Arrendamento de propriedade em condomínio

07/03/2023 às 19:47
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Foto: Shutterstock

O condomínio rural é uma forma de propriedade conjunta, em que os proprietários, denominados condôminos, exercem ao mesmo tempo frações ideais sobre o todo da propriedade indivisa, ou seja, a divisão é idealizada em cotas. Neste sistema, não há uma divisão da propriedade em lotes, pois todos são proprietários simultaneamente dentro de uma única matrícula.

O que pode ser dividido são frações (pedaços) dentro da própria propriedade para delimitar o espaço que cada um tem direito de usar, o que subdivide o condomínio em pro diviso, quando dividido, e pro indiviso, quando indivisível ou não dividido.

Normalmente não encontramos condomínios rurais muito organizados com regras de utilização em uma mesma família, mas o correto é que se organizem por meio de estatutos ou outro tipo de documento para determinar a forma de administração da propriedade comum. 

Enfim, em outra oportunidade já havíamos comentado que, o artigo 504 do Código Civil determina que “não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto”, ficando claro que não é possível vender sem oferecer preferência e, em caso de condomínio indivisível, nem poderia vender até o fracionamento das áreas feito por extinção de condomínio em cartório ou na justiça.

Ocorre que, surge uma outra situação, não relacionada à propriedade, mas à posse do imóvel. A posse pode ser concedida a terceiros (arrendatários ou parceiros), sem anuência dos demais condôminos? O que dizem os tribunais?

Pois bem. O Código Civil novamente responde esta dúvida, com alguns contrapontos que faremos em seguida. O parágrafo único do artigo 1.314 do Código Civil orienta que “Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse ou uso dela a estranhos, sem o consenso dos outros”.

Porém, em algumas oportunidades, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu casos semelhantes a este exemplo e por isso cito o Recurso Especial 1755536, do Rio Grande do Norte, que tratava de imóvel arrendado para empresa do ramo salineiro desde 2001, tendo a autora da ação assinado o contrato, sendo que a fazenda de 160,4 hectares, encontrava-se em condomínio pro indiviso, ou seja, sem delimitação de frações e nenhum dos coproprietários explorava diretamente o imóvel há anos.

Pelo fato de não haver sido explorado há anos pelos demais coproprietários, o STJ então afastou esta regra do artigo 1.314 do Código Civil e deu validade à renovação contratual feita por apenas uma proprietária.

Os ministros consideraram que, se estiver mantida a destinação do imóvel, não basta a oposição de uma coproprietária minoritária para alterar a destinação do imóvel, ainda que se alegue interesse na exploração direta.

Portanto, se a minoria não concordar com as decisões da maioria, poderá, a qualquer tempo, requerer a divisão da coisa comum, se for divisível (art. 1.320 do CC) ou, se for indivisível, requerer a alienação judicial da coisa e a consequente extinção do condomínio (art. 1.322 do CC).

Assim, a maioria dos condôminos, embora tenha o poder de decidir sobre o regime e o modo de administração, a escolha e as atribuições do administrador, não pode contrariar os interesses da minoria, eis que estes podem requerer a divisão da coisa ou a extinção do condomínio, o que pode comprometer e inviabilizar as atividades que todos, em comum, pretendam concretizar.

E mais. Neste caso, nem o direito de preferência no arrendamento o STJ concedeu para os demais coproprietários, pois adotaram o entendimento de que “a assinatura do anterior consentindo com a exploração do imóvel por terceiros, é ato incompatível com o exercício posterior do direito de preferência (visando explorar o imóvel diretamente)”.

Por isso a recomendação é profissionalizar ao máximo as atividades desenvolvidas por um grupo de proprietários, até mesmo familiares, por meio de estatutos, senão um administrador nomeado para isso, para evitar desavenças e outras situações que normalmente acabam nas vias judiciais ou extrajudiciais com a divisão da propriedade, o que também envolve altos custos com despesas processuais, cartoriais, periciais, advocatícios, dentre outros mais.


Sobre o autor
Pedro Puttini Mendes

Advogado, Consultor Jurídico (OAB/MS 16.518, OAB/SC nº 57.644). Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Sócio da P&M Advocacia Agrária, Ambiental e Imobiliária (OAB/MS nº 741). Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Colunista de direito aplicado ao agronegócio para a Scot Consultoria. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA), Membro Consultivo da Comissão de Direito Ambiental e da Comissão de Direito Agrário e do Agronegócio da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco. Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil pela Anhanguera (2011). Cursos de Extensão em Direito Agrário, Licenciamento Ambiental e Gestão Rural. PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA: "Pantanal Sul-Mato-Grossense, legislação e desenvolvimento local" (Editora Dialética, 2021), "Agronegócio: direito e a interdisciplinaridade do setor" (Editora Thoth, 2019, 2ª ed / Editora Contemplar, 2018 1ª ed) e "O direito agrário nos 30 anos da Constituição de 1988" (Editora Thoth, 2018). Livros em coautoria: "Direito Ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988" (editora Thoth, 2018); "Direito Aplicado ao Agronegócio: uma abordagem multidisciplinar" (Editora Thoth, 2018); "Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul - explicada e comentada" (Editora do Senado, 2017).

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