Contratos inteligentes (smart contracts)

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Adilson Marques Furlani
Adilson Marques Furlani
Gabriel Machado Santangelo
Leovan de Oliveira Lourenço
17/04/2023 às 18:11

Resumo:


  • Contratos inteligentes (Smart Contracts) são acordos automatizados executados em computadores, implementados em linguagens de programação e registrados em blockchain.

  • Eles oferecem vantagens como transparência total, ausência de mal-entendidos na comunicação e eficiência na execução, mas também apresentam desafios como a necessidade de dados confiáveis e riscos de erros de codificação.

  • A natureza jurídica dos Smart Contracts é debatida, mas eles seguem regras semelhantes aos contratos tradicionais e não são considerados ilegais, apesar de suas peculiaridades como imutabilidade e condições autoexecutáveis.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

NATUREZA JURÍDICA 

Como já se sabe, um contrato inteligente é uma operação que é executada puramente em um ambiente virtual sem o envolvimento direto de uma pessoa física, no que tange à sua execução, mas por computadores com inteligência artificial, chamados de robôs no mercado. Embora o contrato em si seja basicamente não intelectual, essa "presença eletrônica" o conduz da negociação à conclusão.

No que concerne à “contratos eletrônicos”, há um consenso de classificação de modo que se possa abrangê-los na sua individualidade: (i) interpessoais; (ii) interativos; e (iii) inter sistêmicos.

Os contratos interpessoais são aqueles em que pessoas físicas e/ou jurídicas interagem entre si e expressam suas intenções por meio eletrônico (e-mail, aplicativos de mensagens, "chat", etc.).

Os contratos interativos correspondem à interação humana com o sistema e seguem convenções previamente estabelecidas pelo fornecedor (exemplo: Compra e venda pela plataforma Mercado Livre).

Por sua vez, nos contratos inter sistêmicos (mais próximos aos Smart Contracts), é um sistema que interage com outro sistema (um blockchain) e discute a natureza jurídica de suas operações, se houver. Isto porque é altamente controverso reconhecer e atribuir a vontade a um desses sistemas, que são autônomos e livremente expressos na forma típica das pessoas jurídicas. Explicações a respeito poderiam fundar-se na gestão do negócios ou do mandato.

Uma análise do direito dos negócios jurídicos aplicado aos contratos tradicionais é fundamental para a compreensão deste tema. Considerando suas características jurídicas, é delineado por classificação de natureza jurídica. Derivando dos ensinamentos os elementos que compõem um negócio jurídico se estabeleceu no plano do ser, da validade e da efetividade cercado pelas implicações das obrigações e a possível existência de limitações e, por fim, comparando-os com aspectos comuns de contratos inteligentes na tecnologia blockchain.

Ricardo Negrão (2014, p. 223 – apud AGUIAR)3, defende que o Código Civil de 2002 distingue entre as características da relação entre a solidariedade social, incluindo a personalidade, e as obrigações de influência existencial, e a dignidade da pessoa humana e das partes e terceiro direcionado por princípios fundamentais para a relação contratual, que são a boa-fé e probidade, o equilíbrio econômico e a função social.

O código Civil de 2002 impôs aos contratos a obediência a duas cláusulas gerais, relativas aos princípios da boa-fé e probidade (art.422) e ao cumprimento da função social (Art. 421, razão pela qual entendemos que essas características são relevantes e os distinguem de outras ações humanas, devendo ser incluídas no conceito.

E (NEGRÃO, 2014, p. 224 – apud AGUIAR)3, conceitua:

Contrato é, pois, o negócio jurídico em que duas ou mais partes contratantes concorrem para criar, modificar ou extinguir relações jurídica de natureza patrimonial, sujeitando-se durante a conclusão e execução, aos princípios da boa-fé objetiva e da função social.

Ele enfatiza a natureza jurídica, a manifestação de vontade e a observância das regras gerais nas relações jurídicas, disposições do Código Civil de 2002. Considera-se, portanto, que o contrato forma um vínculo jurídico entre duas ou mais partes constituído por consenso de direito destinado a proteger o princípio do equilíbrio social e proteger os interesses entre as partes contratantes. Sobre a vontade expressa, Cleyson de Moraes Mello (2017, p. 119 – apud AGUIAR)3 descreve:

A aceitação é a manifestação de vontade do oblato que representa a sua anuência aos termos da proposta apresentada pelo policitante. A partir daí formado está o contrato, apto a produzir efeitos jurídicos. A aceitação pode ocorrer através da manifestação de vontade expressa, tácita ou pelo silêncio. A aceitação expressa é aquela realizada através de palavras ou sinais que exprimam a aceitação do contrato. A aceitação tácita ocorre a partir de atos do oblato que representam a execução do contrato. 0 silêncios é a inércia do sujeito que importa anuência e pode dar azo aos efeitos de uma declaração de vontade. O artigo 111 do CCB determina que “o silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa”.

Acontece que os contratos inteligentes consistem em linhas de código algorítmico que podem definir regras, obrigações e efeitos, penalidades e benefícios, assim como os contratos tradicionais. Mas ao contrário disso, é viável por si só, então há uma diferença fundamental nesse sentido. Os scripts são incorporados aos contratos inteligentes como declarações de intenção. Toda a condição é delimitada, segura, precisa e não interpretável. Portanto, o único objetivo da automação é a execução dos termos acordados pelas partes. Portanto, a declaração de intenção é o tipo de acordo exigido em contratos inteligentes. Vinculado, a declaração de intenção está na rede blockchain aprovada pelo consenso da rede. Confirma a vontade das partes, estabelecida por livre consentimento. Em um ambiente digital, quando se trata de contratos inteligentes, a natureza autoexecutável dos contratos é inegável, pois existem em um ambiente inerte contra intrusão de terceiros (via criptografia). Uma vez que seu lançamento tenha sido verificado pelo consenso da rede, sua conformidade não pode ser alterada, a menos que seja fornecida por uma linha de código. Além disso, se as partes desejarem alterar os termos de seu acordo, terão que assinar um novo contrato, pois é impossível interromper praticamente o suposto efeito do algoritmo do contrato inteligente.

Em relação ao efeito da nulidade absoluta, Flavio Tartuce (2014 – apud AGUIAR) destaca que a pretensão de nulidade, por sua natureza principalmente declarativa, não deve ser limitada e não atinge limite ou prazo, como estabelecido no artigo 169 do CC/02. Em relação a isso, é importante entender que as entradas nos scripts de contratos inteligentes formados no blockchain devem representar os requisitos legais estabelecidos no ordenamento jurídico brasileiro sob pena de nulidade absoluta.

Os Contratos inteligentes são baseados na tecnologia blockchain, portanto, abrangem todo o conceito de segurança, transparência, rastreabilidade, velocidade e impessoalidade. Suas características incluem exclusão de intermediários e terceiros, imutabilidade e autoexecução com as qualidades necessárias. Deve-se levar em conta que a autoexecução no sentido de "pacta sunt servanda" decorre da aceitação contratual e representa uma proibição de retroatividade desde o início. Uma resolução de cláusula não retroativa deve ser acordada no novo contrato para eliminar quaisquer arrependimentos, correções ou novos acordos entre as partes. Portanto, a legalidade dos contratos inteligentes construídos em blockchain é entendida através da teoria contratual no direito brasileiro. Observe que a validade desses contratos inteligentes está sujeita aos requisitos de validade impostos pela lei atual. O cumprimento das disposições legais e dos princípios gerais do direito contratual deve ser observado na linha do algoritmo. Cumpridas as disposições estatutárias, não há que falar em nulidade ou contestabilidade.


CONTRATOS INTELIGENTES - Instrumentos Legais Ou Pré-Legais? 

Definição de "Pré-legal"

O Direito Grego conceitua “pré-legal” como sendo: Onde não há critérios estabelecidos sobre os litígios.

No entanto, o professor Pedro Pais de Vasconcelos (apud SILVA)4, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, define os chamados objetos pré-legais como sendo as pessoas, bens e ações, sem os quais o próprio direito não existiria. É baseado neste fundamento que segue a doutrina atual.

Definição de “Legal”

O adjetivo "legal" vem do latim "legalis" e se refere ao direito (do latim lex). Corresponde ao que é regulado e prescrito pelo legislador e faz parte do ordenamento jurídico. O Jurídico-Jurídico pode, em princípio, expressar a ideia de plenasismo, que é desprezível mesmo quando combinado com palavras. Verificados em separados, jurídico é adjetivo que sempre vem qualificar um ato, fato, ordem, a personalidade ou pessoa etc; já legal é o que decorre de, conforme ou relativo à lei.

Contratos inteligentes mostram que o software pode resolver o problema de fazer cumprir as garantias contratuais melhor do que os sistemas de justiça tradicionais e os mecanismos de resolução de disputas existentes. As duas formas de contrato escrito e contrato "algorítmico" coexistirão. Isso porque você deve sempre usar uma linguagem “compreensível” para inserir elementos “pré-legais” para que as pessoas possam entender as obrigações a serem cumpridas através de um algoritmo de contrato (legal). Desta forma, os contratos inteligentes, assim como os contratos tradicionais, são entendidos como instrumentos jurídicos (portanto “legais”) oriundos de objetos pré-legais.

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CONTRATOS INTELIGENTES - Despersonalização do Direito Civil? 

A ideia de contratos inteligentes traz uma grande mudança nos pressupostos da teoria contratual tradicional e levanta questões como: São mesmo contratos? E se houver um erro? O impacto do contrato integral na governança e na teoria é analisado no texto, seu impacto no direito contratual clássico e sob uma perspectiva neo constitucional. Sob este último ponto de vista, tais contratos são vistos como um novo paradigma para a adaptação da vontade, influenciando a noção de despersonalização do direito civil em sua análise pela teoria econômica do direito. Embora os contratos inteligentes tenham grande potencial para romper com a teoria contratual tradicional, podemos concluir que eles podem ser considerados contratos à luz do ordenamento jurídico brasileiro.

Em razão da abertura à moralidade, ou algum grau de aproximação à natureza inerente dos direitos, é importante que o neoconstitucionalismo normalmente distinga as normas jurídicas e as enquadre em regras e princípios. A tradição do direito consuetudinário norte-americano também às vezes faz distinção entre normas jurídicas em termos de estrutura e conteúdo. Distinguir entre regras e normas e formular uma análise econômica mais interessante para adotar cada tipo de norma. Posner5 resume essa visão realizando uma análise de trade-off entre as opções nos seguintes termos:

Uma regra [rule] é clara em virtude de ser exata. Mas sua exatidão a torna mal adaptada a situações imprevistas, criando pressão para reconhecer exceções, as quais muitas vezes reduzem a clareza. Um padrão [standard] é flexível e, portanto, adaptável a uma variedade de contextos, mas o preço da flexibilidade é a imprecisão. (POSNER, 2004, p. 1587)5

Assim, não é possível distinguir fortemente entre os tipos normativos e cabe ao intérprete averiguar a ductilidade entre eles tanto no nível estrutural quanto no funcional, e que as propriedades das regras possam ser encontradas. Em princípio, o inverso também é verdadeiro (VALE, 2009)6. Se a "zona da certeza" não representa um grande desafio interpretativo para os juristas, ele está na "zona da penumbra", que encapsula as normas como regras e princípios em determinadas categorias e as classifica quando inclui tentativas de estabelecer, à priori, método de resolução de conflitos. Aponta André Rufino do Vale6:

A zona de certeza, portanto, pode proporcionar a antecipação do tipo de colisão e do modo de aplicação de uma norma. Na zona de penumbra, no entanto, a indeterminação quanto ao grau de especificidade ou generalidade, precisão ou vaguidade da norma fará com que o tipo de colisão e o modo de aplicação, isto é, se como regra ou como princípio, apenas sejam revelados após o confronto com outras normas e/ou com os fatos determinantes do caso concreto. (VALE, 2009)6

Essa dificuldade em apreender a separação a priori ou rígida em termos de estrutura e função decorre não apenas da dupla caracterização do comando como dignidade humana, mas também dos valores morais permeados por todo o sistema. Tanto regras quanto princípios.

É fácil entender que o conceito de dispositivos legais e doutrinas deriva principalmente de termos não jurídicos. São textos com uma amplitude de significado surpreendente que precisa ser condensada em um caso particular, principalmente por meio de decisões judiciais. No entanto, a estrutura característica dos contratos inteligentes não permite tal arbitragem. É importante definir as condições e consequências específicas de cada ação de um sujeito e incorporar as implicações para ocorrências específicas no evento blockchain.

O efeito prático da adoção de tal tecnologia perpassa necessariamente por um novo fortalecimento do "pacta sunt servanda", uma vez que recaem sobre os contratantes a definição exata dos termos e condições para a efetivação, execução e implementação do negócio jurídico. Para tanto, é imprescindível a utilização de comandos claros, fechados, inteligíveis e logicamente exprimíveis, geralmente utilizando o tradicional esquema se → então (if...else), com o manejo de estruturas lógicas causais.

Nick Szabo7 antecipou essa limitação desde 1997, quando concebeu o chamado 'Protocolo de Deus', matematicamente confiável, no qual todos os participantes forneciam entradas criptografadas para um 'computador virtual'. Contudo, como os algoritmos ainda não podem fazer julgamentos de valor, a evolução tecnológica aponta para um futuro com a ascensão da inteligência artificial, mas por enquanto, observa Szabo, tais protocolos “não serão capazes de substituir terceiros humanos confiáveis, que forneçam informações ou conhecimentos que não podem ser obtidos por um computador” (SZABO, 1997)7.

Portanto, a impossibilidade de utilização de “princípios” e termos jurídicos (ao menos não predeterminando seu conteúdo), bem como a inviolabilidade de tais ações ao controle de constitucionalidade, tal como as conhecemos hoje, estão cobertas sob o véu da imunidade das regras previstas no artigo 5º, XXXV, para a qual “a lei não excluirá, da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito”.

Com isso, ao passo em que cada vez mais contratados e contratantes fizerem uso de Smart Contracts, aumenta concomitantemente a chance de ocorrer uma despersonalização do direito civil no que tange à mediação da execução ou infração de tais contratos, recaindo o vislumbre de tais possibilidades aos contratados e contratantes por delinearem as condições e requisitos do contrato autonomo. O fato é que, já adotados por diversas instituições, empresas privadas e até países, os smart contracts são uma realidade da qual o operador jurídico não pode se furtar.

Sobre os autores
Adilson Marques Furlani

Atual estudante de Direito, apaixonado por esta área tão importante para a sociedade.

Gabriel Machado Santangelo

Leovan de Oliveira Lourenço

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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