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Análise de caso - alegação de militar com dependência química

Agenda 03/05/2017 às 16:00

Soldado alega ser dependente químico durante a prestação do serviço militar obrigatório. Afirma que a condição de dependência de substância entorpecente preexistia ao momento de sua incorporação.

ANÁLISE DE CASO

Soldado do Efetivo Variável alega ser dependente químico durante a prestação do serviço militar obrigatório, no entanto, este afirma que a condição de dependência de substância entorpecente, preexistia ao momento de sua incorporação.

1. A legislação castrense – Lei do Serviço Militar-LSM; Regulamento Interno e dos Serviços Gerais-RISG; Normas Técnicas Sobre Perícias Médicas do Exército-NTPMEx; Decreto nº 703/92 (Instruções Gerais para Inspeção de Saúde de Conscritos nas Forças Armadas-IGISCFFAA), e demais Normas Infralegais apresentam inúmeras disposições sobre os tipos de moléstias e incapacidades a que os militares poderão ser acometidos.

2. No ponto de vista analítico, o caso apresentado não encaixa com perfeição nas disposições normativas (não significa dizer que não deve ser albergado pelo Direito).

3. Mesmo superado a questão manifesta de preexistência da dependência química, uma vez que o próprio militar relatou essa situação, afirmando que omitiu esse fato por ocasião da entrevista para a Comissão de Seleção-2015, não sendo constatada nenhuma referência ao uso ou dependência de substância psicotrópica na sua Ficha de Entrevista. Tal circunstância poderá ser apurada através de Procedimento Administrativo.

4. Resta para a Administração Militar, prover investigação a cerca da narrativa, inquirindo amigos e familiares próximos do militar, além de submetê-lo a inspeção de saúde a fim de constatar o prognóstico da possível enfermidade.

5. Em particular, não identifico nenhuma irregularidade para o seu licenciamento, desde que seja observado o procedimento que averigue as causas e efeitos de seu estado de saúde e ainda, a Inspeção de Saúde para essa finalidade.

6. Diante da premissa apresentada, seguem alguns julgados:

6.1-“PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MILITAR TEMPORÁRIO. REINTEGRAÇÃO. INCAPACIDADE DEFINITIVA PARA O SERVIÇO ATIVO DAS FORÇAS ARMADAS. DEPENDENTE QUÍMICO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CAUSA E EFEITO COM AS ATIVIDADES NAS FORÇAS ARMADAS. AGRAVO IMPROVIDO.

1. O Estatuto dos Militares prevê a reforma ex officio ao militar julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas, podendo sobrevir a inaptidão em consequência de uma das hipóteses previstas no artigo 108 da Lei nº 6.880 /80, dentre elas, o "acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço" (inciso VI).

2. Laudo pericial que diagnosticou o autor como dependente químico, iniciando-se o uso de drogas ilícitas aos 18 anos de idade, logo após o ingresso na carreira militar, sendo certo asseverar, nesse passo, que a dependência não possui relação de causa e efeito com as atividades nas Forças Armadas, razão pela qual, na condição de militar temporário, somente faz jus à reforma no caso de se encontrar total e permanentemente impossibilitado para qualquer trabalho.

3. Não se encontram presentes os requisitos para a concessão da reforma, o que permitiria, por decorrência lógica, a reintegração do militar às Forças Armadas e a percepção dos vencimentos, porquanto o laudo pericial não atesta a incapacidade absoluta, além de assinalar a possibilidade de vários tratamentos serem ministrados ao autor visando à abstinência do uso de drogas ilícitas, como terapia ocupacional, psicoterapia de grupo e individual e outros. Precedente desta Corte.

4. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (PROCESSO: AI 10004 MS 0010004-23.2013.4.03.0000. RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI. JULGAMENTO: 16/09/2013. ÓRGÃO JULGADOR: QUINTA
TURMA)”.

6.2-“ADMINISTRATIVO. MILITAR. CONDUTA. DEPENDÊNCIA QUÍMICA. PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS. ADIDO. TRATAMENTO.

Estando a medida dentro da proporcionalidade do procedimento do militar é de ser mantido o ato emanado no sentido de o autor permanecer como adido para o fim de possibilitar tratamento da dependência química. (TRF-4 - APELREEX: 34028 RS 2007.71.00.034028-4, Relator: SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, Data de Julgamento: 14/10/2009, QUARTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 26/10/2009)”.

6.3-“PROCESSUAL. REEXAME NECESSÁRIO REPUTADO INTERPOSTO. ADMINISTRATIVO. FORÇAS ARMADAS. ATIVIDADE MILITAR. HIERARQUIA E DISCIPLINA. DEPENDÊNCIA QUÍMICA. INCOMPATIBILIDADE. ATO ADMINISTRATIVO. PODER DISCRICIONÁRIO. VÍCIO OU ILEGALIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO.

1. Reputo interposto o reexame necessário, nos termos do art. 475, I, do Código de Processo Civil.

2. As Forças Armadas -Marinha, Exército e Aeronáutica- são instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, que devem ser preservadas para pleno cumprimento de sua missão constitucional (CR, art. 142). Nesse contexto, cabe à Administração assegurar e fazer cumprir as normas relativas ao exercício das atividades em consonância com as obrigações e deveres previstos na Lei n. 6.880/80 e regulamentos que dimanam de cada instituição militar. Portanto, tendo em vista não ser a dependência química neutra em relação ao desempenho da atividade militar, não merece reparo ato que exclui militar que apresenta quadro de dependência química, porquanto devem ser preservadas as condições para o regular e adequado exercício da atividade castrense (STF, HC n. 107688, Rel. Min. Ayres Britto ,j. 07.06.11; HC n. 94524, Rel. Min. Eros Grau, j. 24.06.08).

3. A especificidade da atividade militar exige que situações envolvendo profissionais com quadro de dependência química sejam sopesadas com cautela e prudência; afinal não se trata apenas de bem exercer uma atividade profissional ordinária, mas de atender demandas envolvendo a defesa do País e a garantia dos poderes constitucionais que impõem, escusado dizer, a preservação da supremacia do interesse público e da coletividade. De todo modo, não se pode descartar a ocorrência de prejuízo para as atividades castrenses, sob o crivo da hierarquia e disciplina, a manutenção de militar com restrições para o uso de armamento e condução de veículos, sob pena de conferir aos demais o esforço extraordinário tendente a compensar aquelas restrições.

4. Induvidoso que as ponderações de ordem social e humanitária não podem ser ignoradas, mas também desnecessário destacar a incompatibilidade do estado de dependência química com as escalas para serviços e missões, situações inerentes à atividade militar, que o fato de o autor exercer função administrativa não desobriga. Nesse contexto, não merece reparo o procedimento da Administração na reforma do militar, ao enquadrar a dependência química como doença, a teor do art. 108, VI, e art. 111, I, da Lei n. 6.880/90, fato que propicia a reforma com remuneração proporcional.

5. Inexistente qualquer vício ou ilegalidade do ato administrativo, não cabe ao Poder Judiciário anular ou reformar ato fundado em poder discricionário da Administração.

6. Reexame necessário, reputado interposto, e apelação da União providos, para julgar improcedente o pedido do autor. (PROCESSO: AC1555 SP 0001555-36.2005.4.03.6118. RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW. JULGAMENTO: 14/04/2014. ÓRGÃO JULGADOR: QUINTA TURMA)”.

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6.4-“HABEAS CORPUS. CRIME CAPITULADO NO ART. 290 DO CPM. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PRISÃO PREVENTIVA PELO JUÍZO A QUO. REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. ART. 257 DO CPPM. INCIDÊNCIA.

In casu, não restou comprovada a situação de traficância de entorpecente por parte do Paciente, mas, sim, a de sua dependência química. Em face do Princípio da Presunção de Inocência, o cerceamento da liberdade antes do trânsito em julgado se apresenta como medida excepcional. A decretação ou manutenção da prisão preventiva exige fundamentação legal e fática vinculada ao caso concreto. O art. 257 do CPPM dispõe que o juiz deixará de decretar a prisão preventiva, quando, por qualquer circunstância evidente nos autos, ou pela profissão, condições de vida ou interesse do acusado, presumir que este não fuja, nem exerça influência em testemunha ou perito, nem impeça ou perturbe, de qualquer modo, a ação na justiça. Com efeito, o Paciente é militar da ativa, manifestou interesse em procurar cuidados médicos a fim de tratar sua dependência química, além de não se ter notícias de que este tenha, de qualquer modo, tentado exercer influencia em alguma testemunha ou atrapalhado a instrução processual. Ademais, fato de o Flagranteado ter resistido à prisão, estando sob efeito de entorpecente, não tem o condão de se presumir que este prejudicará a aplicação da lei penal militar. Ordem concedida. Decisão unânime. (PROCESSO: HC 00001073220157000000 DF. RELATOR: ÁLVARO LUIZ PINTO. JULGAMENTO: 23/06/2015. PUBLICAÇÃO: 07/08/2015 DJE)”.

7. Nota-se que não há consenso nas decisões judiciais (nem haveria de ter!) – não há Súmula nesse sentido. Nem sempre uma ou outra decisão judicial aplica-se ao caso concreto, tendo em vista as variáveis que a situação fática pode apresentar. Não raras vezes, surge colidência entre Sentença/Acórdão/Jurisprudência e Leis (ou Atos Normativos).

8. Mesmo sem relação específica com o caso em tela narrado, a decisão do item 6.4 da Corte Militar, inclina-se no sentido de que nos casos de embriaguez/dependência patológica = doença, deve-se propiciar o tratamento médico adequado.

9. Não se tem um juízo de certeza, o que deve ser sopesado é a integridade física coletiva dos militares, bem como a seguraça institucional, associada à legalidade do licenciamento, tendo em vista a impossibilidade de permanência do referido soldado no serviço ativo.

Sobre o autor
Leandro do Amaral Pinto

Pós-Graduando "Lato Sensu" em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais-PUC Minas (2016). Especialista em Direito Público (2015). Especialista em Direito Penal e Processual Penal (2014). Bacharel em Direito (2012). Aprovado no Exame da OAB (2012). Militar do Exército desde 2006. Assessor Jurídico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTO, Leandro Amaral. Análise de caso - alegação de militar com dependência química. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5054, 3 mai. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/54974. Acesso em: 22 dez. 2024.

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