Patentes, desenhos industriais e marcas como bens móveis: a monopolização industrial e a liberdade econômica

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22/11/2024 às 15:43

Resumo:


  • Propriedade industrial é regulada pela Lei de Propriedade Industrial, visando defender bens intangíveis do estabelecimento comercial.

  • Patentes, desenhos industriais e marcas são considerados bens móveis no Brasil, mas ideias não são escassas, tornando questionável essa classificação.

  • Os direitos de propriedade industrial criam monopólios industriais, distorcendo a livre concorrência e prejudicando a alocação eficiente de recursos na economia.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.
  1. O desenho industrial

Desenho industrial é definido pelo artigo 95 da LPI como:

 Art. 95. Considera-se desenho industrial a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial.

O desenho industrial pode ser distinguido da obra de arte e da patente industrial de utilidade por duas características suas: a aplicação industrial e pela falta de atividade inventiva. A primeira, no desenho industrial, dá-se por meio da aplicabilidade dela num produto, ou seja, diferentemente da obra de arte, ela pode ser aplicada a um produto; pela segunda, distinguindo-a da patente de modelo utilidade, tem-se a falta de aplicabilidade prática do desenho industrial na indústria (recordando que indústria é em sentido amplo, não apenas em indústrias em sentido estrito). De acordo com CRUZ (2024, p. 280):

“Assim, se uma determinada criação for técnica, estamos diante de uma invenção ou de um modelo de utilidade. Se, por outro lado, essa criação for estética, estamos diante de uma obra de arte (quando não aplicada a um produto industrial) ou de um desenho industrial (quando aplicada a um produto industrial)”.

Antes de passar para o próximo tópico a respeito do desenho industrial, ele, diferentemente das patentes, ele é registrado. Dessa forma, partir-se-á para a análise dos requisitos de registrabilidade do desenho industrial.

Entre eles, há quatro, que são: novidade; originalidade; aplicação industrial; licitude (ou desimpedimento):

  • Novidade: quando a invenção não está contida no estado da técnica, ou seja, não estar acessível ao público antes da data do depósito, segundo o § 1° do art. 96 da LPI;

  • Originalidade: quando o desenho industrial resultar de “uma configuração visual distintiva, em relação a outros objetos anteriores” (art. 97 da LPI), ou seja, o desenho industrial ser diferente dos demais, distinguindo-se.

  • Aplicação industrial: como citado anteriormente, ele é aplicável a um produto, diferentemente de uma obra de arte, todavia, difere-se das patentes por não ter aplicação prática;

  • Licitude (ou desimpedimento): rol taxativo do art. 100 da LPI, transcrevendo-o abaixo, por preservar a moral e os bons costumes:

Art. 100. Não é registrável como desenho industrial:

        I - o que for contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou imagem de pessoas, ou atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou ideia e sentimentos dignos de respeito e veneração;

        II - a forma necessária comum ou vulgar do objeto ou, ainda, aquela determinada essencialmente por considerações técnicas ou funcionais.

A análise do processo formal de registrabilidade, cabendo ressaltá-lo, é realizado de forma preliminar pelo INPI (art. 102 da LPI). Se com irregularidades, o interessado tem o prazo de 5 dias para cumprir as exigências formais da registrabilidade (art. 103 da Lei 9.279/1996).

A publicação no INPI e a concessão do registro do desenho industrial são automáticas, cabendo ressaltar que, pela doutrina, é dito que o exame de mérito é eventual e diferido, porquanto o exame de mérito do desenho industrial pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial é facultativo, sendo necessário requerê-lo ao instituto, nos termos do art. 111 da LPI.

Já o prazo de vigência do desenho industrial é de 10 anos, com prorrogação de prazo de 5 anos por três períodos sucessivos, conforme o caput do art. 108 da Lei de Propriedade Industrial:

 Art. 108. O registro vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos contados da data do depósito, prorrogável por 3 (três) períodos sucessivos de 5 (cinco) anos cada.

Ainda, no rol do artigo 119, incisos I, II, III e IV da LPI, o desenho industrial, diferente da patente, não se extingue por caducidade.


  1. Marca

“A finalidade precípua da marca, portanto, é diferenciar/distinguir o produto ou serviços dos seus “concorrentes” no mercado” (CRUZ, 2024, p. 286). Dessa maneira, a marca é um sinal visual que distingue os produtos ou serviços de um empresário (nos termos do caput do art. 996 do CC/2002: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”) em relação aos seus concorrentes, como bem leciona André Santa Cruz na passagem transcrita de sua obra ora citada.

O processo de registro de marca é similar aos de patentes e de desenho industrial, não sendo necessário, portanto, expô-lo nesta parte do presente trabalho, pois já foi devidamente explicado com base na Lei de Propriedade Industrial em tópicos anteriores.

Já o prazo de vigência da marca é de 10 anos, prorrogável por períodos iguais e sucessivos, similar – com algumas modificações – ao do desenho industrial, nos termos do art. 133 LPI: “o registro da marca vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos, contados da data da concessão do registro, prorrogável por períodos iguais e sucessivos.” A diferença entre o desenho industrial, as patentes e a marca é que o prazo deste se inicia da data da concessão. Diferente do desenho industrial, que tem prazos de vigência de três períodos de cinco anos, a marca tem prazos indefinidos e sucessivos de dez anos.

A proteção da marca é assegurada pelo INPI o seu uso exclusivo, por parte do titular do registro, em âmbito nacional, podendo ele, nos termos do art. 130 da LPI:

  Art. 130. Ao titular da marca ou ao depositante é ainda assegurado o direito de:

        I - ceder seu registro ou pedido de registro;

        II - licenciar seu uso;

        III - zelar pela sua integridade material ou reputação.

A respeito da proteção concedida pelo registro da marca, este será válido, após a concessão pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial, por todo o território nacional, sendo de uso exclusivo do titular da marca.

Já a cessão da marca, exposto anteriormente no art. 130, I da LPI, diferentemente do que ocorre com as patentes, não precisa aquela estar registrada, bastando o pedido do registro, simplesmente. Além disso, o cessionário da licença, o beneficiário que a receberá do titular, é quem precisa preencher os requisitos legais do registro, segundo o art. 128 da LPI e seu rol formal de processo de registro.

O licenciamento, por outro lado, deve ser averbado no INPI – inclusive para que ocorra o efeito erga omnes perante terceiros – que, segundo o julgado do STJ (REsp 256.422-RJ), tem competência exclusiva para conceder a licença da marca do titular para o novo dono dela.

No quesito nulidade da marca, sob outro prisma, será nula a marca que não preencher os requisitos legais (art. 165 da Lei de Propriedade Industrial), gerando efeitos ex tunc – retroagindo até a data do depósito.

A extinção da marca, por fim, dar-se-á segundo os termos do art. 142 da LPI:

 Art. 142. O registro da marca extingue-se:

        I - pela expiração do prazo de vigência;

        II - pela renúncia, que poderá ser total ou parcial em relação aos produtos ou serviços assinalados pela marca;

        III - pela caducidade; ou

        IV - pela inobservância do disposto no art. 217.

O REsp 1236218/ RJ do STJ, realizando um adendo, já decidiu que se uma empresa produz o produto no Brasil, todavia o exporta, ela tem direito ao registro da marca, nos termos do art. 143, I da LPI.


  1. O artigo 83, inciso III do Código Civil, o artigo 5° da LPI, o Direito de propriedade industrial como bens móveis pela legislação brasileira e a liberdade econômica na sociedade

Chega-se ao ponto central do presente artigo que aqui se escreve. O artigo 83, III do CC/2002 e o art. 5° da Lei 9.279/1996 consideram, para efeitos legais e econômicos, as patentes, desenhos industriais e as marcas como bens móveis. Transcreve-se os artigos citados abaixo:

Art. 83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:

I - as energias que tenham valor econômico;

II - os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes;

III - os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.

 Art. 5º. Consideram-se bens móveis, para os efeitos legais, os direitos de propriedade industrial.

A questão a ser debatida no presente trabalho, como ponto central e ponto chave após a exposição da legislação brasileira em torno do Direito de Propriedade Industrial, é que, para o presente autor deste artigo, não se pode considerar, de forma racional e economicamente, as patentes os desenhos industriais e as marcas como bens!

Bens são, naturalmente escassos, existindo a propriedade para evitar conflitos quanto a eles, pois a escassez gera uma competitividade por eles. Por isso, KINSELLA (2008, p. 25) diz:

“Um pouco de reflexão mostrará que é a escassez desses bens – o fato de que pode haver conflito quanto a esses bens por parte de múltiplos agentes humanos. própria possibilidade de conflito quanto a um recurso o torna escasso, dando origem à necessidade de regras éticas para governar seu uso. Assim, a função social e ética fundamental dos direitos de propriedade é prevenir conflito interpessoal quanto a recursos escassos.”

Dessa forma, os agentes econômicos (o ser humano) necessitam do direito à propriedade a fim de evitar tais conflitos e alocar os recursos da maneira mais eficiente – nos ditames do livre mercado. No entanto, é possível existirem bens intangíveis? Não. Não é possível, porquanto o fator escassez é primordial para que haja, efetivamente e de fato, propriedade, como explica (KINSELLA, 2088, p. 25-26):

“A natureza contém, então, coisas que são economicamente escassas. Meu uso de alguma coisa conflita com (exclui) seu uso dela, e vice versa. A função dos direitos de propriedade é prevenir conflito interpessoal quanto a recursos escassos, ao alocar posse exclusiva de recursos a indivíduos específicos (donos). o cumprir essa função, direitos de propriedade devem ser visíveis e justos. Claramente, para que os indivíduos evitem usar propriedade possuída por outros, limites e direitos de propriedade devem ser objetivos (intersubjetivamente definíveis): eles devem ser visíveis. Por essa razão, direitos de propriedade devem ser objetivos e não ambíguos. Em outras palavras, ‘boas cercas criam bons vizinhos’.”

Dessa forma, é possível, de fato, haver o que a LPI define como propriedade intelectual? O presente autor entende que não, porquanto há no Direito de Propriedade Industrial a intangibilidade de bens. Estes não podem serem intangíveis, pois pressupõe a escassez – coisa que a propriedade intelectual, sendo a propriedade industrial um ramo desta, não possui. KINSELLA (2008, p. 27) diz o seguinte:

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Mas com certeza é claro que, dada a origem, a justificativa e a função dos direitos de propriedade, que eles são aplicáveis apenas a bens escassos. Caso estivéssemos num Jardim do Éden onde a terra e outros bens fossem infinitamente abundantes, não haveria escassez, e, portanto, nenhuma necessidade de direitos de propriedade; conceitos de propriedade não fariam sentido. ideia de conflito, e a ideia de direitos, sequer surgiriam. Por exemplo, o fato de você pegar meu cortador de grama não acabaria me privando de um se eu pudesse encantar outro com um piscar de olhos. Pegar o cortador nessas circunstancias não seria “roubo”. Direitos de propriedade não são aplicáveis a coisas de abundância infinita, porque não há como haver conflito quanto a elas. Assim, direitos de propriedade devem possuir fronteiras objetivas, discerníveis, e devem ser alocadas de acordo com a regra do primeiro ocupante. Além disso, direitos de propriedade são aplicáveis apenas a recursos escassos. problema com direitos sobre P é que os objetos ideais protegidos pelos direitos sobre P não são escassos; e, além disso, tais direitos de propriedade não são, e nem podem ser, alocados de acordo com a regra do primeiro ocupante [...].”

As ideias, portanto, não são escassas. E o que é uma patente, um desenho industrial ou uma marca senão uma ideia materializada? Segundo KINSELLA (2008, p. 27):

“Assim como o cortador de grama magicamente reproduzível, ideias não são escassas. Se eu inventar uma técnica para colher algodão, o fato de você colher algodão dessa forma não tira essa técnica de mim. u ainda possuo minha técnica (assim como meu algodão). Seu uso não exclui o meu; podemos ambos usar minha técnica para colher algodão. Não há escassez econômica, e nenhuma possibilidade de conflito quanto ao uso de um recurso escasso. Assim, não há necessidade de exclusividade.”

Desse modo, o que é a patente senão uma ideia materializada com aplicação prática, também chamada de aplicação industrial, contendo o que se chamada de atividade inventiva – cujo estado da técnica insere-se nisso –, então? Pegando o exemplo das patentes em sentido amplo, elas criam uma escassez artificial no mercado ao monopolizar, por meio do governo – nesse caso o INPI –, a produção de bens ou serviços, mesmo da técnica utilizada pela indústria em sentido amplo. Segundo KINSELLA (2008, p. 28-29):

“Ideias não são naturalmente escassas. Entretanto, ao reconhecer um direito sobre um objeto ideal, se cria escassez onde não existia antes.”

“Apenas recursos escassos, tangíveis, são objetos passíveis de conflito interpessoal, então é apenas a eles que as regras de propriedade são aplicáveis. Assim, patentes e direitos autorais são monopólios injustificáveis garantidos por legislação governamental.”

As patentes, assim como os desenhos industriais, nada mais são do que privilégios de uso exclusivo sobre uma determinada técnica, no caso das patentes, e de símbolos aplicáveis a um produto, todavia sem uma aplicação prática – este último também no caso das patentes. Ao criar estas, por exemplo, o INPI cria um monopólio de uso exclusivo de determinado inventor, o que causa a diminuição na produção por parte deste e o aumento do preço dos produtos finais, visto que o titular da patente monopoliza o mercado.

Ainda, ele pode licenciá-las, fazendo com que ele capitalize em cima da sua invenção patenteada, de seu uso exclusivo concedido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial, e criando, segundo ROTHBARD (2023), uma espécie de imposto artificial sobre os produtos finais, tendo em vista que o licenciado tem que pagar royalties para o titular da patente, o que encarece os produtos finais e desvirtua a livre concorrência, que em um livre mercado seria saudável.

A respeito das marcas, o presente autor concorda com Stephan Kinsella no seguinte ponto: quando há duas marcas de mesmo nicho mercadológico similares, ocorre a anulação de marca – via administrativa ou judicial, dependendo do caso (pois há marcas que podem coexistir, dentro das exceções da LPI) – no caso de levar os consumidores a erro. O presente autor entende que há um quê de justiça nisso, contudo o titular da marca não deveria ter o direito de processar o concorrente desleal, mas sim os consumidores que são induzidos ao erro é quem deveriam entrar em juízo com o fim de solicitar danos materiais – quiçá morais, em alguns casos –, devendo a atuação ser da vara consumerista, mesmo com o auxílio de ação civil pública junto aos PROCONS. De acordo com KINSELLA (2008, p. 48): “No meu ponto de vista, são os direitos dos consumidores que são violados, e não os do dono da marca.” Isso pelo motivo de os consumidores serem levados a erro por nomes marcários similares, querendo, por exemplo, o consumidor médio consumidor o produto de uma lanchonete – tendo ela um alto renome ou mesmo um nome notoriamente conhecido – e consome de outra com a pior qualidade, devendo o(s) consumidor(es) que se sentir(em) lesados entrar em juízo – com ajuda do Ministério Público ou PROCON com o fim de ajuizarem ação civil pública contra a lanchonete que praticou a concorrência desleal.


Conclusão

Conclui-se, portanto que os direitos de propriedade industrial são, na verdade, monopólios industriais – mas não um direito –, tendo em vista que patentes, desenhos industriais e marcas não são, como diz a LPI e o CC/2002, bens móveis, pois para serem considerados como tais devem ser escassos e ideias não possuem escassez. Além disso, que esse monopólio cria uma escassez artificial que sem a concessão do governo e do INPI não existiria, desvirtuando a livre concorrência no mercado, ao dar ao titular da patente, da marca e do desenho industrial a posse de algo que nem sequer é um bem, de fato, distorcendo a alocação dos recursos, escassos, na economia de mercado, prejudicando a sociedade brasileira, desse modo.


Referências Bibliográficas

CRUZ, A. S. Manual de Direito Empresarial: Volume Único. 14 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2024.

KINSELLA, N. S. Contra a Propriedade Intelectual. 1 ed. São Paulo: LVM Editora, 2008.

ROTHBARD, M. Governo e Mercado: A economia da intervenção estatal. 2 ed. São Paulo: LVM Editora e Instituto Liberal, 2023.

MANKIW, N. G. Introdução à economia. 8 ed. EUA: Editora Cengage Learning, 2019

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.

BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial e altera a Lei nº 5.772, de 21 de dezembro de 1971 (Código da Propriedade Industrial). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 1996, n. 93, p. 1-136, 14 mai. 1996.

Sobre o autor
Erick Labanca Garcia

Graduando em Direito UNIFAGOC︎ e estagiário do PROCON Municipal de Ubá

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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