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A governança na nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021)

08/04/2023 às 16:18
Leia nesta página:

A governança nas contratações públicas é responsabilidade da alta administração, que deve garantir integridade e eficiência nos processos.

A chegada da Governança como pilar de gestão das Contratações Públicas já havia sido anunciada pelo TCU, no Acórdão TCU nº 2.622/2015, quando foi fixado “a necessidade de se aperfeiçoar continuamente os sistemas de governança e gestão das aquisições no setor público decorre de sua forte relação com a geração de resultados para a sociedade”.

Por governança entende-se um sistema com o propósito conquistar e preservar a credibilidade da instituição face à sociedade, por meio de um conjunto eficiente de mecanismos, a fim de assegurar que as ações executadas estejam sempre alinhadas ao interesse público1.

Na lição de Leonardo Zannoni, a “governança é a condução responsável dos assuntos do Estado em todas as esferas que coloca os assuntos de governo de forma multilateral e insiste em questões como governabilidade, accountability e legitimação”2.

Embora esteja muitíssimo em voga em diversos setores nos dias atuais, a governança já vinha sendo incentivada e propagandeada há muito tempo, especialmente após o Decreto nº 9.203/2017, que instituiu a política de governança pública na Administração direta, autárquica e fundacional, tornando obrigatória a implantação de programa de compliance em todos os órgãos do Poder Executivo da União, como meio de fomentar a eficiência, promover a cultura da integridade e prevenir a corrupção3.

Nessa marcha inexorável, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021, logrou em propor alguns instrumentos para exercício e incentivo à boa, ou quiçá, à ótima governança, de forma a impactar a Administração Pública em todas as esferas.

Deveras, em que pese trazer a palavra “governança’ apenas duas vezes, a Lei nº 14.133/2021 a apresenta como eixo central estruturante das contratações, estabelecendo o dever de a alta administração responsabilizar-se pela institucionalização da gestão de riscos e controles internos, de promover a gestão por competências, bem como designar agentes públicos para o desempenho das funções essenciais à sua execução da lei4. Vejamos de forma expressa os dispositivos, quais sejam o art. 11, parágrafo único e o art. 169, inciso I:

Art. 11. O processo licitatório tem por objetivos:

I - assegurar a seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida do objeto;

II - assegurar tratamento isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição;

III - evitar contratações com sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis e superfaturamento na execução dos contratos;

IV - incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável.

Parágrafo único. A alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das contratações e deve implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos estabelecidos no caput deste artigo, promover um ambiente íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações.

[...]

Art. 169. As contratações públicas deverão submeter-se a práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos e de controle preventivo, inclusive mediante adoção de recursos de tecnologia da informação, e, além de estar subordinadas ao controle social, sujeitar-se-ão às seguintes linhas de defesa:

I - primeira linha de defesa, integrada por servidores e empregados públicos, agentes de licitação e autoridades que atuam na estrutura de governança do órgão ou entidade;

II - segunda linha de defesa, integrada pelas unidades de assessoramento jurídico e de controle interno do próprio órgão ou entidade;

III - terceira linha de defesa, integrada pelo órgão central de controle interno da Administração e pelo tribunal de contas.

Pela inteligência dos dispositivos citados acima, resta claro que a alta administração do órgão é responsável pela governança das contratações, devendo implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, promovendo um ambiente íntegro e confiável, assegurando o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações.

Isto é, a governança é responsabilidade da alta administração do órgão, podendo o gestor ser responsabilizado por não ter capacitado a equipe e essa ausência de capacitação ter gerado dano à Administração na condução dos processos licitatórios.

Além do que, a Lei evidencia que as contratações públicas deverão submeter-se a práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos e de controle preventivo, inclusive mediante adoção de recursos de tecnologia da informação e, além de estar subordinadas ao controle social, se sujeitarão ao controle realizado por servidores e empregados públicos, agentes de licitação e autoridades que atuam na estrutura de governança do órgão ou entidade.

Processa-se que, para a consecução da boa governança, o legislador se preocupou também em elencar diversos mecanismos nas diversas fases do trâmite licitatório e contratual.

Isto porque, no novo diploma legislativo, na fase de planejamento/interna/preparatória, com a elaboração dos estudos técnicos preliminares, do mapa de riscos, do termo de referência, etc.; na fase externa/seleção do fornecedor, com a utilização correta dos critérios estabelecidos para uma aquisição mais vantajosa; e na fase de execução e gestão contratual, onde os gestores e fiscais de contratos atuam de modo a garantir a boa execução do contrato, são postos à disposição do Gestor Público mecanismos para implementação e manutenção da governança das contratações públicas.

Aperfeiçoando a aplicação da norma, três meses após a publicação da Lei nº 14.133/2021, a Secretaria de Gestão da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia logrou em melhor orientar os gestores acerca da governança através da Portaria SEGES/ME nº 8.678/2021.

Por óbvio, tais mecanismos são complementares, ou até instrumentos de materialização dos princípios elencados no art. 5º do novel diploma, dentre os quais destacam-se o princípio do planejamento com a necessidade da elaboração de plano de contratações anual; e da segregação de funções, que, além de inibir condutas tendenciosas e conflito de interesses, conduz à especialização com sensíveis ganhos de eficiência e de produtividade no desempenho de rotinas relacionadas à execução das despesas públicas.

Diante de todo exposto, verifica-se que a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021, expressou de forma clara uma preocupação com a implantação da governança nas contratações públicas, no intuito de que o Gestor Público, além de prevenir-se de eventual responsabilização, possa contribuir para uma Administração Pública mais íntegra, inspirando mais confiança na sociedade e sendo capaz de assegurar a boa execução das contratações públicas.


Notas

  1. Governança organizacional | Portal TCU

  2. ALENCAR, Leandro Zannoni Apolinário de. O novo direito administrativo e governança pública: Responsabilidade, metas e diálogo aplicados à Administração Pública do Brasil. Belo Horizonte: Fórum, 2018.

  3. MOTA, Mirlane de Queiroz O compliance como instrumento de políticas públicas de integridade e de combate à corrupção na administração direta. Salvador, 2020.

  4. CARDOSO, Lindineide Oliveira; ALVES, Paulo Ribeiro - A nova Lei de Licitações e a inexorável chegada da governança das contrataçoes / Lindineide Oliveira Cardoso, Paulo Ribeiro Alves – Salvador, BA; Brasíllia, DF: Editora Mente Aberta; Rede Governança Brasil, 17 de setembro de 2021.

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Sobre o autor
Jamil Pereira de Santana

Mestre em Direito, Governança e Políticas Públicas pela UNIFACS - Universidade Salvador | Laureate International Universities. Pós-graduado em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário pelo Centro Universitário Estácio. Pós-graduado em Licitações e Contratos Administrativos pela Universidade Pitágoras Unopar Anhanguera. Atualmente, pós-graduando em Direito Societário e Governança Corporativa pela Legale Educacional. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio da Bahia. 1º Tenente R2 do Exército Brasileiro. Membro da Comissão Nacional de Direito Militar da Associação Brasileira de Advogados (ABA). Membro da Comissão Especial de Apoio aos Professores da OAB/BA. Professor Orientador do Grupo de Pesquisa em Direito Militar da ASPRA/BA. Membro do Conselho Editorial da Revista Direitos Humanos Fundamentais e da Editora Mente Aberta. Advogado contratado das Obras Sociais Irmã Dulce, com atuação em Direito Administrativo e Militar.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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