Capa da publicação IA na busca de precedentes do STF
Capa: OpenAI
Artigo Destaque dos editores

Automatização e justiça:

eficácia da inteligência artificial na busca de precedentes do STF

19/10/2024 às 12:20
Leia nesta página:

Enquanto o robô do STF facilita a pesquisa, a expertise dos profissionais do direito continua a ser indispensável para a interpretação e aplicação das informações encontradas.

Com o advento da tecnologia digital, o acesso à informação legal e o gerenciamento de processos judiciais têm se tornado mais rápidos e eficientes. Plataformas digitais, sistemas de automação e inteligência artificial estão revolucionando a forma como advogados, juízes e partes envolvidas interagem com o sistema jurídico.

A era digital trouxe para o Direito grandes avanços e inovações, apresentando novos desafios para o campo jurídico. Tal proposição pode ser afirmada por Patrícia Peck Pinheiro, especialista em tecnologias jurídicas:

“(...) o Direito já não é resultado do pensamento solitário de um jurista, mas sim uma solução prática de planejamento e estratégia que só pode ser feita em equipe, num contato direto com as demandas e a própria evolução da sociedade. Essa solução deve ser capaz de adaptar-se a transformações cada vez mais rápidas e mudar também quando necessário. Toda mudança tecnológica é uma mudança social, comportamental, portanto jurídica.” (PINHEIRO, 2013, p. 26)

Com a IA, o Direito se redefine, oferecendo oportunidades para uma administração mais eficiente e acessível da justiça, mas também apresentando novos desafios que devem ser enfrentados com cuidado e responsabilidade. À medida que a tecnologia continua a avançar, o sistema jurídico precisa se adaptar e evoluir para garantir que a justiça permaneça eficaz, equitativa e segura.

Ademais, a era digital trouxe novas formas de resolução de conflitos, como as plataformas de resolução de litígios online, que oferecem métodos alternativos para a solução de disputas de maneira rápida e econômica. Esses avanços têm o potencial de democratizar o acesso à justiça, tornando-a mais acessível para um maior número de pessoas.

Nesse sentido, observa-se o gráfico abaixo com dados coletados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que compreenderam projetos de IA nos ramos de Justiça em 20232:

Fonte: Adaptado pela autora com base no painel da pesquisa sobre Inteligência Artificial do CNJ (2023)

A partir disso, entende-se que a IA está reformulando o Judiciário brasileiro, auxiliando na rapidez e eficiência no campo jurídico. A digitalização dos processos judiciais, por exemplo, permite uma tramitação mais ágil e transparente, reduzindo a burocracia e facilitando o acompanhamento dos casos. A gestão eletrônica de documentos e a utilização de softwares para análise jurídica proporcionam maior precisão e eficiência, permitindo que profissionais do Direito acessem e manipulem informações de forma mais dinâmica e estratégica.

Com efeito, nota-se esse cenário a partir do gráfico abaixo com dados coletados que apresentam atividades realizadas pelos projetos de IA nos tribunais em 20233:

Fonte: Adaptado pela autora com base no painel da pesquisa sobre Inteligência Artificial do CNJ (2023)

Nessa mesma linha, ressalta-se que além do Robô Victor do STF, que se destaca na busca por precedentes, diversos outros tribunais brasileiros têm incorporado tecnologias semelhantes para aprimorar suas operações. Um exemplo notável é o Robô "Judiciário Digital" desenvolvido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que automatiza a triagem e a classificação de processos. Esta IA utiliza técnicas de processamento de linguagem natural para categorizar casos com base em seu conteúdo, facilitando a distribuição eficiente de processos entre os juízes e agilizando o fluxo de trabalho. Outro caso relevante é o Robô "Sentença Automática" do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), que auxilia na redação de sentenças padrão e reduz a carga de trabalho dos magistrados ao gerar minutas com base em modelos predefinidos e informações do processo.

Esses avanços não se limitam apenas à automatização de tarefas repetitivas; eles também refletem uma tendência mais ampla de digitalização e inovação no sistema judiciário. O uso desses robôs visa não apenas aumentar a eficiência e a rapidez na tramitação de processos, mas também melhorar a precisão das decisões judiciais e garantir uma melhor gestão dos recursos judiciais.

No entanto, a transformação digital também apresenta desafios importantes. A crescente dependência da tecnologia levanta questões sobre a proteção de dados e a segurança da informação. A integridade e a confidencialidade das informações jurídicas são essenciais, e a ameaça de vazamentos ou ataques cibernéticos é uma preocupação constante. Além disso, a automação e o uso de algoritmos na tomada de decisões jurídicas devem ser cuidadosamente monitorados para garantir a imparcialidade e a justiça, evitando a reprodução de vieses e erros sistemáticos.

Nesse sentido, tem-se que a prática jurídica também está se adaptando às novas realidades digitais. Advogados e profissionais do Direito precisam desenvolver competências tecnológicas para utilizar essas ferramentas de forma eficaz e ética. O papel do advogado está evoluindo, exigindo uma compreensão aprofundada das implicações tecnológicas e das novas formas de prática jurídica.

Os órgãos jurisdicionais, visando a resolução de litígios e a pacificação social, utilizam o processo como uma ferramenta para resolver conflitos e garantir a aplicação das normas jurídicas em casos específicos. A função jurisdicional é exercida pelo Estado, que tem a autoridade para aplicar o direito de forma a resolver disputas e proteger a ordem jurídica e a autoridade da lei. Dessa forma, com o objetivo de assegurar a segurança jurídica e promover a justiça, o processo deve assegurar que quem tem um direito não cumprido receba exatamente o que lhe é devido, como se esse direito não houvesse sido violado por outra parte.

Em síntese, a era digital está transformando o processo civil de forma profunda e abrangente, trazendo benefícios significativos em termos de eficiência e acessibilidade, mas também exigindo uma atenção cuidadosa às questões de segurança e ética. A evolução contínua da tecnologia exigirá do sistema jurídico uma adaptação constante para garantir que a justiça seja administrada de forma equitativa e eficaz no contexto digital.

A virtualização dos julgamentos não foi óbice para que as decisões colegiadas aumentassem: passaram de 13 mil para 18 mil. A outra face da moeda mostra que, das 105 mil ações julgadas, 87,6 mil foram decisões monocráticas (83%). Em 2022, o percentual ficou em 86%. Ou seja, ainda estamos falando de um tribunal altamente monocrático e que, quando se reúne, julga 99% das vezes em ambiente virtual.

Para os ministros, o Plenário Virtual é a única solução possível para o volume de casos que chegam ao Supremo. Foi sendo aprimorado ao longo dos últimos anos e hoje é considerado uma referência em termos de funcionalidades:

Nesse sentido, tem-se que o Victor é um robô em operação desde 2017 no Supremo Tribunal Federal para análise de temas de repercussão geral na triagem de recursos recebidos de todo país. O Victor surgiu pela necessidade de agilidade nos procedimentos do STF diante do cenário de congestionamento de processos do STF, que anualmente recebe cerca de 70 mil novos processos e aproximadamente 350 novos processos por dia para serem analisados e julgados.

O robô representa um avanço significativo na busca de precedentes do STF, proporcionando uma ferramenta que alia tecnologia à prática jurídica. Sua eficácia é notável em diversos aspectos, especialmente quando se considera a quantidade de informações disponíveis e a complexidade das jurisprudências. Ao automatizar a pesquisa de precedentes, Victor consegue economizar tempo e esforço para advogados e pesquisadores, permitindo que se concentrem em análises mais aprofundadas.

Um dos principais benefícios é a rapidez com que ele processa dados. Em um cenário jurídico em que decisões podem ter um impacto profundo e imediato, a capacidade de localizar precedentes relevantes em questão de segundos é extremamente valiosa.

Outro ponto a ser destacado é a precisão na busca. Victor é programado para identificar palavras-chave e relacionar conceitos jurídicos, o que aumenta as chances de encontrar decisões relevantes. Quando configurado corretamente, ele pode trazer à tona precedentes que, de outra forma, poderiam ser ignorados em uma pesquisa tradicional. Essa capacidade de cruzar informações é especialmente útil em casos complexos, onde a jurisprudência pode ser ampla e diversificada.

No entanto, a eficácia do robô Victor não é isenta de limitações. Um dos desafios é a interpretação de contextos legais que muitas vezes são sutis e complexos. O robô pode não captar nuances que um profissional experiente entenderia, o que pode resultar em omissões ou na seleção de precedentes que não se aplicam completamente ao caso em questão. Portanto, é fundamental que os usuários complementem as buscas automatizadas com uma análise crítica.

Por fim, a eficácia do robô Victor na busca de precedentes do STF se destaca, mas deve ser encarada como uma ferramenta que complementa, e não substitui, o trabalho humano. A interação entre a tecnologia e o conhecimento jurídico é essencial para garantir que os resultados obtidos sejam realmente úteis e aplicáveis. Assim, enquanto o robô facilita a pesquisa, a expertise dos profissionais do Direito continua a ser indispensável para a interpretação e aplicação das informações encontradas.


REFERÊNCIAS

BERTO, Fernando Conejo da Silva; LUIZ, Denis de Souza. A influência da inteligência artificial no meio jurídico. Trabalho de Conclusão de Curso: Bacharel em Direito. Florianópolis, 2023. Disponível em: https://repositorio.animaeducacao.com.br/items/ab27ad7f-523f-44d5-86ac-5122287ec41a/full. Acesso em: 03 out. 2024.

BRASIL. Lei Federal nº 13.105 de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 10 out. 2024.

CARACIOLA, Andrea Boari; DE ASSIS, Carlos Augusto; DELLORE, Luiz; DE SOUZA,

André Pagani. Teoria Geral do processo contemporâneo. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Com 31,5 milhões de casos novos, Poder Judiciário registra recorde em 2022. Edição 29/08/2023, Brasília. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/com-315-milhoes-de-casos-novos-poder-judiciario-registra-recorde-em-2022/#:~:text=Tramitaram%20no%20Judici%C3%A1rio%20brasileiro%2081,de%20a%C3%A7%C3%B5es%20judiciais%20em%20tramita%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 03 out. 2024.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Justiça 4.0. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/tecnologia-da-informacao-e-comunicacao/justica-4-0/. Acesso em: 13 out. 2024.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ) Justiça 4.0: Inteligência Artificial está presente na maioria dos tribunais brasileiros. Edição 14/06/2022, Brasília. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/justica-4-0-inteligencia-artificial-esta-presente-na-maioria-dos-tribunais-brasileiros/#:~:text=A%20pesquisa%20apresentada%20nesta%20ter%C3%A7a,foram%20informados%20apenas%2041%20projetos.Acesso em: 03 out. 2024.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Painel da pesquisa sobre Inteligência Artificial 2023. Disponível em: https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=43bd4f8a-3c8f-49e7-931f-52b789b933c4&sheet=21c4f3bc-eeb4-4aee-a3ef-42bf55df5eb2&theme=horizon&lang=pt-BR&opt=ctxmenu,currsel&select=Ramo%20da%20Justiça,&select=Tribunal,&select=Seu%20Tribunal/%20Conselho%20possui%20Projeto%20de%20IA?,&select=Nome%20do%20Projeto. Acesso em: 11 out. 2024

DA COSTA FELIPE, Bruno Farage; PERROTA, Raquel Pinto Coelho. Inteligência Artificial no Direito–uma realidade a ser desbravada. Revista de Direito, Governança e Novas Tecnologias, v. 4, n. 1, p. 1-16, 2018.

JUNIOR, Antonio Pereira Gaio; SILVA, Fábia Antonio. Direito, Processo e Inteligência Artificial. Diálogos Necessários ao Exercício da Jurisdição. Revista Eletrônica de Direito

Processual, v. 24, n. 1, 2023.

LACERDA, Bruno Torquato Zampier. Estatuto Jurídico da Inteligência Artificial: Entre categorias e conceitos, a busca por marcos regulatórios. Editora Foco, 2022.

PINHEIRO, Patrícia Peck. Direito digital. 5. ed. rev., atual. e ampl. de acordo com as Leis n.

12.735 e 12.737, de 2012. São Paulo: Saraiva, 2013

RESTIER, Elaine; MACHADO, Carlos Eduardo. OS DESAFIOS VENCIDOS E A VENCER NOS MODELOS DE LINGUAGEM: Como a Inteligência Artificial tem auxiliado o segmento jurídico. Código 31: revista de informação, comunicação e interfaces, v. 2, n. 1, 2024.

ROQUE, Andre; DOS SANTOS, Lucas Braz Rodrigues. Inteligência artificial na tomada de decisões judiciais: três premissas básicas. Revista Eletrônica de Direito Processual, v. 22, n. 1, 2021.

VIANA, Ulisses Schwarz. Inovações no processo civil brasileiro: objetivação, racionalização e redução dos custos de acesso à jurisdição civil. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, t. 2, p. 293-305, abr./jun. 2011.


  1. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Painel da pesquisa sobre Inteligência Artificial 2023. Disponível em: https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=43bd4f8a-3c8f-49e7-931f-52b789b933c4&sheet=21c4f3bc-eeb4-4aee-a3ef-42bf55df5eb2&theme=horizon&lang=pt-BR&opt=ctxmenu,currsel&select=Ramo%20da%20Justiça,&select=Tribunal,&select=Seu%20Tribunal/%20Conselho%20possui%20Projeto%20de%20IA?,&select=Nome%20do%20Projeto. Acesso em: 11 out. 2024

  2. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Painel da pesquisa sobre Inteligência Artificial 2023. Disponível em: https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=43bd4f8a-3c8f-49e7-931f-52b789b933c4&sheet=21c4f3bc-eeb4-4aee-a3ef-42bf55df5eb2&theme=horizon&lang=pt-BR&opt=ctxmenu,currsel&select=Ramo%20da%20Justiça,&select=Tribunal,&select=Seu%20Tribunal/%20Conselho%20possui%20Projeto%20de%20IA?,&select=Nome%20do%20Projeto. Acesso em: 11 out. 2024

Sobre a autora
Roberta Cardoso dos Santos

Acadêmica de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie(UPM). Tecnóloga em Serviços Jurídicos pela Universidade Cruzeiro do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Roberta Cardoso. Automatização e justiça:: eficácia da inteligência artificial na busca de precedentes do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7780, 19 out. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/111282. Acesso em: 21 out. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 37%
Logo JusPlus
JusPlus

R$ 24 ,50 /mês

Pagamento único de R$ 294 por ano
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos