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MODUS OPERANDI
Os serial killers introduziram uma nova abordagem para a investigação criminal, uma vez que esses criminosos deixam marcas e características distintivas na forma como executam e externalizam seus crimes. Através de seus atos repudiáveis perante a lei e a sociedade, eles nos revelam um fragmento de suas mentes sádicas e cruéis. O modo como atraem suas vítimas, a premeditação envolvida, as formas de tortura, violação e homicídio, bem como a maneira como se ocultam e se desfazem delas, compõem o que é denominado "Modus Operandi". Na maioria das vezes, os indivíduos que se enquadram como serial killers seguem um padrão criminal próprio, impulsionado por suas fantasias, que muitas vezes refletem experiências vividas no passado.
Esse padrão criminal de cada assassino em série oferece aos órgãos de investigação uma nova perspectiva para a perseguição do criminoso. Tornando-se essencial compreender como sua mente pensa, raciocina, arquiteta e planeja suas ações para que seja possível alcançá-lo. Como seus crimes são um reflexo de suas fantasias, entender o seu Modus Operandi é fundamental para antecipar seus próximos movimentos.
“Desde meados do século XIX, a polícia percebeu que a obra de muitos criminosos reincidentes pode ser reconhecida a partir do que geralmente se conhece como “modus operandi”, geralmente abreviado como MO. A maneira em que uma porta é arrombada; o modo com o qual um cofre foi aberto, os instrumentos utilizados, o tipo de explosivo empregado – ou, no caso de homicídio, a maneira como a vítima é capturada, assassinada e, talvez, esquartejada – podem ser indicações claras de que uma série de crimes foi cometida pela mesma pessoa”. (INNES, 2009, p.11)
O grande desafio em identificar esse padrão criminal é que, para reconhecê-lo, é necessário que o indivíduo tenha cometido uma quantidade considerável de crimes dentro do mesmo padrão. Somente então se pode concluir que se trata do mesmo criminoso, responsável por uma sequência de crimes violentos, e não de crimes isolados, sem conexão entre si.
O ciclo do crime do assassino em série, tem um começo, meio e fim, alocado nas seguintes fases:
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Fase aura: o serial killer começa a se distanciar da realidade.
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Fase de busca: o assassino inicia a seleção da possível vítima.
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Fase de caça: a vítima foi selecionada e o assassino faz contato com ela.
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Fase da captura: momento em que a vítima é subjugada pelo assassino.
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Fase do assassinato: assassino dá vazão ao seu instinto sádico e homicida.
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Fase da depressão: após toda emoção do crime, a tensão homicida é reduzida e em seguida algum agente estressante faz reiniciar todo o ciclo do crime.
É inegável que alguns desses criminosos veem a investigação como um jogo, uma espécie de caçada a si mesmos, encarando-a como um desafio para continuar cometendo crimes sem ser capturados. Muitos deles deixam mensagens nos locais dos crimes ou até enviam cartas aos órgãos de investigação, vangloriando-se de seus feitos. Exemplos notórios incluem o "Estrangulador BTK" (em português: "Amarrar-Torturar-Matar"), que matou aproximadamente 10 pessoas entre 1974 e 1991 e enviava cartas à polícia relatando seus crimes, e o "Assassino do Zodíaco", que enviava cartas à imprensa contendo criptografias ainda não decifradas. Para esses criminosos, seus crimes muitas vezes são vistos como obras de arte, e mostrá-las ao mundo, chocando-o com tamanha crueldade, representa sua recompensa.
Estabelecer uma conexão criminosa entre os atos de um serial killer não é uma tarefa simples, mas o avanço da tecnologia e das técnicas investigativas tem promovido progressos significativos nesse campo. Em tais crimes, cada detalhe é de extrema importância para identificar possíveis ligações com outros casos, como o uso de cordas para imobilizar a vítima, a aplicação de venenos, o abuso sexual, a escolha de vítimas com um perfil social similar, a seleção de locais específicos para a execução dos crimes, ou os métodos utilizados para matar, como afogamento, estrangulamento, disparos de arma de fogo ou facadas. Todos esses elementos são cruciais para entender o padrão criminoso e associar a autoria a outros crimes, ou até mesmo prever quem poderá ser a próxima vítima.
A eficácia dos centros de investigação nesses casos muitas vezes determina o desfecho desses criminosos. Considerando que, implacáveis, eles se consideram inalcançáveis e, em geral, continuam a cometer crimes até serem interrompidos, é essencial que a investigação criminal compreenda o ciclo homicida e a repetição dos fatos. Somente com a aplicação dos métodos adequados e necessários será possível alcançar êxito na identificação e captura desses criminosos, impedindo que continuem a atuar.
6.SERIAL KILLERS E O IMPACTO NO ESTUDO CRIMINOLÓGICO
A criminologia é a ciência que estuda o comportamento dos criminosos em busca da criação de seus perfis criminais, que compreende desde seus elementos psíquicos, como também os meios em que executam seus crimes, deixando rastros e um certo padrão de execução
O impacto e a proporção que o surgimento desses crimes trouxeram consigo, elucidaram novos métodos e enfoques de estudos na criminologia moderna. Os estudiosos reinventaram as análises e as interpretações delituosas para compreender os Serial Killers e os crimes por eles praticados. As motivações e os objetivos não se encaixavam nos padrões criminais estudados e validado até então.
Um importante avanço quando falamos de técnicas de investigação formulada pelos estudos da criminologia são os perfis criminais, que podem seguir um método indutivo ou dedutivo, sendo respectivamente, processo comparativo, correlacional ou estatístico e um método forense baseado em evidências, ambas as técnicas úteis para a elaboração de um perfil criminal, e devem juntos formular conceitos para compreender a complexidade dessas mentes.
Muito se fala a respeito do perfil dos criminosos como forma de valorar a sua condenação, contudo não é fácil deduzir em que consiste esse perfil, o qual é conceituado por Marina Joana Ribeiro Rodrigues, como sendo a “técnica que analisa padrões de comportamento de um crime ou série de crimes, sobretudo para traçar um modelo descritivo do possível ofensor.” (RODRIGUES, 2010, p. 02)
Uma importante e significativa mudança que esses criminosos trouxeram para a criminologia é a criação dos crimes de cifra vermelha, que tipificam condutas praticadas pelos assassinos em série e que não chegam a conhecimento das autoridades, por medo dos criminosos e das ameaças por ele sofridas, por vergonha do sofrimento a elas causado, por acreditar que os órgãos de Justiça Criminal poderia descredibiliza-los ou até mesmo porque as instâncias formais não seriam capazes de suprir o dano a elas sofridos. O resultado dessa carência de comunicação aos órgãos públicos reflete diretamente nas estatísticas criminais, que acabam apresentando resultados distorcidos da realidade e enfraquecendo as políticas criminais de represália a esses tipos de crimes, bem como as evoluções dos meios de investigação,
Já que a vítima possui um papel muito importante quando falamos de assassinos em série, considerando a incidência massiva e aflitiva que esses crimes carregam consigo, e o força que a denúncia perante as instâncias formais pode apresentar perante os estudos criminológicos, é importante criar mecanismos de acolhimento a segurança para encorajá-las a comunicar as autoridades públicas. Diante dessa problemática enxergamos a necessidade de trazer a vítima como protagonista do sistema de justiça, e esse é o principal objetivo da vitimologia, um dos ramos de estudo da criminologia que tem o enfoque na vítima e no sofrimento por ela vivido. Formular ferramentas que evitam a revitimização, investir em campanhas de encorajamento a denúncias, criar delegacias especializadas, investir em profissionais que conversem com a vítima de modo empático, bem como desenvolver medidas de proteção, se torna essencial para evoluir nos estudos criminais.
CONCLUSÃO
Concluímos, com base no estudo em questão, que os Serial Killers representam um desafio significativo no âmbito da política criminal, da profilaxia criminal e das técnicas de investigação, uma vez que atuam de maneira oculta e quase silenciosa na sociedade.
Embora não seja possível generalizar, é possível afirmar que os Serial Killers possuem plena consciência de suas ações, evidenciada pelo planejamento meticuloso de seus crimes, pela escolha prévia das vítimas e locais, bem como pelo esforço em ocultar suas práticas, reconhecendo que seus atos se configuram como ilícitos.
Suas condutas são impulsionadas por fantasias e pensamentos irracionais, e sua empatia é profundamente comprometida. Os desejos e vontades que surgem em suas mentes obscurecidas predominam, levando-os a agir de maneira desprovida de qualquer consideração pelo sofrimento alheio.
Há dificuldades notórias na compreensão do comportamento criminoso, devido à irrelevância das estatísticas criminais convencionais. Muitas vítimas ainda enfrentam o medo de denunciar, receando represálias, estigmas sociais ou o trauma de reviver o sofrimento. Essa subnotificação, prejudica significativamente os estudos e a formulação de políticas criminais eficazes, pois não temos clareza sobre a verdadeira extensão do problema, e as estatísticas frequentemente refletem apenas uma pequena fração dos crimes cometidos.
Diante dessa limitação, os órgãos públicos devem concentrar esforços em políticas de acolhimento e incentivo às denúncias. Quanto mais alinhados com a realidade forem os dados, mais eficazes e direcionados se tornarão os estudos, bem como o aperfeiçoamento das técnicas de investigação e perfilamento criminal.
A complexidade desse fenômeno e da psicologia desses indivíduos permanece até os dias atuais, resultando em um processo criminológico desafiador e em constante evolução. O cenário atual do país, marcado pela disparidade social, pela cultura de violência, pela corrupção, pela impunidade e pela valorização exacerbada de bens materiais e estéticos, contribui significativamente para a proliferação desses criminosos.
Ao consultar livros, artigos e sites que fundamentaram este estudo, identifiquei uma lacuna no que se refere ao enfoque nas vítimas desses crimes. Embora muito se fale sobre o criminoso, pouco se discute sobre as experiências enfrentadas pelas vítimas e suas famílias. Propõe-se aqui um estudo mais empático e humanizado, que priorize a análise do sofrimento genuíno daqueles que, de fato, enfrentam as consequências dessas condutas desviantes.
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Zodíaco (David Fincher, 2007). Filme