As etnias indígenas mundo afora e suas iniciativas empreendedoras.

Um brevíssimo relato de casos de sucesso

07/09/2023 às 21:10
Leia nesta página:

Diversas etnias indígenas em todo o mundo participam de negócios e partilham benefícios em setores como mineração, pesca e produção de alimentos.

A busca incessante das nações por uma maior qualidade de vida para seus cidadãos é um fato que mal ou bem sempre esteve no horizonte de cada uma delas desde os primórdios. Em meio a disputas, guerras e demais cenários de interesse, as mesmas conseguiram alcançar seus ímpetos através de bons acordos ou acabaram por sucumbir dado o menor poder militar e a menor capacidade dissuasória de impor seus interesses.

No referido contexto, temos o cenário da produção de alimentos, da extração de minérios, da fabricação dos bens industriais pesados na edificação de infraestruturas e a busca constante pela qualidade na prestação de serviços de todas as ordens possíveis.

As etnias indígenas com o passar dos séculos não escaparam a regra, estão totalmente inseridas dentro do horizonte anteriormente descrito. Vejamos os breves exemplos espalhados pelo mundo e desde já o sincero pedido de desculpas por eventuais esquecimentos. Vamos a eles:

  • NORUEGA – Os lapões ou os Sami, etnia parceria de negócios da indústria petrolífera norueguesa e da pesca, no setor pesqueiro, são coparticipes da produção de arenque, peixe bastante apreciado e alvo do primeiro acordo pós-Brexit sobre cotas de pesca no mar do Norte. Cabe registrar que os Sami também possuem representatividade dentro do sistema político norueguês através do seu próprio parlamento, (O Sametinget), desde 1989.

  • PAPUA NOVA GUINÉ e NOVA ZELÂNDIA (Oceania) - A etnia Maori realiza negócios através da partição de benefícios com a indústria mineral e desenvolvem atividades ligadas à sua cultura.

  • CANADÁ – Partição de benefícios no setor de mineração e gás. Etnia Inuit e outras.

  • RÚSSIA – A etnia Komi na Rússia é beneficiária da partição de benefícios do setor gasífero.

  • ESTADOS UNIDOS – Algumas etnias dos Estados Unidos trabalham com franquias de postos de gasolina, os postos da empresa Shell é apenas um dos exemplos. A Rede McDonald's também possui franquias encravadas em algumas terras indígenas dos Estados Unidos. As etnias ao mesmo tempo possuem contratos com o Estado dos Estados Unidos no que tange a partição de benefícios em relação aos aquíferos, oleoduto e fracking. Não é raro observar indígenas proprietários e sócios da rede hoteleira, de restaurantes e de hotéis-cassinos. A cadeia de restaurantes, hotéis e hotéis-cassinos Hard Rock é de propriedade dos indígenas da etnia Seminole.

  • BRASIL – Etnia Potiguara – A etnia Potiguara na Paraíba entre erros e acertos conseguiu construir e consolidar seu processo de produção de camarão (carcinicultura). Sua produção anual é de aproximadamente 70 toneladas do crustáceo. O processo produtivo dos Potiguara envolve nos dias atuais cerca de 100 famílias indígenas produtoras de camarão no Estado da Paraíba. No período de temporada, a referida atividade fatura o equivalente a R$ 1,5 milhão para aldeias de três Terras Indígenas: Potiguara, Jacaré de São Domingos e Potiguara Monte-Mor. O termo Potiguara significa "catadores de camarão".

  • BRASIL – Etnia Guarani Kaiowá da terra indígena Sete Cedros – A etnia Guarani-Kaiowá dos Sete Cerros no Estado do Mato Grosso do Sul é produtora de grãos e também trabalha com pecuária. A situação nesse caso específico é muito interessante pois a referida etnia sempre é vista na mídia em situações de conflito fundiário com proprietários rurais e com as forças do Estado brasileiro. É um exemplo que pode e deve ser mostrado a sociedade brasileira.

  • BRASIL – Etnia Paiter Suruí – Estado de Rondônia – A etnia Paiter Suruí alcançou exuberante êxito quando passou a produzir café dentro das terras de seu usufruto. Uma esplendorosa parceria com a empresa 3corações --- maior produtora de cafés do Brasil -- através do projeto tribos, possibilitou aos Paiter Suruí gerar renda para assim atender as necessidades da etnia. O café produzido na terra indígena agora é comercializado no Brasil e no mundo. Através da parceria do café, foi possível perceber o orgulho e a grande autoestima gerada na aludida etnia.

É possível notar que as experiências indígenas empreendedoras possibilitam boas perspectivas e ações concretas que ao final desembocam sempre numa maior qualidade de vida. Especialmente no pós-guerra com a Carta da ONU de 1945, as nações perceberam que empreender faz parte da essência do homem na busca por maiores e melhores descobertas. Décadas depois, o assunto aqui abordado se consolidou e tomou mais forma com a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986, conforme exposto a seguir:

Artigo 1º

§1. O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, para ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados.

Artigo 2º

§1. A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deveria ser participante ativo e beneficiário do direito ao desenvolvimento.

Certamente que muitas etnias indígenas estão sedentas por reais oportunidades de desenvolvimento econômico e social, assim sendo, as mesmas apelam para que os poderes em suas três esferas, Executivo, Legislativo e Judiciário, avancem na direção de finalmente reconhecer os povos indígenas do Brasil como senhores e protagonistas do seu próprio desenvolvimento social e econômico.

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Sobre o autor
Ubiratan de Souza Maia

Indígena da etnia Wapichana do Estado de Roraima, advogado desde o ano de 2005, consultor de empresas e assessor em Direito Comercial Internacional, assessor de comunidades indígenas que possuem iniciativas empreendedoras.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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