Capa da publicação STJ, Direito do Consumidor e teoria finalista mitigada
Capa: Saulo Cruz/STJ

A teoria finalista mitigada na visão do STJ: uma análise do conceito de consumidor

26/05/2024 às 13:52
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Resumo: Este artigo explora a definição de consumidor no Brasil à luz da teoria finalista mitigada adotada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A partir de uma análise do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e da jurisprudência do STJ, discute-se como a teoria finalista mitigada permite uma interpretação mais flexível e abrangente, reconhecendo a vulnerabilidade do adquirente como critério para a aplicação das normas consumeristas.

Palavras-chave: Código de Defesa do Consumidor, STJ, teoria finalista mitigada, vulnerabilidade, relações de consumo.


1. Introdução

A definição de consumidor no Brasil, conforme prevista no Código de Defesa do Consumidor (CDC), é um tema de significativa relevância e complexidade. O artigo 2º do CDC define o consumidor como "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final". A interpretação desse dispositivo é essencial para a aplicação da legislação consumerista e para a proteção dos direitos dos consumidores. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem consolidado a aplicação da teoria finalista mitigada, que combina elementos das teorias finalista e maximalista para definir quem pode ser considerado consumidor.


2. Teorias Sobre a Definição de Consumidor

A doutrina brasileira apresenta duas principais correntes sobre a definição de consumidor: a teoria finalista (ou subjetiva) e a teoria maximalista (ou objetiva).

A teoria finalista, que orienta a interpretação restritiva do artigo 2º do CDC, considera consumidor apenas aquele que é o destinatário final do produto ou serviço, excluindo aqueles que utilizam o bem para fins de atividade econômica.

Já a teoria maximalista, por sua vez, amplia essa definição, incluindo qualquer pessoa que utilize o produto ou serviço como destinatário final, independentemente do uso ser pessoal ou profissional.


3. A Teoria Finalista na Jurisprudência do STJ

Em regra, o STJ adota a teoria finalista para determinar a qualidade de consumidor, exigindo que o bem ou serviço seja destinado ao consumo final e não para a atividade produtiva do adquirente.

Isso significa que, segundo essa teoria, ficam excluídos da proteção do CDC aqueles que adquirem produtos ou serviços para integrá-los ao processo produtivo ou para revenda.


4. A Teoria Finalista Mitigada

No entanto, o STJ reconhece que há situações em que, mesmo havendo a utilização do produto ou serviço no curso de uma atividade econômica, o adquirente pode ser considerado consumidor se demonstrar vulnerabilidade frente ao fornecedor. Essa interpretação é conhecida como teoria finalista mitigada ou aprofundada.

A vulnerabilidade pode ser técnica, jurídica ou fática, e deve ser demonstrada de forma concreta para justificar a aplicação das normas do CDC.


5. Vulnerabilidade e Proteção do Consumidor

A vulnerabilidade, conforme destacada pela doutrina e pela jurisprudência, é o princípio fundamental que orienta a política nacional de relações de consumo. Ela pode ser técnica, quando há ausência de conhecimento específico sobre o produto ou serviço; jurídica, quando falta conhecimento jurídico ou econômico; ou fática, quando há insuficiência econômica que coloca o adquirente em desvantagem frente ao fornecedor.


6. Exemplos de Aplicação da Teoria Finalista Mitigada

Casos específicos, como a aquisição de seguros agrícolas por produtores rurais ou a compra de equipamentos por pequenas empresas, demonstram a aplicação prática da teoria finalista mitigada.

Nesses exemplos, o STJ tem reconhecido a aplicação do CDC quando a parte adquirente demonstra hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica, mesmo que o bem ou serviço seja utilizado na atividade empresarial.

Em regra, com base na Teoria Finalista, não se aplica o CDC aos contratos de empréstimo tomados por sociedade empresária para implementar ou incrementar suas atividades negociais, uma vez que a contratante não é considerada destinatária final do serviço e não pode ser considerada consumidora.


7. Conclusão

A interpretação do conceito de consumidor no âmbito da legislação brasileira, especialmente à luz da teoria finalista mitigada adotada pelo STJ, reflete uma abordagem que busca equilibrar a proteção dos consumidores com a realidade das relações econômicas modernas.

Reconhecer a vulnerabilidade do adquirente como um critério adicional para a aplicação do CDC é essencial para assegurar uma proteção eficaz e justa, garantindo que os direitos dos consumidores sejam respeitados em diversas circunstâncias.

A evolução da jurisprudência do STJ nesse sentido destaca a importância de uma análise contextual e flexível na aplicação da legislação consumerista.


Referências

BENJAMIN, Antônio; MARQUES, Claudia; BESSA, Leonardo. Manual de Direito do Consumidor. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2021.

MARQUES, Claudia; BENJAMIN, Antonio; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2022

MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. 5º Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

Precedentes do STJ: AgInt no AREsp n. 1.973.833/SP, Quarta Turma, DJe de 18/8/2022; AgInt no AREsp n. 1.917.571/DF, Terceira Turma, DJe de 17/6/2022; AgRg nos EDcl no REsp 1.281.164/SP, Quarta Turma, DJe de 4/6/2012; AgRg no Ag 1.248.314/RJ, Terceira Turma, DJe de 29/2/2012; REsp n. 1.195.642/RJ, Terceira Turma, DJe de 21/11/2012.

Sobre o autor
Rodrigo Almeida Chaves

Defensor Público do Estado do Acre, desde o ano de 2007 atualmente lotado no Subnúcleo do Superendividamento e Ações do Consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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