Instrumentos coletivos do trabalho e a diferença de tratamento entre filiados e não filiados.

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RESUMO

O leitor quando ter acesso ao presente artigo, compreenderá melhor sobre a legalidade ou não acerca da extensão dos direitos previstos nos instrumentos normativos entre filiado(s) ou não na entidade sindical que representa a categoria profissional, ou seja, os empregados, agentes ou trabalhadores autônomos ou profissionais liberais conforme art. 511 da CLT.

PALAVRA-CHAVE: Artigo Jurídico. Instrumentos Coletivos. Legalidade

INTRODUÇÃO

Após a reforma trabalhista que ocorrera em 2017 com o advento da lei 13.467, muitas mudanças ocorreram na esfera sindical, e, o objetivo do presente artigo é exatamente ser ferramenta para compreender melhor acerca da aplicabilidade ou não das cláusulas constantes nas convenções coletivas, principalmente no que tange a diferença de tratamento nestes instrumentos entre os filiados e não da entidade sindical da categoria profissional e econômica.

Inicialmente será abordado de forma suscinta a estrutura da entidade sindical brasileira juntamente com fatos históricos. A seguir aspectos do enquadramento sindical da categoria profissional. E, por fim, será exposto sobre os aspectos formais e materiais para a construção das convenções ou acordos coletivos, e, neste momento apresentarei algumas situações das quais demonstram a diferença dos direitos que são contemplados aos filiados e não filiados, sendo exatamente neste ponto que é importante a reflexão do leitor.

É de extrema importância o estudo sobre a criação de legítimos instrumentos coletivos, e a jurisprudência atual no tocante ao tema proposto.

BREVES COMENTÁRIOS ACERCA DO PROPÓSITO PARA O SURGIMENTO DA ENTIDADE SINDICAL.

Ao estudar os motivos que ensejaram a criação das entidades sindicais, em suma, foi exatamente a ideia de juntar maior número de pessoas, que estavam na condição de empregados, para que pudessem obter melhores condições de trabalho, considerando que em meados de 1879 – 1891 trabalhar estava associado à privação de liberdade.

As condições de trabalho eram tão árduas que “uma série considerável de motivações para o surgimento e atuação de organizações do tipo sindical. Elas se enquadraram no rol das instituições novas que vieram com a República e contribuíram para a modificação do panorama social da época” Rodrigues, 1968 p. 29 apud SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva p.131 e 514. E todas as conquistas de direito estendiam para todos empregados que estavam laborando na determinada empresa(s), não havia exclusão

A primeira lei de sindicalização brasileira que contemplava o trabalho urbano foi o decreto n. 1.637 de 05 de janeiro de 1907, já definia a extensão dos direitos alcançados pela categoria profissional para todos aqueles que enquadravam na categoria, vejamos o art. 8º do citado decreto:

Art. 8º Os syndicatos que se constituirem com o espirito de harmonia entre patrões e operarios, como sejam os ligados por conselhos permanentes de conciliação e arbitragem, destinados a dirimir as divergencias e contestações entre o capital e o trabalho, serão considerados como representantes legaes da classe integral dos homens do trabalho e, como taes, poderão ser consultados em todos os assumptos da profissão. https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto-1637-5-janeiro-1907-582195-publicacaooriginal-104950-pl.html

A constituição federal de 1934 no art. 120, por sua vez, foi a primeira a reconhecer sindicato ou associações profissionais. E na constituição de 1937 há controle exacerbado por parte do Estado em relação a atuação da entidade sindical(art. 61).

Após as constituições de 1946 e 1967 no art. 159 ambas garantiram a liberdade em relação à associação profissional ou sindical.

E por fim a Constituição Federal de 1988, prevê no art. 8º a liberdade sindical, dentre outras garantias.

DO ENQUADRAMENTO SINDICAL

O enquadramento sindical no Brasil tornou-se obrigatório na Constituição Federal de 1988, é uma exigência legal que obriga os trabalhadores a enquadrarem no sindicato de sua categoria profissional ou econômica. Isso permite que os trabalhadores tenham uma representação efetiva de seus interesses econômicos e sociais, e que possam negociar melhores salários, condições de trabalho e benefícios com os empregadores.

E muitos não tem o conhecimento como enquadrar corretamente os empregados nas entidades sindicais, considerando número expressivo de entidades sindicais existentes no Brasil, dentre outros fatores.

Desta forma, considerando o enquadramento sindical econômico é imprescindível checar a atividade preponderante do empregador, e, também é necessário observar se há alguma categoria diferenciada, e, logo em seguida observar junto ao site do Ministério do Trabalho e Emprego a situação cadastral da entidade sindical da qual fará o enquadramento sindical.

O que observa, muitas entidades sindicais tem seus cadastros sindicais irregulares, e, às vezes estão ausentes deste cadastro, sendo obrigatório o registro sindical, tudo conforme previsto art. 8º, I da Constituição Federal “a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical” e art. 558 parágrafo 1º da CLT prevê o órgão responsável para realizar o referido cadastro, “São obrigadas ao registro todas as associações profissionais constituídas por atividades ou profissões idênticas, similares ou conexas, de acordo com o art. 511 e na conformidade do Quadro de Atividades e Profissões a que alude o Capítulo II deste Título. As associações profissionais registradas nos termos deste artigo poderão representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias, os interesses individuais dos associados relativos à sua atividade ou profissão, sendo-lhes também extensivas as prerrogativas contidas na alínea "d" e no parágrafo único do art. 513. § 1º O registro a que se refere o presente artigo competirá às Delegacias Regionais do Ministério do Trabalho e Previdência Social ou às repartições autorizadas em virtude da lei.”

DA FILIAÇÃO OU ASSOCIAÇÃO OBRIGATÓRIA

A filiação ou associação sindical não é obrigatória. Essa prática é proibida no Brasil conforme previsto na Constituição de 1988, que assegurou a liberdade de associação sindical como um direito fundamental. Ou seja, é proibido obrigar um trabalhador a se filiar a um sindicato. A decisão de se filiar ou não deve ser livre e voluntária, tudo em corolário ao art. 8º, V da Constituição Federal: Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;

Todavia consigna várias práticas das entidades sindicais ou/e empregadores que de forma explícita ou implícita viola a disposição constitucional mencionada anteriormente, através de “cláusulas de sindicalização forçada” conforme definição por Mauricio Godinho Delgado, em sua obra Direito Coletivo do Trabalho p. 62, e transcrevemos a seguir:

“Há sistemáticas de incentivos à sindicalização (apelidadas de cláusulas de segurança sindical ou de sindicalização forçada) que são controvertidas no que tange à sua compatibilidade com o princípio da liberdade sindical.

Argumenta-se que tais cláusulas, favorecendo em demasia a dimensão coletiva da liberdade sindical, acabam por prejudicar, inapelavelmente, a dimensão individual desse tipo de liberdade.

Trata-se, por exemplo, das cláusulas negociais coletivas denominadas closed shop, union shop, preferencial shop e, por fim, maintenance of membership.”

DAS CONVENÇÕES OU ACORDOS COLETIVOS – DA ISONOMIA E DA LIBERDADE SINDICAL

Ao redigir convenção coletiva ou acordo coletivo é necessário observar se nas cláusulas há aplicação dos princípios da isonomia previsto na constituição federal, ou seja, todos os cidadãos serão tratados de forma igualitária, observando suas desigualdades, e, princípio da liberdade sindical.

Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, na obra Relações Coletivas de Trabalho p. 94 fez análise do estudo de Arnaldo Sussekind acerca da liberdade sindical e transcrevo para compreendermos melhor sobre esse princípio assegurado na constituição federal:

“No Brasil, parte de nossos juristas do trabalho tende a estudar a liberdade sindical através do debate entre as díades coletivo/ individual e unicidade/ pluralidade sindical. Para Arnaldo Sussekind (2004,p.364), a liberdade sindical deve ser vista por um triplo aspecto: a) coletiva; b) individual e c) autonomia sindical. Como liberdade sindical coletiva, deduz-se o direito de fundação das organizações; e no aspecto individual, salienta-se o binômio positivo/ negativo, em decorrência do enunciado do inciso V do art. 8º da Constituição. Ou seja, a liberdade sindical individual positiva se traduziria na possibilidade de filiação a uma entidade sindical de escolha do interessado, enquanto a negativa na não-obrigatoriedade de participação no sindicato.”

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Desde a reforma trabalhista que ocorreu em 13/11/2017 através da lei 13.467, tornando facultativo o recolhimento do imposto sindical, entidades sindicais tentaram por diversas formas manter o desconto, até que em 29/06/2018 através do acórdão proferido no E. Supremo Tribunal Federal através da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade n. 5.794 decidiram que é constitucional ser facultativo a contribuição sindical prevista no art. 579 da CLT “O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação” , conforme transcrição parcial do v. acórdão:

(...)

4. A Lei nº 13.467/2017 emprega critério homogêneo e igualitário ao exigir prévia e expressa anuência de todo e qualquer trabalhador para o desconto da contribuição sindical, ao mesmo tempo em que suprime a natureza tributária da contribuição, seja em relação aos sindicalizados, seja quanto aos demais, motivos pelos quais não há qualquer violação ao princípio da isonomia tributária (art. 150, II, da Constituição), até porque não há que se invocar uma limitação ao poder de tributar para prejudicar o contribuinte, expandindo o alcance do tributo, como suporte à pretensão de que os empregados não-sindicalizados sejam obrigados a pagar a contribuição sindical.

(...)

11. A Constituição consagra como direitos fundamentais as liberdades de associação, sindicalização e de expressão, consoante o disposto nos artigos 5º, incisos IV e XVII, e 8º, caput, tendo o legislador democrático decidido que a contribuição sindical, criada no período autoritário do estado novo, tornava nula a liberdade de associar-se a sindicatos.

(...)

15. Ações Diretas de Inconstitucionalidade julgadas improcedentes e Ação Declaratória de Constitucionalidade julgada procedente para assentar a compatibilidade da Lei n.º 13.467/2017 com a Carta Magna. https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15339959032&ext=.pdf ADIN 5.794

E desde então, as entidades sindicais, com intuito de captar contribuições, violando o princípio da liberdade sindical e da isonomia, cada vez mais notamos que as cláusulas das convenções ou acordos coletivos tratam os filiados e não filiados de forma diferenciada, sendo esta conduta totalmente desprezível, tanto que observamos a orientação jurisprudencial OJ-SDC-20 do E. Tribunal Superior do Trabalho que entende ser nula a cláusula normativa que prevê a preferência para aqueles empregados que são sindicalizados:

“EMPREGADOS SINDICALIZADOS. ADMISSÃO PRE-FERENCIAL. CONDIÇÃO VIOLADORA DO ART. 8º, V, DA CF/88 (inserido dispositivo) - DEJT divulgado em 16, 17 e 18.11.2010

Viola o art. 8º, V, da CF/1988 cláusula de instrumento normativo que estabelece a preferência, na contratação de mão de obra, do trabalhador sindicalizado sobre os demais.” https://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/LivroInternet+%282%29.pdf/8d181062-503a-54c5-97fa-b66208a7e39b?t=1667941194801

E junto neste ato jurisprudência que reconheceu a nulidade de cláusula do acordo coletivo, considerando a diferença de tratamento entre associado e não associado:

“Verifico que o empregado associado à CABESP, para permanecer nesta condição após o desligamento da reclamada, deve optar no momento de formalização do “Termo de Opção de Licença Remunerada Pré- Aposentadoria” pela rescisão do contrato de emprego por sua iniciativa, percebendo os direitos rescisórios desta modalidade de rescisão contratual.

Já o empregado não associado à CABESP, ao requerer a licença remunerada pré-aposentadoria, também opta pelo pedido de desligamento do emprego por sua iniciativa, porém a rescisão do contrato de trabalho é formalizada como se sem justa causa fosse, com percebimento de direitos relativos a esta modalidade de rescisão contratual.

A norma coletiva estabelece tratamento diferenciado aos empregados, sem quaisquer justificativas e sem que eles sejam desiguais, porque a mera associação à entidade que mantém plano de saúde, CABESP, não os qualifica de maneira diversa na atividade profissional propriamente dita

De tal sorte, houve ofensa ao princípio da isonomia (artigo 5º, inciso I, da CF), uma vez que o empregado não associado tem seu contrato rescindido sem justa causa, enquanto o que se mantém associado à CABESP tem seu contrato rescindido por sua iniciativa.” Processo n. 0000640-43-2012-515-0065

CONCLUSÃO

Logo, conclui a importância de analisar cuidadosamente as cláusulas existentes ou que serão incluídas nos acordos ou convenções coletivas, conforme princípios da liberdade e da isonomia consagrados na constituição federal, e, ocorrendo a violação haverá a nulidade das cláusulas.

E por fim, resta claro que, o tratamento diferenciado entre empregados deve ser motivado, e, repito, não contrarie os princípios da liberdade sindical e da isonomia, exemplificando, estipular adicional para aqueles empregados(as) que laboram em jornada de turno ininterrupto de revezamento, veja, em razão da alternância constante da jornada de trabalho, ora diurno ora noturno, é manifesto que comprometerá a saúde dessas pessoas, assim, para esses empregados(as) poderá prever a contraprestação seja em pecúnia ou in natura.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DELGADO, Mauricio Godinho, Direito Coletivo do Trabalho, 5º edição, São Paulo, Editora LTr, 2017

SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, 1º edição, São Paulo, Editora LTr, 2008

NASCIMENTO, Amauri Mascaro, 5º ed., São Paulo, Editora LTr, 2008

Brasil.https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15339959032&ext=.pdf Acesso em 02/02/2023

Brasil.https://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/LivroInternet+%282%29.pdf/8d181062-503a-54c5-97fa-b66208a7e39b?t=1667941194801 Acesso em 19/03/2023

Brasil. www.trt15.jus.br Acesso em 29/03/2023

https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto-1637-5-janeiro-1907-582195-publicacaooriginal-104950-pl.html Acesso em 15/02/2023

Brasil. Decreto-lei 5.452 de 1º de maio de 1943 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 10/02/2023

Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em 10/02/2023

Brasil. Decreto n. 1.637 de 05 de janeiro de 1907. Disponível em https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto-1637-5-janeiro-1907-582195-publicacaooriginal-104950-pl.html Acesso em 10/02/2023

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Sobre a autora
Graziela Pontes de Siqueira Flavio

Professora universitária há dez anos, também ministra aulas em cursos preparatórios para exame de ordem. Pós graduada em direito do trabalho e processual do trabalho - Escola Paulista de Direito/SP. Foi membro do comitê de direito sindical junto à OAB/SP. É sócia-proprietária do escritório de advocacia localizado em Jundiaí/SP atua em diversas áreas com ênfase em direito coletivo do trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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