Resumo: Atualmente a sociedade, de forma geral, está cada vez mais conectada, com isso, as notícias se espalham em um ritmo cada vez mais acelerado, contudo, com essa facilidade de comunicação, surge o problema das notícias falsas, popularmente conhecidas como Fake News, que pode resultar em prejuízos irreparáveis, seja para o indivíduo, seja para uma coletividade, ou até mesmo para a sociedade como um todo. Visando combater as Fake News, têm sido apresentados diversos projetos de lei com o intuito de solucionar o problema, no entanto, uma das principais críticas a esses projetos é o seu conteúdo normativo, de tal forma, que promovem a ofensa ao princípio constitucional da liberdade de expressão, resultando em uma forma de censura a expressão do pensamento individual e aos veículos de comunicação. A presente pesquisa busca analisar os principais aspectos no tocante à liberdade de expressão e imprensa, frente ao fenômeno da pós-verdade, como também, analisar o problema, em busca de elementos que possibilitem ou não a criação de normas neste sentido. Na existência dessa possibilidade busca- se o entendimento de que o ato normativo deve condizer com a ordem constitucional em vigor, de modo que, ao ser aplicada ao caso concreto, a norma não venha a suprimir o princípio constitucional da liberdade de expressão do pensamento, além de não declarar uma verdade absoluta sobre quaisquer temas em debate que tenham como objetivo a defesa de um interesse particular. Deste modo, a pesquisa se utiliza da metodologia com abordagem hipotético- dedutiva, com procedimento monográfico, através de documentação indireta, utilizando-se doutrina, artigos científicos e jurisprudência. Os resultados apontam para a possibilidade da tipificação desta prática, sem que seja suprimido o direito à liberdade de expressão. No entanto, necessita-se ainda muita discussão sobre o tema, uma vez que não existe um consenso sobre a melhor forma de se enfrentar este problema. Por fim, busca-se na presente pesquisa apontar a melhor forma de atuação do Direito na regulação do atual problema.
Palavras-chave: Liberdade de expressão, notícias falsas, legislação, modernização digital, fake News, desinformação, pós-verdade.
Sumário: Introdução. 1. Origem e o desenvolvimento histórico do conceito de estado de direito. 2. Os direitos fundamentais e suas limitações. 3. Liberdades constitucionais. 3.1. Liberdade de expressão do pensamento. 4. Direito e as novas tecnologias de comunicação e informação. 4.1. Origem e conceito do fenômeno fake news. 4.2. Desafios do direito no combate às fake news. 4.3. Imposição da verdade na defesa de interesses. 4.4. Projetos legislativos e os perigos à liberdade de expressão. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
É impossível saber, mas, segundo a ciência evolucionista, foi provavelmente quando o homem desenvolveu o neocórtex, uma parte do cérebro responsável pelas atividades mais sofisticadas, como a linguagem e a consciência. Segundo estudos recentes, a mentira é um comportamento aprendido na infância e repetido com o intuito de escapar de uma punição ou de obter alguma recompensa.
Por outro lado, no contexto religioso, um dos versículos mais lembrados sobre a mentira na Bíblia é aquele que diz que o Diabo é o pai da mentira. “Ele jamais se firmou na verdade, porque não há qualquer verdade nele. Ele profere mentiras porque, como mentiroso, isso lhe é próprio” (João 8:44). Então isso significa que Satanás foi o primeiro mentiroso. Foi através de uma mentira dele que o primeiro casal foi seduzido a transgredir a Lei de Deus. Sim, o primeiro caso de mentira registrado na Bíblia teve justamente Satanás como seu protagonista. Ele disse a Eva que se ela e Adão desobedecessem a Deus, comendo do fruto da árvore do conhecimento, eles se tornariam como Deus e não sofreriam nenhuma punição (Gênesis 3).
Diante do exposto, observamos duas visões diferentes quanto à origem da mentira, das quais este autor as aproveita para justificar a realização e a relevância da presente pesquisa e consequentemente apresentar argumentos e justificativas para defesa e garantia dos direitos que aqui serão discutidos.
Sem o intuito de defender um ou outro ponto de vista, observa-se que existem, não só esses, mas variados relatos quanto à origem da mentira. E agora? Qual deles é o verdadeiro? Se há um verdadeiro, os outros são falsos? Quem deve decidir a verdade? A depender de sua cultura, um ou outro indivíduo irá defender um ou outro relato. Enquanto os teóricos evolucionistas defenderão que a mentira surgiu quando o homem evoluiu biologicamente e desenvolveu o neocórtex, que lhe deu a capacidade de se comunicar e consequentemente a capacidade de mentir. O religioso irá defender veementemente que a mentira surgiu com o diabo que é o pai da mentira.
Veja-se então uma discussão sem fim, paralelamente, ambos estão convictos que estão defendendo a verdade, enquanto o que outro está dizendo é mentira. Neste diapasão, não cabe nem a um e nem ao outro afirmar o que outro defende é falso, ou que seja intitulado como Fake News, assim, consequentemente, proibir a defesa do argumento contrário, cerceando o direito da liberdade de expressão, e neste caso outro direito fundamental, a liberdade religiosa.
A título introdutório, quanto à origem das Fake News, Irene Patrícia Nohara leciona:
O fenômeno das fake news não é recente. Apesar de situarem seu início na Antiguidade Clássica, quando se desenvolveram a política e a retórica, ainda assim se pode especular que ele acompanhe o ser humano desde o momento em que este começa a se comunicar, podendo, portanto, divulgar fatos verdadeiros ou disseminar deliberadamente notícias que são falsas para obtenção de algum benefício. Até os animais, por incrível que pareça, podem disseminar notícias falsas, ainda que sem a sofisticação humana na comunicação, mas com alguma intenção de se beneficiar. Conforme pesquisa intitulada Beyond words: what animals think and feel, de Carl Safina, verificou-se que vervetes, macacos do leste da África, possuem chamados específicos para alertar a presença de cada tipo de predador, contudo, quando lutam com membros de outros grupos de macacos rivais e começam a perder o combate, eles blefam, gritando: "leopardo!", só para afugentar inimigos. Eles também dão um grito correspondente ao animal "águia", no intuito de liberar arvores frutíferas da competitividade. (NOHARA, 2018, p. 75).
Neste sentido Diogo Rais (2018, p. 9) defende que a mentira parece ser usada como um mecanismo de sobrevivência, deste modo, a mentira está presente em tudo, tanto na humanidade como no mundo animal, como visto anteriormente. Para o bem ou para o mal, ainda que seja um desvio da verdade, ampliando-a ou reduzindo-a, a mentira está em todo lugar. Analisando o exposto até aqui, indaga-se, será que cabe ao Direito regular e punir a mentira?
A velha mentira encontrou novos patamares e significados, com a revolução tecnológica e a democratização da internet. Hoje em dia parece que tudo pode ser chamado de Fake News, mas se algo pode ser tudo, provavelmente não pode ser considerado algo em si mesmo. Em uma sociedade conectada que transita em alta velocidade que absorve e processa um oceano de informações, a desinformação surge como uma espécie de poluição, podendo transformar as relações sociais e, por isso, sua conexão com o Direito.
Diante dessa relação a presente pesquisa busca demonstrar qual a melhor forma que o Direito deve atuar diante do atual problema, defendendo o princípio constitucional da liberdade expressão e pensamento, apontando os riscos de uma possível legislação equivocada que busca tipificar e punir a divulgação daquilo entendido como Fake News. Neste contexto, tanto na esfera civil como na penal, a regulação equivocada deste fenômeno pode ferir direitos que levaram séculos para serem reconhecidos, e em um país como o Brasil, que viveu períodos de recessão, cujo principal direito violado era o da liberdade de expressão e de impressa, de tal modo, que a Lei de Imprensa não foi recepcionada em nosso atual ordenamento constitucional. Neste trabalho será demonstrado que a busca pela regulação das chamadas Fake News merece um debate voltado para a defesa de direitos e garantias fundamentais, diante das mais diversas propostas que buscam normatizar o fenômeno, entende-se que a principal crítica se volta ao fato do que se deve chamar, ou não, de Fake News e quem as deve reconhecer e julgá-las. Teme-se que, de acordo com alguns projetos de lei, qualquer manifestação de pensamento seja intitulada como informação falsa, além disso a quem detém o poder de as declarar e as proibir. Nota-se que na esfera civil existe um viés de responsabilização dos provedores de aplicação de internet, que na opinião deste autor, considera-se um equívoco esta responsabilização, pois, ao responsabilizar a empresa provedora concede-se a ela o dever/poder de filtrar o que deve ou não ser divulgado em sua plataforma, assim, com as devidas ressalvas, caberá a empresa, ao seu livre-arbítrio, decidir o que pode ou não ser divulgado sob a precoce justificativa de que tal conteúdo seja verdadeiro ou não e deste modo ferir o princípio constitucional da liberdade de expressão do pensamento.
Com as devidas considerações, entende-se que o dever/poder de cerceamento de qualquer publicação cabe ao Poder Judiciário, pois este, como Estado, detém a competência diante do devido processo legal declarar o que é ou não prejudicial ao direito de outrem. Por outro lado, observa-se que, tal regulação, agora tanto na esfera penal como na esfera privada, poderá ter desdobramentos antidemocráticos, neste sentido, a partir do momento em que se proíbe uma publicação ou expressão de pensamento, como aquele em que divulga uma notícia falsa, que objeta aferir alguma vantagem, como poderemos garantir que aquele que intitula algo como desinformação, não busca se beneficiar com tal alegação, ou pior, se este detém o poder de proibir, previamente, qualquer publicação que considere, na defesa de seu interesse particular, ser Fake News. Deste modo, poderemos correr o risco de voltar aos tempos arcaicos, quando o mais forte dominava o mais fraco na busca do seu próprio interesse.
Deste Modo, a presente pesquisa tem como objetivo principal a defesa dos direitos fundamentais estabelecidos em nossa Constituição, em especial a liberdade de expressão e pensamento, de tal forma, o trabalho busca apresentar e conceituar o contexto histórico da conquista desses direitos e confrontá-los com os desafios da sociedade atual, diante do fenômeno das Fake News e da pós-verdade. Diante deste campo obscuro e desafiador, este estudo busca defender o atual Estado Democrático de Direito, de modo a apresentar soluções para o atual problema, demonstrando que qualquer cidadão, sem distinção de qualquer natureza, independentemente da sua origem, raça, cor, sexo, idade e religião, tenha a possibilidade de expressar seu pensamento e defender seu ponto de vista referente a qualquer assunto, exercendo de fato os direitos estabelecidos em nosso ordenamento jurídico, sem que venha sofrer qualquer tipo de cerceamento injusto e arbitrário de qualquer pessoa ou grupo de pessoas contrário ideologicamente.
Para tanto, a pesquisa tem como objetivos específicos, individualizar e conceituar o fenômeno das Fake News, a partir daí apresentar, juridicamente, quem seja competente constitucionalmente julgar o que é de fato a conduta de propagar a desinformação, com o intuito de obter algum benefício, para si ou para outrem, ou objetivando prejudicar algum cidadão ou qualquer ente reconhecido juridicamente como titular de direitos. Deste ponto em diante, este autor irá buscar delimitar os direitos fundamentais, os inserindo na sociedade atual, diante da revolução tecnológica e digital, apresentando limitações, diante do princípio da ponderação, desses direitos tendo como partida a máxima de que nenhum direito é absoluto, aplicando o princípio da proporcionalidade (ponderação de bens), sob o marco teórico da teoria estrutural de Robert Alexy.
1. ORIGEM E O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO CONCEITO DE ESTADO DE DIREITO
Para defender argumentos a favor do direito fundamental da liberdade de expressão, não há nada melhor que demonstrar a origem e o desenvolvimento histórico do conceito de Estado de Direito, consequentemente Estado Democrático de Direito. Deste modo, busca-se relembrar o quão sacrificante foi a luta pela conquista desses direitos, o que a humanidade passou, quanto sangue foi derramado, para que hoje tenhamos reconhecidos os direitos humanos, e o poder de gozar dos direitos fundamentais garantidos constitucionalmente. Por tanto, não podemos admitir de forma alguma a restrição arbitrária desses direitos e neste caso o cerceamento da liberdade de expressão e pensamento.
Neste sentido o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso defende que:
[...] a ideia de direitos humanos era estranha ao pensamento convencional até o final da Idade Média. Há registro de que sequer existia uma palavra que identificasse a ideia de direito, no sentido de direito individual. Documentos historicamente relevantes do período medieval – como a Magna Carta inglesa, de 1215 - consubstanciavam a outorga de concessões reais, como ato unilateral do monarca, e não propriamente o reconhecimento de direitos. O conceito contemporâneo de direitos humanos começa a se delinear no alvorecer da Idade Moderna, ao final do século XV e início do século XVI – com o Renascimento, o surgimento do Estado moderno, as grandes descobertas, a Reforma Protestante, a Revolução Cientifica – e teve seu impulso decisivo com o Iluminismo, quando já avançado o século XVIII. (BARROSO, 2019, p. 489).
Visto a que grau se encontra, historicamente, o reconhecimento dos direitos fundamentais, é importante apresentar quando se dá o surgimento do termo “Estado de Direito”, por consequência conceituar o seu desenvolvimento histórico e assim demonstrar as vertentes filosóficas que o sustenta.
Deste modo, Friedrich von Hayek nos apresenta quando surge o termo “Estado de Direito”, lecionando que:
A expressão Estado de Direito, foi cunhada na Alemanha: é o Rechtsstaat. Aparece num livro de Welcker, publicado em 1813, no qual se distinguem três tipos de governo: despotismo, teocracia e Rechtsstaat. Foi igualmente na Alemanha que se desenvolveu, nos planos filosófico e teórico, a doutrina do Estado de Direito. Nas pegadas de Kant, Von Mohl e, mais tarde, Stahl lhe deram a feição definitiva. (HAYEK, 1983, p. 239).
No entanto, alguns doutrinadores apontam o surgimento da instituição do Estado de Direito muito antes da época moderna, apresentando seu surgimento na idade antiga. Desta visão compartilha André Copetti:
A instituição do Estado de Direito, inobstante estar ligada conceitualmente ao pensamento germânico dos séculos XVII e XVIII, tem suas raízes em tempo muito anterior a estes. Num lapso temporal de mais ou menos mil anos, observa-se a construção de uma série de ideias que deságuam na concepção única do Estado de Direito. Assim, temos na filosofia grega as ideias de dike (processo), themis (direito) e nomos (lei), na antiguidade, a ideia de uma constituição mista carregava consigo a pretensão de um poder regulado, moderado, em contraposição à tirania ilimitada; ideia de vinculação do soberano às leis fundamentais do reino; as doutrinas de resistência contra tiranos e do contrato social; e, por fim, o pensamento medieval da liberdade no Direito, ou seja, a liberdade a partir de um determinado estatuto que conduziria à ideia de liberdade natural do homem. (COPETTI, 2002, p. 20).
Dessa forma, a ideia que deu fundamento à construção de uma teoria do Estado de Direito remonta a tempos longínquos, todavia, com a origem do conceito de Estado de Direito ter surgido entre a Idade Média e Idade Moderna, foi criado, especialmente, em oposição aos Estados absolutistas, assim apresenta Norberto Bobbio:
É com o nascimento do Estado de direito que ocorre a passagem final do ponto de vista do príncipe para o ponto de vista dos cidadãos. No Estado despótico, os indivíduos singulares só têm deveres e não direitos. No Estado absoluto, os indivíduos possuem, em relação ao soberano, direitos privados. No Estado de direito, o indivíduo tem, em face do Estado, não só direitos privados, mas também direitos públicos. O Estado de direito é o Estado dos cidadãos. (BOBBIO, 2004, p. 58).
Neste contexto, Bobbio afirma que a evolução do conceito de Estado de Direito poderia ser descrita como:
[...] o processo de desmonopolização do poder ideológico de um lado, e de desmonopolização do poder econômico do outro. Ao Estado resta, e restará até quando for um Estado, o monopólio da força através do qual deve ser assegurada a livre circulação de ideias (e, portanto, o fim de toda ortodoxia) e a livre circulação dos bens (e, portanto, o fim de toda forma de protecionismo). (BOBBIO, 2007, p. 125).
Isto posto, conceituado o instituto do Estado de Direito, cabe agora analisarmos historicamente sua evolução. Como dito anteriormente o fundamento e a construção da teoria do Estado de Direito remonta aos tempos da antiguidade, sendo assim, pode-se dizer que os grandes filósofos contribuíram expressivamente para a concepção atual de Estado de Direito.
Afirmando a tese apresentada, as palavras de Manoel Gonçalves Ferreira Filho são esclarecedoras:
A ideia central do Estado de direito, entretanto, tem raízes que avançam pela Antiguidade. É a tese de que existe um direito que não é criado, mas apenas descoberto pelos homens, direito este que é superior aos governantes, que não o podem validamente alterar. A mais famosa apresentação desta tese é o tema fundamental da Antígona de Sófocles, onde a heroína afirma existir um direito feito pelos deuses, não escrito, inabalável, composto de ‘leis que não são de hoje nem de ontem, mas que sempre existiram e existirão sempre. (FILHO, 1987, p. 1-2).
Neste sentido, temos uma visão em que o surgimento do Direito se confunde com o surgimento de Estado, com isso, podemos afirmar que apesar de ainda não ter sido estabelecida a expressão “Estado de Direito”, as civilizações da época antiga, em especial na Grécia, já estabeleciam um modo de organização social cunhada no direito:
Decorre de tal posicionamento que os grandes legisladores referidos na história antiga (Hummurabi, Solon, Licurgo, por exemplo) apresentam-se como restauradores, ou declaradores, de um direito que sempre havia existido. Nas instituições atenienses, a distinção era nítida entre o direito (a lei - nomos), imutável, eterno, e o ato normativo estabelecido pelo poder - no caso, a Assembleia de todos os cidadãos (psephisma, "decreto"). Este não poderia prevalecer contra aquele, não valeria, portanto, se fosse "ilegal". Ademais, o proponente de ato que fosse considerado violador do direito era sujeito a pesadas sanções. Mas era prevista uma ação - a graphé paranomôn - para anular as "leis" contrárias ao direito e sancionar o seu autor (proponente) bem como o presidente da Assembleia, o qual não se recusara a fazer votar o projeto. (FILHO, 1987, p. 1-2);
A visão acima nos remonta ao naturalismo da época antiga, período em que houve a transição do pensamento pré-socrático, passando pelos sofistas, responsáveis pela elaboração teórica e legitimação do ideal democrático da nova classe em ascensão, que eram comerciantes enriquecidos, assim, a maior virtude passa a ser a justiça, defendendo a ideia de que todos os cidadãos da polis devem ter o direito de exercício ao poder, levantando justamente a ideia de “Estado de Direito”.
Desenvolvendo esse pensamento, Sócrates, em oposição aos Sofistas, defende um desenvolvimento racional das leis, negando a obediência às leis impostas pelo homem ao considerá-las injustas, surgindo assim a ideia de Direito natural, acima do direito imposto pela polis. Platão e Aristóteles desenvolvem o conceito de Estado de Direito, o apresentando através da democracia, sendo Aristóteles responsável pelo surgimento da separação dos poderes, o que mais tarde foi desenvolvido por Montesquieu em sua obra “O Espírito das Leis”.
Na corrente do Naturalismo os filósofos pós-socráticos e os jus-filósofos romanos desenvolveram o conceito de “Estado de Direito” levando em consideração os ensinamentos da filosofia grega. Contudo, os romanos abandonaram a ideia de um direito superior ao Estado. Somente com o advento do cristianismo e a decadência do Império Romano, o pensamento filosófico volta-se para a ideia de liberdade, com contribuição de Paulo de Tarso, sustentando a ideia do livre-arbítrio e de justiça (caritas). Assim, inspirado na filosofia estoica do Direito Natural, desenvolve-se a ideia da lei divina superior à lei escrita, o que servirá de base para as correntes do naturalismo do final da Antiguidade e da Idade Média.
Desenvolve-se então, com a corrente idealista platônica, o pensamento de Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino buscando conceituar os dogmas religiosos com a filosofia antiga. Afirmando o naturalismo, apontando a lei justa como àquela de acordo com o direito natural divino. Mais tarde, na Idade Média, a sociedade volta-se para o totalitarismo religioso durante o período da inquisição. Após algumas revoltas, estritamente voltadas à religião, a igreja continua entrelaçada ao Estado, dessa maneira justificando o poder do monarca nos Estados absolutistas, sendo os reis e o Papa representantes de Deus na terra.
Ainda na Idade Média, diante da opressão exercida pela igreja e pelos Estados absolutistas, merece destaque neste período a posição inglesa, assim apresenta Manoel Gonçalves Ferreira Filho:
O background da doutrina inglesa não é outro que o da continental. Mostra bem Corwin como o pensamento jurídico inglês se vincula às lições da Antiguidade e participa das ideias básicas do cristianismo medieval que teve em Tomás de Aquino o seu principal expoente. Entretanto, essas colocações teóricas vicejaram num terreno especial, o da common law. Esta tem por base o direito comum vigorante na Inglaterra, estabelecido mormente por via costumeira, com raízes imemoriais. Por várias vezes, os monarcas ingleses, como o próprio Guilherme, o Conquistador, se propuseram a restaurar, ou a confirmar, esse direito. A própria Magna Carta, de 1215, não declara visar senão a restabelecer a law of the land - esse direito costumeiro que está na origem da common law. Mas, conforme aponta Corwin, ‘o verdadeiro ponto de partida na história da common law é o estabelecimento por Henrique, no terceiro quartel do século doze, de um sistema de Cortes de circuito (circuit courts) com uma corte de apelação central’. Isto, por um lado, porque este último tribunal gradualmente unificou em escala nacional os costumes. Mas, sobretudo, por outro lado, ‘porque na sua seleção de quais costumes reconhecer a fim de lhes dar influência nacional, e de quais suprimir, os juízes empregaram o critério (test) de razoabilidade (reasonableness), um critério derivado em primeiro lugar das ideias romanas e continentais’. (FILHO, 1987, p. 14).
Diante do protagonismo “constitucional” na Inglaterra, no século XVI começa a surgir a corrente jusnaturalista, ainda pautada em um Estado absoluto as concepções contratualistas de Thomas Hobbes, mesmo sendo defensor do absolutismo, suas ideias partem para uma nova concepção de Estado civilista ou político. Neste sentido, Hobbes defende o surgimento do Estado civil através de um contrato, onde o indivíduo transfere ao Estado o direito à vida em troca de liberdade e segurança, pois acreditava que o homem no estado natural era ruim e com isso prevaleceria o mais forte sobre o mais fraco, o que gera guerra constante, gerando insegurança. Pois para Hobbes o “homem é o lobo do homem”.
O absolutismo, após seu apogeu, começa a declinar, pois as novas ideias de um Direito natural ganham forças nos séculos XVII e XVIII como instrumento contra a antiga organização social medieval, desenvolvendo-se uma teoria contratualista do Estado liberal, e não mais absoluto, em que o direito positivo (posto pelo homem) deve-se amoldar.
Deste modo, Nelson Nery Costa nos apresenta a nova concepção que começa se amoldar com as ideias de John Locke:
Locke parte da condição natural dos homens, do estado de natureza, mas via essa condição de um modo diferente de Hobbes. Para ele, o estado de natureza era um estado de liberdade e de igualdade, não a guerra virtual de todos contra todos. Portanto, o estado de natureza era regido por uma lei de natureza que a todos obrigava. A razão, que era essa lei, ensinava a todos os homens que eram iguais e independentes, que nenhum deles devia prejudicar a outrem na vida, na saúde, na liberdade ou na propriedade. Cada um devia, além disso, garantir a execução dessa lei de natureza, punindo de maneira eficaz aqueles que a transgredissem. (COSTA, 2006, p. 110).
Ainda sobre o pensamento de Locke, Bobbio acrescenta:
Segundo Locke, o verdadeiro estado do homem não é o Estado civil, mas o natural, ou seja, o estado de natureza no qual são livres e iguais, sendo o estado civil uma criação artificial, que não tem outra meta além da de permitir a mais ampla explicitação da liberdade e da igualdade naturais. (BOBBIO, 2004, p. 48).
Neste sentido, Manoel Gonçalves Ferreira Filho apresenta a contribuição de Locke para o desenvolvimento do conceito de “Estado de Direito”:
O Estado de direito, como tantas instituições do direito constitucional moderno, é uma versão racionalizada do rule of law inglês. Isto é bem claro no famoso Segundo tratado do governo civil, de John Locke, no qual está a ideia de que o direito preexiste ao Estado (e o limita), como a de que a liberdade natural do indivíduo somente pode ser restringida pela lei (declarada, não criada, pelo legislador), lei que deve ser igual para todos e há de ter sua aplicação sob o crivo de juízes independentes. (FILHO, 1987, p. 15).
Outro filósofo dessa época, o francês Montesquieu, com sua teoria da separação dos poderes, desenvolvida a partir de Aristóteles, exposta na obra O Espírito das Leis (1748), retoma tais ideias para impor limites internos ao Estado, impedindo a concentração do poder em uma só pessoa, propondo a distribuição das funções estatais por órgãos distintos. Dessa forma, haveria separação das funções legislativa, executiva e judiciária, que passariam a corresponder aos respectivos poderes independentes, que poderiam controlar-se reciprocamente1.
Isto posto, Manoel Gonçalves Ferreira Filho apresenta a notável contribuição do filósofo empirista francês para a evolução do conceito de “Estado de Direito”:
[...] a exposição mais clara dos princípios diretores do Estado de direito está no pensamento político francês. Recorra-se a Montesquieu, no primeiro capítulo de seu mais célebre livro, para exprimir a base deste pensar: "As leis são, na significação mais larga, as relações necessárias que derivam da natureza das coisas." E aduz: "Neste sentido, todos os seres têm suas leis; a divindade tem suas leis; o mundo material tem suas leis; as inteligências superiores ao homem têm suas leis. os animais têm suas leis; o homem tem suas leis." Não é fruto da ‘volonté momentanée et capricieuse’ dos homens. (FILHO, 1987, p. 16)
Foi dessa forma que o “Estado de Direito” identificou-se com a consolidação liberal dos ideais burgueses do final do século XVIII, institucionalizados e levados a efeito no modelo do Estado liberal, caracterizado para dar conta da realização de tais pretensões como “Estado de Direito”, isto é, pautado e vinculado à figura da lei, que constitui os limites e o fundamento necessário de todas as suas ações, em reação aos ordenamentos medievais e absolutistas, à sua pluralidade de poderes concorrentes e à oposição histórica e secular entre a liberdade do indivíduo e o absolutismo do monarca, estruturou-se o Estado liberal de Direito, no qual se refletiu a pugna da liberdade e da propriedade contra o despotismo na área continental europeia (MORAIS; SOUZA; SALGADO, 2015, p. 453).
Concorrentemente a este movimento, a teoria do contrato social, dentro do jusnaturalismo, vai atingir sua definição mais adequada com Jean-Jacques Rousseau. Para ele a passagem do estado de natureza ao Estado civil, por meio do contrato social, deve originar-se do consentimento unanime, em que todos abdicam de seus direitos em favor da sociedade e, assim, cada um nada perde. Diz Rousseau (2014, p.39) que, "se cada um se der a todos, não se dá a ninguém e como não há um associado sobre o qual não se adquira o mesmo direito que se lhe cede sobre si, e mais força para conservar a que se tem”. Neste contexto acrescenta Manoel Gonçalves Ferreira Filho:
A posição de Rousseau não é outra. A fórmula que cunhou - "a lei, expressão da vontade geral" -, adotada no art. 6° da Declaração de 1789 soa voluntarista. Parece afirmar que o povo cria a lei, que a vontade faz a lei. E nesse sentido foi interpretada a deturpada mais tarde. Todavia, no Contrato geral existe inequívoca a distinção entre a "vontade geral" e a "vontade de todos". Ambas surgem da manifestação da vontade de todos os homens, mas a primeira manifesta a razão, que identifica o justo, o bem comum. A segunda é um desvio, motivado pelo egoísmo, pela influência de interesses particulares, que prevalecem sobre a razão. (FILHO, 1987, p. 16)
O pensamento de Rousseau é mais democrático, ataca o absolutismo de Hobbes e supera o elitismo de Locke. A soberania é o exercício de uma vontade geral não opressora que dirige as forças do Estado para coibir atos atentatórios do governo. Com base nesses ideais, reforçou- se a concepção de Estado de Direito Liberal, restrita à proteção dos direitos dos indivíduos, sem interferência do Estado na vida privada. Contudo, a burguesia não seguiu em obediência aos princípios filosóficos que sustentaram sua revolta social (diga-se de passagem, devido à manutenção egoística de seus interesses). Surge, então, o positivismo jurídico, que não se preocupa com o conteúdo normativo, mas com observância do procedimento legal descrito na lei.
O positivismo trouxe uma ideologia de segurança jurídica, mas não foi suficiente para impedir as desigualdades, já que havia pouco espaço para tratamento diferenciado para os desiguais. Após as revoluções o positivismo ganha força e estabelece, no início da idade contemporânea, através de Auguste Comte e Kelsen o sentido lógico e puro do Direito, neste sentido José Manuel de Sacadura Rocha apresenta as contribuições filosóficas de Comte para o conceito de Estado de Direito do início do XIX:
Auguste Comte foi discípulo de Saint-Simon, de quem sofreu enorme influência. Sua principal característica foi a devoção aos estudos e à filosofia positivista. A filosofia de Auguste Comte para a sociedade é vista como uma ciência positiva, experimental, denominando-a, inicialmente, de "física social". Baseando- se nesta definição, bem como se apoiando nos pensadores empiristas do século XVIII, que afirmavam que podemos entender as leis da sociedade humana aplicando os instrumentos da ciência, Auguste Comte insere uma nova teoria da sociedade, denominada "positiva". A "teoria positiva" parte do princípio de que os homens devem aceitar a ordem existente, não devendo contestá-la. Assim, também, ao ser humano cabe "revelar" o mundo, não existindo a possibilidade de "mudá-lo". O positivismo está alicerçado na prática da coleta de dados sobre determinada sociedade, cuja análise será feita através da constatação e confirmação desses dados. E composto pela experimentação, pelo pragmatismo e pelo empirismo. Não basta, portanto, a apresentação de ideias vagas, sem consistência, e, principalmente, sem fundamentação. Para Auguste Comte, as leis estabelecidas pela ciência deverão ser aceitas, não podendo haver nenhum tipo de contestação quanto ao que elas afirmam ou impõem. A crença no que de fato existe é primordial. A verdade científica trata dos fenômenos ou fatos dominantes ou constantes, não tendo como objetivo atingir as causas, limitando-se apenas a constatar a “ordem que reina no mundo”. (ROCHA, 2014, p. 143).
Sobre o positivismo complementa José Manuel de Sacadura Rocha:
Kelsen diz que uma ciência deve ter método e objeto. Da mesma forma que a Sociologia estuda o comportamento humano na sociedade, a Psicologia estuda o comportamento humano na forma de psique, o Direito deve ter seu objeto próprio de estudo. Toda ciência necessita de um objeto próprio e uma metodologia adequada; para o Direito, o objeto próprio é a norma; o método para estudar essa norma é o positivismo. E é de Auguste Comte que Kelsen tira esse pensamento. Kelsen, na tentativa de fazer do Direito uma ciência, nos leva a "abrir" outras discussões sobre um sistema normativo com base em uma lógica jurídica formal. Se essa norma é formal, podemos dizer que é direito posto (feito pelo homem para o homem). Kelsen tem o desejo de elaborar uma teoria pura para uma base científica jurídica, e é por esse motivo que o Direito de Kelsen deixa de ser uma ciência humana para ser uma ciência quase exata (Direito Positivo). E a ciência do Direito se transforma em puro normativismo, fundamentada em uma extrema lógica formal jurídica. Uma obra fundamental de Kelsen chama-se Teoria pura do direito, e é nessa obra que Kelsen consegue positivar mais sua teoria do Direito, apesar de existir um capítulo dedicado exclusivamente à interpretação jurídica. (ROCHA, 2014, p. 149)
Com o advento das revoluções industriais, passando pela primeira e segunda guerra mundial e vivenciando a crise de 1929, concluiu-se que o modelo de Estado posto era insuficiente por não ter sucesso no que se refere às realidades sociais, tendo em vista sua inércia diante das mais variadas situações e por não corresponder satisfatoriamente às necessidades demandadas pela vida em sociedade, dando oportunidade para o surgimento da ideia de que a igualdade em que se sustentou o liberalismo era apenas formal e não substancial e que a liberdade tão desejada se identificava com a emancipação econômica.
Nesse momento, transformou-se o ideário de cidadania, que passou do plano civil e político para a esfera social, conferindo-se à ordem jurídica o papel de atuar também para o alcance de metas sociais concretas, dentro de uma lógica distributiva de satisfação e direitos humanos sociais, igualitários, destinados a organizar a sociedade segundo o ideal de justiça e bem-estar para todos. A necessidade de uma mudança no perfil do Estado de direito liberal para atender às novas demandas se tornou premente, dando origem ao estado do bem-estar social.
Neste sentido, Luiz Guilherme Marinoni leciona:
[...] viu-se que o positivismo jurídico é uma ciência de método explicativo de um objeto, ou seja, da norma positivada, não se preocupando com a atividade de produção do direito. Direito, para essa corrente, é todo direito posto pelo homem (legislador). Diante disso, a aplicação do direito passa a ser uma atividade mecânica, o que não condiz com um ideal de justiça, e que leva a uma nova perspectiva de reestruturação do pensamento jurídico da época; aliás, o direito deve ser construído e evoluído a partir da observação de fatos históricos, sociais e políticos, principalmente para assegurar eficácia aos direitos fundamentais, tanto é que, para Miguel Reale, em sua Teoria tridimensional do direito, o direito é fato, valor e norma. Assim, surge uma vertente crítica do positivismo, a que se denomina positivismo crítico ou pós- positivismo, em que o texto da lei se submete aos princípios de justiça e de direitos fundamentais, obtendo uma norma jurídica que apresenta uma adequada conformação com a lei. (MARINONI, 2014, p. 51).
Nessa fase de pensamento o “Estado de Direito” passa a ser “Estado Democrático de Direito” com viés constitucional. Assim, o Estado de Direito deve ser um Estado de Direito Constitucional que permite a mutação para garantia e eficácia dos direitos fundamentais. Compartilha dessa visão Alexandre Wunderlich:
Com o nascimento do Estado Constitucional Democrático de Direito, a teoria crítica jurídica prega a necessidade de uma adequação ao novel paradigma de produção científica. Deve-se criar uma ruptura com direito meramente regulador, para que se possa ingressar no modelo de direito promovedor e transformador. Em síntese, basta referir que os processualistas contemporâneos têm se orientado por uma tutela constitucional do processo, tendo o processo como instrumento a serviço da ordem constitucional. (WUNDERLICH, 2001, p. 25).
Corroborando com esta ideia ensina o Ministro do STF, Luís Roberto Barroso:
A reconstitucionalização da Europa, imediatamente após a 2.ª Grande Guerra e ao longo da segunda metade do século XX, redefiniu o lugar da Constituição e a influência do direito constitucional sobre as instituições contemporâneas. A aproximação das ideias de constitucionalismo e de democracia produziu uma nova forma de organização política (...) a principal referência no desenvolvimento do no direito constitucional é a Lei Fundamental de Bonn (Constituição Alemã), de 1949, e, especialmente, a criação do Tribunal Constitucional Federal, instalado em 1951. A partir daí, teve início uma fecunda produção teórica e jurisprudencial, responsável pela ascensão científica do direito constitucional no âmbito dos países de tradição romano-germânica. A segunda referência é a da Constituição da Itália, de 1947, e a instalação da Corte Constitucional, em 1956. Ao longo da década de 70, a redemocratização e a reconstitucionalização de Portugal (1976) e Espanha (1978), agregaram valor e volume ao debate sobre o novo direito constitucional. No caso brasileiro, o renascimento do direito constitucional se de igualmente, no ambiente de reconstitucionalização do país, por ocasião da discussão prévia, convocação, elaboração e promulgação da Constituição de 88. (BARROSO, 2006, p. 45).
Diante do exposto até aqui, o conceito de Estado Democrático de Direito surgiu em contraposição aos Estados totalitários, porém, desenvolveu-se desde a idade antiga em que sempre houve contraposição à centralização do poder, seja por um monarca ou por uma oligarquia ou aristocracia. Deste modo, este contexto histórico nos demonstra a dura e árdua evolução da luta pelos direitos humanos e, por conseguinte, a garantia dos direitos fundamentais em cada nação através do caríssimo processo de constitucionalização. Mostra-se, então, claro e evidente que a conquista desses direitos não foi um processo simples, deste modo, todos nós temos o dever intrínseco de preservar cada um desses direitos, garantindo que estes não sejam cerceados e retirados de qualquer forma arbitrária pelo Estado, ou a quem detenha poder econômico ou financeiro para tanto. Indo mais além, para que um ou outro direito fundamental seja limitado, isto deva se dar por autoridade competente com o devido processo legal nos moldes da Constituição Federal vigente.