STJ: abordagem policial violenta configura violação aos direitos humanos e invalida provas

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A recente decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Habeas Corpus 933.395-SP, reafirma a relevância da proteção aos direitos humanos em abordagens policiais. O tribunal determinou que a violência utilizada por agentes de segurança durante uma abordagem policial configura violação de direitos humanos e invalida as provas obtidas em decorrência desse ato.

No caso em questão, as câmeras corporais dos policiais registraram agressões físicas ao paciente, que se rendeu sem resistência. A conduta violenta dos agentes foi caracterizada como tortura, desrespeitando princípios constitucionais e tratados internacionais ratificados pelo Brasil. Além disso, o laudo de corpo de delito confirmou as lesões causadas, reforçando a nulidade das provas.

A decisão baseia-se em normativas como a Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, que estabelece a proibição de tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. O art. 8.3 dessa Convenção determina que confissões obtidas mediante coação são inadmissíveis, reforçando o princípio do devido processo legal.

No âmbito nacional, o art. 157 do Código de Processo Penal (CPP) preconiza a inadmissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos, o que inclui aquelas derivadas de violência ou abusos durante a abordagem policial. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ fortalece a ideia de que o respeito aos direitos fundamentais deve prevalecer em qualquer etapa do processo penal.

A utilização de câmeras corporais pelos agentes de segurança surge como um elemento importante para assegurar a transparência das operações policiais. Contudo, o caso também revelou tentativas de alguns policiais de ocultar as gravações, o que acende um alerta sobre a necessidade de protocolos rigorosos para garantir a integridade dessas imagens.

Sob a perspectiva do sistema interamericano de direitos humanos, a exclusão de provas obtidas mediante tortura não apenas resguarda os direitos do acusado, mas também reforça o compromisso do Estado com as obrigações assumidas em tratados internacionais. O desrespeito a essas normas compromete a legitimidade do processo penal e a confiança da sociedade no sistema de justiça.

A decisão também destaca a importância do laudo pericial como instrumento fundamental para a comprovação de violações de direitos. No caso analisado, o exame de corpo de delito foi essencial para corroborar as alegações de violência policial e evidenciar as lesões causadas.

Além disso, a adoção de mecanismos de accountability, como a gravação de abordagens e o monitoramento independente das ações policiais, emerge como solução para evitar abusos e garantir a proteção dos direitos humanos. Esses mecanismos devem ser acompanhados de treinamento adequado e sensibilização dos agentes para que atuem em conformidade com as leis e princípios éticos.

A nulidade das provas obtidas de forma ilícita reflete também a necessidade de valorizar o princípio da proporcionalidade no processo penal. Isso significa que o combate ao crime deve ocorrer dentro dos limites legais, respeitando os direitos e garantias fundamentais de todos os envolvidos.

Outro ponto relevante é a necessidade de conscientização da sociedade sobre o papel dos direitos humanos na construção de um sistema de justiça mais justo e igualitário. A violência policial, muitas vezes direcionada a grupos vulneráveis, reforça desigualdades e perpetua ciclos de exclusão social, o que vai na contramão dos princípios democráticos.

Sob o prisma da doutrina penal, a decisão do STJ reforça a ideia de que a admissibilidade de provas deve estar condicionada à observação estrita dos direitos fundamentais. Esse entendimento tem sido amplamente defendido por especialistas, que destacam a importância de um sistema penal comprometido com a proteção da dignidade humana.

A exclusão de provas obtidas ilicitamente também visa desestimular práticas abusivas por parte dos agentes de segurança. Ao invalidar essas provas, o sistema de justiça envia uma mensagem clara de que atos de violência ou tortura não serão tolerados, promovendo assim uma cultura de respeito aos direitos humanos.

Por outro lado, a decisão também desafia as instituições policiais a adotarem medidas de prevenção e controle mais eficazes. Investimentos em tecnologia, capacitação e auditorias regulares são essenciais para assegurar que as abordagens sejam realizadas de maneira lícita e respeitosa.

Ademais, é fundamental que o Poder Judiciário continue exercendo um papel ativo na fiscalização das ações policiais, garantindo que os direitos dos cidadãos sejam protegidos em todas as etapas do processo penal. Decisões como essa reforçam a confiança da população na justiça e fortalecem o Estado Democrático de Direito.

O caso também ilustra a importância de uma formação policial voltada para os princípios dos direitos humanos. Agentes bem treinados e conscientes de suas obrigações legais tendem a agir com mais profissionalismo e respeito, reduzindo a ocorrência de abusos.

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É igualmente necessário promover debates públicos sobre a relação entre segurança pública e direitos humanos. A participação da sociedade civil nesse diálogo é essencial para construir soluções que atendam aos interesses de toda a população, garantindo maior transparência e legitimidade ao sistema de justiça.

Em suma, a decisão do STJ no caso do Habeas Corpus 933.395-SP representa um marco na proteção aos direitos humanos e na construção de um sistema penal mais justo e eficaz. Ao invalidar provas obtidas mediante tortura ou violência, o tribunal reafirma o compromisso do Estado brasileiro com os princípios fundamentais que sustentam a democracia e o Estado de Direito.

A implantação de mecanismos de controle e transparência nas ações policiais é um passo indispensável para consolidar esses avanços. Além disso, o fortalecimento das instituições e a promoção de uma cultura de respeito aos direitos humanos são condições essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Sobre o autor
Álvaro Augusto Diniz Queiroz Carvalho

Advogado Criminalista membro da diretoria da OAB subseção Irecê (BA); professor de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Irecê; Pós-graduado em Ciências Criminais; Pós-graduado em Processo Penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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