O DIREITO DE HABITAÇÃO sofreu sensíveis mudanças por ocasião do Código Civil de 2002 (que foi promulgado há pouco mais de VINTE ANOS). Até hoje muita gente confunde esse direito que se funda na proteção do cônjuge supérstite, por evidentes razões de ordem humanitária e social - que evidentemente também deve ser assegurado ao(à) companheiro(a) sobrevivente nos casos de UNIÃO ESTÁVEL (como há muito já assentou o STJ, vide REsp 1273222/SP. J. em 18/06/2013). A excelente doutrina assinada por FARIAS e ROSENVALD (Curso de Direito Civil. 2023) assim esclarece:
"O direito real de habitação é a garantia reconhecida ao cônjuge (e ao companheiro) de continuar residindo no imóvel, de natureza residencial, que, durante a convivência, servia de LAR PARA O CASAL, após a morte do outro componente da sociedade afetiva, independentemente de ter DIREITO MEATÓRIO ou SUCESSÓRIO sobre o bem e independentemente do regime de bens. Trata-se de um direito real sobre a coisa alheia, VITALÍCIO. (...) Na sistemática do Código Civil de 2002, diferentemente do seu antecessor, o direito de habitação é VITALÍCIO, GRATUITO e INCONDICIONADO".
Como bem apontam os ilustres professores, diferentemente do regramento anterior, mesmo que a(o) viúva(o) estabeleça novo casamento ou mesmo nova união estável (e com muito mais razão, qualquer outro relacionamento afetivo que não receba tais classificações), seu direito de habitação não poderá ser afetado mesmo que o imóvel sobre o qual deva exercer esse assegurado direito tenha restado por ocasião da partilha a outros herdeiros deixados pelo(a) falecido(a).
O artigo 1.831 do Código Civil atual é claro:
"Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar".
Necessário sempre recordar que ainda que o artigo citado não informe expressamente sobre o(a) COMPANHEIRO(A) tal direito é assegurado a quem viveu em União Estável já que inadmite-se qualquer distinção entre Casamento e União Estável - inclusive para fins do direito de habitação - no ordenamento jurídico brasileiro como também já decretou o STF (Tema 498 e Tema 809).
Dessa forma, fica claro que o(a) viúvo(a) com tranquilidade pode constituir novos relacionamentos depois do falecimento do(a) seu(sua) companheiro(a) ou cônjuge anterior, sem receio de perder o direito de habitação sobre o bem; da mesma forma, é importante inclusive recordar que a Lei põe a salvo instrumentos processuais para garantir o exercício do referido direito real sobre coisa alheia (ações possessórias). Na mesma intelecção deve ficar claro ao(à) viúvo(a) ocupante que tal direito não tem o condão de lhe conferir USUCAPIÃO e que o bem mesmo onerado com o referido direito poderá ser VENDIDO ou DOADO pelos proprietários, todavia, eventuais novos adquirentes deverão respeitar o direito exercido pelo(a) sobrevivente.
POR FIM, a acertada jurisprudência mineira destacando o novo tratamento do instituto desde o Código Civil de 2002:
"TJMG. 10439150128866002. J. em: 30/04/2019. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. IMISSÃO DE POSSE. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. OCORRÊNCIA DE NOVO VÍNCULO CONJUNGAL. EXTINÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DO REGRAMENTO DO INSTITUTO ENTRE O CÓDIGO CIVIL DE 1916 E O CÓDIGO CIVIL DE 2002. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO COMPROVADO. SENTENÇA REFORMADA. A ação de imissão de posse constitui via adequada para que o adquirente do imóvel, proprietário, obtenha a posse do bem. Trata-se de ação de cunho petitório, representando o remédio jurídico posto à disposição do proprietário não possuidor para que desfrute do exercício da posse direta - O DIREITO DE HABITAÇÃO é considerado um direito real, disciplinado pelos artigos 1414 e seguintes, do Código Civil Brasileiro, no qual confere ao seu titular direito de habitar gratuitamente casa alheia. O cônjuge sobrevivente NÃO PERDE o direito real de habitação mesmo que após a sua aquisição venha a se CASAR ou CONSTITUIR NOVA UNIÃO ESTÁVEL, dadas as alterações substanciais do instituto entre a regulamentação contida no Código Civil Brasileiro de 1916 (art. 1611, § 2º, do CC/16), que permitia a perda do direito real se o cônjuge sobrevivente deixasse de ser viúvo, e a atual regra contida no Código Civil de 2002, que não repetiu a mesma norma. Reconhecido o direito real de habitação do possuidor direto do imóvel, deve ser afastada a pretensão de imissão da posse pelos proprietários e, ainda, extirpada a pretensão de reparação por perdas e danos pela não fruição do imóvel".