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A mecanização dos atos judiciais e seus perigos para o acesso à justiça

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19/09/2007 às 00:00
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1. INTRODUÇÃO

A proposta do presente trabalho é motivar o debate dos operadores jurídicos sobre a visível e crescente "padronização" de determinadas peças judiciais, bem como a "mecanização" de certos atos judiciais.

Procuraremos apresentar exemplos desta situação forense, bem como provocar a discussão em torno de como este "fenômeno" atinge (ou pode atingir) a classe jurídica e a população em geral.

Ao final esperamos que o leitor possa ter tido a oportunidade de refletir sobre este tão delicado tema e o presente trabalho possa contribuir para o debate sobre a melhoria da prestação jurisdicional.


2. DA REVOLUÇÃO OPERADA NO OFÍCIO DO OPERADOR JURÍDICO COM O ADVENTO DO COMPUTADOR

É certo que o computador trouxe avanços anteriormente inimagináveis para o trabalho de todos. Esta máquina, tão envolvente e emocionante, não transformou somente as atividades daqueles que necessitam de exatidão técnica milimétrica para o bom desenvolvimento de seu mister (tais como a medicina e a indústria automobilística) mas, de igual forma, revolucionou o ofício do operador do direito.

Quem não se recorda dos depoimentos dos advogados mais experientes, os quais relatam a sua dificuldade em realizar pesquisas jurisprudenciais, uma vez que tais pesquisas tinham que ser realizadas por intermédio de consulta a periódicos oficiais (tais como a Revista dos Tribunais), folha por folha, índice por índice, até que a decisão jurisprudencial almejada pudesse ser encontrada?

Não era difícil encontrar advogados nas bibliotecas públicas ou nas bibliotecas das faculdades vasculhando inteiramente os periódicos jurisprudenciais, visando pesquisar a maior quantidade possível de decisões, para então poder responder às consultas realizadas por seus clientes.

Com o passar dos tempos e com a democratização do acesso aos aparelhos de informática (mais precisamente o computador), o processo de pesquisa doutrinária e jurisprudencial, que antes se mostrava cansativo e extremamente demorado, passou a ser diametralmente simples e com agilidade anteriormente incalculável.

Se antes breve pesquisa jurisprudencial levava horas, quiçá até dias para ser concretizada, atualmente pode ser concluída em espaço de horas, ou quem sabe em questão de minutos. Isto sem contar que a pesquisa pode ser realizada com extrema precisão e perfeição, dada a abrangência de tribunais que o profissional atualmente pode acessar [01].

Poderíamos afirmar extreme de dúvidas que, com a democratização do computador, se democratizou, igualmente, a informação jurídica.

Entretanto, sem querer ser melodramático ou pessimista, se a popularização do computador trouxe avanço significativo e benefício inegável para o bom desenvolvimento do trabalho do operador jurídico, podemos afirmar, com segurança absoluta também, que tal popularização trouxe a reboque inegáveis malefícios e perigos para o bom andamento e julgamento das demandas.


3. DOS MALEFÍCIOS ORIUNDOS DA INFORMATIZAÇÃO DO TRABALHO DO PROFISSIONAL DO DIREITO

Parodiando as leis da física, onde tudo que sobe obrigatoriamente tem de descer, todo benefício alcançado, por variadas vezes, traz consigo algum problema.

O malefício encontrado no uso contínuo do computador não está relacionado com a máquina propriamente dita, mas, sim, com o mau uso deste equipamento por seu operador.

Diz-se mau uso do computador porque, paradoxalmente, da mesma forma que, em questão de minutos, o operador do direito tem a possibilidade de realizar pesquisa doutrinária ou jurisprudencial, por outro lado, tem a mesma possibilidade de encontrar determinado arquivo que se encontrava isolado em algum lugar longínquo da memória do computador e, com um simples "Crtl + C" [02] e outro não menos complicado "Crtl + V", utilizá-lo em outra tarefa.

Com esta singela atitude, uma petição que demoraria horas, dias ou até meses para ser resolvida, em poucos minutos, pode encontrar seu fim.

Só que esta facilidade pode desandar em uma abominável mecanização de procedimentos judiciais e perigosa padronização de defesas e de decisões judiciais.

Mas em que consiste esta mecanização dos casos?

Todos os operadores jurídicos sabem que cada caso levado ao conhecimento do Poder Judiciário envolve uma relação litigiosa entre partes diferentes.

Quando estas duas partes não chegam a acordo, nada mais resta do que bater às portas do Poder Judiciário para que este órgão - o único com força de solucionar litígios definitivamente em países democráticos [03] - decida a sorte daqueles litigantes.

Não é preciso mencionar que todo o cidadão que procura o Poder Judiciário o faz com vistas a defender seus interesses, confiando que o servidor público responsável pela solução do litígio (juiz) o faça com a análise percuciente, imparcial e refletida das provas produzidas por ela, para chegar ao final desejado, dando a cada um o que é seu!

Dessa forma o cidadão, ao confiar à solução do problema a este Poder constituído, jamais admitirá imaginar que seu caso possa ser decidido sem a atenção esperada, bem como que sua decisão possa ter sido utilizada em outros casos semelhantes ao seu.

Da mesma forma, o cidadão não esperará que seu patrono se utilize deste tipo de recurso e reproduza, ipsis literis, peça que já havia confeccionado para outro caso, sem sequer analisar com cuidado e relatar ao magistrado as peculiaridades existentes naquela demanda.

Espera-se então do advogado, promotor ou magistrado que as versões apresentadas pelas partes sejam devidamente confrontadas com as provas até então existentes para que, após isso, possa se decidir sobre quem tem razão no litígio.

Daí se vê que nenhuma pessoa em sã consciência aceitaria que seu advogado, ou mesmo o magistrado que conduz a causa, realizasse seu trabalho com pouca atenção e deixasse de analisar com extremo cuidado e zelo as peculiaridades do caso debatido.

Como se vê, é isso em tese o que o cidadão espera do operador jurídico.

Lamentavelmente em alguns casos, provavelmente pela constância com que são discutidos no seio do Poder Judiciário [04], alguns operadores jurídicos, com vontade de resolver rapidamente aquele litígio, preferem utilizar-se de modelos pré-confeccionados de peças judiciais, no intuito de agilizar a solução daquela demanda, aumentando inclusive sua produtividade.

Entretanto, esta repetição constante de peças pode desaguar em nulidades processuais e acarretar em sérias injustiças.

Passemos então a demonstrar esta padronização e mecanização (e suas conseqüências) de casos, primeiramente com relação ao trabalho do profissional da advocacia.


4. DA PADRONIZAÇÃO DE PETIÇÕES. COMODISMO INACEITÁVEL.

O perigo mencionado no item anterior, apesar de não alcançar somente os advogados, invariavelmente os atinge com a força de um "tsunami", pois vários julgadores não têm admitido que o profissional da advocacia sucumba à tentação de "copiar" e "colar" peças judiciais.

O advogado às vezes, por pura falta de tempo (em outras vezes por insensata preguiça - o que é lamentável), é tentado a repetir uma mesma petição.

Um exemplo desta "tentação" se encontra quando o advogado tem que confeccionar petição de recurso a tribunais superiores

Ao ser instado a recorrer para as instâncias superiores, alguns advogados repetem em seu recurso as mesmíssimas alegações produzidas perante o juízo de 1º grau.

Entretanto este é um luxo que ao advogado não é dado se aproveitar.

Se um conselho poderíamos dar aos causídicos que pensam poder se utilizar deste expediente, o conselho a ser dado seria o seguinte: jovem advogado, não caia nesta tentação!!!

Todos sabem que a perda de prazo para o bom advogado é como a perda de um ente querido.

De igual forma, o não conhecimento de recurso por tribunal, por ausência de requisito formal de regularidade, para o bom profissional da advocacia, é falta grave que não pode ser admitida.

Nunca nos esqueçamos que "[...] nós juristas, nós os advogados, (...). temos uma alta magistratura, tão elevada quanto aos que vestem as togas, presidindo os tribunais; somos os auxiliares naturais e legais da justiça" [05]

Ou seja, o mister do advogado, antes de se prestar a defesa do interesse privatístico das partes, se presta primordialmente ao alcance da justiça!

Dessa forma, tanto a perda de prazo, quanto o não conhecimento de recurso por ausência de pressuposto formal de regularidade, a par de revelarem desleixo profissional (o que já é grave), podem desaguar na criação de situação totalmente injusta para a parte que confiou o mandato ao profissional da advocacia, o que, além de gerar responsabilização civil, macula indelevelmente a carreira do profissional.

Mas por que nos prestamos a tecer comentário sobre as conseqüências da perda de prazo ou do não conhecimento de recurso por tribunal e, igualmente, nos propomos a dar conselho a outros profissionais com relação aos perigos da mecanização de peças profissionais?

Pelo simples fato de que caso o advogado sucumba à tentação de "copiar" e "colar" qualquer tipo de peça jurídica, deve-se alertar que, constantemente, os Tribunais [06] sequer conhecem de recursos assim formulados, haja vista que o recurso desta forma produzido não atende ao princípio da dialeticidade, previsto no artigo 514 [07], do Código de Processo Civil.

Ora, se o advogado ao recorrer se dá ao luxo de simplesmente "copiar" e "colar" a peça apresentada em primeiro grau, sem se dar ao mínimo de trabalho de demonstrar os eventuais vícios existentes na decisão objurgada, nada mais correto do que o colegiado deixar de apreciar as razões recursais.

Nas palavras do Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná – Miguel KFOURI NETO: "o recurso de apelação não se presta a mera repetição, ou mesmo, colagem da contestação." [08]

Concluindo seu raciocínio, amparando-se no pensamento de Theotonio NEGRÃO: "Não é suficiente mera menção a qualquer peça anterior à sentença (petição inicial, contestação ou arrazoados), à guisa de fundamentos com os quais se almeja a reforma do decisório monocrático. À luz do ordenamento jurídico processual, tal atitude traduz-se em comodismo inaceitável, devendo ser afastado." [09]

Daí se vê o grande perigo a que o bom profissional da advocacia está exposto caso sucumba à sedutora opção de "copiar" e "colar" peça jurídica.

Mas não é somente nestes casos que os tribunais têm inadmitido recursos. Mais exemplos são extraídos com freqüência da jurisprudência.

Outra falha processual que os tribunais invariavelmente não perdoam reside no expediente muitas vezes utilizado de apresentar ao Poder Judiciário petições visivelmente confeccionadas de forma padronizada. Não é preciso mencionar que tais recursos são prontamente repelidos [10], com direito inclusive a repreensão do profissional que assim se porta.

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Com vistas ainda a corroborar tudo o até aqui aduzido, é de bom alvitre advertir ainda que não são somente as petições repetitivas das razões de 1º grau e as petições chamadas "padronizadas" que merecem não ser conhecidas pelos tribunais. Da mesma forma, alguns profissionais apresentam recursos com alegações genéricas e despidas de qualquer fundamentação, cujo único caminho só pode ser o seu não conhecimento. [11]

A orientação dos tribunais em não conhecer estes tipos de recursos é por demais acertada e merecedora de aplausos, pois somente vêm a produzir a melhora da prestação jurisdicional.

No entanto, para que ocorra a efetiva melhora da prestação jurisdicional convém relembrar que o advogado não está sozinho na condução da máquina judiciária e, se a ele é exigido que não sucumba a este tipo de tentação, não podemos esquecer, igualmente, que todos os demais operadores jurídicos estão proibidos de morder a "maçã do pecado".

Apesar de sabermos da imensa carga de trabalho que envolve os magistrados brasileiros, tendo em vista o munus publico e a confiança que os jurisdicionados lhes depositam, mister se faz que a análise de cada caso se dê de forma cuidadosa e criteriosa, pois, afinal de contas, são vidas que estão sendo discutidas.

É totalmente desaconselhável (e não é isso que se espera desta classe tão importante) a mecanização de decisões judiciais.

Afigura-se totalmente inadmissível que decisões sejam proferidas com fundamentos genéricos e imprecisos, as quais, além de poderem ser utilizadas para uma infinidade de situações, revelem a falta de cuidado e objetividade de análise do conjunto probatório em que estão inseridas.

É claro que estamos falando de casos esporádicos e que não são constantes na magistratura, mas que, acaso não sejam combatidos, de excepcionais podem se transformar em regra e, daí, irremediável defeito na prestação do serviço jurisdicional será colocado à disposição dos cidadãos.


5. DA PADRONIZAÇÃO DE DECISÕES JUDICIAIS. O PERIGO DA MECANIZAÇÃO DE DETERMINADOS ATOS.

Aqui chegamos ao ponto nuclear da discussão que pretendemos trazer aos leitores: se os tribunais são implacáveis e sequer conhecem de recursos interpostos por advogados ou promotores de justiça que se apresentam padronizados ou com repetições de alegações já produzidas em instância inferior, como deverá se portar o operador jurídico (em especial o advogado), quando se deparar com decisão padrão, que apresente somente a aparência de fundamentação?

Como deverá se portar diante de decisão visivelmente mecanizada e que pode ser aplicada para uma infinidade de situações?

Antes de responder a estes questionamentos, é de bom alvitre passar os olhos sob em que circunstâncias isso poderá ocorrer.

Quantos de nós profissionais atuantes do foro já não tivemos a triste experiência de se deparar com decisões judiciais que, apesar de apresentarem aspecto e forma legal, não analisaram com a merecida atenção o caso posto a julgamento?

Isto pode acontecer em pedidos de liminares em medidas cautelares; em pedidos de antecipações de tutelas; em pedidos de produção de provas; em pedidos de efeito suspensivo, formulados em agravos de instrumento; em embargos de declaração; enfim, em uma grande gama de situações corriqueiras do dia-a-dia forense.

Geralmente este tipo de decisão apresenta forma semelhante. Após a apresentação do relatório do caso, ao iniciar-se a fundamentação são encontrados alguns jargões, dentre os quais, ad exemplum, podem ser destacados: "dos documentos juntados aos autos não visualizo a possibilidade de deferimento do pedido formulado". Ou então: "analisadas as razões expostas pelo requerente não visualizo suporte fático para o deferimento do pedido".

Atente-se para o fato de que, em hipotéticos exemplos, tais fundamentos são lacunosos e manifestamente genéricos, pois não indicam quais documentos foram considerados inidôneos pelo magistrado para comprovar as alegações das partes. Geralmente o juiz deixa de fazer remessa às folhas dos autos em que estão inseridos tais documentos para fundamentar seu pensamento. Ao invés de relatar, p. ex., que "o documento juntado à fl. ‘xx’ não corrobora a alegação apresentada pela parte", o magistrado simplesmente se utiliza do expediente de empregar expressão genérica como "da análise dos documentos" para indeferir o pedido formulado.

Por certo tais decisões infelizmente são fruto da denominada "padronização" de atos judiciais, o que é inadmissível em qualquer contexto ou época vivida.

Cabe frisar que o que se espera do Poder Judiciário não é que este julgue casos "a rodo".

Espera-se, sim, que julgue as demandas com percuciência e serenidade para que injustiças não sejam criadas.

Mas e se este tipo de decisão aflorar no seio de uma demanda, o que deverá ocorrer?

Athos Gusmão CARNEIRO, com a autoridade de quem foi magistrado por várias décadas, a par de noticiar a existência deste tipo de desastrosa decisão judicial, indica qual será o caminho legal para a mesma:

"5. Não é tão simples, todavia, expressar exatamente o conceito de decisão não fundamentada, distinguindo-o do de decisão mal fundamentada e de decisão insuficientemente fundamentada, e precisando em que casos o vício existente na sentença (ou no acórdão, ou na decisão interlocutória) resultará na gravíssima sanção de nulidade do provimento judicial.

Em monografia excelente sobre as nulidades das sentenças, TERESA ARRUDA ALVIM PINTO refere existirem a grosso modo, três espécies de vícios intrínsecos das sentenças que se reduzem a um só, em última análise: 1. ausência de fundamentação; 2. deficiência de fundamentação; e 3. ausência de correlação entre fundamentação e decisório.

Poderíamos acrescentar, máxime em tempos de informatização do Judiciário, o caso das sentenças ou decisões "padronizadas", com (aparente) fundamentação tão genérica e imprecisa que se aplica a um grande número de lides semelhantes.

Segundo a profª TERESA, todos os casos implicam, ao final, em ‘... ausência de fundamentação e geram nulidade da sentença. Isto porque ‘fundamentação’ deficiente, em rigor, não é fundamentação, e, por outro lado, ‘fundamentação’ que não tem relação com o decisório, não é fundamentação: pelo menos não o é daquele decisório.’ (‘Nulidades da Sentença’, ed. RT, 3ª ed., 1993, pág. 200)" [12] (grifo nosso)

Como demonstrado no escólio do ministro gaúcho, as decisões "’padronizadas’, com (aparente) fundamentação tão genérica e imprecisa que se aplica [m] a um grande número de lides semelhantes" não podem ser aceitas como decisões válidas e merecem ser excluídas do mundo jurídico.

Ressalte-se que uma decisão dessa forma fundamentada, por óbvio e inevitavelmente, não foi prolatada com a esperada atenção e com a criteriosa análise dos dados postos em debate pelas partes, donde se acredita que ofende o princípio da motivação das decisões judiciais.

No mundo moderno, o princípio da motivação (adequada) das decisões judiciais, dada sua relevância, ganhou considerável destaque sendo que, no direito brasileiro foi elevado, inclusive, ao patamar mais alto da legislação, inserido que foi na Constituição Federal (artigo 93, inciso IX).

Em brilhante estudo realizado sobre nulidades no processo e na sentença, Tereza Arruda Alvim WAMBIER discorre sobre os motivos que conduziram o legislador a prever expressamente a necessidade de motivação das decisões judiciais. Explica a festejada professora:

"Outro enfoque que pode ser concebido, típico da nossa épica, é o que vê na idéia de garantia a fonte básica de inspiração da obrigatoriedade da motivação das decisões judiciais.

Essa idéia tem uma série de desdobramentos que se aplicam nitidamente ao processo, ainda que digam respeito a toda atividade estatal. A motivação:

1. oferece elementos concretos para que se possa aferir a imparcialidade do juiz;

2. poder-se-á, também, por meio do exame da motivação da decisão, verificar da sua legitimidade;

3. por fim, garante às partes a possibilidade de constatar terem sido ouvidas, na medida em que o juiz terá levado em conta, para decidir, o material probatório produzido e as alegações feitas pelas partes." [13]

Como visto, o princípio da motivação adequada das decisões judiciais é de singular importância, uma vez que previne a imparcialidade do juiz; assegura o direito da parte à revisão da decisão judicial; além de garantir a ampla defesa do direito pelo cidadão na oportunidade de produção e análise de provas no processo judicial.

Mas o que seria então uma fundamentação adequada?

José Joaquim CALMON DE PASSOS esclarece qual é a fundamentação adequada e esperada de toda decisão judicial:

"A fundamentação só é atendível como clara e precisa quando ela é explícita e completa quanto ao suporte que o juiz oferece para suas decisões sobre questões de fato e de direito postas para seu julgamento. Se o fato não é controvertido, inexiste questão de fato, dispensada a fundamentação, bastando a referência ao fato certo. Se houver controvérsia, a decisão só é fundamentada quando o juiz aprecia a prova de ambas as partes a respeito e deixa claro as razões porque aceita uma e repele a outra. Já as questões de direito, suas decisões são fundamentadas quando o juiz expõe o embasamento doutrinário, jurisprudencial ou dogmático sério que o leva a decidir como decide, tendo em vista os fatos já admitidos para formação de seu convencimento, nos termos precedentemente expostos" [14]

Outrossim, constatada que a decisão não foi fundamentada como se espera, o seu caminho só pode ser um: a declaração de nulidade!.

E a jurisprudência é farta ao cassar decisões que desrespeitam este princípio tão importante para o processo e para a resolução dos litígios.

"ACAO DE PRESTACAO DE CONTAS - PRIMEIRA FASE - PROCESSUAL CIVIL - SENTENCA QUE NAO APRECIA TODAS AS QUESTOES AVENTADAS PELO REU - AUSENCIA DE FUNDAMENTACAO - NULIDADE DECRETADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Todos os julgamentos dos órgãos do poder judiciário serão fundamentados, devendo o juiz analisar as questões de fato e de direito, sendo nula a sentença que não observar os preceitos do art. 93, IX, da CF e os requisitos essenciais do art. 458, II, do CPC. 2. Nula é a sentença que silencia sobre argumento relevante apresentado por uma das partes. 3. (...)." [15] (grifo nosso)

No mesmo sentido ainda: TJPR, agravo de instrumento n.º 171.394-4, 5ª Câmara Cível, relator Desembargador Lauro Augusto Fabrício de Melo, julgamento em 14.06.2005; TJPR, agravo de instrumento n.º 172.787-3, 8ª Câmara Cível, relator Desembargador Rafael Augusto Cassetari, julgamento em 08.06.2005; e TJPR, recurso em sentido estrito n.º 170.886-3, 1ª Câmara Criminal, relator Desembargador Otto Luiz Sponholz, julgamento em 23.06.2005.

Dessume-se, dos exemplos extraídos de singular jurisprudência, que a decisão não fundamentada não merece existir no mundo jurídico, devendo ser combatida por todos, até para melhora da prestação jurisdicional.

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Sobre o autor
Leonardo Cesar de Agostini

Professor Universitário - Direito Civil, Mestrando em Direito Constitucional pela UniBrasil, Membro do corpo editorial da Revista Eletrônica Direitos Fundamentais & Democracia da UniBrasil, Advogado militante na Cidade de Curitiba(PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AGOSTINI, Leonardo Cesar. A mecanização dos atos judiciais e seus perigos para o acesso à justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1540, 19 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10426. Acesso em: 29 mar. 2024.

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