PROCESSO CIVIL. AÇÃO INIBITÓRIA CUMULADA COM PEDIDOS DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. DIREITO MARCÁRIO. TRADE DRESS. PROVA PERICIAL RECONHECENDO SEMELHANÇA DA MARCA. CONCORRÊNCIA DESLEAL CAPAZ DE CONFUNDIR O CONSUMIDOR. LEI N. 9.279/1996. DANO MATERIAL DEVIDO. DANO MORAL PRESUMIDO. PRECEDENTES. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7 STJ. RECURSO DE AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
Relatório
Solicita-se parecer a respeito sobre o AgInt no AREsp 1402561 / SP julgado em 02/09/2024 e publicado em 09/09/2024 na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em que uma empresa entrou com ação judicial contra uma outra sociedade empresária a fim de requerer reparação por danos morais e materiais relativos ao uso do Trade Dress (conjunto-imagem), na seara do Direito de Propriedade Industrial. A recorrida interpôs recurso de agravo interno para recorrer da decisão do TJSP, chegando ao STJ, não obtendo ela êxito na interposição de agravo interno ao recurso especial.
A decisão do STJ julgou procedente os argumentos da parte autora, cabendo à ré o pagamento de danos morais e materiais por concorrência desleal por causar confusão entre os consumidores e imitar sutilmente a marca da parte autora, configurando o uso de trade dress.
Fundamentação jurídica
Deve-se conceituar, em primeiro lugar, o Trade Dress. Este também é chamado de conjunto imagem, sendo uma imitação sutil do modus operandi e de elementos de marca alheia. Assim conceitua CRUZ (2024, p. 342): "Em resumo: ocorre a violação do trade dress quando um concorrente não copia exatamente a marca ou o desenho industrial de outro empresário, mas imita sutilmente uma série de características de um produto ou o modus operandi da prestação de um serviço."
Os tribunais brasileiros vêm decidindo que a violação do trade dress ocorre quando o uso indevido dele tem potencial de causar confusão entre os consumidores, caracterizando, desse modo, a concorrência desleal.
Expor-se-á a ementa completa do caso que trata o presente autor:
PROCESSO CIVIL. AÇÃO INIBITÓRIA CUMULADA COM PEDIDOS DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. DIREITO MARCÁRIO. TRADE DRESS. PROVA PERICIAL RECONHECENDO SEMELHANCIA DA MARCA. CONCORRÊNCIA DESLEAL CAPAZ DE CONFUNDIR O CONSUMIDOR. LEI N. 9.279/1996. DANO MATERIAL DEVIDO. DANO MORAL PRESUMIDO. PRECEDENTES. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7 STJ. RECURSO DE AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Ocorre a violação do chamado trade dress (conjunto-imagem de um produto) quando um concorrente não copia exatamente a marca ou o desenho industrial de outrem, mas imita sutilmente uma série de características do produto ou até mesmo o modus operandi da prestação de um serviço. A proteção da marca prevista na Lei n. 9.279/1996 tem como objetivos primordiais afastar a concorrência desleal e proteger o consumidor de possíveis erros.
2. A prova pericial concluiu que há semelhança no uso pela parte ré da letra ?M? e a cor azul em seus produtos, capaz de confundir os consumidores da parte autora.
3. A ofensa ao trade-dress acarreta ainda a condenação da requerida ao pagamento de indenização por dano material, a ser verificado em fase de liquidação de sentença, e por dano moral, este presumido.
Acórdão recorrido em consonância com julgados do STJ.
4. Em sede de recurso especial, não é possível o reexame do conjunto fático-probatórios, a teor do disposto na Súmula n. 7 do STJ.
5. Recurso de agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp n. 1.402.561/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 4/9/2024).
Apesar de não haver expressa previsão legal do conjunto-imagem, a jurisprudência já vem decidindo desde 2017, no REsp 1677787/SC por proteger a marca na Lei 9.279/1996, por entender o STJ nesse caso citado por ora que o uso indevido de trade dress viola a livre concorrência disciplinada no art. 170, IV da Constituição Federal por meio da concorrência desleal, porquanto pode causar o uso indevido dele confusão entre as marcas pelos consumidores.
Entende ainda a corte superior que é necessária a prova técnica com o fim de se comprovar, julgado em 2018 no REsp 1778910/SP. Segue a ementa:
RECURSO ESPECIAL. USO INDEVIDO DE MARCA. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. CONJUNTO-IMAGEM (TRADE DRESS). COMPARAÇÃO NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TÉCNICA. ACÓRDÃO RECORRIDO FUNDAMENTADO EM SIMPLES OBSERVAÇÃO DAS EMBALAGENS DOS PRODUTOS EM CONFRONTO. DIREITO À PRODUÇÃO DE PROVA.
1. A fim de se concluir pela existência de concorrência desleal decorrente da utilização indevida do conjunto-imagem de produto da concorrente é necessária a produção de prova técnica (CPC/73, art. 145). O indeferimento de perícia oportunamente requerida para tal fim caracteriza cerceamento de defesa
2. Recurso especial provido.
(REsp n. 1.778.910/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 6/12/2018, DJe de 19/12/2018).
Cabe, ainda, dano material, perdas e danos pelo uso indevido do conjunto-imagem, cumulando ambos os pedidos, porquanto CRUZ (2024, p. 329) afirma: "Como o registro da marca assegura ao seu titular o direito ao uso exclusivo em todo o País, nos termos do art. 129 da LPI, aquele que usar indevidamente marca registrada por outrem poderá ser demandado em juízo e condenado ao pagamento de perdas e danos."
Assim, vale destacar a súmula 143 do STJ, a respeito do prazo prescricional, este confere um direito subjetivo que pode prescrever devido à inércia do ofendido, de 5 anos para ajuizamento de ação no caso de uso indevido de marca alheia: Prescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial. (SÚMULA 143, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/06/1995, DJ 23/06/1995, p. 19648). O STJ, nessa súmula, utilizou a teoria do actio nata, dizendo esta que o prazo prescricional se inicia a partir do momento em que o ofendido tem ciência do dano causado pelo infrator e causador do dano.
Também, no REsp 466.761/RJ decidiu a Ministra Relatora Nancy Andrighi que cabe danos morais pelo uso do conjunto-imagem de forma indevida, se comprovada a vulgarização da marca, citando o julgado:
Direito Comercial e Processo civil. Recurso especial. Ação de conhecimento sob o rito ordinário. Propriedade industrial. Marca. Contrafação. Danos materiais devidos ao titular da marca.
Comprovação. Pessoa jurídica. Dano moral.
- Na hipótese de contrafação de marca, a procedência do pedido de condenação do falsificador em danos materiais deriva diretamente da prova que revele a existência de contrafação, independentemente de ter sido, o produto falsificado, efetivamente comercializado ou não.
- Nesses termos considerados, a indenização por danos materiais não possui como fundamento tão-somente a comercialização do produto falsificado, mas também a vulgarização do produto, a exposição comercial (ao consumidor) do produto falsificado e a depreciação da reputação comercial do titular da marca, levadas a cabo pela prática de falsificação.
- A prática de falsificação, em razão dos efeitos que irradia, fere o direito à imagem do titular da marca, o que autoriza, em conseqüência, a reparação por danos morais.
- Recurso especial a que se dá provimento.
(REsp n. 466.761/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 3/4/2003, DJ de 4/8/2003, p. 295.)
Cabe ressaltar os critérios característicos da marca, sendo eles:
Novidade relativa: não se exige novidade em sentido absoluto, algo que nunca existiu e é totalmente novo, mas sim que seja um criação, de fato, capaz de distinguir uma marca de outra;
Não colidência: ou seja, que marcas não colidam entre si, respeitando o critério da novidade relativa.
Dessa forma, não respeitou a empresa ré tais critérios, visto que para CRUZ (2024, p. 286): "A finalidade precípua da marca, portanto, é diferenciar/distinguir o produto ou serviço dos seus "concorrentes" no mercado." Não houve a distinção no caso concreto, pois houve uma imitação de forma sutil, comprovada por prova técnica, o que enseja aplicação de danos morais e materiais, nos termos vistos nas ementas anteriores, por vulgarização da marca e perdas e danos por concorrência desleal, ao causar potencial confusão aos consumidores.
Conclusão
Deve-se concluir, portanto, que o STJ merece elogios, pois o caso concreto em questão, já firmado na jurisprudência dessa corte, auxilia na defesa da livre concorrência e no protecionismo do consumidor ao resguardar o direito de propriedade industrial da empresa que primeiro registrou a marca criada e por não permitir que uma outra sociedade empresária imite-a, mesmo que de forma sutil, para não causar confusão aos consumidores, vulneráveis nas relações de consumo pela teoria consumerista.
Referências
CRUZ, A. S. Manual de Direito Empresarial: Volume Único. 14 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2024.
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial e altera a Lei nº 5.772, de 21 de dezembro de 1971 (Código da Propriedade Industrial). Diário Oficial da União. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9279.htm. Acesso em 5 de dezembro de 2024.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: Constituição. Acesso em: 5 de dezembro de 2024