[1] O termo Rus provavelmente tem origem escandinava, designando nórdicos que habitavam outras regiões, fora da Escandinávia. Até o século XV, o termo referia-se a uma determinada região que abarcava praticamente todos os eslavos orientais, a partir de então passou a ser substituído pelo termo Rússia (Rossíya), que designava estado centralizado em Moscou (BRAUDEL, 2004).
[2] Os eslavos costumam ser divididos em três grandes grupos: eslavos orientais (russos, bielorrussos e ucranianos); eslavos ocidentais (poloneses, kashubianos, checos, eslovacos, sorábios e silesianos); eslavos do Sul (búlgaros, sérvios, croatas, macedónios, eslovenos, bósnios e montenegrinos) (SEGRILLO, 2012; GIMBUTAS, 1975).
[3] O Estado varegue centrado em Kiev tinha caráter comercial, como já vimos: estava localizado de maneira a controlar as rotas comerciais entre a Escandinávia e o Mar Negro, e seu principal tráfico de exportação era o de escravos - destinados aos mundos muçulmanos e bizantino (ANDERSON, 1974, p. 226)
[4] A discussão sobre as origens do estado kievano divide a historiografia e é profundamente marcado por interpretações com viés nacionalista. Mas, de modo geral, costuma-se aceitar o papel inicial dos normandos na formação do estado dos eslavos orientais.
[5] Enquanto no século XIII, a Europa Ocidental possuía cerca de 35 milhões de habitantes, a Europa Oriental, numa região muito maior, possuía entorno de 13 milhões (ANDERSON, 1974, p. 232).
[6] Costuma-se afirmar que os boiardos evoluíram das druzhinas, antigo séquito tribal de guerreiros dos príncipes.
[7] É antes a natureza heteróclita e amorfa da sociedade e da economia kieviena que impressionam (ANDERSON, 1974, p. 227).
[8] Desde 1200, os habitantes de Novgorod pararam de viajar para o Oeste com seus bens. A Liga Hanseática, ou Hansa Teutônica, composta pelas cidades comerciais do Norte da Alemanha, conseguiu obter o controle do comércio em todos os países ao redor do Mar Báltico. Os alemães viajaram para Novgorod para comprar peles, cera de abelha para velas e outros produtos florestais. As peles, que alcançavam um bom preço no Ocidente, variavam de simples esquilos a martas das florestas do Norte. Em troca, Novgorod comprou tecidos ingleses e flamengos e um grande número de itens menores de cidades ocidentais (BUSHKOVITCH, 2013, p. 42).
[9] As vyeche existiam em várias cidades da Rus de Kiev, inclusive na própria capital. Contudo, em Novgorod, apresentou um caráter mais autônomo e independentista, provavelmente por conta do desenvolvimento econômico da cidade e seus choques com Kiev.
[10] Análise demográfica desenvolvida no trabalho de Martin (2002, p. 6-7).
[11] Braudel (2004) enxergou o caráter aberto das cidades russas como algo positivo e, num determinado sentido, economicamente progressista. Em contrapartida, a tradição marxista enfatiza o papel rudimentar desse tipo de organização urbana, visto que é subordinada ao campo ao contrário das cidades fechadas, como as do medievo ocidental, que tendem a evoluir como a antítese do campo, isto é, são cidades que evoluem para dominar a zona rural.
[12] O esplendor dessa primeira Rússia se explica num contexto histórico geral. No dia que o Mediterrâneo ocidental se abrir novamente, nos séculos XI e XII, com o fim da supremacia muçulmana no mar, o interesse desse caminho interminável de rotas fluviais e de transporte declinará. Ele termina definitivamente com a ocupação de Constantinopla, em 1204, pelos latinos: o caminho marítimo matou a rota continental (BRAUDEL, 2004, p. 471).
[13] [...] as cruzadas haviam cortado as rotas comerciais do Mar Negro e Constantinopla e ao mundo islâmico, nas quais se baseava tradicionalmente a prosperidade do comércio de Kiev(ANDERSON, 1974, p. 234).
[14] Com o advento do século XIII, a Rus de Kiev era um único estado apenas nominalmente. [...] Com exceção de Novgorod, cada território tinha uma dinastia nascida da antiga dinastia de Kiev, a dinastia Rurikovich. Como a Rússia de Kiev não reconhecia a primogenitura, todos os filhos de um príncipe tinham que ser considerados, e o tio mais velho também poderia aspirar a governante legítimo. Inúmeros pequenos principados surgiram, enquanto vários centros regionais de poder Vladimir, Smolensk, Chernigov e Galich mantinham os príncipes menores sob controle. Eram sociedades agrícolas, cada uma com uma pequena elite de boiardos que governavam os camponeses e aconselhavam o príncipe (BUSHKOVITCH, 2013, p. 42).
[15] Rus kievana era uma confederação de cidades-Estado com vassalagem ao Grande Príncipe de Kiev. Um Estado florescente, mas descentralizado e desunido. Em tempos de ameaça militar estrangeira nem sempre os príncipes de Rus atendiam ao chamado de luta contra o inimigo externo comum(SEGRILLO, 2012, p. 142).
[16] Enquanto a Rus de Kiev surgiu da síntese sobretudo entre mercadores suecos e dinamarqueses e eslavos orientais, a Rússia do Nordeste se desenvolveu sobretudo da síntese entre esses últimos e os finlandeses (os primeiros povoadores da região, nórdicos de origem oriental-mongol). Esse seria, segundo alguns autores, uma das principais diferenciações étnicas entre grão-russos (russos) e pequeno-russos (ucranianos) (BRAUDEL, 2004).
[17] Para Anderson (1974), o feudalismo na Europa Oriental surgiu sobretudo como consequência da reação senhorial, derivada da crise do século XIV. Nesse sentido, tanto a Rus de Kiev, quanto o estado moscovita, não haviam conhecido o feudalismo antes dos séculos XV-XVI. Assim, a invasão mongol teve o papel de retardar a evolução ao feudalismo da Rus de Kiev ao jogar o centro da civilização russa para a zona de colonização nordestina local onde predominava a abundância de terras e a escassez de homens (ANDERSON, 1974).
[18] [...] a característica mais fundamental de toda a zona plana, estendendo-se do Elba ao Don, pode ser definida como a ausência permanente daquela síntese ocidental específica entre um modo de produção tribal e comunal em desintegração, baseado em uma agricultura primitiva e dominado por aristocracia guerreiras rudimentares, e um modo de produção escravo em dissolução, com uma civilização urbana extensiva, baseado na troca de mercadorias e em um sistema de estado imperial [...] Este fato central foi o determinante histórico básico do desenvolvimento desequilibrado da Europa e o persistente atraso do Leste (ANDERSON, 1974, p. 205).