Um casal de adquirentes de duas unidades comerciais na planta no empreendimento denominado Condomínio Marquês Business Center, no bairro da Barra Funda, em São Paulo, perante a incorporadora Brookfield, obteve vitória expressiva perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, através da reforma parcial da sentença de primeira instância que inacreditavelmente havia beneficiado completamente a incorporadora, para o fim de declarar a quebra dos “Instrumentos Particulares de Promessa de Compra e Venda e outros pactos de unidade autônoma” por culpa exclusiva da própria incorporadora ante gritante atraso na conclusão e entrega do empreendimento, determinando a devolução à vista de 100% sobre os valores pagos em Contrato aos compradores.
A aquisição dos projetos de imóveis na planta ocorreu em setembro de 2011, quando então os pretensos compradores assinaram os contratos perante a incorporadora, sendo certo que o prazo de conclusão das obras era até o mês de fevereiro de 2015, já incluída a cláusula de tolerância de mais 180 (cento e oitenta) dias.
Ocorre que até a data do ajuizamento da ação de rescisão no Foro Regional de Pinheiros, em julho de 2015, não havia sequer a emissão do necessário auto de conclusão de obra ou “habite-se” perante a Prefeitura de São Paulo, o que representou a gota d’água para os compradores e após procurar a incorporadora para obter o distrato amigável dos negócios e consequente restituição dos valores pagos, a incorporadora simplesmente se limitava em afirmar que devolveria somente o equivalente a 60% (sessenta por cento) dos valores pagos, o que jamais foi aceito pelos consumidores.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Regional de Pinheiros de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por culpa exclusiva da incorporadora ante o atraso na conclusão das obras e entrega do empreendimento dentro do prazo máximo estabelecido em contrato, bem como a condenação da incorporadora na restituição de todos os valores pagos, inclusive comissão de corretagem.
Entretanto, o Juiz de Direito da 4ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros de São Paulo, Dr. Paulo Jorge Scartezzini Guimarães, em decisão histórica datada de 04 de agosto de 2015, afirmou textualmente que, de fato, a incorporadora era a única culpada pelo atraso incontroverso na conclusão das obras e consequente entrega do empreendimento, mas que, porém, não vislumbrava interesse dos compradores no pleito de rescisão dos negócios e consequente restituição dos valores pagos, julgando improcedente toda a ação, desprezando o entendimento unânime dos Desembargadores paulistas para a matéria.
O Juiz de primeiro grau havia ainda decretado a ocorrência de prescrição trienal para o pedido de restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem e taxa SATI.
Absolutamente inconformados com a sentença proferida na primeira instância, os compradores decidiram seguir com o processo mediante recurso de apelação interposto perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Recurso processado e devidamente distribuído perante a 3ª Câmara de Direito Privado, tendo como Relator o Desembargador Viviani Nicolau, acompanhado dos Desembargadores Carlos Alberto de Salles e Donegá Morandini, para analisar se o Juiz de Direito na primeira instância agiu corretamente ou não ao negar a condenação da incorporadora na restituição total dos valores pagos em contrato.
Por votação unânime, os Desembargadores entenderam por bem reformar parcialmente a sentença de primeira instância, afastando a fundamentação apresentada pelo Juiz, para o fim de impor à incorporadora a devolução do equivalente a 100% (cem por cento) dos valores pagos em contrato, acrescido de correção monetária e juros de 1% (um por cento) a.m. até a data da efetiva devolução.
Os Desembargadores, no entanto, foram obrigados a manter a decretação de prescrição trienal para o pedido de restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem e taxa SATI, por conta da ordem emanada pelo STJ, em Brasília, no dia 24 de agosto de 2016, que passou a determinar esse prazo como o limite para o comprador discutir o assunto no Poder Judiciário.
Para o Desembargador Relator, com a rescisão do negócio motivada por atraso exclusivo da incorporadora, as partes devem retornar ao estado anterior à compra, observando que no caso em análise a incorporadora deve devolver todos os valores pagos pelos compradores.
Nas palavras do Desembargador:
- “A sentença recorrida entendeu que a pretensão dos autores à devolução dos valores pagos a título de comissão de corretagem e taxa “SATI” estaria prescrita. Os apelantes afirmam que o prazo prescricional aplicável ao caso seria o decenal, previsto no art. 205 do Código Civil.
- Contudo, neste ponto a decisão não comporta reparo.
- Muito embora os autores aleguem descumprimento contratual por parte da ré, fundamentam seu pedido de devolução das verbas de assessoria imobiliária na alegação de que tais cobranças seriam abusivas e não poderiam ser repassadas ao consumidor que se dirigiu ao estande de vendas (fls. 11).
- O Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a prescrição da pretensão dos adquirentes pela devolução dos valores alegadamente indevidos, pagos a título de comissão de corretagem e taxa “SATI” seria trienal, nos termos do art. 206, §3º, IV do Código Civil.
- Portanto, o recurso não comporta provimento, ficando mantida a r. sentença no ponto em que reconheceu a ocorrência da prescrição.
- Com a manutenção do reconhecimento da prescrição, fica prejudicada a análise do recurso, no ponto em que afirma que os valores pagos a título de comissão de corretagem e taxa “SATI” seriam indevidos.
- As partes celebraram dois contratos de “Compromisso de Compra e Venda”, tendo por objeto a aquisição das unidades nº 412 e 1.515, ambas localizadas no empreendimento “Condomínio Marquês Business Center”.
- Verifica-se dos documentos trazidos aos autos que a conclusão do empreendimento estava inicialmente prevista para agosto de 2014 (fls. 23 e 28, item XVII), admitido, ainda, o prazo de tolerância de 180 dias para a entrega da obra (fls. 52, item 7.3.1.1).
- Portanto, o prazo para a entrega dos imóveis, considerada a tolerância de 180 dias, esgotou-se em fevereiro de 2015, estando configurada a mora da ré a partir de então. Por outro lado, os autores afirmam que até a data da propositura da ação, as obras ainda não haviam sido concluídas.
- A ré afirmou em contestação que o atraso na conclusão das obras seria devido a caso fortuito ou de força maior, consistente na necessidade de realização de procedimento de remediação ambiental do solo sobre o qual seria construído o empreendimento (fls. 138).
- O Magistrado a quo entendeu que tal justificativa não seria válida para afastar a responsabilidade da ré pela entrega do imóvel, uma vez que a requerida tinha, ou deveria ter, conhecimento da existência de pendência ambiental sobre o terreno.
- Com efeito, não é possível reconhecer a ocorrência de caso fortuito ou de força maior. . Os fatores alegados pelas rés decorrem diretamente do exercício de sua atividade, uma vez tratar-se de empresa experiente do ramo de construção civil.
- Portanto, corretamente afastada pela r. sentença a tese de caso fortuito ou força maior.
- A sentença recorrida reconheceu a ocorrência de atraso na entrega do imóvel, contudo julgou improcedente a pretensão dos autores, sob o fundamento de que a mora não poderia ser confundida com inadimplemento absoluto, não autorizando a rescisão do contrato. A decisão consignou que os autores poderiam desistir do negócio e pleitear a devolução de valores pagos, suportando as penalidades contratualmente previstas para tanto.
- Respeitado o entendimento adotado pela r. sentença, a decisão comporta reparo neste ponto.
- Constatado o inadimplemento, ainda que parcial, da vendedora, que não concluiu as obras no prazo contratualmente previsto, os adquirentes não são obrigados a levar adiante a contratação, não podendo ser penalizados com retenção de valores contratualmente prevista para a hipótese de rescisão imotivada, fazendo jus à devolução integral das parcelas comprovadamente pagas, como forma de reposição ao status quo anterior à celebração do negócio.
- A aplicação das penalidades contratualmente previstas para o caso de rescisão contratual é descabida, uma vez que diz respeito à rescisão motivada por inadimplemento do adquirente, o que não se confunde com a hipótese presente.
- Este é o entendimento pacífico desta 3ª Câmara de Direito Privado .
- Portanto, neste ponto, o recurso comporta provimento para condenar a ré à devolução integral das parcelas pagas a título de preço do imóvel.
- Os valores deverão ser acrescidos de correção monetária pela Tabela Prática deste Tribunal de Justiça a partir de cada desembolso, bem como juros de mora de 1% ao mês, contados a partir da citação.”
Ao final, por votação unânime, os Desembargadores da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deram parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelos compradores para o fim de reformar a sentença de primeira instância e condenar a incorporadora na devolução à vista de 100% (cem por cento) dos valores pagos, acrescido de correção monetária e juros de 1% a.m.
Processo nº 1005417-59.2015.8.26.0011
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/
* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.