A responsabilidade da guarda, da regulamentação de visitas, da divisão de despesas e da possibilidade de fixação de alimentos aos animais de estimação com o término do vinculo conjugal

Exibindo página 2 de 2
30/12/2024 às 11:39

Resumo:


  • O novo modelo familiar, chamado de família multiespécie, reconhece o animal de estimação como membro da família, tratado como filho pelo tutor.

  • A jurisprudência pátria tem evoluído para reconhecer os pets como seres sencientes, dotados de sensibilidade e sujeitos a proteção jurídica especial.

  • A guarda de animais de estimação em casos de dissolução de união estável ou divórcio tem sido tema de debate, com discussões sobre a regulamentação de visitas, divisão de despesas e critérios para tomada de decisões.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

DO ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL PÁTRIO

A família multiespécie apresenta-se como grupo familiar composto por pessoas que reconhecem e legitimam seus pets como membros da família.

Com relação ao entendimento doutrinário e jurisprudencial pátrio, já existem algumas decisões acerca do tema, as modalidades de guarda, a regulamentação de visitas e a possibilidade de fixação de alimentos aos animais de estimação, seja na dissolução de união estável ou no divórcio.

Neste sentido, já se posicionou e. Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE GUARDA DE ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. CADELA QUE, APÓS A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE DE FATO DAS LITIGANTES, FICOU SOB OS CUIDADOS DA RÉ. SENTENÇA NA ORIGEM QUE INDEFERIU A INICIAL E EXTINGUIU O FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO DA AUTORA. SENTENÇA EXTINTIVA CALCADA NA INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL SOBRE O TEMA. MATÉRIA, NO ENTANTO, DEVIDAMENTE ENFRENTADA NAS CORTES DE JUSTIÇA DE TODO O PAÍS. RECONHECIMENTO, PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ACERCA DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DE REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS A ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO. RECURSO ESPECIAL N. 1713167/SP. VIABILIDADE JURÍDICA DA DISCUSSÃO POSTA. RECURSO PROVIDO PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA O REGULAR PROCESSAMENTO DO FEITO. "1. Inicialmente, deve ser afastada qualquer alegação de que a discussão envolvendo a entidade familiar e o seu animal de estimação é menor, ou se trata de mera futilidade a ocupar o tempo desta Corte. Ao contrário, é cada vez mais recorrente no mundo da pós-modernidade e envolve questão bastante delicada, examinada tanto pelo ângulo da afetividade em relação ao animal, como também pela necessidade de sua preservação como mandamento constitucional (art. 225, § 1, inciso VII - "proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade"). 2. O Código Civil, ao definir a natureza jurídica dos animais, tipificou-os como coisas e, por conseguinte, objetos de propriedade, não lhes atribuindo a qualidade de pessoas, não sendo dotados de personalidade jurídica nem podendo ser considerados sujeitos de direitos. Na forma da lei civil, o só fato de o animal ser tido como de estimação, recebendo o afeto da entidade familiar, não pode vir a alterar sua substância, a ponto de converter a sua natureza jurídica. 3. No entanto, os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimos em seus donos, totalmente diversos de qualquer outro tipo de propriedade privada. Dessarte, o regramento jurídico dos bens não se vem mostrando suficiente para resolver, de forma satisfatória, a disputa familiar envolvendo os pets, visto que não se trata de simples discussão atinente à posse e à propriedade. 4. Por sua vez, a guarda propriamente dita - inerente ao poder familiar - instituto, por essência, de direito de família, não pode ser simples e fielmente subvertida para definir o direito dos consortes, por meio do enquadramento de seus animais de estimação, notadamente porque é um munus exercido no interesse tanto dos pais quanto do filho. Não se trata de uma faculdade, e sim de um direito, em que se impõe aos pais a observância dos deveres inerentes ao poder familiar. 5. A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais. Deve-se ter como norte o fato, cultural e da pós-modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal. Portanto, a solução deve perpassar pela preservação e garantia dos direitos à pessoa humana, mais precisamente, o âmago de sua dignidade. 6. Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado. 7. Assim, na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal." (REsp 1713167/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 09/10/2018). (TJSC, Apelação Cível n. 0308062- 30.2016.8.24.0008, de Blumenau, rel. André Carvalho, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 15-09- 2020) (TJSC, Publicado em 15/09/2020)

O entendimento dos nobres julgadores é no intuito de proteger o ser humano e o vínculo afetivo com seu animal de estimação, visando manter o afeto entre o tutor e o pet.

Nas palavras de Andrey Guimarães Duarte:

nos julgados mais recentes, em divórcios litigiosos, os juízes tem decidido pela imposição da guarda compartilhada entre os divorciados, muito embora ainda com maior foco no direito das partes ao convívio com seu animal de estimação, e não propriamente no direito do animal em manter convívio com aqueles com os quais possui afeto. E é evidente o abalo emocional que animal de estimação sofre quando separado definitivamente do convívio com seus amigos humanos. (DUARTE, 2017, s/p)

Em razão disso, os nobres julgadores tem optado pela deliberado da guarda compartilhada entre os ex-companheiros ou ex-conjuges, pois o grande objetivo é o direito das partes ao convívio com seu animal de estimação.

Andrey Guimarães Duarte relata que:

os doutrinadores tem se manifestado no mesmo sentido, o que desaguou no enunciado n.º 11 do Instituto Brasileiro de Direito da Família, cujo teor diz: Na ação destinada a dissolver o casamento ou união estável, pode, o juiz, disciplinar a custódia compartilhada do animal de estimação. (DUARTE, 2017, s/p).

É notório o grande avanço alcançado até este momento acerca do tema em foco, porquanto, mesmo que ocorra separação do casal, isso não significa que acabou o afeto pelo seu animal de estimação.

Segundo palavras de Mahatma Gandhi, “a grandeza de uma nação pode ser julgada pelo modo como seus animais são tratados” (PENSADOR, s/d).


CONSIDERAÇÕES FINAIS

No transcorrer de todo o artigo científico foi percebido que, a definição da natureza de família vem em constante transformação, antes era constituída somente por pais e filhos, sendo considerado apenas vinculo consanguíneo. Mas, nos últimos tempos, o animal de estimação domesticado, dotado de sentimentos e afeto, vindo estabelecer vínculo muito forte com ser humano, dando o surgimento da família multiespécie, onde o animal de estimação passa ser integrante e membro familiar, tratado como filho por seu tutor.

Cabe dizer que, no seio familiar possuidor animal de estimação, enfrenta dificuldades no ato procedimental de dissolução de união estável ou divórcio, seja pelo amor e afeto que as partes têm pelo pet e/ou pela dúvida de quem será incumbência da responsabilidade acerca da guarda, da regulamentação de visitas, da divisão de despesas, incluindo à possibilidade de fixação dos alimentos e critérios para tomada de decisões, como serão feitas, em conjuntas ou separadas, com relação ao seu pet.

Isto posto, a jurisprudência pátria tem decidido pela guarda compartilhada entre às partes, uma vez que, a grande finalidade é o direito destes ao convívio com seu pet e a manutenção do laço afetivo, tendo em vista o amor, o apego entre o tutor e o seu animal de estimação.

Afinal de contas, ainda há desentendimentos na jurisprudência pátria, se posiciona dizendo que os pets não têm qualquer proteção jurídica, sendo vinculados aos seus tutores. No entanto, pela proposta da comissão de juristas na reforma do Código Civil de 2002, os animais de estimação terão direito a uma proteção jurídica especial, que será definida em lei posterior.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Código Civil de 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm Acesso em: 18 abr. 2024.

CAMARA. Projeto permite visita de animais a pacientes internados em hospitais. Publicado em 24/02/2023. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/939018-projeto-permite-visita-de-animais-a-pacientes-internados-em-hospitais/ Acesso em: 18 abr. 2024.

CAMARA. Projeto regulamenta a família multiespécie, formada por animais domésticos e seus tutores. Publicado em 28/02/2023. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/939334-projeto-regulamenta-a-familia-multiespecie-formada-por-animais-domesticos-e-seus-tutores/

DIAS, Maria Ravelly Martins Soares. Família multiespécie e Direito de Família: uma nova realidade. Publicado em 04/07/2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67381/familia-multiespecie-e-direito-de-familia-uma-nova-realidade Acesso em: 26 abr. 2024.

DUARTE. Andrey Guimarães. A guarda de animais de estimação em caso de divórcio. Publicado em 17/02/2023. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/381767/a-guarda-de-animais-de-estimacao-em-caso-de-divorcio Acesso em: 18 abr. 2024.

GALVÃO & SILVA Guarda e regulamentação de animais de estimação. 2023. Disponível em: https://www.galvaoesilva.com/guarda-de-animais/ Acesso em: 27 mar. 2024.

GAZZANA, Cristina; SCHMIDT, Beatriz. Novas configurações e vínculo com animais de estimação em uma perspectiva de Família Multiespécie. Artigo Cientifico do III Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha, Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, 2015. Disponível em: https://ojs.fsg.edu.br/index.php/pesquisaextensao/article/view/1600 Acesso em: 26 abr. 2024.

LIMA, Denilso de. Qual a origem e o que mais a palavra ‘pet’ significa? Publicado em 06/2010. Disponivel em: https://www.inglesnapontadalingua.com.br/2010/06/qual-origem-e-o-que-mais-palavra-pet.html Acesso em 18 abr. 2024.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MICHIGAN STATE UNIVERSITY. The Human-Animal Bond throughout Time, 7 dez. 2018. Disponível em: https://cvm.msu.edu/news/perspectives-magazine/perspectives-fall-2018/the-human-animal-bond-throughouttime

OLIVEIRA, Samantha Brasil Calmon de. Sobre homens e cães: um estudo antropológico sobre afetividade, consumo e distinção. Dissertação de Mestrado em Sociologia e Antropologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006. Disponível em: https://ojs.ufgd.edu.br/index.php/nanduty/article/view/15546/8442 Acesso em: 26 abr. 2024.

PENSADOR. A grandeza de uma nação pode ser julgada pelo modo que seus animais são tratados. Disponível em: https://www.pensador.com/frase/OTcyMjU/ Acesso em: 18 abr. 2024.

RODRIGUES, Ana Maria Alves. Família multiespécie e guarda de animais domésticos: uma análise de seu reconhecimento no direito brasileiro. Dissertação Programa de Pós Graduação em Direito da Escola Superior Dom Helder Câmara. Belo Horizonte, 2018. Disponível em: https://domhelder.edu.br/mestrado/editor/assets/arquivos_dissertacoesdefendidas/b6bab8d32856f4253148f9174f4e6770 Acesso em: 18 abr. 2024.

SILVA, Juliana Maria Rocha Pinheiro Bezerra da. Família Multiespécie: Reflexos do Direito de Família e de Sucessões. Natal/RN: Edição do autor, 2020.

TEIXEIRA, Osvânia Pinto Lima Teixeira. L. R. B. X. 1. Família Multiespécie: reconhecimento de uma nova entidade familiar. Revista Homem, Espaço e Tempo. [S.I.]. Vol. 11, n. 11. 2017. Disponível em: https://rhet.uvanet.br/index.php/rhet/article/view/249/220 Acesso em: 26 abr. 2024.

TJSC Jurisprudência Catarinense. Publicado em 15/09/2020. Disponivel em: https://busca.tjsc.jus.br/jurisprudencia/#resultado_ancora Acesso em: 18 abr. 2024.

TOLEDO, Maria Izabel Vasco de. A tutela jurídica dos animais no brasil e no direito comparado, 2012. Disponível em: https://periodicos.ufba.br/index.php/RBDA/article/view/8426/6187. Acesso em: 17 abr. 2024.


ABSTRACT

The scientific article aims to present the new family model, called multispecies family, which is based on the relationship between human and pet, with the treatment given to pets as a major issue, being seen in the Civil Code of 1916 as property and properties of human beings, the 2002 Civil Code treats them as assets, even being able to be pledged and/or seized, being objects of search and seizure and guaranteeing debts, therefore, in both Civil Codes the treatment is the same for pets. But, in recent times, national doctrine and jurisprudence have been innovating and bringing new understanding about human beings and their pets, based on love, affection, attachment and coexistence, recognizing them as members of the multispecies family, where the pet becomes a member of the family group and treated as a child by its guardian. That said, the aim is to analyze how the pet will be in the event of the dissolution of a stable union or divorce, regarding the responsibility of custody, the regulation of visits, the division of expenses, the establishment of food and criteria for taking decisions, whether administrative or legal, will be made, jointly or separately, in relation to your pet. For this purpose, it is essential to present the facts in chronological order, starting with the historical perspective of pets; the new vision of family with the inclusion of pets; legal protection due to its nature; the custody of pets and food; and ending with the national doctrinal and jurisprudential understanding.

Key words : Civil Code of 2002. Family right. Pets. Guard. Foods.

Resumen

El artículo científico tiene como objetivo presentar el nuevo modelo de familia, denominado familia multiespecies, que se basa en la relación entre humano y mascota, teniendo como tema principal el trato que se les da a las mascotas, siendo vistas en el Código Civil de 1916 como bienes y propiedades de seres humanos, el Código Civil de 2002 los trata como bienes, pudiendo incluso ser pignorados y/o embargados, siendo objetos de registro e incautación y garantía de deudas, por lo que en ambos Códigos Civiles el tratamiento es el mismo para las mascotas. Pero, en los últimos tiempos, la doctrina y la jurisprudencia nacional han ido innovando y aportando una nueva comprensión sobre el ser humano y sus mascotas, basada en el amor, el cariño, el apego y la convivencia, reconociéndolos como miembros de la familia multiespecies, donde la mascota pasa a ser miembro de del grupo familiar y tratado como niño por su tutor. Dicho esto, se pretende analizar cómo quedará la mascota en caso de disolución de una unión estable o divorcio, en cuanto a la responsabilidad de la custodia, la regulación de las visitas, el reparto de gastos, el establecimiento de la alimentación y los criterios de toma. Las decisiones, ya sean administrativas o judiciales, se tomarán, de forma conjunta o separada, en relación con su mascota. Para ello, es fundamental presentar los hechos en orden cronológico, comenzando por la perspectiva histórica de las mascotas; la nueva visión de familia con la inclusión de las mascotas; protección jurídica por su naturaleza; la custodia de mascotas y alimentos; y terminando con el entendimiento doctrinal y jurisprudencial nacional.

Palabras clave: Código Civil de 2002. Derecho de familia. Mascotas. Guardia. Alimentos.

Sobre o autor
Evantuir Juttel Pereira

Advogado OAB-SC 50982. Graduado em Direito; Pós-graduando em Direito Civil/Processo Civil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos