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A discricionariedade judicial e o papel do julgamento arbitrário

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31/07/2023 às 19:21
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os juízes encontram a ideia de discricionariedade em todos os tipos de contextos no amplo escopo da função judicial, não em compartimentos hermeticamente fechados da lei. Quanto melhor eles entenderem o significado de discrição, melhor eles poderão cumprir suas obrigações e permanecer dentro dos limites de seu papel. Quanto melhor os juízes compreenderem a ideia de discricionariedade, melhor eles poderão, por sua vez, passá-la a um público que na maioria das vezes parece incômoda com a ideia de que nem todos os juízes podem tomar as mesmas decisões. Observar a discricionariedade em diferentes contextos nos ajuda a ser o mais preciso possível, não apenas em nossa compreensão do escopo e significado adequados da discricionariedade, mas também na linguagem que usamos para descrever o exercício do julgamento em diferentes contextos.

Onde existir revisão de apelação por abuso de poder discricionário, para que esse termo tenha alguma significação útil, é imperativo que exista algum núcleo de consistência sobre como o poder discricionário pode ser limitado, como seu abuso pode ser reconhecido de forma confiável como tal, atentando-se contra a legítima liberdade de escolha do juiz nos limites da lei. Quer seja legal ou não, os juízes devem usar sua liberdade de escolha de forma consciente, aberta e moderada, ou seja: devem usar, tanto quanto possível, a orientação da lei em vez de seu próprio julgamento pessoal. Eles devem ser o mais transparente possível quando estão exercendo seu poder discricionário, tanto para que fique claro que a decisão final foi, em algum aspecto, um produto do arbítrio do juiz e, portanto, vinculado a esse caso particular e que a própria lei não obrigar a uma conclusão particular, para que a lei não se torne mais obscura do que antes, e para que possamos ver com mais clareza o que os juízes estão fazendo e como eles podem estar aplicando suas próprias ideologias e, assim, potencialmente aprender mais sobre como nossos juízes veem seus papéis e sobre até que ponto suas personalidades individuais podem moldar a substância da lei (ARRUDA, 2006).

Ainda de acordo com Arruda (2006) a discricionariedade parece ser mais viável como uma concessão passível de revisão de autoridade legal quando há uma estrutura claramente definida, ou conjunto de diretrizes, ou procedimento que rege seu exercício em primeira instância e, por sua vez, sua revisão em apelação. Sempre que houver revisão de apelação por abuso de poder discricionário, duas coisas são essenciais: primeiro, deve haver alguma forma de autoridade legal que estabeleça limites no processo de tomada de decisão ou na gama de resultados legítimos e, segundo, deve haver alguma forma de opinião fundamentada por escrito que pode ser revista por um tribunal de apelação para determinar o cumprimento da autoridade legal que define os limites da discricionariedade do tribunal de primeira instância. Isso realmente não seria nada novo, se pudéssemos manter uma visão clara e consistente disso (SIEGEL, 2006).

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Sempre que essas condições estiverem ausentes, não pode haver revisão de apelação legítima por abuso de poder discricionário, portanto, seria melhor alterar os termos e transferir a supervisão da função judicial do mecanismo de revisão de apelação para uma regulamentação de conduta ou alguma forma de avaliação de desempenho judicial. Caso contrário, precisamente no contexto da revisão de apelação, onde há uma oportunidade maior de alcançar clareza, precisão e consistência, os tribunais continuarão a confundir as questões e turvar as normas jurídicas.


REFERÊNCIAS

ALEXY, Robert. Teoria de la Argumentación jurídica: la Teoria Del Discurso racional como teoria de la fundamentación jurídica. Tradução de Manuel Atienza e Isabel Espejo. Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales, 1977.

ARRUDA, Paula. Efeito vinculante: ilegitimidade da jurisdição constitucional. Estudo comparado com Portugal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

GENRO, Tarso Fernando. Os juízes contra a lei, in: Edmundo Lima de Arruda Jr. (org.), Lições de direito alternativo, 1991, vol. 1, p.27.

MEDINA, Damaris. Amicus curiae: amigo da corte ou amigo da parte?. São Paulo: Saraiva, 2010.

MEIRELLES, Heliy Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 36 ed. São Paulo: Malheiros Editora, 2010.

SANCHÍS, Luis Prieto. Justicia Constitucional y Derechos Fundamentales. Madrid> Editoria Trotta, 2003.

SIEGEL, Reva. Constitutional Culture, Social Movement and Constitutional Change: The Case of the ERA. In: California Law Review, vol. 94. Berkeley: University of California Press, 2006, p. 1323-1419.

SMITHBURN, J. Eric, Judicial Discretion, a Text, The National Judicial College, Reno, NV (2006). Explores the cases and secondary authority which analyze discretion as a jurisprudential concept.

SUNSTEIN, Cass. Designing Democracy: What Constitutions Do? New York: Oxford University Press, 2001.

STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica em Crise. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

VALADÉS, Diego (org.) Conversas acadêmicas com Peter Häberle. Rio de Janeiro: IDP-Saraiva. 2009.

VIDAL, Isabel Lifante. Dos conceptos de discrecionalidad jurídica. Doxa. Cuadernos de Filosofía del Derecho, n. 25, p. 417, 2002.

ZONAY. Thomas A. Judicial Discretion: 10 Guidelines for Its Use. 2015. Disponível em: https://www.judges.org/news-and-info/judicial-news-judicial-discretion-guidelines/. Acesso em: 10/02/2023.

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Sobre o autor
Carlos Luiz da Silva Júnior

Defensor Público do Estado de Sergipe Graduado e Especialista em Direito Público – Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA JÚNIOR, Carlos Luiz. A discricionariedade judicial e o papel do julgamento arbitrário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7334, 31 jul. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/105308. Acesso em: 4 dez. 2024.

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