O instituto da legítima defesa, disciplinado no Código Penal brasileiro no artigo 25, caput e parágrafo único, trata de causa de exclusão de ilicitude. Ou seja, em sua presença, o indivíduo que houver praticado um fato tipificado em lei, não será punido em decorrência de ter sido excluída a ilicitude da conduta.
Explico, determinadas condutas são reprovadas e punidas pelo Direito Penal, consistindo nessa reprovação a ilicitude do fato. Entretanto, existem situações em que, mesmo a lei dizendo ser a ação criminosa, a conduta não será reprovável, isto porque, na situação em que o indivíduo se encontrava não era possível exigir dele que tivesse outra conduta, como é o caso da legítima defesa.
A legítima defesa nada mais é que a possibilidade de o sujeito, sendo agredido injustamente ou presenciado a agressão injusta contra outrem, volte-se contra essa agressão, de modo a impeli-la com os meios que tiver à disposição. Mas não só, é cabível também quando violado direito seu ou de outrem, bem como na iminência de violação.
Nesse sentido, temos como principal exemplo aqueles ocorridos em crimes contra a vida, como no homicídio. Situações nas quais sem motivo aparente um indivíduo atenta contra a vida de outro, o qual repele a agressão para preservar a própria integridade, tendo como consequência o resultado morte do agressor inicial.
Ora, ninguém é obrigado a ver-se em situação perigosa, seja em sua integridade física, moral ou de direito e ficar inerte. E é no âmbito da integridade moral que encontramos a expressão legítima defesa da honra, por muitos anos abordada e usada em julgamentos pelo tribunal do júri como argumento da defesa para provocar a absolvição do réu.
Os casos mais emblemáticos sobre essa questão giram em torno dos homicídios tidos por passionais, entendidos como aqueles cometidos sob grande emoção. E mais, no tema aqui abordado, é usado como justificativa para o cometimento de homicídio quando do adultério praticado por um dos cônjuges, em sua maioria das vezes a cônjuge mulher.
Isto porque foram diversas as situações, e ainda corriqueiras, em que o marido encontra indícios de traição ou mesmo presencia o ato e sob violenta emoção comete os atos de agressão contra sua companheira, levando-a a óbito. Digo companheira pois essas são as situações mais corriqueiras.
Chegando à júri portanto com a tese de que foi movido pelos sentimentos de traição, ferido em sua honra mais íntima e teria, portanto, chegado ao ponto de tirar outra vida humana. Por vezes a tese sendo acolhida pelo corpo de jurados e sendo declarada a exclusão da ilicitude, pois estaria presente a legítima defesa, na modalidade legítima defesa da honra.
Ocorre que, diante dos constantes casos de feminicídio, bem como de femicídio, além de considerações quanto à dignidade humana, igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres nos termos da CF/88 (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988), foi questionado perante o Supremo Tribunal Federal a legitimidade dessa tese – Legítima Defesa da Honra, quanto a homicídios nas circunstâncias aqui já abordadas.
Desse questionamento surgiu a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental de número 779, que em referendo à Medida Cautelar firmando o entendimento de que “a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção à vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF)”.
E mais, proibiu o uso seja da expressão legítima defesa da honra, seja de teses que direta ou indiretamente leve a conclusões do instituto. Além de afirmar, em interpretação conforme à constituição, que a legítima defesa da honra não está abarcada pelo instituto da legítima defesa disciplinado no Código Penal. Convêm destacar ainda que o plenário do STF retomou o julgamento da referida ADPF no corrente mês e declarou a inconstitucionalidade da referida tese.
Pois bem, a legítima defesa da honra trata de tese meritória por muito tempo levantada durante defesa nos tribunais do júri, para justificar a prática de homicídio contra mulheres consideradas adúlteras por seus maridos, e excluir a ilicitude de seus atos. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal proibiu o uso dessa tese direta ou indiretamente, excluindo-a da expressão legítima defesa.
Por fim, é importante destacar que qualquer tese a ser abordada em casos como esses, ou mesmo outros, no tribunal do júri, devem ser muito bem estudadas. Para isso é de grande importância a consulta e contratação de advogados bem qualificados visando a elaboração da melhor estratégia defensiva.