Da não adequação da retributividade da pena ao Estado Democrático de Direito

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  1. Para Lyra, “A justiça penal, na mais rudimentar forma, já era a expressão espontânea, inevitável e irremediável do instinto de conservação do aglomerado, reagindo contra toda ação danosa ou perigosa. O crime constituía, sempre, mediata ou imediatamente, atentado às conveniências predominantes”. (LYRA, Roberto. Comentários ao Código Penal. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 13.)

  2. Para Queiroz, “São Consideradas absolutas todas as teorias que veem o direito penal (a pena) como um fim em si mesmo, cuja justificação não depende de razões utilitárias ou preventivas, de sorte que, em rigor, como diz Roxin, a pena não serve para nada, pois sua legitimação decorre do simples fato de haver sido cometido um delito. A pena se justifica, assim, quia peccatum est (pune-se porque pecou), nisso esgotando seu conteúdo”. (QUEIROZ, Paulo de Souza. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 69.)

  3. JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Finalidades da pena. Barueri: Manole, 2004.

  4. FREUD, Sigmund, Totem e tabu. In: Obras completas de Sigmun Freud. Trad. Órizon Carneiro Muniz. Rio de Janeiro: Imago, 1995.

  5. Nesse sentido, vide BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 67.

  6. Para Foucault: “O suplício tem então uma função jurídico-política. É um cerimonial para reconstituir a soberania lesada por um instante. Ele a restaura manifestando-a em todo o seu brilho. A execução pública, (...) exibe aos olhos de todos uma força invencível. (...) a execução da pena é feita para dar não o espetáculo da medida, mas do desequilíbrio e do excesso; deve haver, nessa liturgia da pena, uma afirmação enfática do poder e de sua superioridade intrínseca”. Ainda que a espetacularização da pena possa remeter à finalidade preventiva geral de intimidação da coletividade, nesse momento específico o que se pretende não é que o apenado sirva de exemplo aos seus semelhantes, mas apenas que seja o veículo de comunicação do poder absoluto do soberano como emissário divino. Devemos atentar para a preponderância da finalidade retributiva da pena no contexto histórico não exclui a ocorrência das demais finalidades de forma colateral, até porque as teorias de finalidades da pena se desenvolveram de forma entremeada e pendular, e não de forma linear consecutiva. (FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. 41. ed. Petrópolis: Vozes, 2014, p. 50.)

  7. Para Foucault, “(...) o suplício deve ser ostentoso, deve ser constatado por todos, um pouco como seu triunfo. O próprio excesso das violências cometidas é uma das peças de sua glória: o fato do culpado gemer ou gritar com os golpes não constitui algo de acessório e vergonhoso, mas é o próprio cerimonial da justiça que se manifesta em sua força. Por isso sem dúvida é que os suplícios se prolongam ainda depois da morte: cadáveres queimados, cinzas jogadas ao vento, corpos arrastados na grade, expostos à beira das estradas”. (Ibidem, p. 37.)

  8. MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 08.

  9. HASSEMER, Winfried; CONDE, Muñoz. Introdução à criminologia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 275-276.

  10. Nesse sentido, temos a posição de Zaffaroni, para quem: “O direito penal de um estado de direito, que aspira formar cidadãos conscientes e responsáveis, ao contrário, tem o dever de evidenciar todo o irracional, afasta-lo e exibi-lo como tal, para que o povo tome consciência dele e se conduza conforme a razão”. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 105.)

  11. Na pena vingança, não se estabelece uma proporcionalidade entre o ato praticado e o castigo recebido. A depender da época, como ficará constatado no capítulo seguinte, a pena padrão era a pena de morte, independente de qual o delito praticado e, mais tarde, temos uma ampla aplicação de penas corporais cruéis (ordálios, amputações, métodos torturantes) que também demonstram a desproporcionalidade das penas- vingança aplicadas. Tais afirmações encontram embasamento nas informações a respeito de extinção de inúmeros grupos sociais envolvidos em contendas vingativas com grupos rivais, como ocorria nos primórdios. Ainda que se fale na Lei de Talião, esta é apenas um instrumento rudimentar de proporcionalidade.

  12. DI GIORGI. Alessandro. Punishment and Political Economy. In: SIMON, Jonathan; SPARKS, Richard. The SAGE Handbook of Punishment and Society. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.4135/9781446247624.n3>. Acesso em: 15 jun. 2024, p. 1-5.

  13. LESCH, Heiko. La función de la pena. Madri: Dykinson, 1999.

  14. LYRA, Roberto. Comentários ao Código Penal. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 1958, 16.

  15. “Só a Deus caberia punir e premiar os homens, dele emanando todo o poder humano – Omnis potestas a Deo – exercido na terra pela Igreja, por delegação divina”. (Ibidem, p. 21.)

  16. LESCH, op. cit., p. 7.

  17. “A reconstrução dos valores humanos pregada pelo cristianismo influenciou diretamente as práticas penais. O homem passou a ser visto como imagem e semelhança de um deus único, O politeísmo chegava ao seu final. Com a proclamação da autonomia da vida espiritual pelo evangelho, a pessoa humana foi elevada acima da tirania estatal.” (MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 47.)

  18. “Segundo Gilberto Safra, o cristianismo fundamenta-se na demonstração de amor do ser divino pelo homem, feito a sua imagem e semelhança”. (Ibidem, p. 47.)

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  19. LYRA, op. cit., p. 21.

  20. MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 51.

  21. É nesse sentido os ensinamentos de Santo Agostinho, o mais conhecido dos pensadores do direito canônico praticado na era medieval.

  22. LYRA, Roberto. Comentários ao Código Penal. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 21.

  23. ROXIN, Claus. Derecho Penal: parte general. Trad. Diego Manuel Luzón Peña. Madrid: Civitas, 1999, p. 85.

  24. LESCH, Heiko. La función de la pena. Madri: Dykinson, 1999, p. 8.

  25. Artigo 16, do Código Penal: Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. (BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848/40. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 13 jun. 2024.)

  26. MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 80.

  27. Para Kant, “A pena jurídica – poena forenses, não pode nunca ser aplicada como um simples meio de procurar outro bem, nem em benefício do culpado ou da sociedade; mas deve sempre ser contra o culpado pela simples razão de haver delinquido: porque jamais um homem pode ser tomado como instrumento dos desígnios de outro, nem ser contado no número das coisas como objetivo de direito real”. (tradução livre). (KANT, Immanuel. Principios metafísicos de la doctrina del derecho. 2. ed. México: Universidad Nacional de México, 1978, p. 167.)

  28. Id. Metafísica dos Costumes. Trad. Edson Bini. São Paulo. Edipro. 2003, p. 176.

  29. “Kant entendia a lei como um imperativo categórico, isto é, como aquele mandamento que ‘representasse uma ação em si mesma, sem referência a nenhum outro fim, como objetivamente necessária’”. (BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 69.)

  30. Ibidem, p. 69-72.

  31. JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. A necessidade de um fim preponderante para a pena no direito brasileiro. 2002. 148 f. Dissertação (Mestrado em Direito)- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2002, p. 44.

  32. “O Estado democrático, pluralista e laico de nossos dias não pode se arvorar em entidade sancionadora do pecado e do vício, mas apenas servir como protetor de bens jurídicos”. (DIAS, Jorge Figueiredo. Questões fundamentais de direito penal revisitadas. São Paulo: RT, 1999, p. 94.)

  33. HEGEL, Georg Wilhem Friedrich. Princípios de filosofia do direito. 3. ed. Trad. Orlando Vitorino. Coleção Filosofia & Ensaios. Lisboa: Guimarães Editores, 1986.

  34. MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 99.

  35. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 73.

  36. QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do direito penal. São Paulo: RT, 2005, p. 23.

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