1. INTRODUÇÃO
Vale rebuscar em torno do relacionamento jurídico entre o Estado, na condição de titular da pretensão punitiva (ius puniendi ) e o acusado, na condição de titular do direito à liberdade (ius libertatis ), consagrado pelas inúmeras garantias que delimitam o poder punitivo estatal.
Neste sentido, vislumbra-se que há dentre as aludidas garantias, a coibição da utilização de provas obtidas por meios ilícitos, que estão previstas no Código de Processo Penal em seu artigo 157, assim como na própria Carta Fundamental de 1988, no seu inciso LVI, do artigo 5°, edificada mediante à posição de cláusula pétrea, nos termos abaixo:
“Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.”
“ Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
“LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.
Na observância da dicção do preceito constitucional precitado, referenciando-se ao vocábulo “processo”, observa-se que não há exclusividade atinente ao processo criminal, mas facultando a toda e qualquer relação jurídica processual.
2. PROVA ILÍCITA E ILEGÍTIMA
No que pertine à diferenciação entre prova ilícita e prova ilegítima, observa-se que a prova ilícita tem a sua previsão no artigo 157 do CPP, dispondo que é aquela que viola uma regra de direito material à medida que vem a contrariar normas constitucionais ou legais, que são obtidas “fora do processo”, enquanto a prova ilegítima é aquela que viola as regras do direito processual, na oportunidade de sua produção em juízo, ou seja, no momento em que é produzida no “contexto do procedimento penal”.
Vale ressaltar que, induvidosamente, esse direito fundamental delimita à investigação da verdade real, que não pode ser negada, uma vez que é um dos esteios do processo que, no entanto, jamais poderá ser alvo de manipulação ilícita.
Porquanto, essa limitação tem a sua justificação, em virtude de o Estado Democrático de Direito não acatar a máxima de que os fins justificam os meios. Nesse sentido, há a maneira justa e legítima de atingir um esteio, além da forma ilegal de buscá-lo.
Destarte, o único meio legítimo da comprovação de um fato criminoso, visando a aplicação correta da sanção é através de um procedimento processual, assegurando ao acusado, a priori , o direito a ampla defesa e ao contraditório, além dos demais direitos fundamentais em que é o titular por determinação constitucional.
Por conseguinte, a obtenção de elementos probatórios diferentemente do que foi acima abordado, é considerado ineficaz para a comprovação da culpabilidade da pessoa acusada.
3. JURISPRUDÊNCIA DO STF
Perquirindo-se em torno da jurisprudência do STF, na manifestação do ex-ministro Celso de Mello, afirmando que, “a ação persecutória do Estado, qualquer que seja a instância de poder perante a qual se instaure, para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à garantia constitucional do due process of law , que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso sistema de direito positivo”. (STF, 2ª Turma, RHC 90.376/RJ, Relator Min. Celso de Mello, DJE, de 17/05/2007). (Grifei).
De efeito, na mesma posição do princípio da proibição do uso de provas ilícitas, também rege no processo penal o consagrado princípio da presunção da não culpabilidade, inserido como princípio da presunção de inocência, previsto no inciso LVII, do artigo 5º da CF/88, prevendo que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
De acordo com este princípio, todo e qualquer acusado se encontra em um estado inicial de inocência, e somente pode ser refutado por meio da produção de prova válida no contexto do processo judicial. Destarte, diante desse princípio incumbe à acusação o ônus de provar induvidosamente a culpa do acusado, além de realiza-lo validamente e legitimamente, por meio do devido processo legal. Uma vez que, as provas obtidas ilicitamente são consideradas absolutamente inidôneas, para que possa suplantar a presunção de inocência. Porquanto, imprestáveis para uma condenação.
Ademais disso, sucede do principio da presunção de inocência, a máxima in dubio pro reo , ou seja, analisando-se a prova e resultar dúvida, esta deverá ser interpretada em favor do réu.
4. MANIFESTAÇÃO ATUAL DO SISTEMA JURÍDICO
Na prática, observa-se que o atual sistema jurídico brasileiro, utiliza-se de uma opção inequívoca, ou seja, prefere absolver um culpado a condenar um inocente. Nesse sentido, juridicamente é possível e legítimo que uma pessoa culpada seja absolvida, em face da carência de comprovação legal de sua culpabilidade pela acusação no âmbito do processo. Ao revés, no entanto, não é real: a condenação de um inocente é totalmente intolerável por meio de um Estado Democrático de Direito. Porquanto, o “preço” que se paga pela pretensão de evitar a condenação de inocentes é justamente o de permitir que um “culpado” seja absolvido.
De efeito, à luz de precitadas premissas, admitindo a condenação de um inocente, utilizando-se de uma prova ilícita que comprove a inocência do réu deva ser plenamente acatada, sob pena de impedir o próprio escopo de garantia do princípio.
Assim sendo, na hipótese legal do réu está amparado por uma prova ilícita, para livrar-se de uma condenação injusta, essa garantia de proibição de utilizar prova ilícita, estaria sendo usada contra o titular, frustrando o seu objetivo.
Por conseguinte, cabível é a permissão de um inocente demonstrar sua inocência ou da ilegitimidade da atuação estatal em seu desfavor, simplesmente por se tratar de uma prova obtida por meio ilícito.
5. ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO DA PROVA ILÍCITA
Compilando-se o entendimento doutrinário do jurista Eugenio Pacelli de Oliveira, lecionando que, “Assim, a existência de material probatório que comprove a ilegitimidade da persecução penal empreendida em desfavor do réu pode ser admitida, ainda que tenha sido obtido por meios ilícitos”. Porquanto, a questão diversa diz respeito à possibilidade de punição daquele que praticou o ato ilícito para produção da prova favorável ao réu. (In Curso de Processo Penal. 11- ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, pág. 291).
Destarte, é válida de forma plena, a utilização de mensagens extraídas de forma ilegal dos aplicativos de celulares de agentes públicos, quando puderem demonstrar a inocência do acusado ou algum vício insanável no âmbito da persecução penal.
Por outra monta, não é admissível que a prova obtida de forma ilícita, seja utilizada para dar início uma investigação ou com o esteio de punir agentes públicos que tiveram a sua privacidade violada. Faz-se necessário traçar essa premissa porquanto, apesar de aparentemente, as mensagens extraídas ilicitamente dos aplicativos de mensagens dos agentes públicos, apresentarem graves vícios na persecução penal e portanto poderem ser usadas pelos acusados, o conteúdo probatório originado dessas mensagens é considerada prova ilícita, por haver sido obtida por meio criminoso, em manifesta violação ao direito fundamental à intimidade dos agentes públicos.
Diante de tudo que foi acima exposto, sendo considerada prova ilícita, não há qualquer possibilidade de ser utilizada para a persecução penal dos agentes públicos ou mesmo para instauração de procedimentos disciplinares. Devendo ser lembrado que a Carta Magna de 1988 proíbe a utilização de prova ilícita no processo, não se limitando ao processo penal. Nesta inteligência, não seria legal a admissão do uso, como prova emprestada em procedimentos cíveis ou administrativos, de provas obtidas de forma ilícita. Porquanto, o aproveitamento da prova ilícita de um processo para outro, não possui o condão de descontaminá-la.
Consequentemente, vale dizer sobre a utilização da prova ilícita pelos réus para demonstrarem suas inocências ou sobre a ilegalidade da persecução penal, o que é plenamente admissível, enquanto que é absolutamente intolerável a pretensão de ser utilizada como prova material de origem sabidamente ilícita em processos criminais ou administrativos com o escopo de punição dos agentes públicos.
Assim sendo, observa-se que há presença de uma carência de nexo ou de lógica, uma vez que o mal que se pretende combater, estará sendo praticado, pela conduta dos membros do MP e do Magistrado, em face do uso de meios conflitantes com o devido processo legal. Contudo, no mesmo patamar, busca-se a punição dos aludidos agentes públicos, fundamentado em provas coletadas de forma ilícita, ou seja, com violação ao princípio due processo of law preteritamente transgredido, uma vez que, as garantias processuais são para todos, mesmo para todos aqueles que as transgrediram.
Destarte, concluso é o entendimento jurídico de que as provas ilícitas são acatadas para somente inocentar e jamais para acusar.
6. O CASO DA OPERAÇÃO LAVA JATO
Nesta inteligência, rebuscando os substratos fáticos que redundaram em grande controvérsias, com base nas provas coletadas a partir do hackeamento ilícito de aplicativos de mensagens dos celulares do então Juiz Federal, Sergio Moro e de membros do MPF, integrantes da Força-Tarefa da Operação Lava Jato, que foram acatadas pelo Poder Judiciário, mesmo sendo sabedor da inexequibilidade de utilização das provas originadas pelos meios utilizados, a favor dos réus e ao mesmo tempo em desfavor dos agentes públicos hackeados .
De efeito, emerge a perquirição em torno do precitado fático, sobre a posição legal a ser tomada diante do Estado Democrático de Direito, conformando-se com a condenação de inocentes pela utilização de provas ilícitas ou daquele que não validamente teve comprovada a sua culpabilidade? Assim sendo, diante desse mesmo paradigma orientado pela Carta Magna de 1988, haverá aceitação de que o culpado seja absolvido?
7. CONCEITO JURÍDICO DE PROVA ILÍCITA
Perquirindo-se em torno do conceito de prova ilícita no contexto jurídico, tem-se como uma evidência ou elemento probatório coletado de maneira ilícita, redundando na violação dos direitos fundamentais, normas infraconstitucionais, inclusive aos princípios processuais. Destarte, tais elementos de provas jamais podem ser consideradas legais, em decorrência do meio ilegítimo, em que foram obtidas, cujas inserções não devem jamais fazer parte do processo judicial.
A prova considerada ilícita exsurge de inúmeras maneiras, tais como aquelas que violam os direitos fundamentais do cidadão, a exemplos do direito à intimidade; a inviolabilidade do domicílio; do sigilo de correspondência, as quais podem ser obtidas pelos meios seguintes:
a) Coerção ou tortura, quando são utilizados métodos ilegítimos de interrogatórios pela crueldade aplicada, como a tortura física ou psicológica.
b) Interceptação ilegal de comunicações, por meio das comunicações telefônicas, eletrônicas e outras, as quais são interceptadas sem a devida autorização judicial ou em desrespeito às normas legais pertinentes aplicáveis.
c) Acesso ilícito de informações ou documentos, quando a obtenção de provas ocorre por meio de acesso não autorizado, em face das informações serem consideradas confidenciais ou por documentos protegidos pelo sigilo.
Porquanto, esse princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas vem munido da garantia constitucional, com o esteio de proteger os direitos fundamentais de todo cidadão, além de preservar a integridade do nosso sistema de Justiça.
8. EXCEÇÕES PARA O USO DA PROVA ILÍCITA
No entanto, afastada qualquer previsão originada da Constituição Federal vigente e do CPP, exsurge a doutrina e a jurisprudência consideradas como fontes escritas do Direito, para estabelecer duas exceções de provas derivadas das ilícitas e provas ilícitas em favor do réu.
A 1ª Exceção – “Provas derivadas das ilícitas”, embora a previsão do § 1º do artigo 157 do CPP, assevere que “são também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, com base no princípio dos frutos da árvore envenenada”. Não obstante, quando não ficar evidenciado o nexo de causalidade entre as provas ilícitas ou derivadas, estas podem ser usadas. Contudo, a exceção é encontrada, quando as provas derivadas puderem ser obtidas através de uma fonte independente das provas ilícitas. Exemplificando: quando por meio de uma interceptação telefônica clandestina, a autoridade policial toma conhecimento de que uma testemunha pode incriminar determinado acusado. Neste caso, configurou-se uma prova derivada da ilícita. No entanto, essa prova somente seria aceita se ficar comprovado que as autoridades policiais iriam tomar conhecimento desta testemunha de qualquer outra forma.
A 2ª Exceção – “Provas ilícitas em favor do réu”. Contudo, segundo a doutrina, declara pacificamente que não devem ser aceitas provas ilícitas que venham prejudicar o réu.
No entanto, há casos em que o resultado é mais vantajoso para o sistema jurídico poder beneficiar o réu, do que a restrição de direitos, como a liberdade, a ampla defesa e presunção de inocência, com a destarte inadmissibilidade da prova ilícita.
9. TEORIA DA PROPORCIONALIDADE
Neste sentido, cabível é recorrer a Teoria da Proporcionalidade, definida como um princípio jurídico que garante que as ações e penas sejam proporcionais aos propósitos almejados. Este princípio tem a sua utilização para limitar o poder do Estado, além de garantir que os direitos dos cidadãos sejam respeitados.
Ademais, cabível é valer-se da proporcionalidade, em cada caso, para haja admissão ou não de uma prova ilícita em favor do réu.
Valendo-se do exemplo de que determinada pessoa está sendo acusada injustamente, pelo cometimento de um homicídio, vem a gravar clandestinamente uma conversa telefônica, onde terceira pessoa confessa haver praticado o aludido crime.
Porquanto, perante essa prova, em tese, ilícita, tem-se a presença um confronto de direitos fundamentais, uma vez que, a prova afronta a inviolabilidade das comunicações telefônicas e ao direito à intimidade, além de está de acordo com a ampla defesa, a liberdade e, mormente, a presunção de inocência do acusado.
De efeito, caberia ao Juiz da causa decidir por utilizar essa prova considerada ilícita, empregando o princípio da presunção de inocência da acusada.
Deduzindo-se, portanto, que as provas ilícitas não podem ser admitidas no âmbito do processo penal, salvante para comprovar a inocência do acusado e, jamais, para acusa-lo. Ademais, para algumas outras exceções que devem ser amplamente analisadas caso a caso.
10. EXCEÇÕES COM BASE EM TEORIAS
Como já comentado em alhures, que no processo penal brasileiro, a utilização da prova ilícita é, em tese, proibida. Contudo, há exceções em que a prova ilícita é aceitável no âmbito do processo penal pátrio, com respaldo na jurisprudência dos tribunais brasileiros, mormente pelo STF, estabelecendo algumas dessas exceções, infra:
Teoria da Descoberta Inevitável: Trata-se da hipótese de a possibilidade demonstrar que a prova ilícita possa ser obtida, por meios legais e independentemente da conduta ilícita, ela poderá ser admitida.
Teoria da Fonte Independente: Caso a prova ilícita tenha sido obtida de modo ilegal, no entanto sua existência já era conhecida de forma independente e antes da conduta ilegal, a prova pode ser admitida.
Teoria da Prova Inevitável: Na hipótese da prova ilícita seja considerada inevitável, ou seja, seria obtida de qualquer modo, mesmo sem haver conduta ilegal, a prova pode ser admitida.
Teoria da Proporcionalidade: No caso em que a exclusão da prova ilícita levaria a uma violação desproporcional de princípios fundamentais ou a uma impunidade injustificada, a prova pode ser utilizada.
Ressalte-se que para a aplicação dessas exceções, dependerá sempre de uma análise do caso concreto e da decisão dos Magistrados e Tribunais. Contudo, cada fato deve ser analisado, sempre levando em consideração os princípios constitucionais, as circunstâncias específicas de cada caso e os fundamentos da decisão.
Ademais disso, impõe-se que a admissibilidade das provas ilícitas tem a sua complexidade, sujeitando-a a debates jurídicos, enquanto que a jurisprudência com a sua evolução e interpretações jurídicas ao longo do tempo pode haver variações.
Definindo-se sobre a figura do Princípio da Proporcionalidade, releva dizer que se trata de um dos princípios fundamentais do Direito, que pode ser aplicado em diversas áreas jurídicas, inclusive o Direito Penal e o Direito Processual Penal. Esse princípio procura estabelecer um equilíbrio entre os interesses que estão em jogo, evitando os excessos ou restrições desnecessárias.
11. DEFINIÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
No âmbito do processo penal, o princípio da proporcionalidade tem como escopo avaliar a adequação e a necessidade das medidas tomadas pelo sistema de Justiça Criminal, levando sempre em consideração os direitos fundamentais das partes envolvidas, além dos interesses da sociedade e a busca pela Justiça.
Ademais disso, o princípio da proporcionalidade desenvolve papel fundamental no âmbito das provas ilícitas no procedimento penal, uma vez que, quando uma prova é obtida de modo ilícito, ou seja, com violação as normas legais ou os direitos fundamentais, o princípio da proporcionalidade pode chamado para avaliar a sua admissibilidade no processo.
No pertinente a aplicação do princípio da proporcionalidade, este deve passar por três etapa, a seguir:
ADEQUAÇÃO: Significa dizer que a prova ilícita deve ser adequada, visando alcançar o objetivo da descoberta da verdade material. Assim, a utilização da adequação deve ter relevância probatória e contribuir de forma efetiva para o esclarecimento da verdade dos fatos.
NECESSIDADE: Trata-se da prova ilícita que só deve ser aceita, caso não exista uma alternativa menos evasiva ou restritiva de direitos, para a obtenção da mesma informação ou evidência. Assim, na existência de meios legais disponíveis para a obtenção da prova, assim a prova ilícita não deverá ser considerada necessária.
PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO: Faz-se necessário a avaliação dos benefícios para admitir a prova ilícita sejam proporcionais aos ônus e sacrifícios causados. Deve-se levar em conta os direitos fundamentais das partes envolvidas; a gravidade da violação praticada para obtenção da prova ilícita, e os efeitos potenciais da sua admissão.
Em suma, a utilização de provas ilícitas nos processos judiciais, em tese, poderá levar à nulidade do processo, comprometer o julgamento e tornar inadmissível as provas derivadas, além de contaminar a confiança no sistema judiciário, resultando na responsabilização dos agentes públicos envolvidos e trazendo dificuldade ao acesso dos recursos, inclusive de violar os direitos fundamentais, tais como a privacidade e a dignidade humana.
Com base na própria doutrina abraçada pelo ministro do STF, Gilmar Mendes Ferreira, lecionando que, “Qualquer violação ao devido processo legal, em síntese, conduz à invalidade da prova”. (In Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 604/605).
Ademais disso, outros autores sublinham que: “A obtenção de provas sem a observância das garantias previstas na ordem constitucional ou em contrariedade ao disposto em normas fundamentais de procedimento, configurará afronta a expressão due process of law , da qual deriva o termo “devido processo legal”, originado da Carta Fundamental de 1988.
No mesmo tom, foi fixada a Tese n. 1238, de Repercussão Geral, no âmbito do Processo ARE n. 1.316.369, seguinte: “São inadmissíveis, em processos administrativos de qualquer espécie, provas consideradas ilícitas pelo Poder Judiciário”.
Na data de 15/06/2023, a 6ª Turma do STJ reconheceu que as mensagens captadas por meio do Print Screen da tela do WhatsApp devem ser consideradas provas ilícitas, devendo, portanto, ser desentranhadas dos autos. De acordo com os ministros, eventual exclusão de mensagem enviada ou recebida não deixa vestígios, seja no aplicativo, seja no computador e, por conseguinte, não pode jamais ser recuperada para os efeitos de prova em processo penal.
Nesse sentido, rejeitou-se os embargos de declaração. Com a decisão unânime no Processo RHC 133.430.
Na mesma inteligência, a jurisprudência do STJ:
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. PROVA OBTIDA EM APARELHO CELULAR APREENDIDO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. ILICITUDE. INSUFICIÊNCIA DE ELEMENTOS PARA AFASTAR O TRÁFICO PRIVILEGIADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 83/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME.
1. Agravo em recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra decisão que inadmitiu o recurso especial manejado pelo ora agravante. O Tribunal de origem reconheceu a nulidade das provas extraídas do celular do réu, apreendido em flagrante, sem autorização judicial, e manteve a aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33. da Lei 11.343/2006 (tráfico privilegiado), sob o fundamento de que não há elementos suficientes para demonstrar a dedicação do acusado a atividades criminosas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO.
2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é válida a prova obtida a partir do acesso aos dados do celular apreendido sem autorização judicial; e (ii) verificar se existem elementos suficientes para afastar a aplicação da minorante do tráfico privilegiado. III. RAZÕES DE DECIDIR.
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça considera ilícita a prova obtida diretamente dos dados de aparelho celular apreendido no momento do flagrante, sem autorização judicial, abrangendo mensagens de texto e conversas em aplicativos.
4. A aplicação da minorante do tráfico privilegiado exige que o réu seja primário, tenha bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas ou integre organização criminosa, nos termos do § 4º do art. 33. da Lei 11.343/2006.
5. A quantidade de entorpecente, isoladamente, não configura elemento suficiente para afastar a incidência da minorante do tráfico privilegiado, conforme entendimento consolidado do STJ.
6. O TJMG entendeu serem nulas as provas extraídas do aparelho celular do réu, o qual foi apreendido no momento da prisão em flagrante, destacando, ademais, não haver outros elementos indicativos da dedicação do acusado a atividades criminosas, pelo que foi reconhecida a causa de diminuição de pena do tráfico privilegiado.
7. A reanálise de fatos e provas, necessária para modificar a conclusão do Tribunal de origem é inviável em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ.
IV. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
(STJ, AREsp 2215806-MG, 5ª TURMA, REL. MINISTRA DANIELE TEIXEIRA, JULGADO EM 26/11/2024, PUBLICADO DJE 04/12/2024).
CONCLUSÃO
Diante da violação do sigilo telefônico que consubstanciou na revelação das mensagens captadas ilegalmente dos celulares do então Juiz Federal, Sérgio Moro e dos Procuradores da República, não poderiam ter sido utilizadas em nenhum processo, uma vez que são consideradas juridicamente ilegais, como acima demonstradas, além de terem sido forjadas mediante conduta clandestina criminosa dos seus autores e, mormente, porque foram utilizadas para beneficiar réu.
Ademais disso, no que concerne ao destino das mensagens e gravações originadas da atividade criminosa dos hackers e dos adquiridores, deverão obedecer aos critérios das Leis nºs 12.961, de 2014 e, 11.343, de 2006, em seu artigo 50, acrescido dos §§ 3º usque 5º, que trata da destruição de drogas apreendidas, além de autorizar a autoridade policial a sua destruição.
No pertinente as mensagens telefônicas, incumbe ao Juiz da causa determinar essa destruição, nos termos do artigo 157 do CPP, infra:
“Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo , as provas ilícitas , assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”.
Destarte, a destinação das mensagens clandestinas captadas criminosamente, sem autorização judicial, dos celulares do então Juiz Federal, Sergio Moro e dos Procuradores da República, deverá ser a destruição, sob o comando da legislação pertinente.
Em síntese, o elemento prova é considerado o principal objeto do processo penal, possibilitando a perquirição material e da autoria dos fatos criminosos, além de estabelecer as responsabilidades e as imputações das sanções cabíveis aos réus. Porquanto, a prova se reveste de um papel preponderante no processo penal, influenciando diretamente o resultado da ação penal.
FONTES DE PESQUISA
Constituição Federal de 1988
Código de Processo Penal
Jusbrasil – 2020
Aluízio Bezerra Filho - Poder 360 – 07/03/2021
Migalhas – 15/06/2021
Marcelo Ávila de Bessa e Yuri Rezende de Macedo – Migalhas - 27/01/2023
Galvão e Silva – Advogados – 01/06/2023
Jurisprudência do STJ