Governo noticia R$ 5 mil de isenção, porém cobra IRPF ilegal desde 1996

Resumo:


  • O limite de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) em 2024 seria de R$ 11.296,00 se respeitado o critério estabelecido em 1996.

  • A escalada de tributação sobre salários fere três princípios constitucionais: Legalidade, Capacidade Contributiva e Vedação ao Confisco.

  • Os aumentos tributários anuais sem lei prévia violam o princípio da legalidade e a inércia legislativa impede a atualização das leis tributárias em conformidade com a realidade social.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Em 1996, no governo de Fernando Henrique Cardoso, trabalhadores do setor privado e servidores públicos que recebiam até oito salários-mínimos mensais estavam isentos do desconto do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) em seus contracheques.

Se tal critério fosse respeitado de acordo com os princípios constitucionais previstos na Carta Magna de 1988, em 2024 o limite de isenção corresponderia a R$ 11.296,00.

Entretanto, a projeção do salário-mínimo para o ano de 2025 é de R$ 1.502,00, o que equivale a R$ 3.004,00 para dois salários-mínimos. Como o orçamento para 2025 não prevê reajuste da tabela do IRPF, mesmo quem receber apenas dois salários-mínimos será submetido à retenção na fonte a título de IRRF.

Essa escalada de tributação sobre salários, vencimentos e proventos, configurando verdadeira expropriação do rendimento do cidadão, afronta três princípios constitucionais:

  1. Princípio da Legalidade;

  2. Princípio da Capacidade Contributiva;

  3. Princípio da Vedação ao Confisco.

Cada um desses princípios já foi objeto de análise na série de artigos sobre os Princípios Constitucionais Tributários Vigentes no Brasil, sendo desnecessário aprofundar tais pontos neste texto.

Na prática, o Governo Federal promove aumentos tributários anuais sem lei anterior que os estabeleça. O Congresso Nacional, a quem cabe legislar sobre o tema, mostra-se mais preocupado com Comissões Parlamentares de Inquérito e negociações internas do que com o exercício de sua competência constitucional.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, na condição de guardião da Constituição, mantém-se silente, anuindo à violação dos direitos fundamentais dos cidadãos, perpetuada ano após ano pelo Poder Executivo.

A seguir, apresenta-se o levantamento divulgado pela UNAFISCO, detalhando a evolução do aumento do IRRF – decorrente do IRPF – ao longo dos últimos 28 anos:

Ano

Salário-Mínimo (R$)

Valor de Isenção (R$)

% no Ano (SM)

1996

112,00

900,00

8,04

1997

120,00

900,00

7,50

1998

130,00

900,00

6,92

1999

136,00

900,00

6,62

2000

151,00

900,00

5,96

2001

180,00

900,00

5,00

2002

200,00

1.058,00

5,29

2003

240,00

1.058,00

4,41

2004

260,00

1.058,00

4,07

2005

300,00

1.164,00

3,88

2006

350,00

1.249,36

3,57

2007

380,00

1.313,69

3,46

2008

415,00

1.372,81

3,71

2009

465,00

1.434,59

3,04

2010

510,00

1.499,15

2,94

2011

545,00

1.566,61

2,87

2012

622,00

1.637,11

2,63

2013

678,00

1.710,78

2,52

2014

724,00

1.787,77

2,47

2015

788,00

1.903,98

2,42

2016

880,00

1.903,98

2,16

2017

937,00

1.903,98

2,03

2018

954,00

1.903,98

2,00

2019

998,00

1.903,98

1,91

2020

1.045,00

1.903,98

1,82

2021

1.100,00

1.903,98

1,73

2022

1.212,00

1.903,98

1,57

2023

1.320,00

2.640,00 *

2,00

2024

1.412,00

2.824,00 *

2,00

2025

1.502,00

2.824,00 *

1,88

Nos anos de 2023 e 2024, foi autorizada a dedução dos 20% previstos para as declarações de ajuste anual em cada mês do ano-base, razão pela qual aparece o valor de R$ 2.640,00, distinto do limite de isenção de R$ 2.259,20.

Observa-se que, independentemente dos partidos que governaram o Brasil no período de 1996 a 2024, todos os presidentes, sem exceção, acabaram por onerar indevidamente os contribuintes.

A situação pode ser ilustrada pela conhecida parábola do sapo: colocado em uma bacia com água fria, esta é aquecida lentamente até ferver, sem que o animal perceba o aumento gradual da temperatura, vindo a morrer cozido. Assim ocorre com os contribuintes brasileiros: ao longo de 28 anos foram sendo gradualmente onerados por aumentos tributários sem lei formal, de maneira dissimulada e, portanto, inconstitucional.

É oportuno recordar o disposto na Constituição Federal de 1988, em seu art. 150, inciso I:

“Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – Exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.”

Trata-se de princípio de legalidade estrita, que não comporta delegação de poderes. Apenas o Poder Legislativo – Congresso Nacional, Assembleias Legislativas Estaduais e Câmaras Municipais – possui competência para instituir ou majorar tributos. Sem lei formal, não há que se falar em criação ou aumento de tributos e contribuições.

Entretanto, a inércia legislativa é notória. Basta observar que ainda vigoram a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943, o Código Tributário Nacional de 1966, o Código Penal de 1940 e o Código Comercial de 1850 (em grande parte revogado, mas com dispositivos ainda aplicáveis), sem que se tenha promovido a devida atualização e consolidação normativa em consonância com a realidade social de 2024.

A situação também atinge os contribuintes do IRPJ, diante do congelamento de valores constantes do Regulamento do Imposto de Renda (RIR/2018), em sua maioria vigentes desde 1996.

Conclui-se, portanto, que toda a sociedade brasileira e suas entidades representativas das classes produtivas reconhecem as distorções geradas pelo congelamento dos valores previstos no IRPF, IRPJ e CSLL. Resta, contudo, vontade política para corrigir os rumos da legislação tributária.

A reforma tributária em curso oferece a oportunidade para sanar tais aberrações. Com a palavra, o Congresso Nacional, a CNI, a CNC, a CNS, a CNT e, por que não, também a OAB.

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Sobre os autores
Roberto Rodrigues de Morais

Especialista em Direito Tributário. Consultor Tributário na DEEP CONSULTING. Ex-Consultor da COAD. Autor do livro online "Reduza dívidas previdenciárias".

Pablo Juan Estevam Morais

Advogado Tributarista

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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