Resumo: O tema discutido perquiriu os retrocessos advindos com a Reforma Trabalhista de 2017 e seus impactos nas relações trabalhistas, na dignidade e na saúde do trabalhador. A metodologia de abordagem empregada foi a dialética-histórica. O texto foi construído a partir de informações coletadas das aulas, do material bibliográfico enviado pela docente e selecionado pelo discente. Os resultados obtidos revelaram que a legislação de Michel Temer precarizou o trabalho e comprometeu a saúde do trabalhador, não honrando à promessa de ampliar o mercado de emprego formal. Contrariamente ao discurso pré-reforma, verificou-se acentuado crescimento da informalidade, sacrifício de direitos e garantias trabalhistas em benefício da hegemonia de pequenos grupos econômicos neoliberais. Desta feita, a dignidade do trabalhador foi sacrificada, a Constituição Federal e a CLT veladas e sepultadas. Os Poderes Executivo e Legislativo permanecem inertes e o Poder Judiciário, ainda que de forma tímida, tem rechaçado alguns dispositivos da malfadada legislatura reformista.
Palavras-chave: trabalho; saúde; dignidade; emprego; direito; precarização.
INTRODUÇÃO
Este trabalho recolhe informações das aulas organizadas ao longo do curso de pós-graduação ofertado pela Profa. Dra. Vera Lúcia Navarro, do Departamento de Psicologia da FFCLRP/USP, sob o tema “Saúde e Trabalho no Brasil”. O curso ocorreu entre abril e junho de 2022 e contou com a exposição de inúmeros assuntos transdisciplinares, todos focados em questões preocupantes e relacionados ao trabalho, ao trabalhador e a sua integridade enquanto ser que constrói o universo laborativo.
Para construção deste texto, coletaram-se as informações obtidas nos encontros semanais, cotejando-as com as questões relacionadas à formação deste discente (Ciências Jurídicas). Do ponto de vista metodológico, foi imprescindível uma abordagem histórico – dialética, a partir de Karl Marx e Friedrich Engels (2002). Tal enfoque buscou compreender a realidade do mundo a partir das grandes transformações da história e das sociedades humanas. Como bem elucida Lukács (2010, p. 171) “[…] o ser só pode ser abordado como ser se for objetivamente determinado em todos os sentidos. Um ser privado de determinações é apenas produto do pensamento: uma abstração de todas as determinações […]”.
Desta forma, tal análise não pode envolver somente um aspecto, sem entender o complexo que o cerca, principalmente após as alterações propostas pela Lei n. 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), quando houve a desconstrução da estrutura constitucional e infraconstitucional de proteção ao trabalhador, com desrespeito aos padrões de saúde e segurança até então presentes no ordenamento jurídico brasileiro.
A análise dos temas será centrada nas questões: 1) a intensificação da jornada de trabalho; 2) a prevalência do negociado sobre a lei e o enfraquecimento sindical; 3) Teletrabalho; 4) Terceirização; 5) Trabalho de Grávidas e Lactantes em Locais Insalubres e a possibilidade de alterar o grau de insalubridade mediante negociação coletiva.
Por fim, busca-se comparar as referidas modificações ao texto constitucional como meio de evidenciar à afronta aos direitos historicamente conquistados e adquiridos pelo trabalhador.
O retrocesso legislativo advindo com a Reforma de 2017 subtraiu do trabalhador sua dignidade, garantida na Constituição Federal em seu inciso III, do artigo I, e a maioria dos Direitos Sociais. Colocou em “Xeque Mate” a própria Democracia estatuída pela Assembleia Nacional Constituinte. Afinal de contas, um Estado Democrático não pode ser um mero depósito de Leis: ele deve suportar a aplicação das Leis por ele produzidas.
1. BREVE HISTÓRICO
Em 11 de novembro de 2017 entrou em vigor, no Brasil, a Lei nº 13.467, conhecida como Lei da Reforma Trabalhista. A nova lei alterou mais de 100 artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – cerca de 200 dispositivos do referido estatuto – além da Lei nº 6.019 de 1974, da Lei nº 8.036 de 1990 e da Lei nº 8.212 de 1991.
Os arautos da Reforma propagavam odes a uma suposta obsolescência da CLT que justificaria sua profunda alteração. Repetiam o mantra, que encanta o Congresso Nacional há décadas, de que para gerar empregos é necessário flexibilizar a legislação trabalhista. Comportavam-se como o Deus Ares na luta pela terceirização sem limites como forma de reduzir os custos empresariais.
Os professores José Dari Krein, Roberto Véras de Oliveira, Vitor Araújo, Filgueiras, em interessante obra intitulada “Reforma Trabalhista no Brasil: promessas e realidade” (2019) esclarecem as verdadeiras razões da Reforma Trabalhista.
Para os escritores, a lógica do Direito do Trabalho, de impor regras à exploração do obreiro, protegendo as relações laborativas e o trabalho assalariado, com jornada de trabalho definida, já é óbice à existência empresarial, principalmente com a emergência da tecnologia da informação e das empresas de aplicativos. Fala-se aqui do fenômeno alcunhado de “Uberização das Relações de Trabalho”.
Neste sentido, com o falacioso argumento de que a Consolidação das Leis Trabalhistas é anacrônica, encarece as contratações, gerando o desemprego e reduzindo os postos de trabalho, optou-se por uma reforma que prometeu, por meio da flexibilização da legislação protetiva, ampliar o número de empregos no país.
A Reforma, contudo, não cumpriu sua promessa! O livro referido argumenta que sua implementação especificamente não reduziu o desemprego ou provocou o aumento da formalização, como indica o capítulo 1 de Vitor Filgueiras. No caso da formalização, pelo contrário, há fortes indícios de que a reforma tem incitado sua redução.
Por outro lado, as alterações legislativas parecem promover impactos importantes na forma que as ocupações novas ou remanescentes estão adquirindo, reforçando ou criando tendências quanto às modalidades de contratação, remuneração e tempo de trabalho. Em todos esses aspectos, predomina o recrudescimento da precarização iniciada ou acentuada com a crise.
Transcreva-se, para tanto, o magistério Vitor Filgueiras (2019, p. 44. – 45):
[...] No Brasil, contratar empregados ilegalmente é uma prática atávica. Reduzir custos de contratação não garante o incremento da formalização, pois continua sendo mais barato negar o vínculo. Sem uma expansão econômica que pressione a demanda por força de trabalho, apenas uma regulação impositiva parece ser capaz de alterar o comportamento empresarial, como fica flagrante no caso não planejado da formalização recente dos caminhoneiros. Todavia, a reforma reduz o risco de perdas ao empresário, que se sente mais seguro para empregar sem assumir vínculos, inclusive sob a alcunha de autônomos ou intermitentes, seguindo ou mesmo sem seguir formalidades.
Em suma, a reforma não parece influenciar positivamente nem a decisão de criação do posto de trabalho, nem a decisão de formalização. No caso da formalidade, pelo contrário, parece reforçar, como incentivo (com verniz da legalização), a tendência já existente de incremento da informalidade, agora escudada em rótulos como “autônomo” e PJ, e com menor risco de processo judicial. [...]
Resta claro que a Reforma foi um fracasso frente aos propósitos declarados e não entregou o que prometeu. Ao contrário, suprimiu Direitos Trabalhistas em nome de uma empregabilidade informal.
Para arrematar esse tópico, relevantes dados são informados por Jorge Luiz Souto Maior, em seu Blog (https://www.jorgesoutomaior.com/blog/a-reforma-trabalhista-gerou-os-efeitos-pretendidos, ) no sentido de que a Reforma Trabalhista foi uma legislação de retrocesso, sob as retóricas da modernização e de que sacrifícios são necessários para a superação da crise. Entretanto, o que de fato ocorreu foi a retirada de direitos e ganhos da classe trabalhadora, com benefícios reais para as grandes empresas e os bancos. Veja-se dos dados abaixo:
[...] 1. aumento dos lucros das 308 empresas de capital aberto que atuam no Brasil, que chegou, em 2018, ao montante de R$ 177, 5 bilhões, representando um aumento de R$52,3 bilhões com relação ao ano de 2017; 2. aumento de 12,3%, em 2018, dos lucros dos quatro maiores Bancos que atuam no país (Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil), os quais seriam, inclusive, os maiores legatários da reforma da Previdência que se pretende implementar no Brasil; No mesmo período, também como efeito da “reforma”, que, inclusive, justifica os efeitos acima, a nova legislação promoveu na vida dos trabalhadores e trabalhadoras: 1. aumento do desemprego, que chegou a 12,7% em abril de 2019, atingindo 13,4 milhões de pessoas; 2. o número de pessoas com carteira assinada tem se mantido praticamente estável, atualmente na faixa de 32,9 milhões de pessoas, isto é, sem aumento considerável, e isto considerando o patamar de 2015, que já trazia a perda de 4 milhões de empregos formais com relação a 2014, sendo que entre os jovens até 24 anos o que se mantém é o fechamento de vagas em número cada vez maior; 3. número recorde de desalentados (4,8 milhões); 4. elevação da informalidade (11,1 milhões); 5. aumento da precariedade; 6. redução, na ordem de 34%, do acesso do trabalhador à Justiça do Trabalho; 7. aumento do sofrimento no trabalho; 8. piora generalizada das condições de trabalho, com aumento do número de acidentes do trabalho, isso em um país em que já se verificava a marca de 700 mil acidentes do trabalho por ano e que já ostentava o posto de quarto país do mundo em número de mortes por acidentes do trabalho; 9. diminuição dos direitos e ganhos normativos dos trabalhadores, com redução da média salarial, fazendo com que a renda média do brasileiro caísse. A inflação em 2018 foi da ordem de 4% e a “elevação” do salário, em 2018, na média, foi da ordem de 2,9%; 10. diminuição do consumo; 11. endividamento das famílias; 12. redução da arrecadação tributária e previdenciária; 13. ampliação do déficit da Previdência; 14. majoração do déficit público em geral; 15. aumento da miséria; 16. aumento da desigualdade social, sendo que, precisamente, já se chegou, aqui, no último período, ao resultado de que a renda dos 1% mais ricos foi 36 vezes superior à média dos mais pobres, sendo que nem mesmo esse acúmulo fica no país, já que os ricos aumentaram, de forma recorde, o volume de suas remessas ao exterior; 17. fragilização dos sindicatos. [...]
A Reforma suprimiu direitos que, fatalmente, atingirão a dignidade e a saúde do trabalhador. Passar-se-á a análise destas questões no tópico a seguir.
2. ALTERAÇÕES DA REFORMA TRABALHISTA E SEUS REFLEXOS NA SAÚDE DO TRABALHADOR.
2.1. A INTENSIFICAÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO. A PREVALÊNCIA DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO. O ENFRAQUECIMENTO SINDICAL. O TELETRABALHO.
No tocante à jornada de trabalho, merecem destaque as seguintes modificações introduzidas:
ANTES DA REFORMA |
APÓS A REFORMA |
Art. 58. A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite. |
Art. 59. Em exceção ao disposto no art. 59. desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação. |
Art. 58. ... § 2º O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001) |
Artigo 58 ... § 2º O tempo despendido pelo empregado até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. |
Art. 71. Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas. § 1º - Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas § 2º - Os intervalos de descanso não serão computados na duração do trabalho. |
Sem correspondência |
Art. 611. Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967) |
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: ... III – intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superior a seis horas; |
Art. 4º. Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada. |
Art. 4º ... § 2° Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como extra o período que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no § 1º do art. 58. desta Consolidação, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares, entre outras: I – práticas religiosas; II – descanso; III – lazer; IV – estudo; V – alimentação; VI – atividades de relacionamento social; VII – higiene pessoal; VIII – troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa. (NR) |
Art. 58-A. Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a vinte e cinco horas semanais. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001) |
Art. 58-A. Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a trinta horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a vinte e seis horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais. |
Art. 62. Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo: (Redação dada pela Lei nº 8.966, de 27.12.1994) I - os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados; (Incluído pela Lei nº 8.966, de 27.12.1994) II - os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial. (Incluído pela Lei nº 8.966, de 27.12.1994) |
Art. 62. ... III – os empregados em regime de teletrabalho. |
Do comparativo acima, percebe-se uma enorme subtração de direitos e garantias trabalhistas após a malfadada Reforma.
A priori, deve-se registrar que as mudanças foram um nítido conluio celebrado à luz de uma política neoliberal para a mitigação da política legislativa de proteção ao trabalho e ao trabalhador. A Reforma foi cruel ao passo que comungou o enfraquecimento sindical à sobreposição do legislado ao negociado.
A função dos sindicatos foi investigada por esse discente em 2003 (2003, on line).
No estudo, destacou-se que a primeira função sindical, a negocial, caracteriza-se pelo poder conferido aos sindicatos para ajustar convenções coletivas de trabalho nas quais serão fixadas regras a serem aplicáveis nos contratos individuais de trabalho dos empregados pertencentes à esfera de representação do sindicato pactuante. Torna-se assim um direito do trabalho paralegal para complementar as normas fundamentais fixadas pelo Estado através das leis e para cobrir as lacunas ou dispor de forma favorável ao trabalhador, acima das vantagens que o Estado fixa como mínimas. No Brasil, a Constituição Federal (art. 7º, XXVI) reconhece as convenções coletivas de trabalho, e a CLT (art. 611) as define e obriga a negociação (art. 616).
A segunda função, a assistencial, é a contribuição conferida pela lei ou pelos estatutos aos sindicatos para prestar serviços aos seus representados, contribuindo para o desenvolvimento integral do ser humano. Há quem sustente ser desvirtuamento das funções principais do sindicato o alargamento dessas contribuições. A CLT determina ao sindicato diversas atividades assistenciais, como educação (art. 514, parágrafo único), saúde (art. 592), lazer (art.592), fundação de cooperativas (art. 514, parágrafo único), dentre outras.
A contribuição sindical era, até a Reforma, a principal receita do sindicato no Brasil. Era compulsória e possuía natureza parafiscal.
A antiga redação do 592 da CLT apontava a contribuição sindical como fonte de receita sindical com características e destinação próprias, sublinhando-se dentre as finalidades, a aplicação em atividades assistenciais e administrativas, sob supervisão do Ministério do Trabalho. A contribuição sindical estava sujeita a minuciosa disciplina legal (CLT, arts. 578. a 610), que compreendia as pessoas que estavam obrigadas ao pagamento; a base de incidência; os critérios fixados para o recolhimento; a distribuição dos percentuais correspondentes às confederações, federações, sindicatos e Ministério do Trabalho, repassada para o custeio do seguro-desemprego.
Após a Reforma, a contribuição deixa de ser obrigatória, o que leva ao enfraquecimento financeiro dos sindicatos. Observe-se as mudanças do texto legislativo:
ANTES DA REFORMA |
APÓS A REFORMA |
Art. 578. As contribuições devidas aos Sindicatos pelos que participem das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação do “imposto sindical”, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo. |
Art. 578. As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas. |
Art. 579. A contribuição sindical é devida por todos aqueles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591. |
Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591. desta Consolidação. |
Art. 582. Os empregadores são obrigados a descontar, da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano, a contribuição sindical por estes devida aos respectivos sindicatos. |
Art. 582. Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) |
A consequência desta tentativa de “falência” sindical foi sentida pelo trabalhador, que teve algumas modalidades de horas extras subtraídas de suas garantias trabalhistas.
Para Sérgio Pinto Martins (2010, p. 115):
Horas extras são as prestadas além do horário contratual, legal ou normativo, que devem ser remuneradas com o adicional respectivo. A hora extra pode ser realizada tanto antes do início do expediente, como após seu término normal ou durante os intervalos destinados a repouso e alimentação. São usadas as expressões horas extras, horas extraordinárias ou horas suplementares, que têm o mesmo significado.
A Reforma, desta perspectiva, surrupiou as designadas horas in itinere, anteriormente previstas no parágrafo 2ª, do artigo 58 da finada CLT. Assim, o tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público, e para o seu retorno, deixa, em tese, de ser computável na jornada de trabalho. Tal entendimento esbarrou em valiosa construção doutrinária e jurisprudencial nascida em idos de 1978 e endossada pelo Tribunal Superior do Trabalho em seu Enunciado 90.
Outro ponto destacado no novo texto é afeto ao intervalo de descanso intrajornada. Para os trabalhadores com jornada de trabalho de 8 (oito) horas diárias, a lei previa uma parada de, no mínimo, uma hora e no máximo duas horas para a alimentação e descanso. Agora essa pausa poderá ser negociada, mas o tempo mínimo é de 30 (trinta) minutos, independente do acerto entre empregador e empregado.
Aqui reside uma situação muito preocupante à saúde do trabalhador.
Maurício Godinho Delgado (2011, p. 886) infere que:
[...] Intervalos e jornadas, hoje, não se enquadram, porém, como problemas estritamente econômico, relativos ao montante de força de trabalho que o obreiro transfere ao empregador em face do contrato pactuado. É que os avanços das pesquisas acerca da saúde e segurança no cenário empregatício têm ensinado que a extensão do contrato do empregado com certas atividades ou ambientes laborativos é elementos decisivos à configuração do potencial efeito insalubre ou perigoso desses ambientes ou atividades. [...]
Releva-se mencionar que o Tribunal Superior do Trabalho já decidiu pela invalidade de cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71. da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva. Tal é o entendimento da Súmula 437 da Corte sobredita.
A redução do descanso intrajornada é uma fatalidade à saúde do trabalhador, que ficará sujeito ao stress, cansaço, fatiga, problemas digestórios, sem considerar os empregados acometidos por doenças endocrinológicas, como diabetes melittus, que necessitam de cuidados especiais e um maior tempo para descanso e alimentação. Há que se considerar o elevado número de brasileiros portadores de doenças cardiovasculares, hipertensos, que passam a se alimentar de forma inadequada para atender o horário determinado pela empresa. Os resultados serão computados a longo prazo e, claro, na conta do trabalhador adoecido.
De acordo com o texto atual, também não é computado como período extraordinário o que exceder a jornada normalmente quando o empregado, “por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares”. Essas atividades, listadas expressamente no artigo 4º, parágrafo 2º, da CLT são: práticas religiosas, descanso, lazer, estudo, alimentação, atividades de relacionamento social, higiene pessoal e troca de roupa ou uniforme.
O dispositivo é sombrio e remonta cenário da Revolução Industrial! Neste compasso, Karl Marx (2002, p. 738-39) conclui:
[...] O trabalho excessivo da parte empregada da classe trabalhadora engrossa as fileiras de seu exército de reserva, enquanto inversamente a forte pressão que este exerce sobre aquela, através da concorrência [entre estas duas frações da classe trabalhadora], compele-a ao trabalho excessivo e a sujeitar-se às exigências do capital. [...] A condenação de uma parte da classe trabalhadora à ociosidade forçada, em virtude do trabalho excessivo da outra parte, torna-se fonte de enriquecimento individual dos capitalistas e acelera ao mesmo tempo a produção do exército industrial de reserva uma escala correspondente ao progresso da acumulação social [...]
Muito atual a perspectiva Marxista, sem a qual não se alcança a exata da dimensão do problema enfrentado: as mudanças na jornada de trabalho são o resultado da superexploração da força de trabalho pelo capital. Tal fato configura-se como lei da produção capitalista, uma consequência inevitável da permanente criação e recriação, decorrente do próprio movimento do capital, de massas de desempregados, sem as quais o capital é incapaz de sobreviver.
Por fim, a legislação de Michel Temer ampliou a jornada diária de trabalho para 12 (doze) horas com período de descanso não inferior a 36 (trinta e seis horas). O limite semanal de 44 (quarenta e quatro) horas fica mantido, assim como as 220 (duzentos e vinte) horas/mês. Anteriormente, o limite era de 44 (quarenta e quatro) horas semanais ou 220 (duzentos e vinte) horas por mês. O limite diário, porém, era de 8 (oito) horas de trabalho, sendo permitido, no máximo, realizar 2 (duas) horas extras por dia.
Este dispositivo é um convite à informalidade e ao adoecimento físico e psíquico do trabalhador. As razões são óbvias e saltam aos olhos: o empregado, mormente contratado com vínculo formal, dedica-se 12 (doze) horas ao seu emprego. Contudo, o achatamento salarial, a crise econômica lhe impõe a necessidade de renunciar às 36h (trinta e seis horas) de descanso para se dedicar a outras atividades. Aqui, cabe destacar, que as tecnologias digitais e os aplicativos favorecem o trabalho informal, seja home office, seja como motoristas, dentre outros.
Novamente, o cansaço, o stress, um conjunto de fatores aliados à sobrecarga de trabalho conduziram ao adoecimento do trabalhador. Assertiva a conclusão de Vera Lúcia Navarro ao estudar o “Trabalho e Trabalhadores do Calçado” (2006) e relatar em um de seus artigos (2016) que:
[...] Na década de 1990, vivenciamos um cenário de acirramento da competição intercapitalista em âmbito mundial – as empresas tiveram que se readequar à nova realidade e, para tanto, implementaram mudanças em seus aparatos tecnológicos e organizacionais, intensificando o processo de reestruturação produtiva. Tais mudanças resultaram em redução de postos de trabalho, intensificação do ritmo de trabalho e precarização, dentre outras.
Passamos então a viver um antagonismo: enquanto parcela da classe trabalhadora passou a sofrer com o desemprego ou com empregos precários, a parcela que continuou empregada vem sofrendo com o excesso de trabalho. Mesmo em países como a França, um dos poucos a reduzir a jornada de trabalho para 35 horas semanais, os trabalhadores adoecem por excesso de trabalho devido às horas extras trabalhadas.
É sabido que no Brasil, onde a jornada de trabalho é de 44 horas semanais, se trabalha muito mais que isto. O trabalho terceirizado, a domicílio, que está em expansão, é um dos responsáveis pelo aumento da jornada além do previsto em lei. No trabalho realizado a domicílio, realizado de forma geral sem contratos formais, é comum se trabalhar até a noite, com jornadas que se estendem para os finais de semana, feriados, sem período de férias. [...]
O trabalho em tempo parcial parece corroborar o cenário acima: tem-se, agora, o contrato de até 30 (trinta) horas semanais, sem horas extras, ou de até 26 (vinte e seis) horas semanais, com até 6 (seis) horas extras. Porém, o trabalhador necessitará de complementar sua renda em outras atividades, vale dizer, muda-se a roupa, mas a pele continua a mesma.
O teletrabalho foi outra inovação surgida com a nova legislatura. Pelo artigo 75-B da CLT, esta modalidade de trabalho ficou definida como “a prestação de serviço preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”.
Em relação à jornada de trabalho, a Reforma incluiu o inciso III ao artigo 62 excluindo os empregados do teletrabalho/home office (trabalho remoto) do controle de jornada. Com isso, o empregador não necessita pagar horas extras ao funcionário, exceto se ele quiser implementar sistema de monitoramento de horário de trabalho do empregado.
O trabalho home office já foi apontado como um grave inimigo à saúde mental do trabalhador. Christian Dunker, psicanalista e docente da Universidade de São Paulo, (Portal de Divulgação Científica do IPUSP, on line) descreveu que esta modalidade de labor compromete desde a alimentação até à libido do empregado. Expõe o estudioso “as pessoas vivem uma espécie de desalento. Entre as queixas narradas nos consultórios virtuais de psicanalistas, está a de operar em modo automático após o trabalho, sem vontade de fazer nada. Uma espécie de efeito zumbi.”
Problemas relacionados ao sono, aumento no consumo de psicotrópicos e antidepressivos, álcool e outras drogas, transtornos depressivos e de ansiedade, fatiga foram relatados em importantes pesquisas realizadas pelo Instituto de Psiquiatria da USP (Portal de Divulgação Científica do IPUSP, on line). Ainda, tal estudo revelou que a permanência no trabalho remoto incluíram sensações de desesperança, tédio, empobrecimento intelectual e fadiga do distanciamento social. Os excessos causados pela pandemia também estão intimamente ligados a questões de gênero. Trabalhar em casa aumentou a jornada em até 65%, e foram as mulheres que sofreram sobrecarga do home office - as mulheres responderam por 40,5% de sintomas de depressão, 34,9% de ansiedade e 37,3% de estresse. “A mulher do home office faz jornada tripla”.
2.2. A TERCEIRIZAÇÃO IRRESTRITA E AMPLA
Mauricio Godinho Delgado (2017, p. 502) define Terceirização como
[...] o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente, consistindo num mecanismo jurídico que permite a um sujeito de direito tomar serviços no mercado de trabalho sem responder, diretamente, pela relação empregatícia estabelecida com o respectivo trabalhador. [...]
Inicialmente, a Justiça do Trabalho mostrou-se resistente ao fenômeno da terceirização, tanto que o TST aprovou em 30 de setembro de 1986 resolução administrativa que instituiu o então Enunciado n. 256, cujo conteúdo era bastante restritivo à possibilidade de subcontratação de trabalho subordinado.
Após novas e sucessivas alterações em seu texto, ocorridas em 2000 e finalmente em 2011, atualmente é a Súmula n. 331. que fixa as diretrizes jurisprudenciais de validade da terceirização. Em linhas gerais, a jurisprudência criou uma distinção entre atividade meio e atividade fim como critério para avaliar as diferentes formas jurídicas de terceirização. Consoante coloca Otávio Pinto e Silva (2017, on line):
[...] Segundo esse critério, a ideia de atividade meio veio no sentido de reconhecer que esta pode ser objeto de terceirização. Vale dizer, considerou-se lícita a subcontratação de trabalho subordinado no que se refere às atividades que não coincidem com os fins da empresa contratante. Sendo assim, a jurisprudência passou a admitir que, além da área de vigilância, as empresas terceirizassem permanentemente também áreas como as de conservação e limpeza, preparação e fornecimento de refeições, transporte de empregados, assistência técnica em informática etc. Em suma: todas as áreas ligadas às atividades especializadas e de suporte. [...]
Entretanto, logo após o Impeachment da Presidente Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer em 2017, as Lei ns. 13.429/2017 e 13.467/2017 ressignificaram a Terceirização no Direito brasileiro. A partir da edição da Reforma passou-se a definir a prestação de serviços a terceiros como a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução. Com isso, parece agora perder sentido a distinção entre atividade fim e atividade meio constante da Súmula n. 331. do TST e construída pela jurisprudência da Justiça do Trabalho. (Otávio Pinto e Silva, 2017, on line).
A terceirização irrestrita e ampla precariza o trabalho. A relação laborativa neste modelo é triangular, envolve três atores: o empregado, a empresa prestadora de mão de obra e a empresa tomadora de serviços. Entre as empresas prestadoras de mão de obra e tomadora de serviços existe mero contrato prestação de serviços regido pelo Código Civil. Por outro lado, entre a empresa prestadora de serviços e o trabalhador existe contrato de trabalho disciplinado pela CLT. Logo, o empregado trabalha efetivamente para duas empresas, porém é subordinado apenas a uma delas.
O trabalhador terceirizado tem sido apontado como aquele mais exposto a acidentes de trabalho. Tal fato se explica porque ele é um trabalhador invisível para a sociedade, que não recebe o mesmo treinamento, não tem cobrança para o uso de EPI, não ganha o mesmo que um empregado direto recebe exercendo a mesma função.
Wilson Fernandes avaliou, em 2018, que “[...] Dos acidentes de trabalho no Brasil, cerca de 70% a 80% envolvem trabalhadores terceirizados. [...]”
Resta a conclusão de que a terceirização é maldade explícita e ilusão, como definiu Jorge Luiz Souto Maior, em seu artigo intitulado “PL 4.330/04: maldade explícita e ilusão”, publicado em seu blog (https://blogdaboitempo.com.br/2015/04/06/pl-4-33094-maldade-explicita-e-ilusao ). Critica o jurista:
O que interessa mesmo aos defensores da terceirização é formalizar um ajuste entre os interesses econômicos e políticos em torno do comércio de gente. O econômico caracterizado pela lógica da redução do custo, o aumento da exploração e a destruição concreta das possibilidades de resistência por parte da classe trabalhadora.
E ainda, a nova consolidação da legislação trabalhista brasileira visa rebaixar os custos com a força de trabalho e ajustar a produtividade do trabalho no país ao sistema capitalista internacional e caminha na contramão da garantia de direitos e proteção da classe trabalhadora. Suas regulamentações - principalmente as referentes ao trabalho temporário, terceirizado, à jornada parcial, ao trabalho autônomo e ao trabalho intermitente - tornam ainda mais precários os vínculos trabalhistas, as relações de trabalho, e acentuam os efeitos negativos já observados pela prática da terceirização no país, apontando para um horizonte de retrocessos já anunciados. Por fim, observa-se que tais mudanças colaboram ainda mais para a desarticulação de instâncias sindicais e para o aumento dos níveis de fragmentação dos coletivos de trabalhadores.
2.3. O TRABALHO DE GRÁVIDAS E LACTANTES EM LOCAIS INSALUBRES E A POSSIBILIDADE DE ALTERAR O GRAU DE INSALUBRIDADE MEDIANTE NEGOCIAÇÃO COLETIVA.
A Reforma de 2017 produziu um caldeirão de malvadezas, bem como leis teratológicas, nascidas para atingir o bem-estar das mulheres trabalhadoras, gestantes ou lactantes, que precisavam, neste momento maternal, trabalhar em ambientes insalubres.
Entenda a cruel dicção do texto do então presidente Temer:
Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
I - atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação.
(aqui, somente a grávida poderá se afastar do trabalhar enquanto durar a gestação. Observe que o dispositivo não faz alusão a lactante, fato, no mínimo, incoerente)
II - atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação;
(neste caso, a gestante deve apresentar atestado médico que justifique sua permanência fora das atividades insalubre de grau médio. Novamente, o dispositivo não se refere à Lactante, deixando uma lacuna a ser desvendada. Afinal de contas, lactantes podem amamentar seus filhos em ambientes insalubres?
III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
(neste caso, a lactante deve apresentar atestado médico que justifique sua permanência fora das atividades insalubre de grau médio. De outro lado, o dispositivo não se refere à gestante)
Este dispositivo, em 2017, foi declarado inconstitucional pelo STF. À época, por 10 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional o trecho da reforma trabalhista que abriu a possibilidade de gestantes e lactantes trabalharem em atividades insalubres. A Corte confirmou liminar proferida em maio pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, suspendendo a norma do artigo 394 – A da CLT.
Na Ação Declaratória de Inconstitucionalidade Julgada pelo STF (ADIN n. ADI 5938 / DF), o Pretório Excelso declarou a inconstitucionalidade do dispositivo 394 – A da CLT pelas seguintes razões:
1. O conjunto dos Direitos sociais foi consagrado constitucionalmente como uma das espécies de direitos fundamentais, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado Democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal; 2. A Constituição Federal proclama importantes direitos em seu artigo 6º, entre eles a proteção à maternidade, que é a ratio para inúmeros outros direitos sociais instrumentais, tais como a licença-gestante e o direito à segurança no emprego, a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei, e redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; 3. A proteção contra a exposição da gestante e lactante a atividades insalubres caracteriza-se como importante direito social instrumental protetivo tanto da mulher quanto da criança, tratando-se de normas de salvaguarda dos direitos sociais da mulher e de efetivação de integral proteção ao recém-nascido, possibilitando seu pleno desenvolvimento, de maneira harmônica, segura e sem riscos decorrentes da exposição a ambiente insalubre (CF, art. 227). 4. A proteção à maternidade e a integral proteção à criança são direitos irrenunciáveis e não podem ser afastados pelo desconhecimento, impossibilidade ou a própria negligência da gestante ou lactante em apresentar um atestado médico, sob pena de prejudicá-la e prejudicar o recém-nascido.
Em belíssimo voto, a Ministra Rosa Weber (ADIN n. ADI 5938 / DF/STF) fundamenta que a permissão do artigo que autoriza gestantes e lactantes trabalharem em ambientes insalubres é um enorme retrocesso aliado aos temas e princípios constitucionais. Assevera que:
[...] Na realidade, a cláusula que proíbe o retrocesso em matéria social traduz, no processo de sua concretização, verdadeira dimensão negativa pertinente aos direitos sociais de natureza prestacional (como o direito à saúde), impedindo, em consequência, que os níveis de concretização dessas prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser reduzidos ou suprimidos, exceto na hipótese – de todo inocorrente na espécie – em que políticas compensatórias venham a ser implementadas pelas instâncias governamentais. [... ]
O outro tema tangente diz respeito ao enquadramento da insalubridade.
O artigo 189 da CLT considerada atividades ou operações insalubres “aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.”. A regulamentação destas atividades é realizada pelo Ministério do Trabalho, por meio das NRs.
A NR 15, que cuida das atividades e operações insalubres, categoriza a insalubridade em três graus, a saber:
Para cada percentual de insalubridade, o trabalhador receberá um adicional de seu salário. Assim: quando o percentual de insalubridade for de 40%, o trabalhador deverá receber um adicional de 40%; quando o adicional for médio, de 20%, o trabalhador receberá um adicional de salário de 20%; e quando for mínimo, 10%, o empregado receberá um adicional mínimo, de 10% de seu salário.
O grande golpe trazido pela Reforma repousa na introdução do inciso XII, do artigo 611 – A, da CLT, o qual estabeleceu:
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho, observados os incisos III e VI do caput do art. 8º da Constituição, têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
(...)
XII - enquadramento do grau de insalubridade e prorrogação de jornada em locais insalubres, incluída a possibilidade de contratação de perícia, afastada a licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho, desde que respeitadas, na integralidade, as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho; (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
Este dispositivo, em nosso sentir, é inconstitucional. Em primeiro lugar, há uma questão simplória de Hermenêutica: as convenções e os acordos coletivos não podem se sobrepor à norma cogente, que contém conteúdo indisponível.
As normas de insalubridade estão dispostas no inciso XII, artigo 7º, da CF, que apregoa “a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”. Esta norma é de disponibilidade absoluta. Cumpre mencionar que, embora a Constituição, no inciso XXVI, do artigo XXVI, reconheça as convenções e os acordos coletivos de trabalho, estes instrumentos não podem se sobrepor a lei, que goza de imperativa, abstração, natureza cogente e são indisponíveis. Neste campo da legalidade, situam-se as leis de proteção à saúde do trabalhador.
Em face desse esforço Hermenêutico, há que se deduzir que o artigo 611 – A é inconstitucional, até porque fere à Própria Dignidade e a Saúde do Trabalhador.
Lamentavelmente, o conteúdo da Lei n. 13.467/17, ao contrário do que afirmou à imprensa, desconstruiu o Direito do Trabalho como se conheceu, contrariando alguns de seus princípios básicos, suprimindo regras favoráveis ao trabalhador, priorizando a norma menos favorável ao empregado, autorizando a livre autonomia da vontade individual. Permitiu, também, que o negociado prevaleça sobre o legislado (para reduzir direitos trabalhistas), valorizando a imprevisibilidade do trabalho intermitente, excluindo regras protetoras de direito civil e de processo civil ao direito e processo do trabalho.
Ainda, a Reforma dificultou ao máximo a intervenção do Judiciário na análise das cláusulas contidas nas convenções coletivas e acordos coletivos, limitando as hipóteses de nulidade. Adotou como o princípio a intervenção mínima (do Judiciário) na autonomia da vontade coletiva, dando maior segurança às convenções coletivas e acordos coletivos e liberdade (poder) aos seres coletivos. Isto está refletido tanto no § 3º do art. 8º, quanto no art. 611-A da CLT.