O direito do réu de “permanecer calado” (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.) pode, muita vez, frustrar-lhe o natural anseio de absolvição (ou proclamação da inocência), pois que o silêncio também é resposta.
I. Embora direito seu permanecer calado — que lho assegura a Constituição da República (art. 5º, nº LXIII) —, nenhum réu ignora que esse teor de proceder contraria de frente a própria razão natural, que manda defender-se, com todo o vigor da palavra, o indivíduo injustamente acusado. Donde a parêmia de Jeremias Bentham: “O silêncio é uma confissão de fato” [1].
Posto não confesse a imputação aquele que opta pelo silêncio, também é certo que a não nega, antes parece esforçar a sentença implacável de Peter Thormton: “A inocência clama pelo direito de falar; a culpa, essa invoca o privilégio do silêncio” [2].
Nisto de silêncio, é muito para notar a lição de Vicente de Azevedo, jurista de alta linhagem:
“Interpreta-se o silêncio. Mesmo em direito, tem valor, tem significação o silêncio, a inatividade, a inércia. O provérbio popular: Quem cala consente, tem sentido jurídico: Qui tacet, consentire videtur. O brocardo completo é o seguinte: Qui tacet, cum loqui potuit et debuit, consentire videtur. Isto é, quem cala, quando pode e deve falar, entende-se que consentiu” [3].
Doutrina é esta que tem por fiador não menos que o eloquente Cícero: “O silêncio em certo modo é confissão” [4].
Autoriza-se ainda com a lira de Cassiano Ricardo: “Mas o ficar quieto é mais que dizer tudo” [5].
Do que fica dito bem se infere que o conhecido refrão chinês A palavra é prata, o silêncio é ouro diminui consideravelmente de ponto à face da Justiça Criminal!
II. “Fim imediato do processo”[6], toda a sentença baseia-se na prova, que é o farol que ilumina o juiz na decisão da causa; logo, dos elementos acumulados nos autos é que ele deduzirá as razões de seu convencimento[7]. No Juízo criminal, onde não há “hierarquia de provas”[8], todas servirão a formar o convencimento do julgador, ainda o interrogatório do réu[9], que passa principalmente por meio de defesa[10]. Demais de termo essencial do processo, constitui, de feito, meio de defesa e juntamente de prova, que este caráter lhe imprimiu o Código, inscrevendo-o no Título VII (Da Prova). E meio de prova que é, parece evidente que o juiz o terá em conta ao sentenciar a causa. Que isto não faça dúvida, em vista do texto expresso da lei: “O silêncio do acusado não importará confissão, mas poderá constituir elemento para a formação do convencimento do juiz” (art. 198 do Cód. Proc. Penal). E, se é fonte de persuasão do juiz o mesmo silêncio do interrogando, mais forçosamente o haverão de ser as respostas que este lhe venha a dar.
Embora direito do preso permanecer calado (art. 5º, nº LXIII, da Constituição Federal), reputa-se porém da última ingenuidade supor que se haja ele de defender melhor reverenciando o silêncio do que usando da palavra, que é o intérprete do pensamento. O juiz, portanto, quando adverte o réu das consequências de seu silêncio no ato do interrogatório, não apenas lhe está a curar legitimamente dos interesses, mas por igual a discorrer-lhe do óbvio: quem cala, consente[11].
III. De que o silêncio do acusado, quando acrescido de prova idônea de sua culpabilidade, pode autorizar juízo condenatório, demonstrou “ad satiem” o acórdão adiante reproduzido, do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo:
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Alçada Criminal
Décima Quinta Câmara
Apelação Criminal nº 1.189.425/8
Comarca: Diadema
Apelantes: EJ e Ministério Público
Apelados: Os mesmos
Voto nº 2248
Relator
– Permanecer calado e admitir implicitamente a imputação: tudo é um. O inocente, ao revés, esse costuma repelir, de toda a alma, a acusação grave e injusta, sem chamar-se ao silêncio.
–“No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento de pena” (Súmula nº 174 do STJ).
– A fixação do regime aberto a autor de roubo (art. 33, § 2º, alínea c, do Cód. Penal) deve interpretar-se, não como fraqueza da Justiça, e sim como oportunidade excepcional que lhe concede de emendar-se do ato reprovável e indigno que praticou e reeducar-se para o convívio das pessoas de bem.
– Só porque duas as qualificadoras, não se justifica a majoração da pena além do mínimo legal de 1/3, o que tem lugar apenas nos casos em que praticado o roubo por numeroso grupo de agentes, mediante emprego de armas de fogo de alto poder ofensivo, etc.
1. Contra a r. sentença que proferiu o MM. Juízo de Direito da 3a. Vara Criminal da Comarca de Diadema, condenando EJ à pena de 1 ano, 9 meses e 10 dias de reclusão, no regime aberto com “sursis”, além de 4 dias-multa, por infração do art. 157, § 2º, ns. I e II, combinado com o art. 14, nº II, do Código Penal, apelam para este Egrégio Tribunal, com o intuito de reformá-la:
a) o réu, que, por sua dedicada e ilustre patrona, pleiteia a absolvição, por insuficiência de prova (fls. 164/167); e
b) o Ministério Público, o qual, por seu digno e combativo representante, pugna pela exasperação da pena privativa de liberdade do réu.
Reclama também contra o benefício do “sursis”, a seu aviso incompatível com o crime praticado pelo réu (fls. 143/150).
Apresentaram as partes contrariedade aos recursos (fls. 154/157 e 169/171).
A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em extenso e sólido parecer do Dr. José Albino Zorthea, opina pelo improvimento do recurso da Defesa, provendo-se porém o da Acusação, a fim de que seja majorada a pena-base do réu e fixado, além do mínimo, o aumento pelas qualificadoras; ao demais, espera seja reduzida a pena, pela tentativa, de metade (e não de 2/3), e estipulado ao réu o regime prisional fechado, no início, com a consequente cassação do “sursis” (fls. 176/182).
É o relatório.
2. O réu foi chamado às barras da Justiça porque, no dia 4 de junho de 1999, pelas 10h40, na Rua Margarida Maria Alves, em Diadema, obrando em concurso e unidade de propósitos com dois menores (MVS e FFS), tentaram subtrair para si, mediante violência e grave ameaça, consistente no emprego de arma de brinquedo, os objetos e valores existentes no local, pertencentes à empresa Vídeo Locadora Center Games, representada por André Justino Silva, o que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade.
Rezam os autos que o réu e seus comparsas entraram na locadora e, sob ameaça de arma, anunciaram que se tratava de roubo; ato contínuo, exigiram a entrega das coisas que ali estavam.
A vítima, no entanto, reagiu; o réu, então, agrediu-a com um revólver, ao passo que o menor Marcos a golpeou com um banco de madeira, provocando-lhe lesões corporais; o adolescente Fernando, esse mantinha duas bicicletas na calçada, de prontidão para dar-lhes fuga, o que sucedeu.
Mas, policiais militares, a quem a vítima comunicou os fatos, empreenderam perseguição ao réu e a seus comparsas, logrando deitar-lhes a mão; com eles, apreendeu a Polícia a arma utilizada para a prática do crime.
Instaurada a persecução criminal, tramitou o processo sob forma legal.
A sentença de fls. 127/132 houve a bem condená-lo.
As partes, entretanto, não se acurvaram ao veredicto e apelaram para esta egrégia Corte de Justiça.
3. O argumento da precariedade da prova acusatória, que a nobre Defesa trouxe ao terreiro do debate, passa por mera figura de retórica, uma vez que o conjunto probatório reunido no processado demonstra, desenganadamente, a culpabilidade do réu.
Deveras, no auto de prisão em flagrante, afirmou, sem rebuços, que, no dia dos fatos, combinara com seus colegas a prática de um roubo na locadora, e isso mesmo levaram a efeito (fl. 8).
Suas palavras não jazeram isoladas no corpo dos autos, senão que tiveram por si os depoimentos dos próprios comparsas, que também descreveram, por miúdo, a ação criminosa (fls. 9/10).
Em Juízo, emudeceu o réu subitamente (fl. 56 v.). Seu estudado silêncio, contudo, lhe não aproveita, uma vez réu confesso na quadra extrajudicial; e, o que é mais, exceto se enfermo das faculdades associativas, ninguém permanece em silêncio, máxime perante o Magistrado, se podia falar e, pois, defender-se com veemência da injusta acusação. Calado, quando era bem se manifestasse em prol de si mesmo, fica apenas aquele que nada tem que responder, por lhe faltarem argumentos que se oponham à força da verdade. Permanecer calado e admitir implicitamente a imputação: tudo é um.
Os elementos de convicção arrebanhados na quadra de instrução do processo, a despeito do silêncio do réu, concluíram por sua responsabilidade penal.
É que a vítima, sobre descrever pormenorizadamente o fato criminoso de que foi protagonista, incriminou o réu, reconhecendo-o, com absoluta segurança, como a um dos autores do roubo.
Pelo mesmo teor o testemunho do policial militar Ricardo Nicotari, o qual, inquirido na assentada de fls. 89/91, esclareceu ter sido um dos que detiveram os malfeitores. Asseverou mais que a vítima reconheceu os três.
Isto de arma, esclareceu o policial ter apreendido uma “pistola semiautomática, de brinquedo, de plástico de cor preta” (fl. 17).
Em face da prova oral que conspira contra os protestos de inocência do réu, era força expedir-lhe decreto de condenação.
Que intentassem perpetrar crime de roubo, tudo o persuade: o réu e seus comparsas o declararam, às expressas, no auto de flagrante.
A vítima, na quadra de formação da culpa, confirmou que, ao entrar em sua loja, o réu disse que era “assalto” (fl. 82).
A grave ameaça exercida com emprego de arma, além da violência contra a vítima, agredida com banco de madeira, arguem a prática de crime de roubo.
É certo que, em virtude da pronta reação da vítima, que os meteu em fuga, não lograram os réus perpetrá-lo, pelo que o roubo não excedeu as lindas da tentativa.
É o dos autos, portanto, caso de roubo tentado, conforme capitulação da própria denúncia.
À vista da prova cabal de sua culpabilidade, a lide não poderia desfechar senão num termo condenatório.
As qualificadoras ficaram demonstradas, além de toda a dúvida razoável: emprego de arma e concurso de agentes.
Embora arma de brinquedo, aquela de que se utilizou o réu para praticar o crime configura a causa de aumento do inc. I do § 2º do art. 157 do Código Penal.
A razão é que, embora sem potencialidade ofensiva, o artefato foi idôneo para intimidar a vítima. Aliás, indagada em audiência a esse propósito, respondeu que achava fosse a arma verdadeira (fl. 81).
Daqui por que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, dispôs, na Súmula nº 174 de sua jurisprudência: “No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena”.
4. O culto e zeloso Dr. Promotor de Justiça, em arrazoado de grande peso e vulto, que lhe acrescenta a boa opinião, não levou à paciência a dosimetria da pena do réu nem os benefícios que a sentença lhe deferiu (regime aberto e “sursis”).
Todo aquele que examinar com tento e imparcialidade o teor literal da r. sentença recorrida, esse conhecerá que nenhuma censura lhe cabe, pois decidiu a causa com acerto, brilho e ainda sabedoria.
Importa notar que o réu, primário, mal atingira a maioridade penal, quando cometeu o crime de tentativa de roubo. Além disso, embora permanecesse mudo em Juízo, confessou o crime na Polícia e, desta sorte, imprimiu nos autos elemento valioso por onde se lhe apurasse a culpa.
A pena-base, por isso, havia mesmo de retrair-se ao mínimo. O aumento de 1/3, à conta da incidência de dupla qualificadora, conforma-se com o entendimento pretoriano, segundo o qual, somente em casos excepcionais(com número excessivo de agentes e emprego de arma de extraordinária capacidade vulnerante), é possível majorar a pena acima do limite mínimo de 1/3.
Assim têm decidido nossos Tribunais:
“A existência de mais de uma qualificadora, por si só, não autoriza a majoração da pena do crime de roubo acima de 1/3, somente se justificando a medida quando o modus procedendi fuja aos padrões normais” (RJTACrimSP, vol. 38, p. 252; rel. Geraldo Lucena).
A redução de 2/3 pela tentativa não desdiz das circunstâncias do crime: apenas o réu anunciou tratar-se de roubo, no mesmo ponto a vítima deu sobre ele, fazendo-o romper em fuga.
Não houve apoderamento de bens da vítima; o “iter criminis”, destarte, foi deveras incipiente, não alcançou o primeiro marco miliário da execução.
A concessão do regime aberto, ao contrário do que inculca a veemente apelação do órgão ministerial, passa por timbre do magnífico senso judicante da nobre Magistrada.
Vem a pelo notar que inexiste proibição legal de o Juiz conceder ao condenado não-reincidente a pena inferior a 4 anos o benefício do regime aberto; o Código Penal, o que veda às expressas é que se defira ele ao reincidente condenado a pena superior a 4 anos (art. 33, § 2º, alínea c).
Persuade-o a jurisprudência deste Egrégio Tribunal:
“Em se tratando de crime de roubo qualificado pelo emprego de arma, sendo o réu primário, cuja conduta não indica reprovabilidade exacerbada, é possível a fixação do regime prisional semiaberto, sendo certo que o estabelecimento da modalidade fechada pela só gravidade do delito não encontra amparo legal, estando o Juiz vinculado aos critérios previstos no art. 59 do Cód. Penal, consoante dispõe o art. 33, § 3º, do mesmo diploma” (RJTACrimSP, vol. 36, p. 116; rel. Ricardo Feitosa).
A suspensão condicional da pena era direito público subjetivo do réu, pois concorriam os requisitos legais (art. 77 do Cód. Penal).
Tal benefício, interprete-o o réu, não como fraqueza da Justiça, e sim como oportunidade excepcional que lhe concede de emendar-se do ato reprovável e indigno que praticou e reeducar-se para o convívio das pessoas de bem!
Merece confirmada, enfim, a r. sentença que proferiu a notável Juíza Dra. Maria da Conceição Pinto Vendeiro.
5. Isto posto, nego provimento aos recursos.
São Paulo, 20 de junho de 2000
Carlos Biasotti
Relator
IV. Silêncio do réu. Pecúlio de máximas, citações e ementas jurisprudenciais (extraídas de votos que proferi na 2a. Instância da Justiça Criminal):
1. “Interpreta-se o silêncio. Mesmo em direito, tem valor, tem significação o silêncio, a inatividade, a inércia. O provérbio popular: Quem cala consente, tem sentido jurídico: Qui tacet, consentire videtur. O brocardo completo é o seguinte: Qui tacet, cum loqui potuit et debuit, consentire videtur. Isto é, quem cala, quando pode e deve falar, entende-se que consentiu” (Vicente de Azevedo, Curso de Direito Judiciário Penal, 1958, vol. I, p. 73; Editora Saraiva; São Paulo).
2. “Taciturnitas imitatur confessionem” (Cicero). “O silêncio em certo modo é confissão” (apud Bluteau, Vocabulário, 1720, t. VII, p. 644).
3. “Silentium sapientibus responsi loco est”. Para os sábios o silêncio é uma como resposta (apud Renzo Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, 2000, p. 10; Editora Martins Fontes).
4. O silêncio é uma confissão de fato (Jeremias Bentham; in Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal, nº 1, 1954, p. 93).
5. A inocência clama pelo direito de falar; a culpa, essa invoca o privilégio do silêncio (Peter Thormton; in Revista da Escola Paulista da Magistratura, nº 2, p. 117).
6. “O silêncio é a negação da palavra; e a palavra é vida” (César Salgado, Temas e Perfis, 1975, p. 27).
7. “É cousa tão natural o responder, que até os penhascos duros respondem, e para as vozes têm ecos. Pelo contrário é tão grande violência não responder, que aos que nasceram mudos fez a natureza também surdos, porque se ouvissem, e não pudessem responder, rebentariam de dor” (Pe. Antônio Vieira, Cartas, 1971, t. III, p. 680; Imprensa Nacional; Lisboa).
8. “(…) citaria inevitavelmente o silentium ore facundius, o silêncio que diz mais que a boca” (Camilo Castelo Branco, As Três Irmãs, 1946, p. 222).
9. “Mas o ficar quieto é mais que dizer tudo” (Cassiano Ricardo, Poesias Completas, 1957, p. 602; Livraria José Olympio Editora; Rio de Janeiro).
10. Segundo aquilo do jurisconsulto Paulo, no Digesto (50, 17, 142): Quem cala não confessa, mas também não nega (“Qui tacet non utique fatetur, sed tamen verum est non negare”).
11. “Muito embora o silêncio do interrogando seja uma faculdade procedimental, é difícil acreditar que alguém, preso e acusado de crime grave, mantenha-se calado só para fazer uso de uma prerrogativa constitucional” (RJTACrimSP, vol. 36, p. 325; rel. José Habice).
12. “O silêncio do indiciado pode ser interpretado contra si e isso não macula o direito constitucional previsto no inc. LXIII do art. 5º da Carta Magna. Ora, comumente o increpado inocente, de pronto proclama, de forma enfática e reiterada, esse estado, daí por que o fato de reservar-se a prestar esclarecimentos somente em pretório, data venia, é muito sintomático” (RJTACrimSP, vol. 33, p. 218; rel. Xavier de Aquino).
13. “O silêncio do réu pode ser considerado pelo juiz em seu desfavor, ao analisar o conjunto probatório sem que se vulnere o inc. LXIII do art. 5º da Constituição Federal, pois em se cuidando de inocente, a atitude normal deste é, na primeira oportunidade, proclamar, com ênfase, a sua inocência” (RJTACrimSP, vol. 46, p. 107; rel. Damião Cogan).
14. Embora direito do réu permanecer calado no interrogatório — que lho garante a Constituição da República (art. 5º, nº LXIII) —, contudo a lição da experiência vulgar tem mostrado que ao silêncio unicamenbte recorre quem não pode justificar-se perante a autoridade.
15. A menos dê o acusado convincentes razões de sua inopinada mudez na fase do inquérito, será força interpretá-la por indício grave de culpa. É que nenhum inocente, que deveras o seja, deixa correr, sem protesto enérgico, injusta acusação.
16. Suposto seja direito do réu permanecer calado no interrogatório, paga contudo alto preço por isso: decai da oportunidade de justificar-se perante quem o acusa. E, nas mais das vezes, este silêncio é confissão tácita de culpa.
17. É para desconfiar sempre dos tardios protestos de inocência de quem, na Polícia, injustificadamente, permanece calado, pois o silêncio nunca passou por expressão de defesa, antes parece argumento de culpa.
20. Conquanto exaltado à dignidade de garantia constitucional do réu, contudo, isto de ter permanecido calado, quando se lhe deitou em rosto o labéu de criminoso, repugna à mesma condição humana, que impõe ao indivíduo injustamente acusado o dever (não só o direito) de repelir com todas as forças a insofrível imputação.
21. Não é pouco de admirar isto de permanecer calado o réu no instante em que, arguido da prática de crime grave, razão era se defendesse com a última veemência.
22. Seu silêncio no interrogatório, posto se não deva interpretar sempre como confissão implícita, depõe contudo a favor da tese de que somente não se defende de um libelo quem o reputa justo, ou não tem razões com que lhe objete.
23. A garantia constitucional do silêncio no interrogatório não poupa o acusado à incômoda suspeita de culpa. É que, afora casos em extremo raros, ninguém se resigna ao silêncio podendo falar e, pois, com todas as forças da alma, proclamar sua inocência.
24. Permanecer calado quando lhe importava defender-se com todas as forças de injusta acusação, embora direito do réu, é procedimento que, pelo insólito, argui, se não perturbação de inteligência, decerto culpa, que só o culpado carece de razões com que geralmente se guarda e justifica a inocência.
25. O inocente, quando vítima de infâmia, brada logo por justifiça, com todas as forças e incessantemente. O silêncio do réu, na Polícia, ainda que se não tenha por documento formal de culpa, entende-se todavia por estultícia desmarcada, pois era a primeira e melhor oportunidade para proclamar sua inocência, e deitou-a a perder!
26. Quando natural e plausível era falar, não estranha se tome por confissão o proceder de quem, apartando-se da linguagem e estilos da inocência, prefere permanecer calado, indiferente à advertência do aforismo: “Qui tacet, consentire videtur” (em vulgar: Quem cala, consente).
27. O acusado que, no inquérito policial, se restitui a abafado silêncio, nisto mesmo dá a conhecer a desconfiança de sua inocência, pois somente quem não sabe justificar-se perante o acusador é que cede, temerário, ao impulso de permanecer calado.
28. Não maravilha guarde o réu, muita vez, no interrogatório policial, silêncio de deserto. Reza lá o anexim: Para ruim defesa, melhor é nenhuma.
29. Isto de haver-se recolhido a profundo silêncio, na Polícia, quando natural era que se defendesse desde logo da grave imputação, abate os créditos da versão que, em Juízo, dá o réu para o fato criminoso.
30. Embora direito do réu permanecer calado durante seu interrogatório, repugna à razão natural não queira defender-se pela palavra e com veemência o inocente acusado de fato grave. Em face de injusta acusação, geralmente se interpreta o silêncio por confissão de culpa.
31. O réu que permanece calado na fase do inquérito policial, nisto mesmo dá a conhecer, em certo modo, sua culpa (“lato sensu”), pois repugna à razão natural se entregue ao silêncio quem, por injustamente arguido de fato grave, era de preceito se defendesse com a veemência da palavra.
32. Repugna à razão isto de alguém aguardar, com resignação de Jó, o momento do interrogatório judicial, para só então lavrar seu eloquente protesto de inocência. O que prefere o silêncio — aliás, direito que a Constituição da República assegura a todo o acusado (art. 5º, nº LXIII) —, é certo que não confessa a autoria do delito, mas também não a nega.
33. Postergar a autodefesa é risco tão grande, que somente correm aqueles que, bem cientes de sua culpa, nada ou pouco se lhes dá que a própria liberdade se deite a perder. O homem inocente e que se acha em seu acordo e razão, esse não espera pela undécima hora: apenas o acusem injustamente, logo se defende com todo o vigor de sua palavra. Donde o haverem os romanos cunhado a sentenciúncula: “Qui tacet, consentire videtur” (o que, vertido em vulgar, soa: Quem cala, consente).
34. Concede-se que permanecer calado é direito de todo o réu, solenemente consagrado pela Constituição da República (art. 5º, nº LXIII). No entanto, há invencível implicância lógica entre o estado de inocência e o silêncio perante o acusador. É que a razão natural pôs preceito que nenhum homem injustamente acusado deixasse de defender-se com energia e sem dilação.
35. Aquele que, arguido de furto, prefere prestigiar o silêncio, nisto mesmo dá a conhecer que não é inocente, visto não pôde refutar a acusação (o que geralmente sucede aos culpados).
36. Aquele que, arguido acerca do fato criminoso, cerra os lábios e nada responde, nisso mesmo dá a conhecer sua grande culpa, uma vez que a razão natural ensina não ser próprio do inocente suportar em silêncio injusta acusação, podendo falar e defender-se. Afora os casos de exceção (que merecem comprovados sempre), calado só permanece quem admite a veracidade da imputação.
37. O silêncio do réu perante o acusador como que lhe argui culpa, visto ser contrário à razão natural não queira o inocente defender-se com todo o vigor de sua palavra.
38. Mas, se é verdade que não admite a imputação o que fica em silêncio, também o é que não a nega.
39. Ainda que direito respeitável do réu (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), permanecer calado vale o mesmo que confissão de culpa, se era de razão o uso da palavra. É que nenhum inocente ouviu nunca, em silêncio, injusta acusação!
40. Que maior prova de culpa, do que permanecer alguém calado em presença de injusto acusador?! Qualquer seja sua condição, o inocente sempre se defende pela palavra e com toda a energia; em silêncio fica só o mudo “a nativitate” ou aquele que não tem que opor ao libelo acusatório, porque expressão da verdade.
41. O réu que é inocente já o enuncia na primeira ocasião, quando arguido pela autoridade policial; nada responder a injusta acusação é próprio unicamente de quem se acha culpado.
42. O réu que é deveras inocente não se entrega a perpétuo silêncio quando acusado de crime grave, antes repele com todo o vigor a injusta imputação. Embora direito seu (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), compromete-o sempre a eloquência da mudez.
43. Conquanto direito do réu permanecer calado, não entra em dúvida que esse teor de proceder faz contra o réu, pois o inocente, levado do natural instinto, sempre se manifesta por palavras e atos em repúdio da injusta acusação.
44. Quando firme e seguro o conjunto probatório, não maravilha prefira o réu permanecer calado. Prática é esta que adotam os que já não podem afastar de sobre si o libelo de acusação. O inocente, como lhe ensinou a própria natureza, sua reação normal é clamar com todas as forças contra o injusto acusador.
45. O silêncio do réu no interrogatório passa, não raro, por argumento de responsabilidade criminal. É que, salvo o mudo “a nativitate”, ninguém permanece calado na presença de injusto acusador, pois a todos ensinou a natureza defender-se, em tal caso, com a maior veemência.
46. Da culpa do réu é muita vez argumento irrefutável seu próprio silêncio no interrogatório policial. O inocente já o declara, em altos brados, na primeira oportunidade em que pôde defender-se da grave imputação. O que se deixa ficar mudo e indiferente à sorte processual peleja contra si mesmo, pois dá curso à presunção de que se resignara a mortal silêncio por não ter que contrapor à evidência da acusação.
47. O réu que prmanece calado no interrogatório, ainda que direito seu (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), faz avultar a convicção de que é culpado, porque nenhum inocente ouve em silêncio injusta e infame acusação.
48. O que é inocente já o declara na Polícia quando arguido a respeito do fato criminoso, não prestigia o silêncio. Embora direito que lhe confere a Constituição da República (ar. 5º, nº LXIII), o réu que permanece calado dá a conhecer sua culpa. É que o inocente, quando sem razão o acusam, de imediato se defende com todas as potências de sua alma. Isso entenderam bem os antigos ao cunhar a parêmia: “Qui tacet consentire videtur” (em vernáculo: Calar, o mesmo é que consentir).
49. O silêncio, em face de leviana acusação, é prodígio de que só os mártires foram capazes; no comum dos indivíduos, passa por confissão de culpa.
50. Embora direito seu, vai mal-advertido o réu que, dando de mão à primeira oportunidade de autodefesa, prefere permanecer calado, na Polícia. É que a própria razão natural o intima a defender-se com o vigor da palavra, sobretudo se inocente. Donde a velha máxima: “Qui tacet, consentire videtur” (que, em português, responde assim: Quem cala, consente).
51. Sem quebra da majestade do preceito constitucional (art. 5º, nº LXIII), ensina a experiência vulgar que, em se tratando de causa-crime, o silêncio importa o mesmo que confissão de culpa, visto passa por verdadeira aberração (a cujos efeitos a natureza quis poupar todos os indivíduos) manter-se calado quem podia (e ainda devia) defender-se, vigorosamente, pela palavra).
52. Ensina a experiência vulgar que o sujeito inocente, quando acusado de crime, não o sofre em silêncio, antes se defende com energia e prontamente.
53. Isto de permanecer calado no inquérito, conquanto direito seu, faz contra a presunção de inocência do réu: se deveras inocente e limpo de crime, tê-lo-ia já proclamado, como aqueles que são acusados sem causa, pois a todos ensinou a natureza defender-se com a última força. Ordinariamente falando, é o silêncio do réu pedra de toque de sua culpa.
54. O réu que se refugia no silêncio acrescenta peso e força à acusação, pois embora não confesse o crime, também o não nega.
55. O silêncio do réu, que nada responde acerca dos fatos de que é arguido, dá a conhecer-lhe em certo modo a culpa. É que ninguém deixa de repelir com todas as forças injusta acusação, notadamente se da prática de crime gravíssimo.
56. Ainda que assista ao réu o direito de ficar calado, ensina a razão natural que nenhum homem deixa de retorquir com veemência à injusta acusação, exceto se privado da luz do entendimento.
57. Em que pese à previsão de preceito legal em contrário, o estudado silêncio do acusado, na fase do inquérito, interpreta-o de ordinário o raciocínio lógico, se não por culpa manifesta, ao menos por alto desinteresse em fazer prova de sua inocência, proceder próprio só de quem se julga irremediavelmente perdido.
60. Calado na fase do inquérito, nisto mesmo revelou o réu a fraqueza de seus tardios protestos de inocência. Fosse deveras inocente, ali já o afirmara, mas porque preferiu recolher-se a silêncio de túmulo, fica logo entendido que não tinha como defender-se.
61. Embora direito do réu permanecer calado, carece porém de explicação razoável isto de não romper o silêncio para protestar contra injusta acusação. A resignação ao sofrimento, que toda imputação falsa inflige ao homem de bem, é rasgo que se não compadece com a condição humana, e sacrifício ingente que a natureza não impõe a ninguém. Pelo que, o silêncio em tais casos argui menos o cômodo exercício de um direito do que a falta de razões e argumentos com que contrastar acusação verdadeira. Donde a milenar parêmia: “Qui tacet, consentire videtur” (em vulgar: Quem cala, consente).
62. A sabedoria das nações cunhou a retrilhada parêmia Quem cala, consente, como a significar que o silêncio é o outro nome da culpa num acusado que, podendo, não se defendeu com a força da palavra.
63. O que é inocente afirma-o desde logo à autoridade policial; quem prefere o silêncio à palavra, nisto mesmo se revela culpado; é que ninguém se subtrai ao império da lei natural, que ordena ao indivíduo injustamente acusado de crime se defenda com todas as forças. À imputação falsa de crime só o morto não responde, porque tudo lhe é já indiferente.
64. Passa por princípio de razão lógica interpretar-se contra o acusado o seu silêncio, pois não é próprio de inocente relegar sua defesa para as barras da Justiça quando, no empenho da busca da verdade, podia já deduzi-la na Polícia.
65. Depõe ordinariamente contra o interesse do réu seu silêncio na quadra do inquérito. Deveras, quando injusta a acusação, o inocente não se retrai ao silêncio, antes clama de contínuo à face do mundo.
66. Aquele que, perguntado dos fatos graves e delituosos que lhe são imputados, prefere cerrar-se a toda a comunicação, não entra em dúvida que, ainda sob o paládio constitucional (art. 5º, nº LXIII), dá ruim conta de si mesmo. É que, em face de injusta acusação, nenhum homem se esquiva do legítimo dever de responder ao acusador e lavrar-lhe veemente protesto.
67. O silêncio, no interrogatório, não raro argui culpabilidade. É que, segundo a lição da experiência comum (“id quod plerumque accidit”), não costuma calar-se o inocente, antes brada aos céus com todas as forças, desde o primeiro instante e sem cessar, contra injusta acusação.
68. A própria razão natural adverte que não é de inocente ficar em silêncio, no interrogatório, quando lhe cumpria falar, para defender-se com todas as forças de injusta acusação.
69. Interpreta-se em geral contra o réu seu silêncio no interrogatório, pois a mesma razão natural ensina que não é próprio do inocente calar-se, mas protestar com todas as forças, quando injustamente acusado.
70. Ainda que direito seu permanecer calado, atenta contra os foros da razão humana o réu que se deixa de defender, com todas as suas forças, quando injustamente acusado de crime grave.
71. Também o deliberado silêncio costuma interpretar-se por culpa. É que a mesma lei natural pôs preceito ao inocente que se não calasse perante injusta acusação.
72. É princípio de direito natural que todo o inocente deve defender-se com a última energia quando injustamente acusado. Aquele que, em tal caso, permanece calado, não sendo mudo, argui extraordinária carência de defesa lógica e eficiente, transe incômodo e comprometedor em que, pelo comum, apenas se debate o culpado.
73. O réu que é inocente já o proclama na fase do inquérito policial; pelo que, se aí recai em largo silêncio, mais não faz que prestigiar a acusação e reonhecer-lhe a legitimidade. Com efeito, que maior prova de culpa (“lato sensu”), do que ouvir alguém em silêncio grave acusação, podendo falar?!
74. O réu que, podendo falar, prefere permanecer calado, embora direito seu (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), nisto mesmo dá a conhecer sua culpa. É que a todos ensinou a natureza repelir, com a última veemência e sem delonga, acusação injusta e grave. Perante o acusador, em silêncio e cabisbaixo somente fica o culpado.
75. O réu que se mantém em profundo silêncio quando interrogado, nisto mesmo deixa conhecer sua culpa, pois não é próprio do inocente permanecer calado perante injusta acusação; ao revés, logo na primeira oportunidade se defende em todas as potências de sua alma.
76. Ainda que direito garantido pela Constituição Federal (art. 5º, nº LXIII), o réu que permanece calado nisso mesmo dá a conhecer sua culpa. É que nenhum inocente confia ao silêncio o encargo de sua defesa, antes se empenha em repelir com energia extraordinária a injusta acusação.
77. Embora direito que lhe assegura a Carta Magna (art. 5º, nº LXIII), o silêncio do réu, no interrogatório — exceto em circunstâncias excepcionais, cuja prova lhe toca (art. 156 do Cód. Proc. Penal) —, interpreta-o de ordinário a inteligência humana por indício de culpa, uma vez não é próprio do inocente ouvir calado, braços cruzados sobre o largo peito, injusta acusação, mas repeli-la de toda a alma.
78. Aquele que deixa correr em silêncio oportunidade de repelir imputação de crime, ainda que exerça direito seu, admite em certo modo a culpa. É que a própria razão natural ensina o homem a defender-se pela palavra de injusta acusação, sobretudo quando inocente.
79. Não merecem crédito as palavras do réu que, em Juízo, protesta inocência, mas na Polícia, onde era de razão repelisse a imputação grave, preferiu abismar-se em profundo silêncio, refúgio natural dos culpados.
80. O réu que, na Polícia, permanece calado não pode, pelo comum, ser contado entre os inocentes; a razão é que estes, quando injustamente acusados, sempre se defendem com todo o vigor da palavra, não com o silêncio.
81. Não admira permanecessem calados os réus na Polícia: é comum o silêncio naqueles que, tocados da evidência de sua culpa, têm por desarrazoada e baldia outra sorte de linguagem.
82. O réu inocente já o declara na Polícia, não permanece aí calado, embora direito seu. O silêncio foi havido sempre pelo refúgio natural dos que, tocados da evidência da própria culpa, não podem defender-se, que lhes falecem argumentos.
83. O réu inocente já o proclama na fase do inquérito policial. O silêncio é a pedra de toque de quem, não tendo que responder a justa acusação, nisso mesmo dá a conhecer que é culpado.
84. Embora direito do réu manter-se calado (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), ordena a razão natural que todo o indivíduo se defenda com bravura de injusta acusação; em silêncio e indiferente, quando arguido de crime, só permanece o que foi achado em culpa.
85. Isto de permanecer calado no inquérito, conquanto direito seu, faz contra a presunção de inocência do réu. A razão é que, se deveras inocente e limpo de crime, tê-lo-ia já proclamado, como aqueles que são acusados sem causa, pois a todos ensinou a natureza defender-se com a última força. Ordinariamente falando, é o silêncio do réu pedra de toque de sua culpa.
86. Embora direito que a Constituição da República reconhece a todo o acusado (art. 5º, nº LXIII), ficar em silêncio perante injusto acusador passa por prodígio de tal ordem, que a experiência vulgar o tem reputado irmão gêmeo da culpa (“Qui tacet, consentire videtur”).
87. Permanecer calado e admitir implicitamente a imputação: tudo é um. O inocente, ao revés, esse costuma repelir, de toda a alma, a acusação grave e injusta, sem chamar-se ao silêncio.
88. O réu inocente responde logo à injusta acusação, como o determina a própria razão natural; não se chama ao silêncio, que é este o refúgio comum dos culpados.
89. Permanecer calado no interrogatório policial é traço conspícuo daqueles que, perante a evidência do crime que praticaram, não têm que responder e, pois, preferem refugiar-se no silêncio. Donde a presunção comum de que, no suspeito de crime, o silêncio equivale a culpa.
90. Protestos de inocência que irrompem somente em Juízo, durante o interrogatório, são pelo comum notados de insinceros e suspeitos, porque, se verdadeiros, já os haveria o réu formulado na ocasião mesma em que, chamado a contas pela autoridade policial, preferiu retrair-se a cômodo e extraordinário silêncio.
91. Suspeita de insinceridade é sempre a serôdia versão exculpatória do réu apresentada em seu interrogatório judicial, pois o inocente já o proclama na fase do inquérito, não invoca o silêncio como defesa.
92. Suposto direito do réu permanecer calado (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), custa crer assim proceda o inocente. É que a natureza a todos os homens ensinou repelir, ainda que pela força, injusta ofensa.
93. Toda versão exculpatória serôdia é passível de suspeita, que lhe retira a credibilidade, pois o inocente apresenta desde logo autodefesa, na primeira ocasião que tem de justificar-se, não guarda para fazê-lo somente à barra da Justiça.
94. Aquele que, arguido da prática de crime, recorre ao silêncio, não se defende; e, como era de razão o fizesse, nisto mesmo dá a conhecer sua culpa. Com efeito, não se cala o inocente, aliás repele com todas as forças de sua alma a injusta acusação.
95. O acusado inocente repele com veemência a imputação de crime, como lho impõe a própria dignidade. Assim, ainda que direito seu permanecer calado art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), réu que se não defende de injusta acusação nisto mesmo dá a conhecer que tem culpa. Donde a verdade da antiga máxima: É o silêncio o refúgio dos culpados.
96. Muita vez, o silêncio do acusado é a mais clara das explicações.
97. O silêncio do acusado, embora conte com o beneplácito da Constituição da República (art. 5º, nº LXIII), é indício eloquente de culpabilidade porque em contradição com o natural instinto de defesa, que impõe ao homem inocente a obrigação de protestar sempre contra injusta acusação.
98. O réu inocente não se exime de afirmá-lo já na primeira oportunidade em que pode fazê-lo. Se às perguntas da autoridade responde com o silêncio, dá logo a conheceer que não lhe tem que dizer, situação anormal e absurda, na qual soem achar-se unicamente os culpados de crime.
99. Que maior indício de culpa que ficar mudo quem estava na obrigação de protestar inocência?! Daqui a natural conclusão: unicamente se não defende aquele que é incapaz de contrastar a evidência da própria culpa!
100. Primeiro que o mais, excita estranheza isto de se inculcarem inocentes os réus e, no entanto, haverem guardado na Polícia, a respeito dos fatos, obliterado silêncio.
Aquele que é inocente não dilata nem protela oportunidade de afirmá-lo; ao revés, tanto que se lhe depara ocasião de repelir a acusação, no mesmo ponto pratica sua defesa.
Esta, a razão por que, ordinariamente falando, ainda que direito do réu permanecer calado (art. 5º, nº LXIII, da Const. Fed.), esse teor de proceder não se compadece com o perfil do inocente, antes é o retrato moral do culpado.
Não carecem de razão, portanto, os que afirmam ser o silêncio, nas mais das vezes, “a mais clara das explicações”.
Notas
[1] Cf. Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal, nº 1, 1954, p. 93.
[2] Cf. Revista da Escola Paulista da Magistratura, nº 2, p. 117.
[3] Curso de Direito Judiciário Penal, 1958, vol. I, p. 73; Editora Saraiva; São Paulo.
[4] “Taciturnitas imitatur confessionem” (apud Bluteau, Vocabulário, 1720, t. VII, p. 644).
[5] Poesias Completas, 1957, p. 602; Livraria José Olympio Editora; Rio de Janeiro.
[6] Eliézer Rosa, Dicionário de Processo Civil, 1957, p. 325.
[7] O que não está nos autos não está no mundo, reza venerando aforismo jurídico (“Quod non est in actis, non est in mundo”). Este princípio, as velhas Ordenações Filipinas exaltaram num lugar célebre: “E assim dê (o julgador) a sentença definitiva, segundo o que achar alegado e provado de uma parte e da outra, ainda que lhe a consciência dite outra coisa, e ele saiba a verdade ser em contrário do que no feito for provado” (liv. III, tít. LXVI).
[8] Cf. Exposição de Motivos do Cód. Proc. Penal, cap. VII.
[9] Dado que impressione asperamente os sentidos, e até as fibras delicadas da alma, o vocábulo réu é termo próprio da linguagem do foro, para designar “aquele que é demandado e chamado em Juízo. O seu contrário é autor. Chama-se réu, da palavra latina res, que, segundo os jurisconsultos, vale o mesmo que causa, demanda e litígio” (Bluteau, Vocabulário, 1720, t. VII, p. 251). Tome-nos ainda a mão o erudito vocabulista: “De sorte que réu, na Jurisprudência, se chama todo aquele que é arguido e acusado, ainda que inocente; e, nesta conformidade, chama Cícero a Milão réu, no mesmo tempo que, apadrinhando a sua causa, quer provar que é inocente” (Ibidem).
[10] “… o interrogatório do acusado não constitui meio de prova, mas representa o mais importante instrumento da autodefesa no processo penal” (Ada Pellegrini Grinover, As Nulidades no Processo Penal, 2a. ed., p. 226).
[11] Só por exceção deixa de triunfar a verdade deste brocardo, como se lê em Cícero: O silêncio em certo modo é confissão (cf. Bluteau, op. cit., t. VII, p. 644).