Jurisdição para Casos de Homofobia e Transfobia: Evolução Legal no Brasil

24/10/2023 às 15:43
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Este artigo analisa a questão da competência para processar e julgar crimes relacionados à homofobia e transfobia no contexto do ordenamento jurídico brasileiro. A discussão aborda a equiparação desses crimes ao racismo social, com base em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e no contexto de tratados internacionais. E explora a evolução do entendimento legal e destaca a mudança na atribuição da competência para investigar e julgar esses delitos.

Para iniciar vale destacar o artigo 5º, XLII, da Constituição Federal de 1988, que estabelece o racismo como crime inafiançável e imprescritível, sujeito a pena de reclusão. No entanto, essa norma depende de regulamentação legislativa para produzir todos os seus efeitos. Assim, em 1989, foi promulgada a Lei nº 7.716, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou cor.

Nessa esteira, há o compromisso internacional do Brasil na luta contra o racismo, destacando a Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial da ONU, promulgada pelo Brasil em 1969 por meio do Decreto nº 65.810.

Em junho de 2019, o STF, no julgamento da ADO nº 26/DF, reconheceu o "estado de mora inconstitucional do Congresso Nacional na implementação da prestação legislativa destinada a cumprir o mandado de incriminação" relacionado à homofobia e transfobia. O Tribunal deu uma interpretação conforme à Constituição, equiparando a homofobia e a transfobia aos crimes previstos na Lei nº 7.716/1989 até que o Congresso Nacional promulgasse legislação específica.

Na mesma linha, o STF julgou procedente o MI nº 4.733/DF, para reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e aplicar a Lei 7.716/1989 com efeitos prospectivos para crimes resultantes de discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.

Então, diante da mora inconstitucional, uma das principais questões que fica em aberto é sobre a competência para processar e julgar os crimes de homofobia e transfobia. A Constituição Federal, no artigo 109, V, determina que crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando a execução tiver sido iniciada no Brasil, com resultado no estrangeiro ou reciprocamente, são de competência da Justiça Federal.

No entanto, o Brasil não era signatário de tratado ou convenção internacional que reprimisse condutas homofóbicas e transfóbicas na época do julgamento do STF em 2019. Essa ausência de um tratado específico gerou dúvidas sobre a competência para processar esses crimes.

É importante destacar que em janeiro de 2022, o Brasil promulgou a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, por meio do Decreto nº 10.932. Com essa ação, o Brasil passou a ser signatário do tratado, o que levou ao cancelamento do Enunciado nº 105 da 2ª CCR do MPF, que negava a atribuição de competência federal para apurar crimes de homofobia e transfobia.

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É importante também mencionar as decisões do STJ que confirmam a competência da Justiça Federal para processar e julgar esses crimes, especialmente quando as condutas são divulgadas na internet, em perfis de abrangência internacional.

Portanto, refletindo sobre o tema, no estado atual, é possível concluir que a atribuição da competência para processar e julgar crimes de homofobia e transfobia passou por uma mudança significativa. A equiparação desses crimes ao racismo social, a promulgação da Convenção Interamericana contra o Racismo e decisões do STF e STJ levaram a uma revisão do entendimento legal. Agora, a Justiça Federal é competente para processar e julgar esses delitos em certos contextos.

Sobre o autor
Marcelo Gomes Borges

Formado em direito, com pós-graduação em Direito Processual Penal, Direito Constitucional, Compliance e LL. M. Direito de Contratos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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