Capa da publicação Contador e a responsabilidade por dívida tributária de cliente
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Estado de Minas Gerais cobra contador por dívida de cliente

06/07/2024 às 13:04
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Existe responsabilidade solidária do profissional de contabilidade pelo pagamento de penalidades impostas ao contribuinte que o contrata?

Fiscalização do ICMS de MG relacionou dono de escritório de contabilidade como coobrigado em Auto de Infração lavrado contra empresa que desejou ser cliente do Contador.

Profissional da contabilidade fez os procedimentos para abertura da empresa e, como esta não lhe enviou nenhum documento que indicasse início de atividade, ele enviava informações mensais como negativa, de modo a evitar a aplicação de multas. Pouco depois o contador devolveu documentação social para empresa, que estava em seu escritório como inativa.

Anos depois foi surpreendido com Auto de Infração de 18 milhões relativo ao ICMS e seu nome como coobrigado sob alegação que o profissional contábil responderia como se fosse sócio, como se tivesse algum benefício econômico com a atividade do então cliente, sendo que apenas registrou os atos sociais da empresa na Junta Comercial. Como agravante, o feito fiscal foi classificado como Não Contencioso, ou seja, sem a oportunidade de apresentação de defesa administrativa.

Por conseguinte, rapidamente foi ajuizada Execução Fiscal contra o contador e nosso escritório foi contratado para representá-lo no processo executório, e a ferramenta utilizada foi a Exceção de Pré-Executividade, sem oferecimento de garantia da execução.

Cumpre destacar que o próprio Conselho de Contribuintes do Estado de Minas Gerais assim entendeu sobre caso análogo:

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - CONTABILISTA - ELEIÇÃO ERRÔNEA.

Imputação ao contabilista de responsabilidade pelo crédito tributário com fulcro no § 3º do art. 21 da Lei nº 6.763/75.

Não havendo prova nos autos de que agiu com dolo ou má-fé, exclui-se o mesmo do polo passivo da obrigação tributária.”

Acórdão 24.057/22

3ª Câmara.

Para que seja configurado o dolo é necessário prova positiva, e quem alega (no caso, o Estado de Minas Gerais) dever ter prova insofismável de sua assertiva. Isso não se observa no caso em tela, pois além de o Contador fazer prova de que nunca pertenceu aos quadros societários da empresa em questão, por intermédio de Certidão emitida pela JUCEMG, o Fisco Estadual não apresentou qualquer documento para corroborar sua pretensão, tão pouco comprovou o recebimento de qualquer vantagem da pessoa jurídica. Ao contrário, nem mesmo os honorários contábeis pelos serviços prestados foram pagos pelo seu então cliente.

Em que pese a fundamentação legal impressa no corpo do texto do Auto de Infração em voga, o plenário virtual do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIn nº 6.284, formou maioria para considerar inconstitucional lei do Estado de Goiás que responsabiliza solidariamente o contador pelo pagamento de penalidades impostas ao contribuinte que o contrata. Os ministros seguiram voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que propôs a seguinte de tese:

“É inconstitucional lei estadual que disciplina a responsabilidade de terceiros por infrações de forma diversa das regras gerais estabelecidas pelo CTN”.

Com a permitida venia, coleciona-se parcialmente artigo do Tributarista e Professor Roberto Rodrigues de Morais sobre o princípio da legalidade, violado pelo ato administrativo aqui impugnado.

O Princípio da Legalidade veda expressamente à União Federal, aos Estados Membros e aos Municípios exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça. É a garantia legal ofertada pela Carta Magna aos cidadãos deste País. A lei é à base deste princípio.

O preconizado na CFB/1988, com relação ao princípio da legalidade, está no artigo 150, inciso I, verbis:

“Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao distrito Federal e aos Municípios:

I - Exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

O resultado lógico e esperado foi o deferimento do pedido do Executado/Contador para determinar a exclusão do seu nome do processo, excluindo-o da condição de coobrigado da execução fiscal pela Justiça Estadual da Comarca de Uberaba. Não satisfeita, a Procuradoria da Fazenda recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que entendeu pela manutenção da decisão de primeira instância, conhecendo o agravo decidindo pelo não provimento, culminando na extinção da dívida definitivamente em relação ao Contador. O Poder Judiciário fez prevalecer a esperança de que o Brasil ainda é um Estado Democrático, em detrimento da fúria arrecadatória do Estado.

Além da indevida cobrança em processo cível, a promotoria do Estado de Minas Gerais instaurou procedimento de investigação criminal em desfavor do profissional, que culminou no oferecimento de denúncia e distribuição de Ação Penal. Do mesmo modo, após a apresentação da defesa cabível, houve absolvição sumária do Contador, com manifestação da Promotoria em concordância com tal decisão.

Porventura, em casos análogos, é aconselhável recorrer ao Judiciário para a defesa dos direitos e garantias constitucionais do profissional contábil.

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Sobre o autor
Roberto Rodrigues de Morais

Especialista em Direito Tributário. Consultor Tributário na DEEP CONSULTING. Ex-Consultor da COAD. Autor do livro online "Reduza dívidas previdenciárias".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAIS, Roberto Rodrigues. Estado de Minas Gerais cobra contador por dívida de cliente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7675, 6 jul. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/110092. Acesso em: 7 set. 2024.

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