteradas manifestações públicas de descontentamento e até com uma certa revolta, sendo discutidas medidas que possam alterar, ao menos em parte, esse quadro atual, como o projeto de Lei do Senador Marcos do Val, registrado como PL 816/2021, com os seguintes esclarecimentos e informações(fonte agência Senado)[4]:

O senador Marcos do Val (Podemos-ES) apresentou um projeto que limita o poder de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de tomarem decisões monocráticas. Pelo texto do PL 816/2021, as decisões monocráticas de ministros do STF e do STJ, quando decretarem a nulidade de atos praticados em processos penais, só terão eficácia após ratificação por órgão colegiado.

Marcos do Val admite que seu projeto é uma reação à decisão tomada na segunda-feira (8) pelo ministro do STF Edson Fachin, que declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba no julgamento de ações penais contra o ex-presidente Lula nos casos do tríplex de Guarujá (SP), do sítio de Atibaia (SP) e referentes a investigações sobre o Instituto Lula. A 13ª Vara Federal de Curitiba era comandada pelo ex-juiz Sergio Moro, que a deixou após as eleições de 2018 para assumir o cargo de ministro da Justiça no governo Bolsonaro.

A decisão de Fachin foi tomada anos após o início das ações penais, após intensos e desgastantes julgamentos públicos pelo 4º Tribunal Regional Federal e pelo próprio Supremo. A decisão tomou a comunidade jurídica de assalto e trouxe ainda mais insegurança jurídica ao país. A extemporaneidade da decisão monocrática do relator dos processos da Lava Jato apenas demonstra algo que este Parlamento há anos observa: o quão é perigoso o poder de decisão monocrático de um ministro, máxime na seara penal.

Para Marcos do Val, o projeto, caso vire lei, impede que decisões monocráticas penais "polêmicas" de nulidade passem a produzir efeitos imediatos. Mas não obstaculiza o desenvolvimento dos trabalhos pelo Tribunal, uma vez que o efeito suspensivo decairá de forma tácita se não houver referida manifestação de rejeição por dois ministros do tribunal, detalha o senador.

Procura-se, a meu ver, com essa iniciativa legislativa, diminuir ou restringir os poderes decisórios dos Ministros, impedindo que certas situações ocorram, devendo ser a decisão referendada por órgão colegiado, diga-se, as turmas e o plenário, tratando-se, ainda, de PL pontual e, conforme admitido pelo parlamentar, em reação à decisão do Ministro Edson Fachin, ao reconhecer a incompetência do juízo da 13o Vara Federal Criminal de Curitiba, referente aos casos do ex presidente Lula.

Preocupado com decisões monocráticas, proferidas pelos Ministros da mais alta corte de justiça do país, o ministro Marco Aurélio propôs alteração do regimento interno da casa, no sentido de que pedidos de concessão de liminares referentes a atos, consoante a seguinte matéria publicada[5]:

atos de competência dos poderes Executivo e Legislativo só possam ser julgados em plenário. Essa mudança significaria, por exemplo, que uma indicação feita pelo presidente da República a um cargo de órgão público só poderia ser contestada pelo STF de forma colegiada

Essa proposta do ministro Marco Aurélio surgiu após a decisão do Ministro Alexandre de Moraes, em decisão monocrática-liminar, em barrar, impedir, a indicação de Alexandre Ramagem para assumir a Abin, servindo como gatilho para a proposta do Ministro Marco Aurélio.

Se acolhida a proposta, a nomeação de diretor para a Abin, feita pelo Presidente da República, não poderia ser barrada liminarmente por decisão monocrática de Ministro da Corte, devendo-se submeter ao plenário.

Mas a câmara dos deputados também se volta contra esse chamado ativismo judicial, sendo proposta pelo deputado Felipe Francisquini, do PSL-PR, conforme matéria veiculada na Revista Poder ONLINE, publicada no dia 23-03-2021, argumentando que Acredito que existe uma vontade grande dos parlamentares em mudar o cenário de hoje. O Judiciário está superpoderoso, sendo o texto encaminhado à CCJ em dezembro de 2018.

Evidencia-se que uma decisão, pode-se dizer, monocrática, pois sugerida pelo ministro, acaba por interferir e modificar o resultado de um julgamento histórico, permitindo-se que uma presidente da República, cassada, continuasse elegível, contrariando-se o entendimento de que, com a perda do mandato, os direitos políticos, automaticamente, seriam suspensos pelo período de 08(oito) anos, como ocorre no impedimento do Presidente Fernando Color de Melo.

Este caso, como tantos outros que poderíamos apontar, mediante simples pesquisa, aponta para os excessos praticados por quem deveria, de forma serena, sensata e sem ofensas e ataques às partes, decidir casos, aplicando-se a lei, mas, ao revés, verifica-se que, em assim agindo, o julgador se afasta da exigida imparcialidade, passando a ofender partes, fazendo às vezes do Poder Legislativo, valendo-se de instrumentos e mecanismos dos quais dispõe, para decidir monocraticamente, pedir vistas, declarar fora dos autos a sua opinião, interferindo e influenciado decisões dos outros dois Poderes da República.

Se é verdade que o sistema político afeta o Poder Judiciário, com as demandas propostas, mas, embora provocado e tenha que dar resposta, deve o judiciário agir com moderação e equilíbrio, evitando que juízes e ministros, sobretudo de forma monocrática e por meio de decisões liminares, adotem posturas questionáveis, alterando, da forma descrita alhures, o rumo da política e da história do país.

O fato é que o juiz de direito, seja de qual instância for, detém o poder de dizer o direito, visto que a eles são investidos poderes jurisdicionais, e este poder deve ser equilibrado, sereno e sensato, sempre em atenção ao caso concreto, na efetiva distribuição da justiça e não necessariamente do direito, observando-se, ainda, os reflexos e desdobramentos da decisão que terá que tomar, para que não se criem situações antagônicas, de difícil compreensão e que os seus efeitos sejam o de menor impacto possível na vida dos jurisdicionados e, de forma indireta, na vida dos cidadãos e das pessoas.

Por fim, transcreveremos as palavras de Oscar Vilhena[6], discorrendo sobre a atuação dos magistrados, assentando que:

A ideia de que juízes e tribunais devam ser imparciais, representada pela deusa de olhos vendados que adorna o prédio do Supremo Tribunal Federal em Brasília e as mesas de tantos juízes ao redor do mundo, é uma importante aspiração para aqueles que prezam viver sob o governo das leis.

Como qualquer ser humano, no entanto, juízes têm preferências, ideologias e preconceitos. Também como qualquer ser humano, quando lhes são apresentados problemas tendem a resolvê-los a partir de uma intuição. Essas intuições são fruto da experiência e conhecimento adquiridos ao longo da vida, mas também de suas preferências, ideologias e preconceitos, nem sempre conscientes.

Bons juízes e juízas testam suas intuições antes de colocá-las em prática, a partir de uma série de parâmetros estabelecidos pela lei e por precedentes. Maus juízes apenas cozinham retoricamente argumentos voltados a camuflar suas inclinações.

Para mitigar essas dificuldades, decorrentes da própria natureza humana, os sistemas jurídicos das democracias contemporâneas estabelecem uma série de limitações, condições e garantias institucionais para que os magistrados realizem suas tarefas com o maior grau possível de fidelidade à lei e não às suas próprias paixões. Como é impossível eliminá-las, definem que a última palavra seja normalmente proferida por alguma forma de tribunal colegiado.

Para os mais otimistas o pressuposto é que num órgão colegiado, eventuais idiossincrasias ou erros de interpretação possam ser corrigidos pela força do melhor argumento. Para os mais céticos, a colegialidade pode ajudar a mitigar as preferências pessoais dos magistrados ou, ao menos, reduzir o efeito lotérico de um julgamento monocrático.

Sobre o autor
Luiz Carlos de Oliveira

Advogado, formado pela Universidade Ibirapuera, no ano de 1.999. Pós graduado pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, no ano de 2.000, com o título de especialista em Direito Penal. Especialista em Tribunal do Júri e em direito condominial, atuante nas áreas cíveis e penal. Mestrando profissional em direito constitucional pelo IDP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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