Artigo Destaque dos editores

A responsabilidade pela prática de infrações tributárias não-delituosas

Exibindo página 3 de 3
Leia nesta página:

5 CONCLUSÃO

Das hipóteses levantadas, podemos agora concluir que:

Hipótese 1: O CTN admitiu a responsabilidade subjetiva como regra a todas as modalidades de infrações tributárias. No entanto deixou a Fazenda Pública livre de ter que perquirir a ocorrência da intenção (dolo).

Essa hipótese pode não ser unânime, mas sem sombra de dúvidas, é bem mais equânime do que a corrente que defende a adoção da responsabilidade objetiva pelas infrações tributárias estritamente fiscais. No entanto, a averiguação a ocorrência de culpa por parte do Fisco inviabiliza a atividade de fiscalização por ser de alto grau de dificuldade a comprovação da culpa do infrator por parte da Fazenda.

Hipótese 2: O CTN admitiu a responsabilidade objetiva como regra a todas as infrações tributárias não delituosas. No entanto, nesse caso teremos a não recepção do art. 136 do CTN pela CR/88, ante a sua completa inconformidade com o princípio constitucional da desconsideração prévia da culpabilidade.

Conforme já demonstrado, essa tese não se sustenta. A aplicação isolada e indistinta do princípio da presunção de inocência não se aplica no Direito Tributário. A Constituição deu a albergou esse princípio em seu artigo 5º, e por isso ele é fundamental, mas somente para infrações criminais. Nas infrações tributárias não-delituosas, outros princípios são mais adequados, como o da isonomia, da proporcionalidade e da racionalidade. Além, o princípio da presunção de inocência contrapõe-se ao princípio da praticidade tributária. Assim, a presunção de inocência sozinha não deve prosperar nas responsabilizações tributárias por infrações não criminais sob pena de inviabilizar todo o sistema de arrecadação tributária e prejudicar o financiamento das atividades estatais mais essenciais.

Hipótese 3: Após a promulgação da CR/88, há um embate entre a presunção de inocência (art. 5º, LVII da CR/88) e a presunção de culpabilidade (art. 136, CTN). Tal oposição é resolvida diante do caso concreto em que, se aplicando os princípios da proporcionalidade e da equidade, chega-se a uma ponderada decisão sobre a imputação, ou não, de responsabilidade pela autoria de infração tributária não-delituosa e a conseqüente submissão do agente às sanções cabíveis.

Por tudo o discutido e demonstrado nesse trabalho, acredita-se ser essa a hipótese mais viável de interpretação do art. 136 do CTN. A fiscalização está livre de provar a culpa do infrator, porque presumisse a culpa deste. No entanto, este tem o direito de provar sua inocência ou sua não culpabilidade, e se agir assim, será isento de aplicação da sanção. Há, assim, a inversão do ônus da prova nos casos das infrações estritamente fiscais. Assim presume-se a culpa do responsável, mas admite-se a prova em contrário.


REFERÊNCIAS

AMARO, Luciano. Infrações Tributárias. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 67, p. 25-42, 1996.

ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Limites constitucionais da responsabilidade objetiva por infrações tributárias. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 77, p. 14-26, fev. 2002.

ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Infrações e sanções tributárias. São Paulo: Dialética, 2003.

BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Atualizado por Misabel de Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 471.894/SP. Relator Ministro João Otávio de Noronha. Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em:

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp 743.849/RS. Relator Ministro Luiz Fux. Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em:

CANTO FARÁG, Cláudio Renato do. Multas fiscais – regime jurídico e limites de gradação. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001.

CARDOSO, Alessandro Mendes. A responsabilidade do substituto tributário e os limites à praticidade. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 68, p. 141/178, jul. 2006.

CASSONE, Vittorio. Sanções administrativas tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2004. p. 466-477.

FANUCCHI, Fábio. Direito Tributário Brasileiro. 3. ed. São Paulo: Resenha Tributária, 1986. v. 1.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir, 19ª ed., Petrópolis: Ed. Vozes, 1999,

GALVÃO, Fernando. Imputação objetiva. 2. ed. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.

GODOI, Marciano Seabra de; ROLIM, João Dácio. Imposto sobre a renda e correção monetária do balanço: os expurgos de 1989 e de 1990 e a jurisprudência do STF. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 130, p. 56-71, jul. 2006.

GOMES, Luiz Flávio. Responsabilidade penal objetiva e culpabilidade nos crimes contra a ordem tributária. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Direito Penal Empresarial (Tributário e das Relações de Consumo). São Paulo: Dialética, 1995. p. 95-96.

MACHADO, Hugo de Brito. Teoria das Sanções Tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2004. p. 159-191.

MELO, Daniela Victor de Souza. Apontamentos para uma aplicação da teoria da imputação objetiva no campo das infrações tributárias. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, 2004.

ROLIM, João Dácio; SOUTO, Daniela Silva de Guimarães. Sanções administrativas tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2004. p. 231-245.

SILVA, Paulo Roberto Coimbra. A responsabilidade pelas infrações tributárias. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 47, jul.-dez. 2005.

SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Sanção tributária – limites quantitativos e qualitativos. Revista Internacional de Direito Tributário, Belo Horizonte, v. 4, p.369-390, jul./dez. 2005.

SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito Tributário Sancionador. – São Paulo: Quartier Latin, 2007.

SPAGNOL, Werther Botelho. Curso de Direito Tributário – conforme a Emenda Constitucional n. 42/03 DOU 31.12.2003. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.


BIBLIOGRAFIA

AMARO, Luciano. Direito Tributário brasileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva 2003.

ARISTÓTELES. Ética à nicômaco. Trad. Mário da Gama Kury. 3. ed. Brasília: Ed. UnB, 1999.

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1992.

BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 10. ed. atualizado por Misabel de Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1990.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1972.

BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Trad. Luis Guerreio Pinto. 12. ed. Brasília: Ed. UnB, 1999.

CANTO, Gilberto de Ulhôa. Direito Tributário aplicado – pareceres. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1992.

CANTO FARÁG, Cláudio Renato do. Multas fiscais – regime jurídico e limites de gradação. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001.

CARRARA, Francesco. Programa de Direito Criminal. Trad. José Luiz Vicente de Azevado Franceschini e J. R. Prestes Barra. São Paulo: Saraiva, 1957. v. 2.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito Tributário aplicado. Belo Horizonte: Del Rey, 1997.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria e prática das multas tributárias – infrações tributárias sanções tributárias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

GODOI, Marciano Seabra de. Justiça, Igualdade e Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1999.

GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)Pensando a pesquisa jurídica – teoria e prática. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

HOBBES, Thomas. Leviatã. Trad. João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. 2. ed. [S.l.]: Imprensa Nacional da Moeda, 1978.

LYRA, Roberto. Comentários ao Código Penal. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Atlas, 2003. v. II.

MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Sanções tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2004. p. 192-222.

MARTINS, Ives Gandra da Silva. Sanções tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2004. p. 223-230.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979.

MEIRELLES, Hely Lopes. "Direito Administrativo Brasileiro". 21ª ed., São Paulo: Malheiros, 1996.

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Estudos de problemas e casos tributários. São Paulo: José Bushatsky, 1969.

PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos: federais, estaduais e municipais. Porto Alegre: Liv. do Advogado, 2004.

ROLIM, João Dácio; SILVA, Maria Inês Caldeira Pereira da. A dedutibilidade ou não das multas moratórias perante o imposto de renda. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 11, p. 73, ago. 1996.

SANTOS, Eduardo Sens dos. Tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade nas infrações administrativas. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, v. 13, n. 51, p. 229-260, abr./jun. 2005.

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 10. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 311.

XAVIER, Alberto. Do lançamento: Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo tributário. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 320-321.


Notas

01CR/88 - Art. 5º LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória

02GODOI, Marciano Seabra de; ROLIM, João Dácio. Imposto sobre a renda e correção monetária do balanço: os expurgos de 1989 e de 1990 e a jurisprudência do STF. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 130, p. 69, jul. 2006

03 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir, 19ª ed., Petrópolis: Ed. Vozes, 1999, p.13. Esse autor utiliza a expressão abominável teatro’ em referência às execuções em praça pública ocorridas em séculos passados.

04 SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito Tributário Sancionador. – São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 62.

05 ROLIM, João Dácio; SOUTO, Daniela Silva de Guimarães. Sanções administrativas tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2004. p. 232.

06 Apesar de que, como visto na segunda parte desse trabalho, as sanções tributárias pela prática de ilícitos estritamente fiscal têm natureza tributária por ser oriunda do ius tributandi do Estado.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Flávio Lúcio Chaves de Resende

Procurador da Fazenda Nacional desde 2008. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (2007). Pós-Graduando Lato Sensu em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp e Rede LFG e em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp e Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) e Rede LFGexperiência na área de Direito, com ênfase em Direito Tributário, Constitucional, Administrativo e Processo Civil. Ex-Gestor Fazendário da Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RESENDE, Flávio Lúcio Chaves. A responsabilidade pela prática de infrações tributárias não-delituosas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1707, 4 mar. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11013. Acesso em: 19 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos