Capa da publicação Inteligência Artificial e o Direito
Capa: Paramount

Inteligência Artificial e o Direito

Leia nesta página:

Filmes. Filmes científicos, quem não ama? Robôs, humanoides etc. Enfim, máquinas. Claro que tal definição, “máquina” , é bem simplista. Muito mais sobre “Nada substitui, ou substituirá, o ser humano (espécie humana)”. Dos deuses (panteão) ao Deus (monoteísmo) e , por fim, o antropocentrismo (o ser humano como o centro de tudo).

Filmes dos anos de 1950, 1960 etc. A imaginação humana sobre ser criador de. Criador sem ser criado, por um ser soberano. Em Star Trek II, A Ira de Khan, a capacidade da espécie humana em criar vida em planetas desabitados. Segundo Spock, pela sua lógica, em caso de existência de vida, outra vida surgiria, ou seja, a primeira seria exterminada. 

Questões filosóficas representam a base da jornada da espécie humana no orbe. O Direito, produto da espécie humana, evolui conforme o perceber da própria existência. A vida em si, contemporaneamente, tem preço, ainda que se assevere “dignidade”. Os processos em defesa da honra possuem cálculos matemáticos sobre indenizações. Não se pode banalizar o ressarcimento pelos danos sofridos, ou tornar-se-ia uma indústria dos danos morais.

É de se considerar, a indústria dos danos morais é reflexo do preço que se coloca numa possibilidade de auferir vantagem econômica. Essa vantagem pode ser por vários motivos: comprar um carro novo; comprar medicamentos; comprar indumentária representativa de alta classe social. Parece absurdo? Não! Programa Botched. Programa sobre cirurgias plásticas. Num dos episódios, um homem colocou dois silicones em seu peito, após aceitar desafio de colocá-los. Ganhou dólares por colocá-los. Um dos cirurgiões lhe perguntou se aceitaria outro procedimento cirúrgico em troca de dinheiro. Sim, espondeu. Uma mulher, com seios, com silicones dentro, capazes de amassar lata de refrigerante e de esmagar melancia — Americana fica rica esmagando tijolos e melancias com os seios. 

Espere. Melancia, seios e riquezas materiais. E o Direito? Profissionais da área Direito necessitam de ganhar dinheiro, construírem patrimônios para eles e suas famílias. Ganhar causa é também ganhar satisfação pessoal, cliente e, claro, dinheiro para viver com dignidade. Existe a ética para os profissionais de Direito. Questões filosóficas, sociais, antropológicas, as normas, o metajurídico etc. Contemporaneamente, pós Segunda Guerra Mundial, não basta somente o ter; é necessário o ter para si e para o benefício coletivo. Por exemplo, não se pode ter propriedade e achar que pode tudo. Exemplo, no Gigantes da Indústria, do History — gosto de dar exemplos de fácil consulta —, o empresário David Donahoe impediu trem de prosseguir por uma ponte. Quem tem, pode mandar. Era assim no início do século XX, nos EUA. Defensores atuais de livre propriedade e faço como quero não encontram respaldos neste planeta, a não ser em territórios soberanos controlados por ditadores. A função social da propriedade, a responsabilidade social do empreendimento: as consequências dos direitos humanos.

No Supremo Tribunal Federal (STF), o uso da Inteligência Artificial (IA) para agilizar processos, encontrar similaridades entre processos etc. A UNESCO conjuntamente com os seus parceiros (1) desenvolveram um curso on-line global sobre IA e o Estado de Direito.

Do documento Advancement or Impediment? AI and the Rule of Law (2):

O Instituto Alan Turing define sistemas de IA como modelos algorítmicos que executam 'funções cognitivas ou perceptivas no mundo que antes eram reservadas para pensar, julgar e raciocinar seres humanos'.4 A famosa frase de René Descartes que diferencia humanos de outros seres sencientes, je pense , donc je suis, vem à mente neste contexto e pode ser visto como encapsulando os medos em torno da IA e seu potencial para rivalizar com a inteligência humana. 

(...)

Os sistemas de IA são cada vez mais implantados para traçar o perfil de pessoas e áreas geográficas e para determinar a probabilidade de uma pessoa reincidir ou de um crime ser cometido em uma área específica.

Esse uso de sistemas de IA é classificado como 'alto risco' de acordo com o projeto de lei de IA da UE. O uso de sistemas de IA para esse fim pode representar uma ameaça direta aos princípios do estado de direito, como igualdade perante a lei, presunção de inocência e não discriminação. Seu uso foi contestado por inúmeras organizações da sociedade civil e, em 1º de março de 2022, Fair Trials, European Digital Rights (EDRi) e 43 outros emitiram uma declaração coletiva pedindo a proibição de sistemas de policiamento preditivo sob o Artigo 5 da futura Lei de IA. 26 O policiamento preditivo, nesse sentido, envolve o uso de sistemas de IA para identificar indivíduos ou grupos com maior probabilidade de cometer crimes ou áreas nas quais os crimes têm maior probabilidade de ocorrer. Isso apresenta vários dilemas legais e éticos e representa uma ameaça ao princípio do estado de direito da igualdade perante a lei. (Tradução livre).

Bem assustador:

Inteligência artificial prevalece na previsão de decisões do STF - Algoritmo pode revelar as melhores estratégias para os demandantes (3). 

O novo estudo se baseia em um conjunto de dados muito mais rico para prever o comportamento de qualquer conjunto de juízes a qualquer momento. Os pesquisadores usaram o banco de dados da Suprema Corte , que contém informações sobre casos que datam de 1791, para construir um algoritmo geral para prever o voto de qualquer juiz a qualquer momento. Eles se basearam em 16 características de cada voto, incluindo o juiz, o prazo, a questão e o tribunal de origem. Os pesquisadores também acrescentaram outros fatores, como se os argumentos orais foram ouvidos.

Para cada ano de 1816 a 2015, a equipe criou um modelo estatístico de aprendizado de máquina chamado floresta aleatória. Ele examinou todos os anos anteriores e encontrou associações entre as características do caso e os resultados da decisão. Os resultados da decisão incluíram se o tribunal reverteu a decisão de um tribunal inferior e como cada juiz votou. O modelo então analisou as características de cada caso para aquele ano e previu os resultados da decisão. Finalmente, o algoritmo foi alimentado com informações sobre os resultados, o que lhe permitiu atualizar sua estratégia e passar para o próximo ano.

De 1816 a 2015, o algoritmo previu corretamente 70,2% das 28.000 decisões do tribunal e 71,9% dos 240.000 votos dos juízes , relatam os autores no PLOS ONE . Isso supera a popular estratégia de apostas de "sempre adivinhar o contrário", que tem sido o caso em 63% dos casos da Suprema Corte nos últimos 35 mandatos. Também é melhor do que outra estratégia que usa decisões dos 10 anos anteriores para ir automaticamente com uma previsão "reversa" ou "afirmativa". Mesmo especialistas jurídicos experientes têm apenas cerca de 66% de precisão na previsão de casos , segundo o estudo de 2004. “Toda vez que mantivemos a pontuação, não foi uma imagem muito bonita para os humanos”, diz o principal autor do estudo, Daniel Katz.

(...) construir um algoritmo geral para prever o voto de qualquer juiz a qualquer momento. Por mais que se fale em isenção dos juízes e desembargadores, a subjetividade. E pela subjetividade o Direito pode ou não refletir os anseios sociais ou de algumas comunidades oprimidas pela maioria. Por exemplo, nos EUA a Suprema Corte dos EUA decidiu pelo não aborto. EUA é Confederação, e cada Estado pode editar suas leis sobre aborto, mesmo com a decisão da Corte. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) quando decide, decide, por previsão na CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 (CRFB de 1988). Se decide pelo não aborto, em quaisquer circunstância, pelo direito à vida, aborto é crime, em qualquer lugar do Brasil. Nos EUA, a possibilidade de fazer aborto em Estado da Confederação que não considera crime o aborto. Notem. Tanto nos EUA quanto no Brasil há relativização sobre direito à vida — no Brasil, caso a gestante corra risco de vida, e não pode abortar, a vida da gestante é relativizada; nos EUA, cada Estado decidirá pela relativização da vida, a gestante ou o nascituro. No perigo de vida para a gestante, duas vidas, dela e do nascituro, sendo uma a morrer e outra a viver. Desse exemplo de relativização do direito à vida, a Inteligência Artificial (IA) poderia verificar e indicar os países para empreender, fazer aborto etc. pelas legislações locais. Menos impostos? País “B”. Flexibilidade legislativa para comercializar cigarros de tabaco? País “C”. Menores indenizações em casos de danos ambientais? País “D”. O Direito é uma possibilidade, um fim, não um meio. 

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O Direito deve ser o meio para se atingir um fim, a dignidade humana. A Inteligência Artificial (IA) vasculha, compara, indica o melhor investimento, a melhor possibilidade de se fazer etc. Com os direitos humanos na inteligência Artificial (IA), as respostas poderão ser menos individualistas e mais coletivistas. Pensemos num escritório de advocacia num país. Nesse país um empresário quer vender seu produto em outro país para expandir o seu negócio e ter mais lucros. A Inteligência Artificial (IA) encontra país cujas leis consumeristas são flexíveis, ou quase inexistentes, para futuros empreendimentos. Não há necessidade de informação pormenorizada sobre o uso do produto. Por exemplo, um achocolatado vitaminado. Tem boa porcentagem de leite em pó. É adicionar água e servir. 

A empresa interessada, após consulta do escritório de advocacia — a Inteligência Artificial (IA) encontra país cuja legislação consumerista não é “exigente” nas informações aos consumidores. Além disso, a subnutrição é alta nesse país — informa o cliente sobre o país “menos burocrático”. Filial nesse país e produções do achocolatado. Ocorre, infelizmente, que esse país não tem água potável para a maioria da população. A única informação no rótulo do produto é “adicione três colheres de sopa para ter 300 ml do achocolatado pronto para o consumo”. A publicidade do produto é “Acabe com a subnutrição na sua família e viva bons momentos com ela. Zelamos pela saúde”.

Não existe responsabilidade social da empresa aos consumidores independentemente do país? Os advogados não são responsáveis pela dignidade de qualquer população? 

No Brasil, por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor (LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990):

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

(...)

IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

Não existe responsabilidade social da empresa aos consumidores independentemente do país? Os advogados não são responsáveis pela dignidade de qualquer população? Se existe a internacionalização dos direitos humanos, por considerar o ser humano como um fim em si mesmo, a espécie humana é um fim em si mesmo. Não é possível isentar de culpa os advogados e o fornecedor pelas informações fornecidas pela Inteligência Artificial (IA) sobre país menos burocrático. Antes da Inteligência Artificial (IA), escritórios de advocacia pesquisavam legislações de outros países, já que envolve risco econômico para o empresário, para favorecer o cliente (empresário). Falta de ética? Depende do entendimento. Se advogados agem conforme legislações internas, a ética profissional. No caso do achocolatado em outro país, sem água potável, o escritório de advocacia agiu eticamente, pois não infringiu legislação local. Aplicaram o Direito. No entanto, o Direito contemporâneo é, assim se espera, coeso com os direitos humanos, e esses direitos são universais. Pensemos. Na Terra é crime o estupro de vulnerável. Fora da Terra não é crime? Se positivo, o ser humano não é um fim em si mesmo, mas um meio. Logo, o Estado de Direito pode servir para práticas antidireitos humanos, quando não há os direitos humanos.


NOTAS

(1) — UNESCO. Inteligência Artificial e o Estado de Direito. Disponível em: https://www.unesco.org/en/artificial-intelligence/rule-law

(2) — Global Europe. Advancement or Impediment? AI and the Rule of Law. Disponível em: https://www.iiea.com/images/uploads/resources/Advancement-or-Impediment-AI-and-the-Rule-of-Law.pdf

(3) — Science. Artificial intelligence prevails at predicting Supreme Court decisions. Disponível em: https://www.science.org/content/article/artificial-intelligence-prevails-predicting-supreme-court-de...

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos