V. A incompatibilidade da extinção ou cancelamento da pensão por morte em caso de novo casamento ou constituição de união estável após o advento da Emenda Constitucional nº 103/2019.
Conforme estabelece o artigo 24, XII da Constituição Federal, a União, Estados, Municípios e o Distrito Federal detêm competência concorrente para legislar sobre previdência social e proteção e defesa da saúde.
Aos Estados e ao Distrito Federal compete legislar sobre previdência social dos seus respectivos servidores, no âmbito de suas respectivas competências e especificamente para os servidores titulares de cargo efetivo, sempre em observância às normas gerais editadas pela União, conforme o disposto no §1º do referido artigo 24, não excluindo a competência suplementar dos Estados, os quais exercerão a competência legislativa plena enquanto inexistirem referidas normas gerais, as quais, uma vez editadas, suspenderão a eficácia da lei estadual no que lhe for contrária.
Com efeito, com o advento da Emenda Constitucional 103/2019, com relação à pensão por morte ficou estabelecido ser vedada a acumulação de mais de uma pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro no âmbito do mesmo regime de previdência social, ressalvadas as pensões do mesmo instituidor decorrentes do exercício de cargos acumuláveis na forma do art. 37 da Constituição Federal, ou seja, a vedação se restringe única e exclusivamente em coibir o recebimento de duas pensões por morte decorrentes de ex-cônjuges ou companheiros no mesmo regime previdenciário, não havendo qualquer previsão quanto ao cancelamento da pensão em razão de novo casamento ou união estável.
Conforme ensinamentos de Bruno Sá Freire Martins
A previsão deixa claro, também, que o novo casamento ou a nova união estável não se constitui impedimento para o recebimento de uma pensão por morte decorrente do óbito do cônjuge ou companheiro, já que o que está sendo vedado é o recebimento de duas pensões e não o novo enlace. (2021, p. 298)
Assim, a previsão contida no artigo 24 da EC 103/2019, que não impõe que o novo casamento ou constituição de união estável seja causa de extinção da pensão por morte, deve ser considerada a norma geral a ser seguida pelos Estados e Municípios.
Desta forma, não devem os referidos entes federados, através de lei, ainda que decorrente de reforma da previdência local, dispor de forma diversa sobre a extinção do referido direito. E assim o fazendo, padecerá de inconstitucionalidade.
VI. Conclusões
A extinção da pensão por morte prevista nas Leis dos Regimes Próprios dos Estados e Municípios daquela (e) que venha a contrair novo casamento ou constituir união estável, não deve ser efetivada de forma abrupta ou discricionária por parte dos entes federados, mas sim precedida de procedimento administrativo que garanta o direito do contraditório e da ampla defesa da(o) pensionista, sob pena de nulidade do ato de cancelamento da pensão, devendo ao final restar comprovada a efetiva melhoria da condição financeira da(o) pensionista com o novo casamento ou união estável, sendo o ônus de tal comprovação da Administração.
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