Uma Análise Jurídica e Fática sobre o papel dos Conselhos de Fiscalização Profissional no Brasil e a um Estudo sobre suas Anuidades.

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20/09/2024 às 18:05

Resumo:


  • Os conselhos de fiscalização profissional são autarquias federais com autonomia financeira, sobrevivendo das anuidades cobradas dos profissionais inscritos.

  • As anuidades dos conselhos são classificadas como contribuições parafiscais, com natureza tributária, e têm como fato gerador a existência de inscrição no conselho.

  • Os conselhos possuem poder de polícia para fiscalizar as profissões regulamentadas, sendo sua atuação limitada às atividades pertinentes ao conselho, e sua fiscalização é essencial para proteger o público e garantir a qualidade e ética profissional.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

RESUMO: Este artigo visa abordar um tema que chama a atenção de vários profissionais inscritos em conselhos de fiscalização profissional e até mesmo de membros da classe advocatícia inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil nos diversos estados brasileiros. O embasamento constitucional e a legalidade das anuidades cobradas pelos conselhos de fiscalização profissional será tratado, assim como o papel destes conselhos perante a sociedade. No presente estudo, será abordada toda a classificação tributária das anuidades cobradas pelos conselhos de fiscalização profissional, todo o contexto histórico dessas autarquias até o entendimento da Suprema Corte nos dias atuais acerca dessas entidades. Além disso, serão trazidos comentários acerca da Lei Federal 12.514/2011, com os devidos acréscimos promovidos pela Lei Federal 14.195/2021. Por fim, a questão do Poder de Polícia destas autarquias serão apresentadas assim como seus limites.

Palavras-Chave: Direito Administrativo. Poder de Polícia Execução Fiscal. Dívida Ativa. Supremo Tribunal Federal. Superior Tribunal de Justiça.

ABSTRACT: This article aims to address a topic that draws the attention of several professionals enrolled in professional regulatory bodies and even members of the legal profession enrolled in the Brazilian Bar Association in the various Brazilian states. The constitutional basis and legality of the annual fees charged by professional regulatory bodies will be addressed, as well as the role of these bodies in society. In this study, the entire tax classification of the annual fees charged by professional regulatory bodies will be addressed, along with the historical context of these autarchies up to the understanding of the Supreme Court today regarding these entities. In addition, comments will be made on Federal Law 12,514/2011, with the appropriate additions made by Federal Law 14,195/2021. Finally, the issue of the Police Power of these autarchies will be presented along with their limits.

Keywords: Administrative Law. Police Power. Tax Enforcement. Active Debt. Supreme Court. Superior Court of Justice

SUMÁRIO. 1. O Contexto Histórico dos Conselhos de Fiscalização Profissional no Brasil. 2. A Celeuma da Natureza Jurídica dos Conselhos de Fiscalização Profissional 3. As Anuidades dos Conselhos de Fiscalização Profissional 4. Os Conselhos de Fiscalização Profissional e o Superior Tribunal de Justiça 5. Uma Análise sobre os Conselhos de Fiscalização Profissional no Brasil e no Mundo. 6. Conclusão


INTRODUÇÃO

O tema a ser abordado no presente trabalho é de grande relevância e possui grande impacto na compreensão do que são os conselhos de fiscalização profissional, entidades que são rapidamente mencionadas nos cursos de Direito do país, mas pouco aprofundadas. Será tratado desde o surgimento dessas entidades até o funcionamento delas e seu papel nos dias atuais. A celeuma da natureza jurídica desses órgãos públicos também será trazida à tona. A questão das anuidades também será tratada, assim como a importância de conhecer as peculiaridades dessas contribuições frente aos impostos comuns. Por fim, a relação dos conselhos com o Superior Tribunal de Justiça também será abordada neste artigo jurídico, assim como a importância desses conselhos e o funcionamento dessas entidades equiparadas em alguns países do mundo.


O CONTEXTO HISTÓRICO DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAIS NO BRASIL

No Brasil, apenas em 1870, houve a primeira regulamentação de uma profissão, que foi a de Contador. Vale lembrar que, na época, vigorava a Constituição Imperial de 1824, que preceituava de forma rígida a liberdade de trabalho. Posteriormente, vieram a Constituição de 1889 e depois a de 1891, que mantiveram o forte princípio da liberdade de trabalho no país.

Em 1930, foi fundada a Ordem dos Advogados do Brasil, apesar de ter sua criação prevista há bastante tempo, desde o período imperial, pelo Instituto dos Advogados do Brasil. Com a criação da OAB, iniciou-se, no Brasil, a regulamentação profissional do exercício da advocacia, com exigência de formação universitária. A criação foi realizada pelo Decreto 19.408/1930, que assim dispôs:

“Art. 17. Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pelos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo.” 1

Foi apenas na Constituição de 1934, durante o governo Getúlio Vargas, que o texto foi modificado para assegurar a liberdade de trabalho em todo o país, desde que sejam observadas as condições de capacidade técnica e outras que a lei estabeleça. Neste caso, a lei seria ditada pelo Poder PúblicoParte superior do formulário.

Erroneamente atribui-se o surgimento dos conselhos ao período do regime militar do Brasil, que foi de 1964 até 1988. No entanto, tal afirmação é equivocada, visto que antes do regime militar, a partir da segunda metade do século XIX, começaram a surgir outros conselhos, além do de Contabilidade, como por exemplo, o Conselho Federal de Economia, o Conselho Federal de Medicina, o Conselho Federal de Economia (criados os três em 1951), o Conselho Federal de Odontologia, o Conselho Federal de Química (criados em 1956), o Conselho Federal de Biblioteconomia (criado em 1962) e o antigo Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura, hoje Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, criado em 1933. Ou seja, sete conselhos de fiscalização foram criados antes de 1964. A partir de 1964 até 1988, que foi o ano da Constituição Federal, tivemos a criação de aproximadamente quatorze conselhos de fiscalização profissional, entre eles o COFFITO (Fisioterapia e Terapia Ocupacional), o CFN (Nutrição), o CFA (Administração) e o CFMV (Medicina Veterinária). Entre os conselhos de fiscalização mais recentes estão os de Arquitetura e Urbanismo, criado em 2010, o de Técnicos Industriais, criado em 2018, entre outros criados antes dos anos 2000, como o de Educação Física de 1998 e o de Serviço Social de 1993.

Ocorre que a criação em si destes conselhos de fiscalização profissional foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. E a mesma Constituição reforçou o que dizia a carta constitucional de 1934, visto que consagrou o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, ainda detalhando a competência privativa da União Federal em legislar sobre a organização nacional do emprego e condições para o exercício das profissões. Ou seja, não cabe aos estados e aos municípios legislarem a fim de criarem conselhos federais/regionais de profissões, salvo se ocorrer Lei Específica delegando aos estados tal atribuição, o que não ocorreu até então.


A CELEUMA DA NATUREZA JURÍDICA DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAIS

Inicialmente, a ideia preponderante era de que os conselhos não integravam a Administração Pública, visto que eram outorgados a particulares das profissões que estes representavam. No entanto, depois da Constituição de 1988, por ocasião do art. 22, inciso XVI, ficou proibida a delegação a particulares para atuarem na regulação das profissões, o que era até então legalmente possível.

Atualmente, os conselhos são considerados autarquias federais, ou seja, devem ter suas criações feitas por lei, possuem personalidade jurídica de direito público, e é importante lembrar que possuem autonomia financeira, ou seja, sobrevivem de anuidades e não são ligados a qualquer tipo de esfera de Governo, seja União, Estados ou Municípios. Apesar disso, os conselhos são obrigados a contratar funcionários mediante Concurso Público, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal há mais de 10 (dez) anos. Vale ressaltar o recente julgado no RE 1.128.254 no âmbito da Suprema Corte, destacando-se o entendimento do Ministro Nunes Marques, relator do caso, que entendeu que os conselhos exercem atividade pública ao fiscalizar o exercício profissional e, por isso, devem seguir as normas constitucionais. Acompanharam o entendimento os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Luiz Edson Fachin.

Ainda é possível afirmar que os conselhos podem contratar sob o regime celetista, conforme definiu o STF no julgamento da ADC 36, ADI 5367 e ADPF 367. Destaca-se que, na ocasião do julgamento, esse entendimento não foi unânime, havendo voto contrário, por exemplo, da Ministra Carmen Lúcia, do Ministro Celso de Melo, de Marco Aurélio e de Ricardo Lewandowski, que entenderam ser inconstitucional a contratação pela via celetista, devendo os conselhos se submeterem ao regime jurídico único. O julgamento foi um grande divisor de águas no âmbito dos conselhos, visto que tratou de temas que até então eram objeto de grande discussão, tendo o STF finalmente se pronunciado sobre a natureza jurídica dos conselhos.

Apesar de serem autarquias federais, aos conselhos de fiscalização profissional, não se aplica o regime de precatórios, isto é o que definiu o STF por meio do Tema 877.

Insta lembrar que a celeuma foi trazida no próprio voto do Ministro Alexandre de Moraes, por ocasião do julgamento da ADC 36, AI 5367 e ADPF 367. O mesmo citou que o próprio STF, no julgamento da ADI 1717, invalidou a Lei Federal 9.649/1998, no tocante à previsão de que o exercício da fiscalização das profissões regulamentadas poderiam ser realizadas por ente de direito privado. Assim dispôs o Meretíssimo Ministro, ipsis litteris:

“...O fundamento então adotado cingiu-se à indelegabilidade de atividade típica de Estado, tal como a desenvolvida pelos Conselhos, em que há o exercício de poder de polícia na a fiscalização da atividade privada dos membros da categoria. Inclusive, destacou-se que tais entes detém parcela de poder tributário, consistente na capacidade tributária ativa para a arrecadação das anuidades de seus inscritos, mediante inscrição em dívida ativa e ajuizamento de execução fiscal.”

Ainda em seu voto, o mesmo destaca que a ADI 1717, não exauriu a discussão sobre o regime jurídico dos conselhos:

“...O julgamento da ADI 1717 não exauriu a discussão sobre o regime jurídico dos Conselhos, embora tenha assentado premissa decisiva para a incidência de certas regras do regime jurídico administrativo. Persiste a discussão sobre se, e em que medida, tais entes pertenceriam à estrutura orgânica da Administração Pública...”

Por fim, destaca-se a seguinte passagem no voto do referido ministro, acerca do regime jurídico dos conselhos, de sua independência em relação às leis orçamentárias e ao Poder Executivo e à verba que custeia esses conselhos:

“...De fato, os Conselhos profissionais gozam de ampla autonomia e independência; eles não estão submetidos ao controle institucional, político, administrativo de um ministério ou da Presidência da República, ou seja, eles não estão na estrutura orgânica do Estado. Eles não têm e não recebem ingerência do Estado nos aspectos mais relevantes da sua estrutura – indicação de seus dirigentes, aprovação e fiscalização da sua própria programação financeira ou mesmo a existência, podemos chamar, de um orçamento interno. Eles não não se submetem, como todos os demais órgãos do Estado, à aprovação de sua programação orçamentária, mediante lei orçamentária, pelo Congresso Nacional. Não há nenhuma ingerência na fixação de despesas de pessoal e de administração. Os recursos dessas entidades são provenientes de contribuições parafiscais pagas pela respectiva categoria. Não são destinados recursos orçamentários da União, suas despesas, como disse, não são fixadas pela lei orçamentária anual...”

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Diante de tudo o que foi exposto, podemos classificar os conselhos de fiscalização profissional como autarquias federais sui generis. O regime jurídico não é estatutário, mas sim celetista. Os conselhos possuem fonte de renda em contribuições parafiscais pagas pela categoria, que são as famosas anuidades. Além disso, os conselhos são obrigados a realizar Concurso Público para contratação de pessoal e não se sujeitam ao regime de precatórios como as autarquias federais comuns.


AS ANUIDADES DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL

As anuidades dos conselhos de fiscalização profissional são classificadas como contribuições parafiscais e têm natureza tributária, conforme preceitua o art. 149 da CF/88. Atualmente, cada conselho federal de classe dispõe sobre os valores das anuidades, desde que obedeçam aos limites do art. 6º da Lei 12.514/2011, lei esta que é bastante importante para o estudo das anuidades dos conselhos de fiscalização profissionais. Destaca-se na Lei 12.514/2011:

  1. “Art. 4º, parágrafo único - O inadimplemento ou o atraso no pagamento das anuidades previstas no inciso II do caput deste artigo não ensejará a suspensão do registro ou o impedimento de exercício da profissão.     (Incluído pela Lei nº 14.195, de 2021);

  2. Art. 5º - O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício;

  3. Art. 6º, § 2º O valor exato da anuidade, o desconto para profissionais recém-inscritos, os critérios de isenção para profissionais, as regras de recuperação de créditos, as regras de parcelamento, garantido o mínimo de 5 (cinco) vezes, e a concessão de descontos para pagamento antecipado ou à vista, serão estabelecidos pelos respectivos conselhos federais;

  4. Art. 9º A existência de valores em atraso não obsta o cancelamento ou a suspensão do registro a pedido.” 2

"Sobre o ponto 'a', é importante ressaltar que há algumas leis criadoras de conselhos e até mesmo resoluções internas que preveem a possibilidade de suspensão do exercício profissional do inscrito por inadimplemento ou atraso no pagamento de anuidades. Acontece que há alguns anos as cortes superiores já se manifestaram no sentido de declarar inconstitucional tais previsões.

A Lei 14.195/2021 foi, na verdade, uma correção legislativa a fim de pacificar e corrigir na letra da lei tais previsões. Com relação à suspensão do exercício profissional, o STF firmou entendimento de que a aplicação da medida em decorrência da falta de pagamento das anuidades configura sanção política em matéria tributária (Tema 732 de repercussão geral). Para a Corte, essa interdição profissional é um meio indireto de coerção para o pagamento do tributo, violando os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do devido processo legal.

O STF, nos últimos anos, vem reafirmando a inconstitucionalidade de normas que estabeleçam embaraços ao exercício de atividades profissionais ou econômicas, a fim de induzir o contribuinte ao pagamento de dívidas tributárias.3

Acerca do ponto 'b', o fato gerador das anuidades antes da Lei 12.514/2011 não era a existência de inscrição no conselho, e sim deveria ser comprovado o efetivo exercício profissional do inscrito. Tal mudança impactou significativamente na fiscalização de inscrições dos conselhos, visto que facilitou o controle de inscritos e baixados por parte das autarquias federais, que já poderiam ter sistema informático próprio para isso. Antes da Lei, a comprovação deveria ser por anotações em carteira de trabalho, se o profissional era responsável técnico de algum estabelecimento, se era sócio de alguma empresa que tenha como atividade básica a correspondente em seu conselho de fiscalização, etc. Ou seja, era mais difícil ter esse controle, e a mudança legislativa facilitou para os conselhos o controle de quem está inscrito ou não e para ter o conhecimento de quem é devido o lançamento das anuidades.

Com relação ao ponto 'c', o dispositivo é autoexplicativo, não há margem para eventuais insurgências acerca da competência dos conselhos federais em definir o valor exato da anuidade, desde que obedeçam aos limites previstos no art. 6º da Lei 12.514/2011, observando o reajuste de acordo com o INPC, calculado pelo IBGE.

Chamo a atenção para a questão do reajuste: este deve ser calculado da data de publicação da Lei 12.514/2011, ou seja, 31/10/2011, até a data de publicação da resolução respectiva do conselho profissional.

Sobre a questão do reajuste, o próprio Superior Tribunal de Justiça, já se posicionou:

“...A própria Lei nº 14.195, de 2021, estabelece as situações em que se aplica e aquelas em que não se aplica aos feitos pendentes, nestes termos:(a) a lei nova não se aplica aos feitos pendentes de valor igual ou superior ao novo piso por ela instituído (em vez de 4 anuidades cobradas pelo conselho, agora o novo piso corresponde a 5 vezes o valor de R$ 500,00 corrigido desde 2011 pelo INPC)...” Brasília, 19 de dezembro de 2022.
Ministro GURGEL DE FARIA, RECURSO ESPECIAL Nº 2041607 - SC (2022/0375493-9)

"Sobre o ponto 'd', trata-se de um entendimento trazido pela Lei desde 2011, o qual não constitui motivo para os conselhos profissionais negarem a baixa ou até mesmo suspenderem seus profissionais pelo fato de estarem inadimplentes com seu conselho. É uma disposição que vai de encontro a resoluções expedidas pelos conselhos profissionais e até mesmo previsões legais anteriores, as quais naturalmente não estão mais recepcionadas pelo ordenamento jurídico pátrio. A jurisprudência também já se posicionou sobre o tema, não deixando qualquer tipo de dúvidas sobre isso. O STF já declarou ser inconstitucional a suspensão realizada por conselho de fiscalização profissional do exercício laboral de seus inscritos por inadimplência de anuidades, pois a medida consiste em sanção política em matéria tributária. A questão foi discutida no RE 647.885.

Sobre o prazo prescricional dos conselhos profissionais, há uma grande confusão entre os profissionais inscritos referente a este prazo, pois erroneamente acham que o prazo de 5 (cinco) anos contido no CTN deve ser contabilizado da mesma forma que é para débitos municipais, estaduais e federais, o que não se aplica às anuidades de conselhos. Já é entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça (STJ):Parte superior do formulári

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. OFENSA AO ART. 1.022 NÃO CONFIGURADA EXECUÇÃO FISCAL. ANUIDADE. CONSELHO PROFISSIONAL. AUSÊNCIA DE DECADÊNCIA. ART. 8º DA LEI 12.514/2011. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. SITUAÇÃO ANALISADA PELA CORTE DE ORIGEM. CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.1. O acórdão recorrido consignou: "Inicialmente, é necessário destacar que a inscrição de débito em dívida ativa não constitui o crédito tributário. O ato de constituição do crédito é o lançamento.Desse modo, o débito não foi constituído com a inscrição em dívida ativa em 06/03/2020. No caso, já havia sido feito o lançamento das anuidades, tendo a devedora recebido notificação do Conselho em 13/09/2019 para efetuar o pagamento das anuidades referentes aos exercícios de 2012 a 2018 (Id. 3600370 - autos originários). Como não houve decadência, cabe analisar a ocorrência de prescrição. A Lei nº 12.514/11, que dispõe sobre as contribuições devidas aos conselhos profissionais em geral, estabelece, em seu art. 8º, que os conselhos profissionais não executarão judicialmente dívidas referentes a anuidades inferiores a 04 (quatro) vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente. Com efeito, a norma em questão contém disposição de ordem processual, instituidora de condição específica da ação de execução de anuidades profissionais. No tocante à prescrição, a Segunda Turma possui entendimento no sentido de que, em virtude da exigência de valor mínimo para fins de ajuizamento da execução estipulado pelo art. 8.º da Lei nº 12.514/2011, o prazo prescricional deve ter início somente quando o crédito se tornar exequível, ou seja, quando o total da dívida inscrita, acrescida dos respectivos consectários legais, atingir o patamar mínimo requerido pela mencionada norma jurídica. Precedente: TRF5, Processo nº 0803753-41.2016.4.05.8100, Rel. Des. Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, Segunda Turma, julgado em 20/07/2021. O Conselho executou valor superior a quatro anuidades, atendendo ao requisito do artigo 8º da Lei nº 12.514/11 apenas em 2015, com o termo inicial do prazo prescricional em 31/03/2015. Assim, consoante o princípio da actio nata , como a execução foi ajuizada em 24/03/2020, não há que se falar em prescrição. Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. (fls. 150-151, e-STJ) 2. Conforme já mencionado na decisão monocrática, não houve ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015. Não se constata omissão, obscuridade ou contradição no acórdão recorrido capaz de torná-lo nulo, especialmente porque o Tribunal de origem apreciou a demanda de forma clara e precisa, estando bem delineados os motivos e fundamentos que o embasam.3. O órgão julgador enfrentou a demanda, observando as questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução.4. Ademais, não se pode confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional.5. O aresto objurgado está em consonância com o entendimento do STJ no sentido de que "as anuidades pagas aos conselhos profissionais possuem natureza tributária, o que, em tese, admitiria o dia seguinte ao vencimento da obrigação como sendo o termo inicial da prescrição. No entanto, considerando a limitação de valor mínimo para fins de execução criada pela Lei n. 12.514/11, para o ajuizamento da execução, o prazo prescricional dever ter início somente quando o crédito se tornar exequível, ou seja, quando o total da dívida inscrita, acrescida dos respectivos consectários legais, atingir o patamar mínimo exigido pela norma" (REsp 1.524.930/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 8.2.2017).6. A pretensão da parte agravante não envolve a aplicação do direito ao caso. O que se pretende é modificar as premissas fáticas estabelecidas no acórdão hostilizado - que expressamente consignou que não ocorreu nem decadência nem prescrição -, em sentido oposto ao lá estabelecido, o que é inconfundível com revalorar as conclusões a partir delas extraídas e obstado em razão da Súmula 7/STJ.7. Agravo Interno não provido.”

(STJ - 202201446684, Relator: MIN. HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 28/11/2022, Data de Publicação: 13/12/2022)

Desta forma, conclui-se que o prazo prescricional de 5 (cinco) anos, só deve começar a ser contabilizado quando o débito inscrito se tornar exequível:

“...A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, em virtude da exigência de valor mínimo para fins de ajuizamento da execução, estipulada pela Lei 12.514/2011, o prazo prescricional dever ter início somente quando o crédito se tornar exequível, ou seja, quando o total da dívida inscrita, acrescida dos respectivos consectários legais, atingir o patamar mínimo requerido pela mencionada norma jurídica.” (REsp 2039214, Ministra REGINA HELENA COSTA, 30/11/2022)

Um exemplo de Tribunal Regional Federal que já se debruçou sobre a matéria é o TRF-5, já foi consolidado o entendimento no sentido de detalhar qual seria o patamar mínimo quantitativamente:

“PROCESSO Nº: 0811838-13.2021.4.05.8400 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECCIONAL DO RIO GRANDE DO NORTE ADVOGADO: Anne Danielle Cavalcante De Medeiros e outros ADVOGADO: Sergio Emmanuel Campos Feitosa APELADO: RILDER JORDAO DE LIMA AMANCIO RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima - 2ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Magnus Augusto Costa Delgado EMENTA PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. OAB. ANUIDADES. ART. 8º DA LEI Nº 12.514/2011 COM REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 14.195/21. APLICABILIDADE. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. 1. Apelação interposta pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Norte - OAB/RN, em face de sentença que indeferiu a inicial, extinguindo a presente execução, com fundamento no art. 330, III, c/c art. 924, I, do CPC, entendendo não se vislumbrar, no caso, o requisito da adequação; 2. Entendeu o MM. Juízo sentenciante que o valor executado estaria abaixo do patamar estabelecido no art. 8º, da Lei nº 12.514/2011, uma vez que, com a redação dada pela Lei nº 14.195/21, corresponderia ao valor de cinco anuidades (que, no exercício de 2021, ano da propositura da ação, correspondia a R$ 950,00, sendo, portanto, o valor mínimo para execução das dívidas o montante de R$ 4.750,00 - quatro mil setecentos e cinquenta reais). Concluiu que, como o valor executado é de R$ 4.714,52 (quatro mil setecentos e quatorze reais e cinquenta e dois centavos), relativo às anuidades de 2017, 2018, 2019 e 2020, teria restado caracterizada a carência de ação; 3. O art. 8º da Lei 12.514/11 com a alteração trazida pela Lei nº 14.195/2021, passou a estabelecer que: "os Conselhos não executarão judicialmente dívidas, de quaisquer das origens previstas no art. 4º desta Lei, com valor total inferior a 5 (cinco) vezes o constante do inciso I do caput do art. 6º desta Lei, observado o disposto no seu § 1º" (reajuste pelo INPC ou índice oficial que venha a substituí-lo). Já o art. 6º do mesmo diploma legal dispõe que as anuidades cobradas pelos Conselhos Profissionais serão, para os profissionais de nível superior, no valor de até R$ 500,00 (quinhentos reais); 4. Tendo em vista que a redação atual do art. 8º c/c o art. 6º da Lei 12.514/11 faz referência, expressamente, ao valor ali descriminado - cinco vezes R$ 500,00 (quinhentos reais), reajustados pelo INPC, ou por índice oficial que venha a substituí-lo, e não mais às anuidades cobradas pelos Conselhos Profissionais, é de ser provido o apelo, visto que o valor da execução, à toda evidência, o supera; 5. Destarte, deve o feito retornar à instância de origem a fim de que a execução tenha prosseguimento; 6. Apelação provida para reformar a sentença, determinando a remessa dos autos à instância de origem, para prosseguimento do feito. NC
(PROCESSO: 08118381320214058400, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA, 2ª TURMA, JULGAMENTO: 12/04/2022)”

Diante disso, é necessário ter bastante atenção às regras de prescrição referentes às anuidades dos conselhos de fiscalização profissional, que são específicas, não se confundindo com as regras aplicadas aos impostos municipais, estaduais e federais. Por fim, vale destacar o seguinte julgado referente ao lançamento das anuidades:

“As anuidades devidas aos conselhos profissionais constituem contribuições de interesse das categorias profissionais e estão sujeitas a lançamento de ofício, o qual apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte para efetuar o pagamento do tributo e o esgotamento das instâncias administrativas, em caso de recurso, sendo necessária a comprovação da remessa da intimação.” STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 1689783/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 26/10/2020.

Sobre o autor
David Félix Ribeiro da Silva

Advogado inscrito na OAB/PE sob o nº 49.941; Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco; Especialista em Relações Internacionais com ênfase em direito internacional pela Damásio Educacional; Licenciado em Letras (Inglês), pela Universidade Estácio de Sá; Pós-graduando em Advocacia Tributária pelo CEISC. Ocupo o cargo de Assessor Jurídico no CREFITO-1, Autarquia Federal, instituída pela lei nº 6.316/1975, Conselho de Fiscalização Profissional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional nos estados de Alagoas, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. Por esta mesma instituição, fui estagiário; No CREFITO-1, atualmente sou membro da Comissão de Contratações e Compras Públicas, possuo curso de pregoeiro oficial e curso de Licitações e Contratos pela Lei 14.133/2021, ministrado pela Escola Superior de Advocacia de Pernambuco. Em 2013, obtive o certificado de Cambridge com nível de proficiência em Inglês, nível B2.

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