Câmara aprova projeto que prevê novo tipo de flagrante

Resumo:


  • O projeto de lei propõe a criação do "flagrante provado" como uma nova modalidade de flagrante no Brasil, visando ampliar as possibilidades de autuação de suspeitos com base em elementos de prova obtidos em circunstâncias distintas.

  • O flagrante provado estabelece que o suspeito deve ser identificado e reconhecido pela vítima ou por terceiros em até 24 horas após o crime, com o uso de evidências como filmagens ou fotografias, desde que reforçadas por outros elementos de prova.

  • O debate em torno do projeto destaca a importância de equilibrar a eficácia no combate ao crime com a proteção dos direitos individuais, além da necessidade de treinamento adequado para os agentes de segurança e a definição de limites claros para evitar abusos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O projeto de lei recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados, que propõe a criação de um novo tipo de flagrante denominado "flagrante provado", representa uma inovação significativa no ordenamento jurídico brasileiro. Essa medida busca ampliar as possibilidades de autuação de suspeitos com base em elementos de prova obtidos em circunstâncias distintas das modalidades clássicas de flagrante já previstas no Código de Processo Penal.

De acordo com o texto do projeto, considera-se flagrante provado a situação em que o suspeito é identificado e reconhecido pela vítima ou por terceiros em até 24 horas após a prática do ato criminoso. Esse reconhecimento pode ocorrer por meio de evidências como filmagens ou fotografias do momento do delito, desde que haja outros elementos de prova que reforcem a acusação. Esse prazo de 24 horas foi introduzido a partir de uma emenda sugerida pelo partido Novo, sendo posteriormente acatada pelo relator do projeto.

A ideia central do flagrante provado é conferir maior flexibilidade às forças de segurança pública na identificação e prisão de indivíduos que cometam delitos. O deputado Delegado Éder Mauro, autor do projeto, destacou que a utilização de tecnologias como filmagens e fotos será essencial para viabilizar a prática. Segundo ele, a proposta também busca superar a incoerência entre a obrigatoriedade de policiais utilizarem câmeras durante as operações e a não aceitação dessas gravações como elementos de prova para efetivar prisões em flagrante.

O ordenamento jurídico brasileiro já previa outras modalidades de flagrante, como o flagrante propriamente dito, quando o agente é pego no momento da infração penal; o flagrante impróprio, quando é perseguido logo após a prática do crime; e o flagrante presumido, quando é encontrado com objetos ou instrumentos que indiquem sua autoria no ato criminoso. Assim, o flagrante provado surge como uma alternativa às situações em que a autuação tradicional não é possível.

Em sessão plenária, a proposta gerou debates intensos. Deputados como Alberto Fraga (PL-DF) argumentaram que o projeto oferece novos instrumentos para elucidação de crimes e fortalecimento do trabalho dos delegados. Por outro lado, a liderança do Psol, representada pelo deputado Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ), destacou a importância de medidas que garantam a fidedignidade das provas e a proteção contra erros judiciais, especialmente envolvendo jovens negros da periferia.

Outro ponto de discussão foi levantado pelo deputado Afonso Motta (PDT-RS), que manifestou preocupação com a ampliação do conceito de flagrante, sugerindo que a proposta poderia ferir princípios constitucionais como o da presunção de inocência. Ele destacou que o conceito de “presença”, característico da prisão em flagrante, seria relativizado por essa nova modalidade.

Ademais, a deputada Delegada Adriana Accorsi (PT-GO) enfatizou o potencial do flagrante provado para auxiliar na resolução de crimes de feminicídio, frequentemente marcados por dificuldades na prisão imediata do agressor. Essa opinião ressalta como o projeto pode ser adaptado para combater crimes graves com eficiência.

Sob a ótica dos institutos jurídicos, o flagrante provado representa uma extensão da possibilidade de limitação da liberdade antes da condenação definitiva, dialogando diretamente com os conceitos de prisão cautelar e presunção de inocência. A prisão em flagrante, como medida excepcional, requer uma análise rigorosa de proporcionalidade e necessidade para garantir que não ocorra abuso de poder.

Outro aspecto relevante é o uso de tecnologias na esfera penal. A admissibilidade de filmagens e fotografias como elementos probatórios levanta discussões sobre autenticidade, cadeia de custódia e riscos de manipulação. Esses fatores reforçam a importância de protocolos robustos para assegurar que tais provas sejam confiáveis e sigam os princípios do devido processo legal.

Sob a perspectiva da doutrina penal, o projeto também pode ser analisado como uma tentativa de equilibrar a efetividade da persecução penal com as garantias fundamentais dos cidadãos. A limitação temporal de 24 horas, por exemplo, busca evitar que a modalidade se torne uma justificativa para autuações arbitrárias ou perseguições retroativas indefinidas, o que poderia configurar um “flagrante eterno”.

Há também um debate sobre o impacto social da medida. Em um país onde a desigualdade estrutural influencia a atuação do sistema de justiça, é fundamental que novas medidas legais sejam acompanhadas de diretrizes claras e treinamento adequado para os agentes de segurança, de modo a evitar preconceitos e discriminações.

A proposta também destaca como a legislação penal deve acompanhar os avanços tecnológicos. A incorporação de filmagens e fotografias reforça a relevância de ferramentas digitais na construção de provas, mas também suscita debates sobre privacidade e segurança jurídica.

Por outro lado, alguns especialistas apontam que a medida pode enfrentar resistências em tribunais superiores, onde a interpretação restritiva de garantias constitucionais tem prevalecido. A prática da prova visual como elemento central no flagrante poderá ser questionada em função de eventual carência de regulamentações específicas.

A análise comparada com outros sistemas legais também é pertinente. Em países onde tecnologias já são amplamente utilizadas no combate ao crime, observa-se que a adoção dessas ferramentas está atrelada a sistemas de auditoria pública que evitam abusos e asseguram maior transparência.

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Por fim, a implementação de medidas como o flagrante provado requer planejamento, treinamento e monitoramento constantes. O impacto desse tipo de legislação não é apenas jurídico, mas também social, podendo redefinir a relação entre o cidadão e o sistema de justiça.

A inclusão de limites claros para a aplicação do flagrante provado pode ser um mecanismo essencial para evitar o uso indiscriminado. O prazo de 24 horas, por exemplo, deve ser rigorosamente fiscalizado para não se transformar em um instrumento de execuções penais precoces.

Ademais, é fundamental que haja um esforço conjunto entre o Poder Legislativo e as instituições de segurança pública para criar normativas que detalhem o uso de tecnologias, como a análise de imagens e provas digitais, garantindo transparência e proteção aos direitos individuais.

O papel do Judiciário também será decisivo para definir o alcance dessa medida. Decisões de tribunais superiores poderão criar jurisprudência que harmonize a nova legislação com os princípios constitucionais, evitando abusos e promovendo segurança jurídica.

Em conclusão, a aprovação do projeto que institui o flagrante provado traz questões jurídicas e sociais relevantes, exigindo reflexão aprofundada sobre sua implementação. O Senado, ao deliberar sobre o tema, terá o desafio de ajustar os dispositivos do projeto para garantir que sejam respeitados os princípios constitucionais e os direitos fundamentais. O sucesso dessa inovação dependerá de um equilíbrio delicado entre a necessidade de eficácia no combate ao crime e a salvaguarda das garantias individuais.

Sobre o autor
Álvaro Augusto Diniz Queiroz Carvalho

Advogado Criminalista membro da diretoria da OAB subseção Irecê (BA); professor de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Irecê; Pós-graduado em Ciências Criminais; Pós-graduado em Processo Penal; Inscrito no programa de Mestrado em Direito Público.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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