A natureza antidemocrática do hate speech

Uma análise do caráter antidemocrático do discurso de ódio.

26/07/2023 às 17:24
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Resumo:

O presente artigo tem como objetivo expor e analisar o fenômeno do hate speech e seu caráter antidemocrático. Tomando por base as teorias contemporâneas sobre a democracia atual, buscou-se desde o primeiro capítulo identificar o discurso de ódio como atitude perniciosa ao processo democrático. Assim, no primeiro capítulo, a disseminação do ódio pelos novos meios de comunicação torna impossível a convivência democrática, pois impede o diálogo. No segundo capítulo, o discurso de ódio é analisado dentro da tensão dos limites constitucionais da liberdade de expressão, pois por suas características tornou-se um abuso deste direito. No terceiro capítulo, tentou-se isolar o cerne da vivência democrática contemporânea, recorrendo aos principais estudiosos sobre o tema para, a partir daí, demonstrar a inadequação do discurso de ódio no processo democrático. Para a presente análise, foi empregado o método dedutivo, partindo da análise de legislações, documentos bibliográficos, através dos quais se pode analisar os limites à liberdade de expressão face ao objetivo maior, que é a vida democrática. Justifica-se a presente pesquisa ante o fato do crescimento exponencial desta prática pelos atuais meios eletrônicos de comunicação e com estes a mobilização popular pela polarização, a comprometer a vida democrática. Concluiu-se que o hate speech ou discurso de ódio atinge as bases, os fundamentos, da democracia, pois acelera a polarização ideológica e inibe a liberdade política.

Palavras-chave: Direito Constitucional - Democracia - Discurso de ódio - Liberdade de Expressão.

Abstract:

This article aims to expose and analyze the phenomenon of hate speech and its undemocratic character. Based on contemporary theories about current democracy, we sought from the first chapter to identify hate speech as a pernicious attitude to the democratic process. Thus, in the first chapter, the dissemination of hatred by the new media makes democratic coexistence impossible, as it prevents dialogue. In the second chapter, hate speech is analyzed within the tension of the constitutional limits of freedom of expression, because by its characteristics it has become an abuse of this right. In the third chapter, an attempt was made to isolate the core of contemporary democratic experience, using the main scholars on the subject to, from there, demonstrate the inadequacy of hate speech in the democratic process. For the present analysis, the deductive method was used, starting from the analysis of legislation, bibliographic documents, through which the limits to freedom of expression can be analyzed in the face of the greater objective, which is democratic life. The present research is justified in view of the exponential growth of this practice by the current electronic means of communication and with these the popular mobilization by polarization, compromising democratic life. It was concluded that hate speech or hate speech reaches the bases, the foundations, of democracy, as it accelerates ideological polarization and inhibits political freedom.

Keywords: Constitucional law – Democracy - Hate Speech - Freedom of expression.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo visa expor e analisar o fenômeno do hate speech ou discurso de ódio, sob o contexto democrático contemporâneo, tentando demonstrar sua inadequação à vida democrática.

A partir do levantamento de algumas características prejudiciais à vida democrática que se pode atribuir ao hate speech, é possível chegar a essa conclusão. A primeira delas é o prejuízo ao diálogo, vez que a prática surge como uma ideologia de negação, onde nega-se as diferenças, o conhecimento e, consequentemente, o diálogo torna-se impossível. Não suporta-se a democracia e fundamentam-se na ignorância e intolerância. A partir do momento em que esse direito se materializa de modo a incitar violência, ódio, intolerância e desprezo sobre determinado grupo, há uma extrapolação do direito à liberdade de expressão e passar a estar inserido no discurso de ódio.

A segunda ideia é que o hate speech leva à imposição de ideias manifestação com apologia à violência e discriminação de pessoas em razão de suas características, seja pela cor de sua pele, por sua religião, orientação sexual, posicionamento político e por diversos outros motivos, onde nega-se a diversidade e incita a violência física e moral contra as vítimas, movidos por um pensamento de que não deveriam fazer parte da sociedade.

A disseminação de opiniões carregadas de ódio e repulsa direcionada a determinado grupo faz com que haja uma redução da participação do indivíduo no meio social do Estado, pois as vítimas se sentem coagidas. A troca de ideias, opiniões dão lugar à discursos duros, carregados de ofensa e que, quando não são contidos, se tornam contundentes ao ponto de causar uma agressão física, moral.

Em cada um destes pontos, que poderiam ser mais, se o espaço e o tempo de pesquisa permitissem a exploração do tema, é possível deduzir a inadequação do discurso de ódio como prática da vida democrática.

A intenção desse artigo é abordar como o hate speech se manifesta, quais são seus efeitos na sociedade e como a prática prejudica o desenvolvimento do Estado como um regime democrático de Direito..

2. DISCURSO DE ÓDIO E IMPOSSIBILIDADE DE DIÁLOGO

O discurso de ódio representa uma grave ameaça à cidadania, dado ao fato de que silencia o processo comunicacional e busca inferiorizar a vítima, baseando-se na intolerância. Segundo Signates (2018, p. 6) o conflito e contradições na democracia fazem parte do jogo democrático, no entanto, no caso do discurso de ódio, o que acontece é a incomunicabilidade da cidadania. A comunicação deve manifestar-se com base em conhecimento democrático, relacional e sob negociação de sentidos, onde há a capacidade de ouvir e ser ouvido. Numa democracia, a liberdade surge como um direito garantido a cada cidadão de não ser impedido de exercer suas faculdades e, por isso, a tolerância política é indispensável para a manutenção das relações entre as minorias e as maiorias.

Existem diversas formas de exteriorizar a liberdade de expressão e, por vezes, em decorrência das diferenças, o meio utilizado para se comunicar acaba por inferiorizar uma pessoa devido suas crenças políticas, religiosas, opção sexual e por diversos outros motivos, o que caracteriza o discurso de ódio. Surge como uma ideologia de negação, onde nega-se as diferenças, o conhecimento e, consequentemente, o diálogo torna-se impossível. Não suporta-se a democracia e fundamentam-se na ignorância e intolerância.

Signates (2018, p. 6) afirma que a comunicação faz parte dos relacionamentos sociais, da busca por legitimidade, essencial para a construção da identidade e condição fundante do processo democrático. O autor afirma, ainda, que a comunicação é criadora de diversos espaços simbólicos de interação.

Interessante observar como a comunicação, seja em sua versão institucional e sistêmica, seja como processualidade social de trocas simbólicas, faz-se presente como elemento aferidor da condição democrática. Onde quer que se pense o jogo democrático em funcionamento, pode-se surpreender a comunicação como categoria analítica fundamental.

Para o autor, é através da comunicação que os cidadãos podem debater sobre suas realidades, de modo a participar de modo ativo na democracia. No caso do discurso de ódio, o diálogo é substituído pela violência radicalizada, onde há apenas disputa de opiniões, formas de opressão.

Uma vez que a sociedade se divide em grupos, os indivíduos procuram se inserir no meio que mais se identificam, seja por crenças religiosas, convicções políticas, etc., distanciando-se de qualquer outro que adote uma postura, um pensamento contrário do que entendem como certo ou normal. Assim, qualquer um que suja desse padrão passa s ser visto como um ‘‘inimigo’’, daí tornam-se alvo do discurso de ódio. O discurso de ódio é caracterizado pela intolerância e tem sua exteriorização a partir de ataques verbas e físicos. Meyer; Pflug (2010, p. 97) o define como ‘‘manifestação de ideias que incitam à discriminação racial, social ou religiosa em relação a determinados grupos, na maioria das vezes, as minorias. Tal discurso pode desqualificar esse grupo como detentor de direitos.’’

Os autores aludem que disseminação de opiniões carregadas de ódio e repulsa direcionada a determinado grupo faz com que haja uma redução da participação do indivíduo no meio social do Estado, pois as vítimas se sentem coagidas. A troca de ideias, opiniões dão lugar à discursos duros, carregados de ofensa e que, quando não são contidos, se tornam contundentes ao ponto de causar uma agressão física, moral. É possível concluir que aquele que propaga o discurso de ódio não é dotado de senso crítico e que cria-se uma rede de apoio onde aqueles que partilham do mesmo pensamento também propagam o ódio e a intolerância. Não há qualquer abertura para aceitação daquilo que consideram diferente. Existe apenas desprezo, ódio em razão de características relacionadas a crença, condição econômica, entre outros.

Pessoas extremistas acreditam que possuem amplo conhecimento sobre diversos assunto e fazem dessa crença uma justificativa da sua visão, preferindo manter sua polarização. O extremismo aliena e as pessoas alienadas tendem a não ser receptivas para novas informações ou mudanças. Independente de posicionamento, os extremistas sobrevalorizam o seu conhecimento sobre diversos temas (SCHKADE et al, 2010, p. 22). Não é incomum pessoas escolherem, de maneira seletiva, os argumentos que melhor os convêm para defender suas convicções. Para Hardin (2002, p. 3), as pessoas confiam em informações sobre questões políticas que advém dos grupos que se identificam e ignoram outras fontes.

O atual cenário político brasileiro deixou de ser uma discussão política partidária e tornou-se um ambiente de ataque à democracia. O fanatismo torna os indivíduos irracionais, entram numa devoção cega e, por muitas vezes, rígida, uma vez que defendem tanto o seu ponto de vista que são incapazes de ouvir e aceitar argumentos opostos. A única verdade que pode existir é a sua, o que ela pensa e pessoas que vão em contrário, estão erradas em todos os campos do pensamento e das relações sociais. A agressividade e o ódio ganham lugar e, como consequência, trazem medo aos indivíduos, de modo que deixam de expor suas opiniões e ideologias. Sobre o tema, Habermas (2003, p. 164) menciona que:

Os direitos políticos procurados têm que garantir, por isso, a participação em todos os processos de deliberação e de decisão relevantes para a legislação, de modo a que a liberdade comunicativa de cada um possa vir simetricamente à tona, ou seja, a liberdade de tomar posição em relação a pretensões de validade criticáveis.

A política funciona como um sistema onde o poder comunicativo deve ser elaborado a partir de processos argumentativos acessíveis à todos e por todos, livres de coação, norteado pelo princípio da dignidade humana e da liberdade de manifestação do pensamento. Nesse sentido, Habermas (2003, p. 158) explica:

[...] O princípio da democracia resulta da interligação que existe entre o princípio do discurso e a forma jurídica. [...] Ela começa com a aplicação do princípio do discurso ao direito a liberdades subjetivas de ação em geral - constitutivo para a forma jurídica enquanto tal - e termina quando acontece a institucionalização jurídica de condições para um exercício discursivo da autonomia política.

Assim, o sistema só será de fato uma democracia quando se pautar num procedimento discursivo construído sobre o respeito aos direitos fundamentais, tornando efetiva a participação dos cidadãos em debates, diante de uma condição de igualdade. A liberdade comunicativa está referida, antes de qualquer institucionalização, a condições de um uso da linguagem orientado pelo entendimento, ao passo que as autorizações para o uso público da liberdade comunicativa dependem de formas de comunicação asseguradas juridicamente e de processos discursivos de consulta e de decisão.

3. O DISCURSO DE ÓDIO VIOLA OS LIMITES DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO?

De acordo com o autor Claudomiro Batista de Oliveira Junior (2008, p. 4), com a evolução histórica do constitucionalismo, foi construída ao longo do tempo a ideia e necessidade de fortalecer e proteger os direitos dos homens, bem como a sua dignidade. Assim, em 1988, nasce a Constituição Cidadã, estabelecendo como um dos seus fundamentos o pluralismo político e destacou o direto à liberdade como uma garantia inviolável.

O direito à liberdade de expressão encontra-se ligado às garantias fundamentais elencadas pelo art. 5o da Constituição Federal de 1988, sendo um dos princípios mais antigos, com origem no início da Idade Moderna.

Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, liberdade, igualdade, segurança e a propriedade, nos termos seguintes: IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. (BRASIL, 1988)

A liberdade de expressão vem como fruto da criação e consolidação do Estado Democrático de Direito, no qual, de acordo com Martins Neto (2008, p. 27), visa cumprir cinco finalidades, como assegurar a autossatisfação pessoal do indivíduo, permitir o avanço do conhecimento e possibilitar a descoberta da verdade, representar uma forma de garantir a democracia, determinar a manutenção do balanço entre a estabilidade e a mudança da sociedade, representar um incentivo ao desenvolvimento e tolerância.

A Declaração Universal de Direito Humanos de 1948, em seu artigo 19o diz que ‘‘Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias [sic] por qualquer meio de expressão.’’ Gilmar Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco (2020, p. 300) afirmam que ‘‘A liberdade de expressão, enquanto direito fundamental, tem, sobretudo, um caráter de pretensão a que o Estado não exerça censura. Não é o Estado que deve estabelecer quais as opiniões que merecem ser tidas como válidas e aceitáveis; essa tarefa cabe, antes, ao público a que essas manifestações se dirigem. Daí a garantia do art. 220 da Constituição brasileira.’’

Art. 220 A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 2o - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. (BRASIL, 1988)

Edilsom Farias (2004, p. 64) defende que a liberdade de expressão possui duas perspectivas: uma, de natureza subjetiva, no qual a liberdade de expressão é indispensável para a proteção da dignidade humana e para o livre desenvolvimento do homem; outra, de natureza objetiva, que diz respeito ao grau de diversidade dos pontos de vista expressos na sociedade e da sua pertinência com assuntos de interesse público. Partindo da afirmação de que a liberdade de expressão pode ser demonstrada de diversas formas, sendo vedado qualquer forma de impedimento quanto ao seu exercício. Ao falar da liberdade de expressão, tem-se o entendimento de que toda manifestação de opinião é válida, no entanto, os incisos IV, X e XII do art. 5o, da Constituição Federal de 1988, impõe um ‘‘limite’’ em tal liberdade, a fim de impedir que viole a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, preservando a dignidade da pessoa humana.

Sob a perspectiva de Sarlet (2010, p. 511) ainda que a liberdade de expressão seja essencial para a consagração do Estado democrático de Direito, o ordenamento jurídico brasileiro não atribui imunidade absoluta a tal direito, nem estabelece hierarquia entre as normas fundamentais. A escolha de como se expressar é limitada pelas normas constitucionais, vez que há outros valores prestigiados pela Constituição Federal de 1988, como a dignidade humana e o direito da personalidade. A liberdade de expressão não pode ser usada para manifestações que incite práticas ilícitas, como apologia ao crime, antissemitismo, entre outras. A proteção à liberdade de expressão, no que tange à incitação ao ódio, é fortemente confrontada pelo princípio da isonomia e da dignidade da pessoa humana (FERNANDES, 2011, p. 427).

O Pacto Internacional de Direitos Civil e Políticos de 1966, em seu artigo 20, prevê a possibilidade de restringir a aplicação do direito à liberdade de expressão em favor da proteção da segurança coletiva e do respeito a outros direitos individuais. Ainda limita o exercício da liberdade de expressão, proibindo propagandas em favor de guerra, bem como ‘‘apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, hostilidade, ao crime e à violência.’’

A liberdade de expressão não está pautada no ‘‘falar o que quer, como quer’’, há a necessidade de avaliar se o que está sendo dito fere ou não alguns direitos fundamentais expressos na Constituição Federal de 1988 e no que diz respeito à dignidade humana. Assim, ao expressar uma opinião que discrimina ou com intuito de violentar uma pessoa ou um grupo em virtude de nacionalidade, religião ou outra característica, há uma violação da liberdade de expressão e da dignidade humana, vindo a caracterizar o discurso de ódio (SARLET, 2010, p. 23).

É nessa linha tênue do limite da liberdade de expressão que o discurso de ódio se insere. Segundo Brugger (2010, p. 151) discurso de ódio, consiste na intenção de humilhar e calar determinado grupo minoritário, de modo a ser discrepante com a finalidade social do direito à liberdade de se expressar. E é justamente por estar tão próximo da liberdade de expressão que surge a necessidade de impor limites ao seu exercício.

O jurista Marcus Vinicius Furtado Coêlho (2011) disserta que ‘‘a liberdade de expressão é um direito fundamental consagrado na Constituição Federal de 1988, no capítulo que trata dos Direitos e Garantias fundamentais e funciona como um verdadeiro termômetro no Estado Democrático. [...] Ela serve como instrumento decisivo de controle de atividade governamental e do próprio exercício do poder.’’ Assim, ‘‘o princípio democrático tem um elemento indissociável que é a liberdade de expressão, em contraposição a esse elemento, existe a censura que representa a supressão do Estado democrático. A divergência de ideias e o direito de expressar opiniões não podem ser restringidos para que a verdadeira democracia possa ser vivenciada.’’

O jurista acrescenta que ordenamento jurídico brasileiro tem como um de seus valores e fundamentos a proteção da dignidade humana e veda todo e qualquer ato discriminatório e violador de direitos e liberdades fundamentais. A luz da democracia brasileira, a liberdade de expressão garante o direito do indivíduo de se manifestar mas observando os limites da intolerância, afim de impedir a extrapolação do direito.

De acordo com Silva et al. (2011, p. 445), o discurso do ódio extrapola os limites do bom senso, uma vez que seu objetivo nada mais é do que promover a violência, a discriminação e o preconceito e aquele que profere discurso de ódio tem a crença de que se pode dizer tudo que pensa em qualquer situação. O Comitê de Ministros do Conselho da Europa define o discurso de ódio como ‘‘[...] todas as formas de expressão que propaguem, incitem, promovam ou justifiquem ódio racial, xenofobia, antissemitismo e outras formas de ódio baseado na intolerância, incluindo intolerância expressa por nacionalismo ou etnocentrismo agressivo, discriminação e hostilidade contra minorias, migrantes e pessoas de origem migrante.’’

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A doutrina majoritária não é favorável a nenhuma restrição ao direito à liberdade de expressão, mas defende que a partir do momento em que há ofensa, é preciso existir impedimento legal para determinado comportamento. O filósofo Stuart Mill (2011, p. 14) defende que a restrição à liberdade de expressão só é válida quando determinada opinião constituir incitação à violência. Mill adotava o pensamento de que o agir deveria ser sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar. Assim, em colaboração com o jurista e filósofo Jeremy Bentham (1748-1873), Mill desenvolveu o princípio do utilitarismo, uma doutrina ética que se fundamenta na ideia de que se uma ação gera felicidade, ela está correta mas se gera infelicidade, está errada. Assim, a sociedade só poderia interferir na liberdade dos indivíduos para prevenir danos a terceiros (2016, p. 2).

Tal princípio baseia-se na ideia de que o agente moral deve pensar antes de agir, pois se sua ação causa dano a outro, ela está errada. Assim, Mill (2011, p. 26) desenvolveu o princípio do dano alheio, onde sustenta que as ações de um indivíduo somente podem ser restringidas quando causar dano a outros e argumenta que ‘‘ [...] o único fim para o qual as pessoas têm justificação, individual ou coletivamente, para interferir na liberdade de ação de outro, é a autoproteção. É o princípio de que o único fim em função do qual o poder pode ser corretamente exercido sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra a sua vontade, é o de prevenir dano a outros.’’

O filósofo defende ainda que ‘‘a única liberdade que merece o nome é a liberdade de procurar o nosso próprio bem à nossa própria maneira, desde que não tentemos privar os outros do seu bem, ou colocar obstáculos aos seus esforços para o alcançar. [...] As pessoas têm mais a ganhar em deixar que cada um viva como lhe parece bem a si, do que forçando cada um a viver como parece bem aos outros (2011, p. 28)’’

Já para o jurista Daniel Sarmento (2007, p. 41), a proibição do hate speech não é uma solução para os problemas oriundas desta prática, vez que a minoria não passa a ser reconhecida e a desigualdade não simplesmente desaparece. É de extrema relevância que o Estado tenha um posicionamento firme contra a prática do discurso, vez que a omissão pode, de certa forma, ‘‘encorajar’’ o ofensor, já que não há medida coercitiva para impedi-lo de praticar o discurso, Segundo Sarmento, ‘‘dor e a sensação de abandono dos alvos destas manifestações tende a ser amplificada, e o símbolo que fica – e todos sabemos da importância dos símbolos na vida social – é o de um Estado cúmplice da barbárie.’’

Sarmento (2007, p. 41) acrescenta que atuação estatal é essencial para combater a prática do hate speech, muito embora, no Brasil, não há um tratamento jurídico específico para o discurso de ódio. A divulgação de condenações baseadas em acusações da prática do discurso não é um elemento suficiente para conscientizar os indivíduos mas é um meio de transmitir a mensagem da intolerância desses discursos pelo Estado.

A cerca das decisões em casos relacionados ao discurso de ódio no Brasil, há o HC 82.424, envolvendo Siegfried Ellwanger Castran, um escritor brasileiro que foi denunciado em 1991 pela prática de racismo por intolerância racial contra judeus. O STF, ao decidir sobre a questão, levantou questionamento sobre o conflito entre a liberdade de expressão e os direitos humanos.

HABEAS-CORPUS. PUBLICAÇÃO DE LIVROS: ANTI-SEMITISMO. RACISMO. CRIME IMPRESCRITÍVEL. CONCEITUAÇÃO. ABRANGÊNCIA CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. LIMITES. ORDEM DENEGADA. [...] 11. Explícita conduta do agente responsável pelo agravo revelador de manifesto dolo, baseada na equivocada premissa de que os judeus não só são uma raça, mas, mais do que isso, um segmento racial atávica e geneticamente menor e pernicioso. 12. Discriminação que, no caso, se evidencia como deliberada e dirigida especificamente aos judeus, que configura ato ilícito de prática de racismo, com as conseqüências [sic] gravosas que o acompanham. 13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. 14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5o, § 2o, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica [...] (BRASIL, 2003)

Durante o julgamento do caso em análise, o Ministro Gilmar Mendes defendeu que os limites da liberdade de expressão devem ser aplicados com observância ao princípio da proporcionalidade e deve ser ponderado com outros direitos previstos no ordenamento jurídico, ‘‘a liberdade de expressão, incluindo a liberdade de imprensa, é fundamental para uma democracia. Se a democracia é definida como controle popular do governo, então, se o povo não puder expressar seu ponto de vista livremente, esse controle não é possível. Não seria uma sociedade democrática. Mas, se igualmente, o elemento central da democracia é o valor da igualdade política. (...) Uma sociedade que objetiva a democracia deve tanto proteger o direito de liberdade de expressão quanto o direito à não-discriminação. Para atingir a igualdade política é preciso proibir a discriminação ou a exclusão de qualquer sorte, que negue a alguns o exercício de direitos, incluindo o direito à participação política’’ (BRASIL, 2003, p. 650).

Os Ministros Carlos Velloso, Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Maurício Corrêa, Nelson Jobim e Sepúlveda votaram contra a concessão do Habeas Corpus e pela identificação do hate speech. O Ministro Celso de Mello afirmou que ‘‘aquele que ofende a dignidade pessoal de qualquer ser humano especialmente quando movido por razões de fundo racista, também atinge – e atinge profundamente – a dignidade de todos e de cada um de nós’’ e acrescenta que a liberdade de expressão não legítima ofensa à dignidade da pessoa humana, ‘‘a prerrogativa concernente à liberdade de manifestação do pensamento, por mais abrangente que deva ser o seu campo de incidência não constitui meio que se possa legitimar a exteriorização de propósitos criminosos especialmente quando (...) evidente superação dos limites da crítica política ou da opinião histórica transgridem de modo inaceitável valores tutelados pela própria ordem constitucional’’ (BRASIL, 2003).

Em contrapartida, os Ministros Moreira Alves, Carlos Ayres Britto e Marco Aurélio votaram a favor da absolvição de Siegfried Ellwanger Casten, vez que não houve existência do crime de racismo e pela prevalência da liberdade de expressão no caso concreto. O Ministro Moreira Alvez, que foi relator do processo, afirmou que, pelo ponto de vista científico, judeu não era uma raça. Para o Ministro Marco Aurélio, os atos de Ellwanger não constituíram crime, pois estavam amparados pela liberdade de expressão e seu ofício protegido constitucionalmente. Ainda acrescentou que a restrição da liberdade de expressão do paciente não iria assegurar a dignidade do povo judeu (BRASIL, 2003)

Ao final da decisão, foi concluído pela suprema corte que o direito à liberdade de expressão não pode ser usado como argumento para manifestações discriminatórias, para estimula da violência e intolerância contra qualquer grupo humanos, nos quais se incluem os membros da comunidade judaica.

4. O DISCURSO DE ÓDIO NEGA A ESSÊNCIA DA DEMOCRACIA?

Aristóteles (2004, p. 255) definiu o regime democrático como um ‘‘elemento supremo em toda sociedade’’, onde o povo é ‘‘supremo do governo e do regime, pelo fato de formar a grande massa dos cidadãos, constituindo a multidão, e dado que a sua decisão será sempre a maioria, se fazendo assim suprema, e estar sintonizado no sentido de que todos devem possuir o mesmo em termos numéricos, identificando-se, assim, necessariamente, com uma democracia.’’

O filósofo indaga que a democracia é, acima de tudo, determinada pela igualdade, onde nem os ricos nem os pobres são superiores uns aos outros e não há domínio de uma sobre a outra, apenas semelhança (2004, p. 255). Assim, a liberdade passa a ser uma condição dominante da democracia tal como a igualdade, vinculando o princípio da igualdade ao princípio da liberdade. O fundamento do princípio ao fim da democracia, segundo Aristóteles, reside na liberdade (2004, p. 259).

Segundo Rousseau (2002, p. 79), o poder legislativo pertence ao povo. No entanto, tal poder deve ser imposto por atos decorrentes de leis pois ‘‘a força pública de um agente próprio que a reúna e a ponha em funcionamento segundo os rumos da vontade geral, que sirva à comunicação do Estado e do soberano, e faça de alguma forma na pessoa pública o que a união da alma e do corpo faz no homem.’’ O filósofo defende a democracia direta, acreditando que cada indivíduo é capaz de participar das decisões do governo e, assim, fazer prevalecer a soberania popular, afirmando que o governo ‘‘é um corpo intermediário, estabelecido entre os vassalos e o soberano para possibilitar a recíproca correspondência, encarregado da execução das leis e da manutenção da liberdade, tanto civil como política.’’

A fim de garantir a segurança dos indivíduos e privilegiar a sociedade, Rousseau (2002, p. 24) afirma ser preciso estabelecer um pacto social, onde os homens possam somar a força e a liberdade de cada um como instrumentos de sua conservação. Uma sociedade regida por leis e fundada num acordo universal, onde beneficia à todos e organiza-se com base em deveres mútuos, favorecendo a coletividade como um todo.

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A Constituição Federal de 1988 garante a liberdade como um direito fundamental, assim, como preservar a liberdade do indivíduo e garantir a segurança e bem-estar da vida em sociedade ao mesmo tempo? Rousseau (2002, p. 24) responde que a solução para tal problema seria dada pelo contrato social. A ideia que o filósofo traz (2002, p. 26) consiste no pensamento de que a liberdade política decorre da tentativa de fazer com que o homem abra mão da sua liberdade individual em prol da liberdade coletiva.

Ao falar em liberdade, tem-se como regra geral que o homem é possuidor de liberdade plena, mas ao torna-se membro de uma sociedade, deve ser priorizado o bem-estar da comunidade, aprimorando suas potencialidades humanas e desenvolvendo sua natureza racional (ROUSSEAU, 2002, p. 26).

Cada um de nós põe em comum sua pessoa e toda a sua autoridade, sob o supremo comando da vontade geral, e recebemos em conjunto cada membro como parte indivisível de um todo (ROUSSEAU, 2002, p. 25- 26)

Rousseau (2002, p. 24) destaca que a maior dificuldade de impor entre os homens um contrato social onde a liberdade é minimizada em prol do bem comum está em fazer com que os homens abram mal de seus direitos individuais em favor da liberdade coletiva, sendo necessário ‘‘encontrar uma forma de associação que defenda e proteja contra toda força comum, a pessoa e os bens de cada associado e pela qual cada um, unindo-se a todos, apenas obedeça a si próprio, e se conserve tão livre quanto antes.’’

O filósofo afirma que a democracia é a melhor forma de governo, devido sua ligação direta à natureza de associação dos homens e que o gênero humano precisa de união para não perecer e, por isso, forma comunidades. Ainda que abdique de parte de sua liberdade, estabelecendo uma liberdade convencional, as forças individuais devem ser superadas para atender às necessidades de preservação do homem e de seus bens (2002, p. 30-31)

Já para Benjamin Constant (1985, p. 152), há um problema ao exaltar a vontade coletiva causa prejuízos a liberdade individual. Sob termos de necessidade, segundo o autor, a liberdade individual não está sobreposta à liberdade política, pois esta é apenas uma garantia indispensável, assim, ‘‘pedir aos povos de hoje para sacrificar, como os de antigamente, a totalidade de sua liberdade individual à liberdade política é o meio mais seguro de afastá-los da primeira, com a consequência de que, feito isso, a segunda não tardará a lhes ser arrebatada.’’

Por conseguinte, a liberdade política é uma garantia da fruição pacífica da independência privada, pois funciona como via de controle em que o indivíduo exerce sobre a instância política, a fim de observar o governo e não permitir que ameace a liberdade individual. Por isso, há a necessidade de um sistema representativo, para preservar a liberdade individual e a política.

Em primeiro momento, Constant (1985, p. 7) assume o princípio rousseunísta, concordo com o filósofo, quando disse que a ‘‘supremacia da vontade geral sobre toda vontade particular’’ deveria prevalecer. No entanto, ressalta que muitos crimes surgiram sob a prerrogativa da vontade geral e afirma que ‘‘Rousseau criou a liberdade que deu os maiores pretextos à tirania’’. O autor ainda sustenta que tal definição existe apenas na teoria, o que significa que corre o risco de fundamentar a vontade geral numa lei abstrata, desconsiderando a realidade prática da política e afirma que a sociedade caiu nesse erro, ‘‘a lei deve ser a expressão ou da vontade de todos ou da vontade de alguns. Ora, qual seria a origem do privilégio exclusivo que você concederia a essa minoria? Se é a força, a força pertence a quem dela se apossa; ela não constitui um direito e, se você reconhecer como legítima, ela o será igualmente, quaisquer que sejam as mãos que a empunhem, e cada um quererá conquistá-la por sua vez. Se você supuser o poder da minoria sancionado pelo assentimento de todos, esse poder te torna, então, a vontade geral.’’

Independente da forma em que o governo se estabeleça, de acordo com Constant (1985, p. 8) é preciso refletir sobre o que a soberania popular consiste e até onde ela pode ir, de como que mantenha a legitimidade da vontade geral, de como a não se tornar uma calamidade na aplicação. O autor se contrapõe a ideia de Rousseau, onde, segundo o mesmo, ‘‘não aumenta em nada a soma da liberdade dos indivíduos; e se se atribuir a essa soberania uma latitude em que ela não deve ter, a liberdade pode ser perdida apesar desse princípio, ou até por causa desse princípio.’’ Destarte, não é possível gozar da liberdade individual se não observar a natureza da soberania popular, e ao ultrapassar os limites, a liberdade torna-se perdida justamente em nome da própria soberania do povo. O autor (1985, p.23) define o sistema representativo como uma organização ‘‘através da qual cada indivíduo confia a outros o que não pode ou não quer fazer. O homem moderno não tem tempo para preocupar-se com assuntos políticos, mas também não pode deixá-los completamente à deriva, nas mãos de qualquer um’’ e acrescenta ‘‘o sistema representativo é o único sob o qual podemos hoje encontrar alguma liberdade e tranquilidade.’’

A participação política é essencial ao sistema da liberdade individual, o qual inclui-se uma mistura de participação política e independência privada, responsabilidade pública e o desfrute dos prazeres privados da vida. Constant (1985, p. 25) ressalta que a liberdade não está excluída do mundo político, no entanto, não deve ser obrigatória ao indivíduo e sim, uma forma de atraí-lo, de maneira a encontrar uma forma de relaciona-se politicamente e acrescenta ser preciso encontrar uma outra forma de democracia, uma onde o indivíduo possa contribuir e participar de acordo com a sua vontade, mas ‘‘não fervorosamente como os antigos, pois isso não é mais uma paixão moderna.’’ Portanto, a representação é o que permite que o indivíduo seja cidadão, atuando no domínio político, e ‘‘ao mesmo tempo, é a própria representação que, ao liberar o cidadão da vida política intensa e direta, proporciona a vida individual e privada.’’

Constant (1985, p. 153) prioriza a independência individual, sob a alegação de ser uma ‘‘necessidade moderna, em oposição à necessidade dos antigos pela liberdade política’’, vez que o indivíduo não pode ser confundido com a sociedade, isto é, não pode ser reduzido por ela. A cerca dos direitos individuais, o autor as elenca de forma específica, sendo elas: liberdade pessoal, liberdade religiosa, liberdade de opinião e livre gozo da propriedade. O direito à liberdade individual decorre de um conflito entre a autonomia do indivíduo e a vida em sociedade e na ordem pública.

Tocqueville (2004, p. 172) critica o pensamento adotado por Constant, pois acredita que estão ‘‘preocupados unicamente com fazer fortuna, não percebem mais o vínculo estreito que une a fortuna particular de cada um deles à prosperidade de todos. Não é necessário arrancar de tais cidadãos os direitos que possuem; eles próprios os deixam escapar naturalmente. O exercício de seus deveres políticos lhes parece um contratempo incômodo que os distrai de sua indústria. Se se trata de escolher seus representantes, de dar mão forte à autoridade, de cuidar em comum da coisa comum, falta-lhes tempo: não seriam capazes de dissipar esse tempo tão precioso em trabalhos inúteis; [...] Essa gente crê seguir a doutrina do interesse, mas só têm dela uma ideia grosseira e, para zelar melhor pelo que chamam seus negócios, negligenciam o principal, que é permanecer donos de si mesmos.’’

Alexis de Tocqueville (2004, p. 408) definiu a liberdade como uma arte humana, onde a existência de uma liberdade política, elemento essencial para um Estado democrático, é necessário haver ação humana. Acrescenta que a soberania do povo é guiada pela igualdade de condições. Entretanto, alerta que só a igualdade não é suficiente para garantir tal soberania, pois ‘‘a igualdade de condições pode conduzir um povo para a democracia ou para o despotismo’’, assim, a liberdade deve estar atrelada à igualdade para que a soberania popular exista de fato.

Segundo Tocqueville (2004, p. 392) quando um cidadão deixa de pensar coletivamente e prioriza as necessidades particulares, acaba ameaçando a soberania do povo, pois negligenciam a liberdade política e, por consequência, caem gradualmente no nível de humanidade. A falta de compromisso com o bem comum, segundo o filósofo, é um vício da democracia, ausente de civismo, que pode vir à corromper a democracia gradativamente, usurpando a liberdade política dos cidadãos.

O filósofo (2005, p. 294) entende que a democracia tem base na soberania popular e se faz presente na vontade da maioria, entretanto, teme a possibilidade da maioria oprimir a minoria. O pensador defende a existência de semelhança entre a onipotência de um homem contra o outro e a maioria tomada contra a minoria, no entanto, contrapõe-se a aplicação descabida do princípio democrático onde os interesses do maior número de cidadãos baseia-se no pretexto de ‘‘tudo pode fazer’’, pois trará riscos a liberdade individual.

Sob à ótica de Hans Kelsen (2000, p. 67-70), democracia não encontra-se voltada ao domínio da maioria sob a minoria e sim em compromisso entre elas. Assim, a fim de proteger a minoria da dominação da maioria, Kelsen adota a ideia de que é preciso estabelecer uma carta de garantia de direitos fundamentais, que vise proteger e garantir a participação de todos na ordem social, bem como na criação e aplicação de leis.

A partir das ideias de Kelsen, compreende-se que a base fundamental da democracia é a atuação do povo, por meio do voto livre e igualitário, consubstanciado no princípio do sufrágio universal e consiste em um processo dialético, onde acredita-se que o embate entre maioria e minoria é o caminho para o consenso e solução do conflito.

A discussão livre entre maioria e minoria é essencial à democracia porque esse é o modo de criar uma atmosfera favorável a um compromisso entre maioria e minoria e o compromisso é parte da própria natureza da democracia. O compromisso significa a solução de um conflito por meio de uma norma que não se conforma inteiramente aos interesses de uma parte, nem contradiz inteiramente os interesses da outra. Na medida em que numa democracia, os conteúdos da ordem jurídica também não são determinados exclusivamente pelo interesse da maioria, mas são o resultado de um compromisso entre os dois grupos, a sujeição voluntária de todos os indivíduos à ordem jurídica é mais facilmente possível, que em qualquer outra organização política (KELSEN, 2003, p. 412)

Para Hans Kelsen (2003, p. 406), democracia encontra-se ligada, intrinsecamente, à ideia de liberdade política onde, onde quem participa da criação da ordem política e está sujeito à ela, é politicamente livre. O jurista afirma que ‘‘um indivíduo é livre se o que ele deve fazer, segundo a ordem social, coincide com o que ele quer fazer’’ e acrescenta que a ‘‘democracia significa que a vontade representada na ordem jurídica do Estado é idêntica à vontade dos sujeitos.’’ Portanto, a democracia é marcada pela participação do povo na ordem jurídica. A ideia de liberdade dada por Kelsen (2000, p. 27-28) tem fundamento baseia-se na igualdade, uma vez que a autodeterminação só pode ser concretizada se todos forem iguais, razão pela qual a ideologia política não pode abrir mão de unir liberdade e igualdade.

A liberdade só tem sua sede em um Estado onde o supremo poder pertence ao povo, e não pode existir nada mais doce do que essa liberdade, que não será absolutamente liberdade se não for igual para todos (KELSEN, 2000, p. 168)

Com base nessas características, Kelsen (2003, p. 411-412) define que a democracia tem caráter dialético-discursivo, vez que ‘‘a vontade da comunidade numa democracia é sempre criada através da discussão contínua, entre maioria e minoria, através da livre consideração de argumentos a favor e contra certa regulamentação de uma matéria. Essa discussão tem lugar não apenas no parlamento, mas também, e em primeiro lugar em encontros políticos, jornais, livros e outros veículos de opinião.’’

Ao fazer uma análise sobre as possíveis interpretações sobre a prática democrática, o cientista político norte-americano Robert A. Dahl (2012, p. 3) menciona que, diante do mundo em que vivemos, é preciso traçar um limite no que se entende como democracia. Segundo o cientista político (2012, p. 20) ao avaliar uma sociedade, ‘‘nada se iguala em importância aos atributos de excelência-que ela promove em seus cidadãos’’, isto é, uma boa sociedade é aquela que promove e encoraja que seus cidadãos ajam de forma correta, de modo que o mesmo se aplica à justiça, pois ‘‘uma vez que a justiça é o que tende a promover o interesse comum, uma boa pólis deve também ser justa; e, portanto, deve ter por objetivo desenvolver cidadãos que busquem o bem comum.’’

O bom cidadão, no conceito de Dahl (2012, p. 20-21), é aquele que busca o bem comum no que diz respeito à assuntos públicos e afirma que a vida em sociedade deve ser estruturada de modo a contribuir com o bem comum, devendo as atitudes cívicas serem fortalecidas por constituições e leis, para garantir a ordem social de modo a tornar a justiça alcançável. Dahel (2012, p. 21), assim como Aristóteles, também defendia que para alcançar o bem de todos, a sociedade não pode se dividir em ricos e pobres ou por crenças distintas e sim se viverem juntos em harmonia.

Ainda que a sociedade deva caminhar no mesmo sentido no que diz respeito a construção de sociedade justa, Dahl (2012, p. 22) ressalta que não é preciso que todos tenham interesses em comum ou sejam parecidos ‘‘pois o que é a pólis senão um lugar no qual os cidadãos podem viver uma vida plena sem estar sujeitos ao chamado deveres cívicos a todo instante? Esse é o modo espartano. Não é o nosso. Uma cidade necessita de sapateiros e armadores, carpinteiros e escultores, fazendeiros que cuidem de seus olivais no campo e médicos que cuidem de seus pacientes na cidade. Cada cidadão tem por objetivo algo que pode não ser o objetivo de outrem. Portanto, o bem de cada um de nós pode não ser exatamente o mesmo que o bem dos outros.’’

O cientista político (2012, p. 23) destaca que as diferenças existentes entre cidadãos nunca devem ser tão grandes ‘‘a ponto de não podermos concordar quanto ao que é melhor para a cidade, ou seja, o que é melhor para todos e não somente para alguns’’ e para isso, ‘‘os cidadãos devem ser suficientemente harmoniosos em seus interesses de modo a compartilhar um sentido forte de um bem geral que não esteja em contradição evidente com seus objetivos e interesses pessoais’’ e ‘‘[...] os cidadãos devem ser notavelmente homogêneos no que tange às · características que, de outra forma, tenderiam a gerar conflito político e profundas divergências quanto ao bem comum.’’

O governo democrático depende, de certo modo, das crenças de alguns grupos de pessoas, assim, se uma maioria ou minoria se opuser à uma ideia e preferir outra alternativa, dificilmente, tal grupo se governaria democraticamente. Segundo Dahl (2012, p. 46), um grupo cujo os membros acreditam que todos são mais ou menos qualificados para participar de decisões, ‘‘a probabilidade é relativamente alta de que eles governarão a si próprios por meio de algum outro tipo de processo democrático.’’

Como consequência dessa diversidade, surge as divisões políticas e o conflito torna-se um aspecto inevitável da vida comum e, embora o pensamento e as prática políticas sejam uma característica comum da vida política, há uma preocupação quanto à extensão dos direitos políticos primários. Acredita-se que conforme as diversidades aumentam e o conflito político se torna normal e aceito, os direitos individuais podem ser tidos como substitutos para o consenso político, oferecendo um modo de garantir a todos um espaço livre para tomar decisões políticas comuns (DAHL, 2012, p. 349).

Em contrapartida, John Rawls (2000, p. 42) adota o pensamento de que a concepção de bem comum, numa sociedade marcada pela pluralidade de doutrinas, é um tanto confusa e por isso, não tem uma estrutura sólida. Segundo o filósofo, o liberalismo político acolhe diversas concepções, vez que a própria sociedade decorre da diversidade humana e ‘‘uma concepção política deve basear-se em várias idéias [sic] de bem.’’

O indivíduo, em sua posição original, tem conhecimento de seus bens primários, como liberdade e auto respeito e abraça os meios necessários a protege-los. Na concepção de Rawls (2000, p. 46), a ‘‘representação dos cidadãos como livres e iguais e como racionais e razoáveis corresponde a uma concepção normativa de pessoa que se encontra implicitamente reconhecida nas instituições e práticas de uma democracia constitucional.’’

Mas surge um questionamento, o homem é realmente livre? De acordo com John Locke (1999, p. 1), é da natureza do homem se sentir num estado completo de liberdade, dono das próprias razões, sem precisar da permissão ou sem depender da vontade de qualquer outro homem, ‘‘um estado de perfeita igualdade de direitos e posse’’, portanto, o homem tem como lei natural para se governar, as suas próprias razões. O homem, como um animal racional, onde todos são iguais e independentes, não deve prejudicar a vida do outro, seja na saúde, na liberdade ou nas posses, a fim de preservar toda a humanidade.

Para Locke (1983, p. 15) ‘‘nascemos livres na mesma medida em que nascemos racionais’’, assim, os homens são governados pela razão, onde a liberdade consiste ‘‘em ser livre de todo poder superior sobre a terra e na insubmissão à vontade ou à autoridade legislativa de quem quer que seja e no possuir como norma própria somente a lei da natureza. A liberdade do homem em sociedade consiste em não estar sujeito a outro poder legislativo senão àquele estabelecido por consentimento no Estado nem ao domínio de outra vontade ou a limitação de outra lei se não aquela que este poder legislativo estabelecerá de acordo com a confiança que é nele depositada.’’

Locke (1999, p. 2) conclui que todos os homens nascem livres, mas nem todos escolhem o bem e a estes, que escolhem infringir os direitos dos outros, cabe a aplicação de castigo, pois ‘‘são transgressores. E se esses transgressores não se propõem a viver racionalmente devem ser eliminados como um animal irracional. Para estes não deve haver nenhum tipo de tolerância.’’

Ao viver em sociedade, a liberdade de escolhas do homem é limitada por uma lei estabelecida por um poder destinado ao consentimento dos cidadãos. Locke (1983, p. 36) defende que a liberdade encontra limites legais e, por isso, não deve ser desordenada ou causar prejuízo a dignidade do homem e ressalta que ‘‘para impedir a todos os homens que invadam os direitos dos outros e que mutuamente se molestem, e para que se observe a lei da natureza, que importa na paz e na preservação de toda a Humanidade, põe-se, naquele estado, a execução da lei da natureza nas mãos de todos os homens, mediante a qual qualquer um tem o direito de castigar os transgressores dessa lei em tal grau que lhe impeça a violação [...]’’

Locke (2003, p. 187-188) classifica as opiniões e ações humanas em: opiniões especulativas e cultos divinos; opiniões que dizem respeito à sociedade; e aquelas que também dizem respeito à sociedade mas são eivadas de vícios e desvirtuadas. Segundo o filósofo, apenas as opiniões do primeiro tipo, de cunho religioso, tem o direito absoluto de tolerância. As opiniões de segundo e terceiro tipo podem ser toleradas, mas apenas quando não causarem ‘‘distúrbios ao Estado ou forem inconvenientes à comunidade.’’

O filósofo evidencia que a liberdade de consciência deve ter limites bem definidos, vez que ‘‘a consciência ou persuasão do indivíduo não pode possivelmente ser a medida pela qual o governo pode ou deveria enquadrar suas leis, as quais deveriam ser adequadas ao bem de todos seus indivíduos, e não às persuasões de uma parte, as quais frequentemente sendo contrárias umas das outras devem produzir leis contrárias’’ (2003, p. 191).

Na busca pela defesa da tolerância, a visão de Locke torna-se um pilar fundamental no estudo da liberdade de expressão, onde pactuava que a aceitação da diversidade de opiniões e pensamentos era o caminho para evitar guerras. O filósofo admite que cabe ao governo vetar ou proibir a manifestação de opiniões odiosas, mas que o Estado não pode fazer isso forçando o indivíduo à renunciar suas crenças e convicções e concordar com a parte contrária, pois ao invés de garantir a segurança civil e a paz, iria torna-los inimigos do Estado (2003, p. 192).

Ao passo que a liberdade de consciência deve ser protegida como um direito natural do ser humano, o direito de impor leis é uma das maiores prerrogativas do Estado e ambos devem trabalhar juntos para que nem o indivíduo e nem o Estado extrapolem suas prerrogativas sob o argumento de justiça. Locke ainda ressalta que não cabe ao Estado interferir nos vícios e virtudes morais dos indivíduos, mas somente deverá fazer quando tais vícios provocarem desordem civil (2003, p. 195).

Sob a ótica de Noberto Bobbio (2010, p. 36) a democracia deve conciliar a liberdade e o poder, vez que só haverá democracia se o Estado for organizado e eficiente e os indivíduos poderem vivenciar sua liberdade. No entanto, o filósofo político, explica que a grande dificuldade da democracia está em encontrar uma paridade entre a liberdade e o poder do Estado.

Os direitos individuais e a democracia, para Bobbio (2013, p. 142), são interdependentes, de modo que um condiciona a efetivação do outro, bem como os direitos e a liberdade determinam o tipo do sistema democrático estabelecido. Assim, os ‘‘direitos humanos, democracia e paz são três momentos necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos humanos reconhecidos e efetivamente protegidos não há democracia; sem democracia não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos.’’ Bobbio (2013, p. 143) ressalta que para alcançar a paz, os direitos humanos devem estar associado à um tipo de regime: a democracia. O vínculo entre os direitos humanos e a democracia ‘‘repousam, em primeiro lugar, sobre uma concepção comum da liberdade’’, já que tanto na tradição dos direitos humanos como na democracia, a ‘‘liberdade política se define pela autonomia do indivíduo’’.

Os direitos humanos têm a finalidade de proteger os indivíduos de possíveis contra os horrores de determinados grupos que venham a lhes subjugar e oprimir. A sociedade não divide- se em direito de um ou de outro, mas sim na soma dos direitos de cada um, pois ‘‘o direito dos povos à autodeterminação é então para ele, antes de tudo, o sinal de um movimento de democratização da ordem internacional. Direitos dos povos e Direitos dos homens procedem de um mesmo movimento de avanço dos direitos humanos e da democracia’’ (BOBBIO, 2013, p. 144).

A democracia e os direitos humanos, segundo Bobbio (2013, p. 144-145) apresenta uma ‘‘indissociabilidade pragmática’’, já que para haja o reconhecimento dos direitos, ‘‘é indispensável o bom funcionamento da democracia’’, vez que ela mesma é o regime cabível para proteger tais direitos. ‘‘Assim nada serve melhor a democracia do que o reconhecimento dos direitos-liberdades (as liberdades de opinião, de expressão, de reunião, de associação) que permitem aos cidadãos de se expressar e aos partidos políticos de se formar, dos direitos políticos (direito ao voto), ou ainda dos direitos sociais que contribuem para o desenvolvimento do indivíduo.’’

A essência da democracia consiste na participação de todos os indivíduos na formação da vontade do Estado, assim, deve prevalecer o diálogo aberto e a tolerância. Sarmento (2018) defende que o conflito entre o discurso de ódio e a liberdade de expressão é um caminho necessário. O jurista afirma que o discurso de ódio é subjetivo, vez que pode ser visto de maneiras diferentes por cada indivíduo e elenca casos em que a liberdade deve prevalecer, como discurso de minorias contra maiorias, teses científicas ainda que contrárias às minorias, manifestação implícitas de preconceitos, liberdade religiosa, obras científicas, teóricas e artísticas.

Sarmento (2018) defende que sem debate não tem como existir democracia, mesmo que as ideias sejam opostas e privar o ser humano de expressar seus pensamentos seria um atraso no desenvolvimento pessoal. O autor acredita que a repreensão do hate speech é ineficiente, vez é um fato presente no cotidiano.

De acordo com os autores Freitas e Castro (2012, p. 336), é natural do ser humano, um ser social por excelência, querer transmitir seu pensamento quando está diante de outros, direta ou indiretamente, e discordância é natural quando há diversas convicções religiosas, políticas e filosóficas. Todavia, ao restringir o direito do outro por discordar de seus posicionamentos, há uma violação de direitos constitucionais.

Como todo direito, a liberdade não é absoluta e ilimitada, por tanto, devem conviver em harmonia com os outros direitos constitucionais, de modo a não incorrer em condutas ilícitas. Qualquer conduta que extrapole o exercício do direito à liberdade poderá ser alvo de repreensão, como por exemplo, a liberdade de expressão e de pensamento, no qual o ordenamento jurídico proíbe a prática de calúnia, injúria ou discurso de ódio (FREITAS; CASTRO, 2012, p. 334).

Segundo Rosenfield (2017, p. 10) a sociedade ‘‘fere constantemente os valores nos quais ela está fundada pois, ao mesmo tempo que procura assegurar o bem-estar individual, ela exclui grandes grupos sociais das vantagens dessa nova sociabilidade ’’ e acrescenta que ‘‘a liberdade política, liberdade de intervenção na cena pública, vem assim a contrapor-se a uma forma estatal de organização do espaço público que, em nome da necessária regulação dos conflitos sociais e do bem comum, vem a reduzir a possibilidade igualmente dada a cada cidadão de participação nos assuntos coletivos.’’

Segundo Meyer; Pflug (2012, p. 12), a formação política e a teoria democrática idealizada pelos filósofos supracitados, tem se mostrado um tanto distante da democracia atual no que diz respeito à participação da vontade estatal. Elencam que uma das principais ocorrências da manifestação de ideia de superioridade, é o hate speech, onde, por meio de ameaças e ofensas, reduz o acesso das vítimas à participação do debate da formação da vontade estatal e na partilha de ideias.

Meyer; Pflug (2012, p. 14) atribuem o fenômeno do hate speech às desigualdade sociais, advindas da imposição de um Estado de se construir em cima de uma sociedade diversa da qual ela existia. Acrescentam que a imposição de um regime democrático que não inclui a todos, de acordo com as suas peculiaridades, à estrutura social ‘‘gera uma figura inútil para com a essa essência do que seja democracia: imposição da maioria.’’ Os autores criticam que o ‘‘Estado Democrático de Direito da República Federativa do Brasil ainda não existe por completo e satisfatoriamente para todos’’, vez que ao impor a vontade da maioria sobre a minoria, se fecham para a possibilidade da minoria expressar suas vontades.

5. CONCLUSÃO

Como se pode notar nos pontos de desenvolvimento anteriores, o hate speech é prática atual que demonstra como a sociedade política encontra-se sempre numa tensão entre aqueles que desejam a via do diálogo para alcançar os objetivos de desenvolvimento democrático e os que desejam a imposição de ideias e comportamentos, aviltando o direito constitucional da liberdade de expressão, para alcançar objetivos unidirecionais, por meio de ameaças e força.

O discurso de ódio se torna presente de maneira exacerbada, pois não há diálogo construtivo, apenas disseminação de ofensas gratuitas pela simples divergência de pensamento, sem qualquer restrição, vindo a causar uma desintegração social, onde não há mais interação e os alvos desses discursos se fecham em seus próprios espaços sociais. Há ainda outros danos, pois esses discursos intimidam e, de certa forma, impede que o cidadão participe da vida pública e a liberdade de expressão é instrumento essencial e indispensável para a existência do processo democrática.

O atual cenário brasileiro está marcado pela competição fervorosa entre opiniões distintas, manifestadas por representantes e partidos políticos, escândalos de corrupção e tensões causadas, principalmente, por discussões a respeito de gênero e orientação sexual e agressões físicas, todo tipo de expressão pejorativa se torna válida quando usada à quem se posiciona como ‘‘direita’’ e de ‘‘esquerda’’. Predomina-se a ideia de que só cabe ao indivíduo escolher um dos lados, sendo ignorado qualquer concepção oposta.

O discurso de ódio se mostra como uma clara ameaça à cidadania pois silencia o processo comunicacional da minoria, uma vez que tem como base a intolerância, à medida que reduz o espaço de fala.

A liberdade é ausente de coação e é garantia necessária à felicidade individual, de modo que o regime democrático é composto pela liberdade de expressão e opinião. Assim, presume- se que a liberdade de expressão está interligada à democracia, pois uma não funciona sem a outra.

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