Considerações preliminares sobre a filosofia contemporânea

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12/07/2024 às 20:59
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Considerações preliminares sobre a filosofia contemporânea

Considérations préliminaires sur la philosophie contemporaine

 

Resumo: Considerando-se o presente tempo, a tarefa mais nobre da Filosofia é justificar a presença humano no mundo. Concretizada no convívio com a natureza e, principalmente, na criação da realidade a que chamamos cultura. A filosofia de nosso século se deparou com existência e, ainda, com a essência, sua missão constitui-se em esclarecer a situação do homem em elucidar o seu modo de ser e, ainda traçar novas bases para sua sobrevivência. A precariedade da existência humana, nesse tempo, renova a importância do filosofar. Procurando preservar a dignidade humana mesmo em declínio. A Filosofia tem hoje, como teve na antiga Grécia, a missão de elaborar argumentos válidos capazes de nos libertar do medo e da ignorância.

Palavras-chave: Filosofia. Filosofia Contemporânea. Cultura. Dignidade da pessoa humana.

 

Résumé: À l'heure actuelle, la tâche la plus noble de la philosophie est de justifier la présence humaine au monde. Incarné dans la coexistence avec la nature et, principalement, dans la création de la réalité que nous appelons culture. La philosophie de notre siècle s'est retrouvée face à l'existence et, aussi, à l'essence, sa mission est de clarifier la situation de l'homme, d'élucider sa manière d'être et, même, de tracer de nouvelles bases pour sa survie. l'existence humaine, à cette époque, renouvelle l'importance de philosopher. Chercher à préserver la dignité humaine même en déclin. La philosophie a aujourd’hui, comme dans la Grèce antique, la mission d’élaborer des arguments valables, capables de nous libérer de la peur et de l’ignorance.

Mots-clés: Philosophie. Philosophie contemporaine. Culture. Dignité de la personne humaine.

 

A filosofia contemporânea situa-se nos séculos XIX, XX e XXI e, perpassa pelo positivismo, fenomenologia, o materialismo histórico-dialético, teoria da significação hermenêutica, o niilismo, o pensamento da Escola de Frankfurt, existencialismo, filosofia analítica e, o pós-estruturalismo. A intenção desse modesto texto é resumir e evidenciar suas interações e influências sobre a vida contemporânea.

De fato, a filosofia contemporánea é iniciada pelo positivo de Auguste Comte e, pelo materialismo histórico-dialético nos idos do século XIX. E, dois conceitos dão início o que viria a ser a construção do pensamento filosófico contemporâneo.

 Lembremos que o pensamento científico é o único considerado válido pois Comte[1] abandonou totalmente as anteriores noções de filosofia que ainda adotavam pensamentos sobre a metafísica e o transcendentalismo.

O racionalismo e o cientificismo são as principais características relevantes do positivis e que muito influenciaram o modo de pensar e fazer ciência. Comte[2] enxergava a sociedade como sendo sistema dotado de progressão natural e, assim, mantendo-se a ordem, naturalmente se galgaria a evolução e, o progresso. E, os acontecimentos históricos posteriores, já no século XX, enfatizaram esse aspecto do positivismo.

A industrialização das sociedades conduziu o pensamento de Marx e Engels que passaram a refletir sobre o materialismo histórico-dialético que se opusera as crenças iluministas, vendo a sociedade como sendo resultado de seu nível de produção e de sua economia.

A problemática do Direito na obra de Karl Marx vem de forma intermitente, na medida em que faz parte de um conjunto amplo de relações e interconexões dentro daquilo que o pensador alemão, em prefácio da obra Contribuição à Crítica da Economia Política, de 1859, denominou superestrutura jurídica e política da sociedade.

E, assim, não tratou de forma sistemática o fenômeno jurídico, mas o abordou em suas particularidades, e, principalmente, em seu amplo papel do processo de reprodução do capital e na totalidade de relações sociais a estes correspondentes[3].

Os filósofos enxergavam a sociedade em caminho do progresso, mas sim, suas transformações materiais e econômicas. E, assim, as mudanças econômicas e transformações nos modelos de produção bem definiram o caminho histórico que a sociedade teria.

Afinal, a história deixou de ser concebida como mera sucessão de fatos históricos, para ser enxergada como ordem de fatos que se passaram em face das alterações no modelo econômico e produtivo.

Aliás, pode-se afirmar que as mudanças históricas que foram propiciadas pela Revolução Industrial estão relacionadas com as alterações econômicas que as provocaram. E, assim, a transformação social tal como a migração do campo para as cidades, a luta por direitos trabalhistas entre outros.  A evolução social se deu através da luta de classes.

O materialismo histórico-dialético[4] é contrário ao idealismo e, por meio dessa tese é preciso estudar a sociedade e sua evolução em sua totalidade e inserido num contexto mais amplo.

A fenomenologia, igualmente avessa aos positivistas, de Husserl propunha que era necessário repensar a construção filosófica se afastando de convicções cientificistas.

Para Husserl, o conhecimento seria produzido a partir da forma como a consciência humana interpreta os fenômenos. Como fenômeno, pode-se entender qualquer acontecimento ou manifestação, qualquer coisa que se coloque diante de um indivíduo.

Portanto, na fenomenologia, o conhecimento sobre determinado assunto ou objetivo é construído através interpretação, ou seja, de uma leitura feita pela consciência humana.

Com tal afirmação, Husserl tira o protagonismo do pensamento filosófico do objeto e passa para a pessoa/sujeito, que detém a consciência capaz de interpretá-lo.

A fenomenologia acaba sendo vista por muitos estudiosos como uma espécie de método para o pensamento filosófico.

No contexto da interpretação, a hermenêutica é uma importante característica da filosofia contemporânea. Pois é a filosofia de interpretar e compreender a significação, a produção de sentido ou a semântica.

Pode-se afirmar que as disciplinas-chave para entender filosofia atual são a fenomenologia e a hermenêutica. A filosofia contemporânea tem uma grande preocupação com os estudos linguísticos, das teorias da significação. A filosofia analítica tem também como base as teorias da significação. Um dos seus nomes mais importantes foi Russel.

Com a filosofia analítica, parte-se do princípio de que as pessoas são seres linguísticos, e que é por meio da linguagem que se transmite e se constrói conhecimento. Portanto, essa corrente de pensamento propõe uma análise lógica da linguagem.

A filosofia deixa de pensar sobre objetos ou o conhecimento em si, e passa a estudar a linguagem com a qual se compartilha conhecimento.

A filosofia contemporânea também tem uma forte característica niilista. Baseada, principalmente, nos pensamentos de Nietzsche. O niilismo de Nietzsche influenciou na construção do existencialismo e do pós-estruturalismo.

O niilismo[5] é uma filosofia que afirma não existir nenhum tipo de certeza na qual se possa basear o conhecimento. A partir do niilismo de Nietzsche[6], tem-se as concepções de morte de deus e da libertação do sujeito.

Nesses conceitos, o ser humano deixa de ser regido pela moral, pela cultura ou pela religião. Afinal, no niilismo, nenhuma dessas crenças podem ser considerada uma certeza na qual se deve seguir ou construir conhecimento sobre.

Dessa forma, o ser humano passa a ser livre, pois a vida não teria qualquer tipo de sentido ou essência. Essa é a base do pensamento existencialista. O existencialismo tem como nomes importantes Sartre, Beauvoir e Camus.

Esse pensamento filosófico declara a falta de sentido para a vida humana. Assim a vida não teria qualquer significado maior, o indivíduo simplesmente existe e cabe unicamente a ele construir e guiar a sua existência. Construindo a sua condição humana.

Com base marxista, a Escola de Frankfurt[7] sugeria uma nova leitura dos conceitos de Marx. Os pensadores de Frankfurt se opunham ao positivismo[8] e ao iluminismo, pois consideravam que com a ascensão dos movimentos fascistas e nazistas na Europa havia acontecido uma severa regressão social.

A Escola de Frankfurt surgiu na Alemanha no século XX e durante a II Guerra Mundial se mudou para os Estados Unidos. Os filósofos, entre eles, Horkheimer e Adorno, desenvolveram a Teoria Crítica.

A Escola de Frankfurt era formada por pensadores marxistas. Desse modo, as reflexões produzidas por eles apresentam uma visão do sistema capitalista.

Em seus trabalhos é possível observar a denúncia das formas de dominação presentes na política, economia, cultura e psicologia da sociedade moderna. Entre os nomes mais importantes estão:

Max Horkheimer (1895-1973) - era filósofo e sociólogo. Junto com Adorno, desenvolveu o conceito de Indústria Cultural, presente no livro "A Dialética do Esclarecimento";

Theodor W. Adorno (1903-1969) - foi filósofo, sociólogo e músico. Autor dos livros "Dialética Negativa", "A Ideia de História Natural" e defensor da educação como forma de emancipação do sujeito;

Herbert Marcuse (1898-1979) - seus estudos se dedicam a apontar as relações entre capitalismo e sexualidade, bem como as questões envolvendo raça e exclusão social;

Friedrich Pollock (1894-1970) - foi cofundador do Instituto para Pesquisa Social de Frankfurt. Seus trabalhos mais proeminentes estudam as relações entre capitalismo e Estado;

Erich Fromm (1900-1980) - suas reflexões utilizam bases do pensamento marxista aliadas a elementos da psicanálise. Em seus trabalhos, ele analisa as relações sociais, a família e outras elementos que interferem na formação da pessoa;

Jürgen Habermas – esse pensador, ainda vivo, faz parte da segunda geração da Escola de Frankfurt. Seus trabalhos analisam as relações entre ética e política.

A Teoria Crítica visava a transformação social. Não se colocava como um conceito neutro, o que era comum nas conceituações anteriores, mas propunha um pensamento crítico e que provocasse mudança.

A indústria cultural é conceito da Teoria Crítica, que surge a partir da análise dos meios de comunicação. A indústria cultural se refere a um sistema de "fabricação" de bens culturais que serviriam como mecanismo de geração de lucro e de controle social, mantendo as pessoas alienadas.

Pertencentes à indústria cultural estariam filmes, novelas, programas de rádio e televisão, livros e todo bem artístico-cultural resultado da chamada cultura de massa.

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A cultura de massa seria uma mistura da cultura erudita com a cultura popular. Esses bens seriam produzidos com o objetivo de manter a ordem social e econômica vigente.

Outro conceito presente na Teoria Crítica é o da razão instrumental. A razão instrumental seria quando a razão ou conhecimento se tornam instrumentos de dominação e controle social.

Com a razão instrumental[9], a ciência deixaria de ser um modelo para o conhecimento e a liberdade, e passaria a ser um meio para alcançar o poder, tornando-se exploratória e dominadora.

Um dos principais pensadores da corrente pós-estruturalista[10] é o filósofo Michel Foucault. O pós-estruturalismo é uma corrente de pensamento filosófico que critica as bases do estruturalismo, por considerá-las deterministas e não levarem em consideração os contextos históricos.

Os filósofos pós-estruturalistas consideram a realidade uma construção social e de caráter subjetivo. O pós-estruturalismo também tende a negar posições binárias, como os conceitos de "bom ou mal" ou "homem ou mulher".

O pensamento pós-estruturalista está presente em estudos semânticos e de significação, nos estudos de gênero, na análise literária e em muitos outros. O pós-estruturalismo tem como base os conceitos de Nietzsche e o antipositivismo[11].

Os principais filósofos pós-estruturalistas e suas obras mais importantes, a saber:

1. Michel Foucault: foi um dos pensadores pós-estruturalistas mais influentes. Suas obras, como "Madness and Civilization", "The Birth of the Clinic" e "Discipline and Punish", exploraram como as estruturas de poder sustentam sistemas e instituições de conhecimento. O conceito mais famoso de Foucault é provavelmente "poder/conhecimento", que afirma que poder e conhecimento estão inerentemente interligados.

2. Jacques Derrida: foi outra figura chave no pós-estruturalismo, particularmente conhecido por desenvolver a desconstrução. Sua obra seminal "Of Grammatology" critica a confiança da tradição filosófica ocidental no "logocentrismo" ou a ideia de que a fala é uma forma de linguagem mais autêntica do que a escrita. Derrida argumentou que tais dicotomias são problemáticas e podem ser desconstruídas.

3. Julia Kristeva: contribuiu significativamente para o pós-estruturalismo, particularmente por meio de seu trabalho em semiótica e psicanálise. Seus trabalhos mais influentes incluem "Revolution in Poetic Language" e "Powers of Horror", nos quais ela introduziu o conceito de abjeção.

4. Roland Barthes: foi uma das primeiras influências no pensamento pós-estruturalista, particularmente com seu trabalho em semiótica (o estudo de signos e símbolos). Seu ensaio "A Morte do Autor" é um texto pós-estruturalista significativo, argumentando que a intenção do autor ou o significado original é menos importante do que as interpretações dos leitores.

5. Gilles Deleuze e Félix Guattari: com suas obras colaborativas como "Anti-Édipo"[12] e "Mil Planaltos", desenvolveram conceitos como rizoma e desterritorialização, desafiando modos de pensar lineares e hierárquicos e defendendo multiplicidades e fluidez identidades.

Husserl foi o principal nome da fenomenologia. Para o filósofo, a realidade seria um fenômeno que precisaria ser interpretada e revelada.

A consciência humana seria a responsável por realizar essa interpretação. Husserl também afirmava que a consciência é sempre uma consciência de algo. Portanto, a consciência não seria vazia, estaria sempre relacionada a alguma coisa, seja uma pessoa, um objeto ou uma situação.

Essa consciência também seria considerada plástica, ou seja, teria a capacidade de mudança, sendo aberta para transformações e se adaptando.

Entretanto, a consciência também teria a particularidade da temporalidade. Assim, a forma da consciência humana de interpretar fenômenos poderia variar de acordo com o tempo histórico em que o indivíduo vive.

Para o filósofo, o conhecimento também possuiria características de intencionalidade. Quando um indivíduo volta sua atenção para um fenômeno existente, sempre há intenção em fazê-lo.

Edmundo Husserl era alemão, nasceu em 1859 e faleceu em 1938. Outro nome importante dentro da fenomenologia foi Friederich Hegel. Russel foi um filósofo pertencente a corrente de pensamento da filosofia analítica.

A filosofia analítica[13] se dedicava aos estudos dos enunciados linguísticos, isto é, era um ramo da filosofia que pensava o ser humano como um ser linguístico, e que a linguagem era o meio pelo qual se construiria e se transmitiria o conhecimento.

Por ser também matemático, Russel traz para a filosofia uma forma lógica de se analisar a linguagem. A análise lógica da linguagem seria o caminho para entender e se pensar a filosofia.

Para os filósofos analíticos, a análise lógica da linguagem era a maneira de superar os problemas da filosofia metafísica. Russel nasceu no Reino Unido em 1872. Pertenceu a aristocracia britânica, assumindo o título de conde.

Foi um homem considerado progressista para a sua época, posicionando-se politicamente contra as duas Grandes Guerras e se mostrando a favor do voto feminino. Em 1950, ganhou o Nobel de Literatura. Morreu em 1970.

Horkheimer foi um dos mais prestigiados membros da escola de Frankfurt. Uma das maiores correntes filosóficas do século XX, influenciando a filosofia e sociologia. Também compõem a escola de Frankfurt, pensadores como Walter Benjamin[14], Theodor Adorno e Jürgen Habermas[15].

A Escola de Frankfurt iniciou seus estudos na Universidade de Frankfurt, em 1924, e construiu pensamentos filosóficos sobre vários temas, como estética, comunicação, linguística, entre outros.

Tendo origem judia, a Escola de Frankfurt passou a existir na clandestinidade por volta dos anos de 1930, tendo depois que mudar sua localização para os Estados Unidos, durante o regime nazista.

Propondo uma releitura do marxismo, a Escola de Frankfurt também tinha perfil antipositivista, e inspiração no existencialismo e na psicanálise de Sigmund Freud.

Horkheimer foi um dos pensadores base para a Teoria Crítica. A Teoria Crítica é um conceito guarda-chuva para diversos pensamentos importantes desenvolvimentos dentro da Escola de Frankfurt, entre eles, a indústria cultural[16] e a razão instrumental.

A indústria cultural seria a produtora da cultura de massa. Portanto, a indústria cultural iria produzir, assim como em uma fábrica, bens ou produtos culturais.

Esses bens da cultura, que poderiam ser filmes, novelas, peças de teatro, séries de tv, etc., assim como em uma indústria são feitos em série e com os objetivos de gerar lucro e promover o controle social.

Os filósofos da escola de Frankfurt apontavam ser danoso que a indústria cultural fosse a fonte de informação e o guia de vida das pessoas. Esse aspecto "educativo" da indústria cultural poderia influenciar padrões e comportamentos.

Os "frankfutianos" também elaboraram o conceito de razão instrumental, que seria quando a ciência e/ou a razão passam a ser utilizadas como instrumento de dominação e exploração econômico e social.

Foucault é um dos filósofos fundamentais para entender o pensamento filosófico atual. Muitas vezes visto como um pensador de revolucionou as ciências humanas.

O filósofo é o grande nome do pós-estruturalismo[17], no qual retomou os pensamentos de Nietzsche e se inspirou no existencialismo de Sartre. Também apoiando as ideias antipositivistas.

Foucault elaborou conceitos sobre o poder, o discurso, a domesticação dos corpos, a história da sexualidade, a história da construção do conhecimento ocidental e também da loucura, abordando a psiquiatria.

Por ser um notável crítico do mundo contemporâneo, Foucault ficou conhecido como o filósofo da desconfiança. A expressão faz referência à pratica do pensador analisar as instituições sociais e defender uma atitude de desconstrução da realidade, típica dos chamados pós-estruturalistas.

Dentre as várias conceituações, destacam-se os pensamentos sobre o poder e a domesticação dos corpos. Foucault se afastou do pensamento marxista clássico que pensava o poder como uma posição majoritariamente ligada ao fator econômico.

Foucault não via o poder como uma posição, mas como algo que poderia ser exercido. O poder seria algo que poderia ser executado. E sempre seria exercido de maneira desequilibrada, isto é, por mais sutil que possam ser, as relações de poder são sempre desiguais.

Nenhum indivíduo poderia estar fora dessas relações. Por menor que a execução de poder seja, ele sempre estará presente no cotidiano de todos.

Como exemplo, essas relações de poder podem ficar evidente nas relações familiares, entre pais e filhos, ou mesmo entre irmãos. Na escola, entre professores e estudantes; entre trabalhador e empregado; entre os policiais e os cidadãos civis; entre amigos ou em situações maiores, como entre as instituições jurídicas e a população comum.

O poder[18] não necessariamente é exercido em uma relação de dualidade, o poder se ramifica em toda a sociedade e tem como uma de suas principais característica a de ser assimétrica.

O poder também não é algo que se exerce eternamente, as dinâmicas das relações de poder são mutáveis. Transformando-se com o decorrer do tempo, mas nunca deixando de existir.

Outra característica do poder seria a capacidade de atuar sobre os corpos dos indivíduos. Nessa conceituação, Foucault elabora o pensamento sobre a domesticação dos corpos. O que faria com que os corpos dos indivíduos fossem transformados para que pudessem entregar o máximo possível.

Ou seja, os corpos deveriam ser domesticados ao ponto máximo de rendimento. O filósofo afirmava que essa domesticação poderia ser vista nos espaços, como no militarismo ou nas escolas. A domesticação criaria uma espécie de disciplina, que formam regras e comportamentos a fim de explorar ao máximo o tempo e o corpo.

O contexto histórico que permeou a construção da filosofia contemporânea começou a partir da Revolução Francesa e também da Revolução Industrial.

Tais dois eventos históricos mudaram a estruturação econômica e social em todo mundo. Inicialmente na Europa e depois, gradativamente, no restante do globo.

Em contrapartida aos avanços tecnológicos da Revolução Industrial, transformações sociais problemáticas ocorreram, como a forte migração das populações das zonas rurais para as cidades, em busca de trabalho nas fábricas (o êxodo rural).

Também houve uma acentuação das desigualdades sociais, que eram notórias devido às más condições de trabalho nas fábricas, moradias precárias e a falta de direitos trabalhistas.

A necessidade das populações em conquistar direitos trabalhistas e melhores condições de vida abriu caminho para conceituações como a luta de classes de Karl Marx e o feminismo, com o movimento sufragista. O movimento lutava pelo direito feminino ao voto.

Diante das desigualdades sociais consequentes ao estabelecimento do capitalismo, outros modelos sociais e econômicos passaram a ser pensados, como o socialismo, o comunismo e a anarquia.

Além das mudanças sociais negativas, o ideal de progresso natural firmado pelo positivismo foi colocado em causa com a tomada do poder por governos totalitários no século XX. Tanto de direita, como o nazismo e o fascismo, como de esquerda, o stalinismo.

Hannah Arendt[19] foi uma importante filósofa alemã, perseguida pelo regime nazista. Arendt era judia e foi a responsável por um renomado estudo sobre regimes totalitários, e elaborou conceitos como o da banalidade do mal.  as características do totalitarismo.

A partir desses fenômenos, especialmente a ascensão do nazismo na Alemanha, passou-se a valorizar ainda mais o pensamento crítico. A chamada escola de Frankfurt, que durante a guerra teve de se mudar para os Estados Unidos, tinha uma base marxista, mas procurava ir além das noções de Karl Marx.

Eram contrários ao positivismo e foram influenciados pelo existencialismo e pela psicanálise. A sua base de pensamento filosófico estava nas teorias críticas ao capitalismo e na emancipação social.

É também na Escola de Frankfurt que surge o conceito de indústria cultural. A indústria cultural seria um mecanismo capitalista de transformar a cultura em uma mercadoria e em um meio de controle social.

No fim do século XX começa, na França, um movimento baseado nas concepções de Nietzsche. Embora o movimento pós-estruturalista não tenha assim se autodenominado, ficou dessa forma conhecido por pensar a sociedade como uma construção e negar o binarismo presente nos estudos estruturalistas.

Além de Michel Foucault, Gilles Deleuze e Judith Blutter[20] são importantes nomes da filosofia contemporânea.

Apesar de ser possível traçar uma linha temporal sobre os acontecimentos históricos que influenciaram e foram influenciados pela filosofia contemporânea, também é notória que a filosofia praticada nos últimos dois séculos é diversa.

Conclui-se que a filosofia contemporânea tinha por objetivo produzir uma nova concepção de racionalidade. O pensamento filosófico moderno tinha a razão como uma ferramenta de emancipação intelectual através da reflexão. A racionalidade deveria ser utilizada para que os homens dominassem sua natureza.

Ou seja, a racionalidade contemporânea, alimentada pelos processos e produtos de conhecimento gerados através do pensamento abstrato e dedutivo do campo teórico-cientifico, comunicar-se-ia com a sociedade de maneira naturalizada, sob forma de representação social,

Duarte demarca com precisão que “a eclosão da primeira guerra mundial […] constitui a própria inauguração de nossa época”: a modernidade virulenta dos conflitos bélicos e éticos. Naquele evento se empregou segundo o autor, a mais avançada tecnologia em massa para exterminar vidas humanas, utilizando-se do falacioso argumento de proteger o mundo.

Hobsbawm (1994) ao discorrer sobre acontecimentos históricos da modernidade, nomeia aquele momento como “um século de guerras religiosas [e ideológicas], que têm na intolerância sua principal característica”. E assim se desenrola a paradoxal modernidade, do início ao fim, atacando cidadãos, sua dignidade e sobretudo os princípios éticos.

A era da incerteza[21], das relações complexas não pode ser avocada como argumento inconfidente para manipular, execrar a natureza do próprio homem. Assim se estaria mais uma vez negando a própria eticidade que deveria conformar e nutrir a própria sociedade em cada tempo histórico.

Enfim, a epistemologia contemporânea está ancorada numa abordagem de cientificidade pautada na “desdogmatização”, a epistemologia contemporânea busca romper com a dicotomia entre ciências sociais e ciências naturais, resguardando a ambas a unidade científica e a especificidade inerente aos seus respectivos objetos e problemas de investigação.

Em síntese, para os desafios impostos para haver uma real abordagem científica do fenômeno da mediatização, algumas respostas, ou, pelo menos, pistas concretas encontram-se no percurso histórico e na institucionalização das ciências sociais[22]. Portanto, o pluralismo epistemológico não pode tender ao relativismo radical e a metodologia deverá designar reflexão transteórica e transdisciplinar[23].

 

 

 

Referências

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Sobre a autora
Gisele Leite

Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores POA -RS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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