Resumo: Este artigo apresenta a análise do direito do Professor de Universidade Federal de se remover para Universidade distinta da que está lotado, por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas, com base no artigo 36, parágrafo único, alínea “b” da Lei nº 8.112/1990
Palavras-chave: Servidor Público Federal - Professor; Remoção para universidade distinta, Quadro único, Ministério da Educação; Direito Subjetivo; Preservação da Unidade Familiar.
I - Introdução
Antes de adentrar especificamente no tema do presente artigo, se faz necessária a distinção de dois institutos, Remoção e Redistribuição.
A remoção consiste no deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Nos dizeres do Professor Marcelo Barroso Lima Brito de Campos A remoção incide sobre o servidor, diferente da redistribuição, que incide sobre o cargo que ele ocupa1.
A redistribuição é o deslocamento de cargo de provimento efetivo, ocupado ou vago no âmbito do quadro geral de pessoal, para outro órgão ou entidade do mesmo Poder.
II - A Remoção do Professor de Universidade Federal para Universidade Distinta por motivo de saúde, independentemente do interesse da Administração.
A remoção no serviço público federal está prevista no artigo 36 da Lei nº 8.112/90, verbis:
Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção:
I - de ofício, no interesse da Administração;
II - a pedido, a critério da Administração;
III - a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:
a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;
b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial; (...) Grifamos
A remoção de ofício, (inciso I, parágrafo único do artigo 36), é realizada sob o juízo de conveniência e oportunidade, em razão do interesse público diante da necessidade de serviço, ocorrendo o deslocamento de oficio do servidor no âmbito do mesmo quadro.
No inciso II do parágrafo único do artigo 36, cuida da remoção a pedido do servidor, sendo que também neste caso terá que ser observada a conveniência e oportunidade da Administração.
No entanto, o que iremos tratar no presente artigo o contido no inciso III, parágrafo único, alínea “b” do artigo 36 da Lei nº 8.112/90, no caso,
a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração por motivo de saúde de dependente que viva às suas expensas e que conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial.
O Instituto da Remoção, conforme previsão contida no caput do artigo 36 da Lei nº 8.112/90, consiste no deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Ocorre que, na maioria das vezes a Administração Pública indefere o pedido do Professor lotado em uma Universidade Federal para Universidade distinta, sob a assertiva de que o pedido não se enquadra como remoção, pois se trata de “outro órgão”, ou seja, corresponde ao conceito legal de redistribuição, previsto no artigo 372 da Lei nº 8.112/90, que se dá somente em caso de interesse da Administração, inexistindo o motivo de saúde.
No caso da remoção de professor de uma Universidade Federal para outra, trata-se de direito subjetivo formado simplesmente a partir do instituto da remoção por motivo de saúde própria, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial.
Apesar do pedido de remoção ser para Universidade diversa da que está lotado, todas estão vinculadas a um mesmo órgão da Administração Pública federal, no caso, o Ministério da Educação. Assim, os professores de todas as instituições de ensino superior federal fazem parte de um mesmo quadro de servidores: o quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação.
Neste sentido, vem se firmando o entendimento pelos Tribunais pátrios, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça de que professores de Universidades Federais integram o mesmo quadro de servidores, pois se interpreta como servidores pertencentes a um quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação.
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDORA PÚBLICA FEDERAL. PROFESSORA UNIVERSITÁRIA. REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE ENTRE INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO DIVERSAS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. O cargo de professora de Universidade Federal pode e deve ser interpretado, ainda que unicamente para fins de aplicação do art. 36, § 2º, da Lei nº 8.112/90, como pertencente a um quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação" (v.g.: AgRg no AgRg no REsp 206.716/AM, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJ 9/4/2007). 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp n. 1.498.985/CE, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 24/2/2015, DJe de 2/3/2015.)
E M E N T A SERVIDOR PÚBLICO. REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE DE DEPENDENTE ENTRE UNIVERSIDADES DISTINTAS. POSSIBILIDADE. ART. 36 DA LEI 8.112/90. PROVISORIEDADE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. - Com fundamento na proteção pela Constituição Federal à família, em seu art. 226 e ao direito fundamental à saúde, em seu art. 196, a Lei nº 8.112/90 possibilitou a remoção do servidor público federal para outra localidade, no âmbito do mesmo quadro, por motivo de saúde do seu dependente, condicionada à comprovação da enfermidade por junta médica oficial - A jurisprudência recente do E. STJ é no sentido de que, para fins de aplicação do art. 36 da Lei 8.112/1990, o cargo de professor de Universidade Federal deve ser interpretado como pertencente a um quadro único, vinculado ao Ministério da Educação, não havendo, portanto, óbice à remoção pretendida, por motivo de saúde de sua dependente – (...) - Apelação provida em parte. (TRF-3 - ApCiv: 00062089520154036000 MS, Relator: Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, Data de Julgamento: 25/03/2021, 2ª Turma, Data de Publicação: DJEN DATA: 05/04/2021).
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REMOÇÃO. ART. 36, § ÚNICO, LETRA B, DA LEI 8.112/90. PROFESSORA DE UNIVERSIDADE FEDERAL. DIREITO DE SER REMOVIDA À OUTRA UNIVERSIDADE FEDERAL POR MOTIVO DE SAÚDE. 1. A hipótese dos autos é de remoção a pedido independentemente do interesse da Administração, por motivo de saúde - art. 36, III, b, RJU. A condição de saúde está devidamente comprovada pelo laudo do evento 122, emitido pelo Subssistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor, órgão da UFTM, no qual se lê que a apelada é portadora de enfermidade cujo tratamento não pode ser realizado em Uberaba, devendo ser removida para cidade com condições climáticas da cidade de Curitiba, com maior umidade relativa do ar e temperatura amena, são as ideais porque benéficas para o estado de saúde da apelada. O mais relevante, porém, é que a própria perícia consignou que a situação médica faz incidir a hipótese legal de remoção por motivo de saúde. 2. É possível a remoção entre universidades federais distintas porque á está pacificado jurisprudencialmente que professores de Universidades Federais integram o mesmo quadro de servidores, pois se interpreta como servidores pertencentes a um quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação.
(TRF-4 - AC: 50220365520174047000 PR 5022036-55.2017.4.04.7000, Relator: MARGA INGE BARTH TESSLER, Data de Julgamento: 14/07/2020, TERCEIRA TURMA)
III - O Direito fundamental à preservação do núcleo familiar e do dever estatal de proteção à família.
Não obstante o direito subjetivo do Professor de Universidade Federal para Universidade distinta por motivo de saúde de familiar, nos termos do art. 36, parágrafo único, III, “b”, da Lei nº 8.112/90, deve se somar o direito fundamental à preservação do núcleo familiar e do dever estatal de proteção à família o que tem fundamento direto na Constituição Federal, nos termos do artigo 226 que estabelece que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
[…]
§7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas;
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
Da simples leitura do dispositivo constata-se a importante atenção que o constituinte conferiu à instituição familiar. Segundo Marcelo Novelino, “por seu papel fundamental tanto para o indivíduo, quanto para a sociedade de uma forma geral, a Constituição de 1988 impôs ao Estado o dever de especial proteção à família, instituição que é a base da sociedade civil.”3
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região proferiram decisões determinando à Administração a remoção de servidores públicos por motivo de saúde, fundamentando-se no direito fundamental à preservação do núcleo familiar e o dever estatal de preservação da família:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REMOÇÃO A PEDIDO POR MOTIVO DE SAÚDE DE DEPENDENTE MENOR DE IDADE INDEPENDE DE INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO. PRESERVAÇÃO DA UNIDADE FAMILIAR. PROVA PERICIAL. ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO III, LETRA 'B', DA LEI 8.112/1990. - A teor do artigo 36, parágrafo único, inciso III, da Lei 8.112/1990, o instituto da remoção passa a ser direito subjetivo do servidor, de modo que preenchidos os requisitos, a Administração tem o dever jurídico de promover o deslocamento horizontal do servidor dentro do mesmo quadro funcional. A alínea 'b' do referido dispositivo dispõe que o pedido de remoção por motivo de saúde de dependente não se subordina ao atendimento do interesse da Administração, bastando a comprovação por junta médica oficial, ou prova pericial, como é o caso. Trata-se, portanto, de questão objetiva. - A moderna doutrina jurídica há muito reconhece que o Direito não é apenas um conjunto constituído por regras válidas positivadas, mas também por princípios estruturantes do Sistema Jurídico e informadores da atividade judicial de todo Estado Democrático de Direito. Não se pode perder de vista que os princípios informadores dos artigos 36 e 84 da Lei nº 8.112/90 foram, justamente, as garantias à unidade familiar e à proteção à infância. Desta feita, os referidos dispositivos do Estatuto do Servidor devem ser aplicados em consonância com a finalidade para a qual foram editados. […] (TRF4, APELREEX 5025995-69.2010.404.7100, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Loraci Flores de Lima, juntado aos autos em 06/08/2014)
AGRAVO REGIMENTAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA FEDERAL. REMOÇÃO. ART. 36, § ÚNICO, DA LEI 8.112/90. PROFESSORA DE UNIVERSIDADE FEDERAL. DIREITO DE SER REMOVIDA À OUTRA UNIVERSIDADE FEDERAL PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE, SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL, REMOVIDO POR MOTIVO DE SAÚDE. 1. O cargo de professora de Universidade Federal pode e deve ser interpretado, ainda que unicamente para fins de aplicação do art. 36, § 2º, da Lei nº 8.112/90, como pertencente a um quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação. 2. Por outro lado, se fosse impedida a remoção da Professora por se tratarem as Universidades de autarquias autônomas, a norma do art. 36, § 2º, da Lei nº 8.112/90 restaria inócua para diversos servidores federais que estivessem vinculados a algum órgão federal sem correspondência em outra localidade. Tome-se por conta, ainda, que o cargo de professora de Universidade Federal, certamente pode ser exercido em qualquer Universidade Federal do País. 3. É de se observar que, ainda que não se queira dar a referida interpretação à norma, o art. 226 da Constituição Federal determina a proteção à família, artigo este que interpretado em consonância com as demais normas federais aplicáveis à hipótese, demonstra ser irrazoável que se impeça uma servidora pública federal, concursada, ocupante de cargo existente em diversas cidades brasileiras, de acompanhar seu cônjuge, servidor público, que, por motivos de saúde, foi transferido para uma destas cidades. 4. Direito da Professora de ser removida, da Universidade Federal do Amazonas para a Universidade Federal Fluminense, em razão da transferência de seu cônjuge, por motivos de saúde, para o Rio de Janeiro. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no AgRg no REsp 206.716/AM, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 15/03/2007, DJ 09/04/2007, p. 280).
IV. Conclusões
O pedido de remoção do Professor de Universidade Federal para Universidade distinta trata-se de direito subjetivo do servidor, que independe do interesse da Administração, uma vez que os professores de Universidades Federais integram o mesmo quadro, vinculado ao Ministério da Educação, não havendo, assim, óbice se cumprido os requisitos do artigo 36, parágrafo único, inciso III, , alínea “b” da Lei nº 8.112/90.
Referências
CAMPOS, Marcelo Barroso Lima Brito. Manual dos Servidores Públicos - Administrativo e Previdenciário. 2. ed. São Paulo: Lujur, 2022.p.83.
BRASIL Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8112cons.htm. Acesso em: 1 de fevereiro de 2024.
NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 9 ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2014. p. 1231.
BRASIL. Constituição Federal Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 1 de fevereiro de 2024.
CAMPOS, Marcelo Barroso Lima Brito. Manual dos Servidores Públicos - Administrativo e Previdenciário. 2. ed. São Paulo: Lujur, 2022.p.83.︎
Art. 37. Redistribuição é o deslocamento de cargo de provimento efetivo, ocupado ou vago no âmbito do quadro geral de pessoal, para outro órgão ou entidade do mesmo Poder, com prévia apreciação do órgão central do SIPEC (...).︎
NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 9 ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2014. p. 1231.︎