CONCLUSÕES
De acordo com a interpretação sistemática dos dispositivos que compõem o sistema constitucional tributário, chegamos à conclusão de que as competências tributárias possuem os seguintes atributos: facultatividade, indelegabilidade, incaducabilidade e irrenunciabilidade.
Nesse passo, pensamos que não assiste a todas as competências tributárias o caráter de privatividade, mas somente àquelas atribuídas à União. Isso porque, os artigos 147 e 154, II, da Constituição veiculam algumas hipóteses em que a União pode exercer as competências outorgadas às outras Pessoas Políticas. E essas hipóteses, ainda que excepcionalíssimas, são mais do que suficientes para desautorizar a assertiva de que as competências tributárias concedidas aos Estados, Municípios e Distrito Federal lhes são exclusivas.
Afinal, recorrendo à lógica jurídica, só poderíamos afirmar, em caráter universal, que todas as competências tributárias são exclusivas, caso não houvesse qualquer exceção a essa regra. Desse modo, como os impostos Estaduais e Municipais podem ser instituídos/regulados em algumas situações pela União, não sendo a recíproca verdadeira, entendemos que somente a faixa impositiva desta Pessoa Política goza genuinamente do atributo da privatividade.
De outra feita, também é insustentável o caráter de inalterabilidade do sistema de competências tributárias, eis que a sua estrutura é suscetível de modificação por meio das Emendas Constitucionais. Tanto é assim que, na prática, já restou alterada diversas vezes, principalmente no que concerne aos arquétipos dos tributos. Contudo, mister advertir que referidas modificações só são possíveis caso respeitem os princípios fundamentais que orientam o sistema de competências tributárias.
Nesse diapasão, a inalterabilidade só é válida para o legislador infraconstitucional, no sentido de que este não pode modificar, em hipótese alguma, o sistema de distribuição de competências, já que se trata de matéria exclusivamente constitucional.
Por isso mesmo, e agora fechando o raciocínio, são as competências tributárias matéria indisponível ao legislador, não podendo este delegá-las ou renunciá-las. Essa exigência constitui máxima do atributo da rigidez constitucional, o qual não admite que as instâncias inferiores de poder promovam alterações na Carta Constitucional. De fato, como dito acima, o Constituinte representa uma "potestade", gozando, pois, de poder absoluto para instituir os órgãos e competências que lhe aprouver, bem como as regras de seu funcionamento.
Por isso, admitir a ingerência desses órgãos inferiores sobre o Texto Constitucional seria permitir a inversão da hierarquia entre as espécies normativas minuciosamente construída pelo Constituinte, e, em última instância, a destruição de todo o sistema jurídico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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_______________, Ciência do Direito. In. A Semestralidade do PIS: Favos de Abelha ou Favos de Vespa? In Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº 83, ago./2002, p. 89-93.
VILLEGAS, Hector. Curso de Finanzas, Derecho Financiero y Tributário. 7.ed. Buenos Aires: Depalma, 1999.
Notas
01 VIEIRA, José Roberto, A Noção de Sistema no Direito. In Revista da Faculdade de Direito da UFPR. Porto Alegre: Síntese, nº 33, 2000, p. 53-64.
02 Que se refere a uma realidade lógica integrante do sistema constitucional brasileiro, e, portanto, do sistema de direito positivo.
03 SALOMÃO, Marcelo Viana, ICMS na Importação. 2ª Edição, São Paulo: Atlas, 2001, p. 23.
04 ÁVILA, Humberto Bergmann. Sistema Constitucional Tributário. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 110-111.
05 ÁVILA, Humberto Bergmann. Idem, p. 159.
06 Lembre-se que a Constituição brasileira é rígida e ocupa o grau máximo na hierarquia do sistema de direito positivo.
07 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 19.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 346.
08 De fato, é nesse sentido que MARÇAL JUSTEN FILHO (Princípios Constitucionais Tributários. In Caderno de Pesquisas Tributárias, nº 18. São Paulo: Resenha Tributária, 1993), complementando a construção de HECTOR VILLEGAS (Curso de Finanzas, Derecho Financiero y Tributario, 7.ed., Buenos Aires: Depalma, 1999), assevera que o sujeito passivo não deve ser apenas o "destinatário legal tributário", mas o "destinatário constitucional tributário". Para tanto, é necessário que a pessoa eleita pelo legislador para suportar a carga do tributo esteja direta ou indiretamente unido ao núcleo objeto da situação tributada. Nesse viés, conforme defendido pelo mestre paranaense, no que foi acompanhado por GERALDO ATALIBA (Hipótese de Incidência Tributária. 6.ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 86 e seguintes.), muito embora a Constituição não individualize expressamente os sujeitos passivos dos tributos, esse dado pode ser extraído, de maneira genérica, mediante interpretação sistemática dos dispositivos que veiculam as respectivas competências tributárias.
09 É por esse motivo que o método de interpretação do direito por excelência é o sistemático, eis que observa os dispositivos legais como integrantes de um sistema lógico e unitário, unificado em torno das regras e princípios constitucionais, transcendendo, pois, à sua letra seca. Esse é o único modo de interpretar o direito em respeito ao sistema que o encerra, e, por conseguinte, filtrar suas contradições, vaguezas e ambigüidades, de forma a atingir o verdadeiro significado e alcance das regras jurídicas. Do contrário, alerta-nos JOSÉ ROBERTO VIEIRA, os resultados atingidos serão enganosos e destituídos de conteúdo. Ciência do Direito. In. A Semestralidade do PIS: Favos de Abelha ou Favos de Vespa? In Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº 83, ago./2002, p. 89-93.
10 Salvo as hipóteses expressamente previstas de obrigatoriedade do uso de leis complementares, a exemplo dos Impostos atinentes à competência residual da União e dos Empréstimos Compulsórios, previstos, respectivamente, nos artigos 154, I, e 148, da Constituição.
11 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 434-435.
12 Segundo adverte PAULO DE BARROS CARVALHO, o sistema de competências tributárias compreende também a possibilidade de edição dos deveres administrativos instrumentais, que facilitam ou tornam possíveis a arrecadação e a fiscalização. Curso de Direito Tributário. 16.ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 213-215.
13 CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO define o que são princípios da seguinte forma: "o princípio é, por definição, mandamento nuclear do sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critérios para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo". Por este motivo, afirma que "Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma, a desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos (...) representa insurgência contra todo o sistema". Princípios Gerais de Direito Constitucional Moderno. Vol. 1. 5.ed. São Paulo: RT, 1971, p. 50-51.
14 Aliás, um dos alicerces fundamentais do sistema de distribuição de competências é justamente o princípio federativo. Se este for vulnerado pelo legislador infraconstitucional, todo o sistema restará destruído, juntamente com o Estado Democrático de Direito e as instituições republicanas.
15 Raciocínio muito interessante nesse sentido foi desenvolvido por EDVALDO BRITO, no artigo denominado ICMS – Sujeito Passivo da Obrigação Tributária Respectiva e Base de Cálculo após a Emenda Constitucional nº 33/2001, publicado na obra coletiva, O ICMS e a EC 33. São Paulo: Dialética, 2002, p. 39-75.
16 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 168-173.
17 ÁVILA, Humberto Bergmann. Ob. Cit., p. 213-214.
18 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 436.
19 ATALIBA, Geraldo. Ob. Cit., p. 85 e seguintes.
20 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 215.
21 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 453.
22 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 219-225.
23 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 451, nota de rodapé nº. 21.
24 CARRAZZA, Roque Antonio. Idem, Ibidem.
25 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 219.
26 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 595-597.
27 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 218.
28 Inclusive a do ICMS. CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 598-599.
29 "Art. 11. Constituem-se requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da federação. Parágrafo único. É vedada a realização de transferências voluntárias para o ente que não observe o disposto no caput, no que se refere aos impostos."
30 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 578.
31 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 217.
32 CARRAZZA, Roque Antonio. Ob. Cit., p. 587.
33 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 219.
34 BRITO, Edvado. Ob. Cit., p. 39-75.
35 CARVALHO, Paulo de Barros. Ob. Cit., p. 218.