Abuso sexual infantil intrafamiliar no contexto da vulnerabilidade social

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07/02/2025 às 12:14

Resumo:

- O estudo aborda os casos de abuso sexual infantil intrafamiliar no Brasil, destacando a vulnerabilidade das crianças e as consequências para o futuro dessas vítimas, apontando a necessidade de medidas urgentes para coibir esse crime.
- Apesar da existência da legislação, como o artigo 217-A do Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a ineficácia das leis existentes e a falta de políticas públicas eficazes contribuem para o aumento dos casos de abuso sexual infantil intrafamiliar no país.
- A adoção de políticas públicas de prevenção contra o abuso sexual infantil, como o Programa Nacional de Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes, é essencial para combater o crime e proteger as vítimas mais vulneráveis, requerendo um maior comprometimento de todos os setores envolvidos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

RESUMO

O presente trabalho aborda os constantes casos de violência sexual infantil no Brasil, contra as crianças em estado de vulnerabilidade dentro do âmbito familiar, dirimindo a violência sofrida e o que passam dentro dos próprios lares com seus abusadores, as consequências que trazem para o futuro dessas crianças. Nesta perspectiva, a questão social contribui muito para um lastro de violações de direitos, corroborando ainda a ineficácia da lei existente que acaba contribuindo para o aumento de casos diários. O objetivo central do estudo é abordar e analisar o tema do abuso sexual infantil intrafamiliar que pode ser considerado um dos crimes mais delicados para a sociedade, será apresentado no contexto da vulnerabilidade social, à luz do direito penal, da previsão legal do ECA e abordando a adoção de políticas públicas de prevenção contra o abuso sexual infantil. O estudo fundamentou-se em pesquisas de cunho bibliográfico em materiais de referência da área, como livros, artigos e leis, percorrendo pela Doutrina da Proteção Integral do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e das manifestações destas violações. Sob essa ótica, medidas de urgência são necessárias para coibir esse crime, assegurando as vítimas mais vulneráveis a chance de não perpetuar os casos em família para que os ciclos de abusos cessem.

Palavras-chave: abuso sexual; vulnerabilidade; família.


1 INTRODUÇÃO

O presente estudo aborda um panorama geral sobre o abuso sexual infantil intrafamiliar que pode ser considerado um dos crimes mais delicados e relevantes para sociedade como um todo. A premissa que essa abordagem seja esclarecedora, será apresentada no contexto da vulnerabilidade social, à luz do direito penal e a previsão legal do ECA, abordando a adoção de políticas públicas de prevenção contra o abuso sexual infantil. Segundo (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2022), as crianças de até 13 anos representam em média, 60% das vítimas de estupros registrados. Dessa forma é possível afirmar que a maior parte dos crimes cometidos contra crianças é o estupro de vulnerável, uma alarmante realidade para o Brasil. O silêncio e a dificuldade na identificação causam um verdadeiro lastro de subnotificações e impunidade.

Infere-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA tem a premissa de priorizar pela dignidade e proteção integral das crianças, para que a Família, a Sociedade e o Estado se responsabilizem por seu cuidado e pela promoção de condições adequadas do desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. Nessa perspectiva, como objetivos específicos, analisar o abuso sexual infantil intrafamiliar, avaliar a ineficácia da lei penal art. 217-A do Código penal Brasileiro e a previsão legal do ECA, diante do crime de estupro de vulnerável e conhecer a adoção de políticas públicas para prevenção.

A escolha do tema, justifica-se por tratar de uma questão social de suma importância para toda sociedade, uma vez que, trata-se de um dos crimes mais terríveis cometidos contra uma criança em plena formação. Ademais o autor desses crimes normalmente é a pessoa incumbida do dever de cuidar e proteger. A legislação aponta que a família é a primeira instituição social que a criança tem contato, outrossim é dever dos pais ensinar as regras para o convívio em sociedade, formar um bom cidadão e principalmente resguardá-lo de todo perigo. No entanto, essa relação de poder e hierarquia acaba favorecendo o abusador e silenciando a maioria das vítimas de abuso sexual infantil intrafamiliar.

O tipo de pesquisa por revisão bibliográfica no presente trabalho, foram necessárias muitas pesquisas bibliográficas, via livros, artigos, de entrevistas e de leis, as quais foram importantes para a elaboração da argumentação. A abordagem utilizada no estudo será qualitativa, e via método dedutivo, onde será analisado o abuso sexual infantil intrafamiliar no contexto da vulnerabilidade social, a falta de medidas para prevenção do crime e a adoção de políticas públicas.

Enfim, sob o aspecto estrutural, tal pesquisa se ramifica em três tópicos. Na primeira parte, será abordada, através da análise do abuso sexual infantil intrafamiliar, sob o aspecto da vulnerabilidade social que a criança é submetida por meio desse crime, cometido dentro do seu lar que expõe com risco evidente para o crime de estupro de vulnerável. Na segunda parte, serão avaliadas as leis existentes no direito a proteção da criança e do adolescente, frente a violência sexual infantil, à luz do art. 217-A do Código penal e do ECA. Por fim, a terceira parte será abordada, a adoção de políticas públicas para prevenção do abuso sexual infantil, refletindo sobre a realidade da violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil.


2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 O ABUSO SEXUAL INFANTIL INTRAFAMILIAR

O abuso sexual infantil é todo ato sexual envolvendo adulto e criança, o qual pode ocorrer mediante contato físico, ou não. E quando a violação ocorre entre a criança e o adulto do seu âmbito familiar ou de convívio próximo, é denominado de abuso sexual infantil intrafamiliar, a maior violência existente perpetrada contra uma criança que é punida pelo código penal brasileiro, Art. 217-A (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009):

Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

Dessa forma, o estupro de vulnerável é a conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 14 anos, com ou sem consentimento, ou com enfermidade ou deficiência mental, as quais não possuem o discernimento necessário para a prática do ato, ou que não consiga ou não possa oferecer resistência.

A violência não é uma questão nova e as crianças são as vítimas mais fáceis para os abusadores familiares, pois historicamente a sociedade é construída baseada a partir das relações de poder, gênero, etnia e de classe social, fazendo com que a violência intrafamiliar seja uma expressão extrema de distribuição desigual de poder entre homens e mulheres, de discriminação, da desigual partilha de renda, de raça e de religião no país (PEDERSEN,2008).

Assim, pautada a realidade das desigualdades sociais, a vulnerabilidade social ganha a dimensão para criar-se uma fonte de abusadores em potencial.

A produção de crianças vitimadas pela fome, por ausência de abrigo ou por morar em habitações precárias, por falta de escolas, por doenças contagiosas, por inexistência de saneamento básico, que refletem diretamente na relação entre crianças, adolescentes e violência no cotidiano de famílias brasileiras. Essa situação de vulnerabilidade, denominada vitimação pode desencadear a agressão física e/ou sexual contra crianças e adolescentes, haja vista que a cronificação da pobreza da família contribui para a precarização e deterioração de suas relações afetivas e parentais. Nesse sentido, pequenos espaços, pouca ou nenhuma privacidade, falta de alimentos e problemas econômicos acabam gerando situações estressantes que, direta ou indiretamente, acarretam danos ao desenvolvimento infantil (BRASIL, 2006, p. 27).

No decorrer do tempo, as relações sociais com a família, igreja, estado, entre outros, fora perpetuado pelos valores morais, religiosos e culturais na sociedade, sendo até hoje arraigados em toda sociedade, por isso, pouco se fala, se ouve, ou se pública nas mídias, ainda existe o tabu que deve ser quebrado, o do silencio da vítima, por várias situações como a do medo do abusador, ou receio da mãe não acreditar, ou até mesmo do próprio silencio imposto pelos responsáveis que fingem que nada ocorreu, e também o silencio por vergonha, o silencio que cala as famílias quando descobrem o que está ocorrendo dentro lar, constrangidas como se fosse algo desonroso tanto para vitima quanto para família assumir para sociedade e ter que enfrentar o preconceito do seu meio social e o desespero de não ter a família perfeita e viver a destruição do seu lar (SANTOS, DELL'AGLIO, 2010).

Portanto, são muitas variáveis por trás desse crime que deve ser urgente mais falado e exposto por toda sociedade, pois a maioria das pessoas não sabem nem aonde ir, ou o que fazer nesses casos, ou acabem procurando ajuda no lugar errado, uns acabam se calando deixando impune um estuprador que logo vai repetir o abuso em outras crianças, o abusador não cessará, ele perpetuará a sua pratica dentro da família ou de pessoas próximas do seu convívio. Esse é um tema extremamente delicado para a maioria, e ainda mais para a criança que terá sequelas para toda a vida, mas o silencio não pode ser uma opção, independente do status social, vergonha, medo ou situação econômica familiar, ou qualquer outra situação não listada, o abusador tem que ser denunciado.

A violência intrafamiliar contra meninas estabelece uma relação que transgride os limites do poder familiar conferidos aos cuidadores. Tal transgressão pode se dar por meio de um ato violento que se utiliza da força física para realizar os propósitos do abusador. Ou ainda por meio do emprego abusivo do próprio poder simbólico familiar, na medida em que o cuidador se utiliza deste poder “naturalmente legítimo” para constranger, explorar, dominar e oprimir o outro. Esta última forma é mais sutil e silenciosa, pois ela se realiza sem que seja percebida como violência, mesmo por quem a sofre, já que ela se insere em tramas de relações de poder naturalizadas (JARDIM, 2008, p.100-101).

Como Jardim, ressalta, as tramas não podem ser naturalizadas, o alvo é fácil para o abusador sexual, devido a vulnerabilidade que permeiam as crianças.

Ressalto, sobre o divórcio como exemplo de cenário típico perfeito para o estuprador de crianças, quando uma família fica vulnerável, ela abre portas para tudo que uma criança não foi preparada para vivenciar dentro de casa ou fora, os pais têm que permanecer vigilantes, mesmo separados, proteger e zelar pelos seus filhos, abrir a mente em relação a educação sexual e evitar ao máximo os danos causados pela separação, manter uma convivência amistosa e presente é o ideal para não afetar tanto os filhos, conversas abertas salvam vidas.

Segundo dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, cerca de 75,9% dos casos de abuso ocorrem no ambiente domiciliar. Dentro desse total, mais de 40% dos episódios, são cometidos pelos próprios pais ou padrastos.

Os casos de violência sexual infantil não são isolados no Brasil. A cada hora, quatro crianças ou adolescentes sofrem violência, segundo organização de defesa dos direitos infantis. De acordo com balanço do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em média, são cerca de 37 por dia. (ANUÁRIO, 2022)

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Contudo, na prática o abuso sexual infantil intrafamiliar, segue subnotificado, por falta de medida de prevenção, políticas públicas assertivas e leis ineficazes, devido ao cenário arrolado.

2.2 A INEFICÁCIA DA LEI PENAL Art.217-A E A PREVISÃO LEGAL DO ECA

O art. 217-A do Código penal e a previsão legal do ECA não sãos efetivas o suficiente como deveria ser, pois os dados recentes do Anuário brasileiro de Segurança Pública que mapeia desde 2019 a 2022, atestam que os casos de estupro de vulnerável por regiões brasileiras, só cresce, fora a grande quantidade de casos subnotificados, dados dizem que são mais de 4 meninas de menos de 13 anos estupradas por hora no Brasil, logo em uma visão macro acaba tornando a lei ineficaz.

O Estatuto da Criança e do Adolescente- ECA que foi criado para promover essa maior proteção, também não conseguiu vislumbrar grandes êxitos para esse crime, devido variados fatores estruturais próprios da nossa sociedade. A lei tem que evoluir para cessar esse crime, mas não é somente no âmbito da penalização que resolverá. As medidas de prevenção devem ser urgentes, a sociedade tem que falar desse assunto abertamente, o tabu do silencio tem que cessar, as principais instituições têm que se unir para aumentar a eficácia da lei e promover políticas públicas eficazes para todas as regiões do país.

A lei sustenta os pilares e orienta os caminhos da democracia, O direito tem a função de organizar a sociedade, de manter a sua funcionalidade e evitar que ela se torne instintiva.

Dessa forma, está previsto pelo artigo 217-A do Código Penal:

Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

1ºIncorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

Então, é necessário ressaltar que o crime de estupro de vulnerável não é cometido apenas contra crianças. Ou seja, qualquer pessoa que se encontre em condição de fragilidade está vulnerável, o estupro de vulnerável é a conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 14 anos, com ou sem consentimento, ou com enfermidade ou deficiência mental, as quais não possuem o discernimento necessário para a prática do ato, ou que não consiga ou não possa oferecer resistência, não é necessário que haja grave ameaça ou violência, uma vez que a consumação do ato já é considerada crime de estupro de vulnerável, outro ponto importante a ressaltar sobre essa lei é que o crime de estupro de vulnerável não acontece exclusivamente quando há consumação do ato. Logo, poderá ser considerado violação, também, qualquer ato libidinoso perpetrado, não apenas a conjunção carnal. Dessa forma, nos termos da lei e em consonância dos tribunais:

“A configuração do tipo estupro de vulnerável prescinde da elementar violência de fato ou presumida, bastando que o agente mantenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com menor de catorze anos, como se vê da redação do art. 217-A, nos termos da Lei n.º 12.015/2009.” (EDcl no AgRg no Ag 706012 / GO, 5ª Turma, relatora Ministra Laurita Vaz, DJe de 22/03/2010).

“Crime de pedofilia”: pedofilia é o nome dado a uma enfermidade prevista na Classificação Internacional de Doenças (CID-10, Código F65.4). O fato de o agente ser pedófilo ou não é irrelevante para a configuração do crime – caso contrário, se a ideia fosse a punição de quem possui a doença, seria exigida a perícia de todos os acusados pela prática do estupro de vulnerável. Por isso, descabida a realização de campanhas que buscam o fim da pedofilia. Em verdade, mais correto seria lutar pelo fim da violência sexual contra menores de 14 anos, real objetivo do art. 217-A do CP.

Evidencia-se, inclusive, que como alguns tipos de abuso sexual infantil são considerados crimes hediondos, Lei 8.072, de 1990, como o estupro de vulnerável (artigo 217-A do Código Penal), o regime imposto é diferente aos considerados crimes não hediondos: segundo o artigo 2º, §1º, da lei supra, quando da condenação de tais crimes o regime inicial deverá ser o fechado, sendo a progressão de regime 40% se réu primário e 60% se reincidente (redação dada pelo artigo 112, V e VII, do pacote "anticrime"). Após proferida a sentença, sempre haverá a possibilidade de recurso, seja pela defesa quanto pela acusação (MP ou assistente de acusação, quando presente) (CONJUR,2021).

Além disso, em decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ato, mesmo que seja à distância, poderá ser considerado crime. Ou seja, ainda que o acusado não tenha tocado na vítima, é possível que haja um processo de estupro de vulnerável. O maior objetivo dessa lei é proteger a dignidade sexual das vítimas.

A sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente que, uma vez reconhecida a prática de atos libidinosos, diversos da conjunção carnal, que configuram a forma consumada do crime de estupro de vulnerável (art.217-A, do Código Penal), é descabida a diminuição da pena pela tentativa.

A decisão (AgRg no REsp 1869474/MS) teve como relatora a ministra Laurita Vaz:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO. DISSONÂNCIA DE JURISPRUDÊNCIA CONSO LIDADA DOS TJ. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊ NCIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ATOS LIBIDINOSOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO CARNAL. CONSUMAÇÃO.TENTA TIVA. APLICAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. DESCABIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Nos termos do art. 255, § 4.º, inciso III, do Superior Tribunal de Justiça e da Súmula n. 568 também desta Corte Superior, pode o Relator, monocraticamente, dar provimento ao recurso especial quando o acórdão recorrido for contrário à jurisprudência consolidada neste Tribunal Superior. Além disso, a possibilidade de interposição de agravo regimental, com a submissão da insurgência ao Colegiado, esvazia a alegação de cerceamento de defesa.

2. O entendimento desta Corte Superior é firme no sentido de que, uma vez reconhecida a prática de atos libidinosos que configuram a forma consumada do crime de estupro de vulnerável, tipificado no art. 217-A do Código Penal, é descabida a diminuição da pena pela tentativa, nos termos do art. 14, inciso II, do mesmo Estatuto, sob o fundamento de que a reprimenda aplicada seria desproporcional.

3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1869474/MS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/06/2021, DJe 30/06/2021).

Conquanto, essa violação é considerada um dos crimes mais violentos do Código Penal. Por isso, é considerado um crime hediondo. Além disso, este crime ocorre mediante a agressão real ou presumida, mas mesmo com esse cenário com leis garantidoras, o número de abuso sexual infantil só cresce no Brasil. A lei existe, mas é ineficaz, devido a vários motivos intrínsecos, já dispostos e principalmente pela falta de políticas públicas de prevenção.

O Governo brasileiro criou diversas medidas para proporcionar melhor assistência às crianças e aos adolescentes carentes, que, por diferentes motivos, ficam excluídos do quadro de

saúde definido pela OMS. Entre as medidas adotadas, encontra-se a elaboração do ECA, a criação dos Conselhos Tutelares (no âmbito municipal e os programas assistencialistas).

A proteção integral a partir do ECA, um estatuto protetivo, entra em vigor como o maior ordenamento protetivo da história legislativa, a promulgação do ECA foi um marco decisivo, a partir do qual a criança e o adolescente deixaram de ser objetos da ação opressiva do Estado. O Estatuto elevou os menores à condição de sujeitos aos quais são assegurados todos os direitos e garantias fundamentais, provenientes do princípio da condição peculiar de pessoas em desenvolvimento.

Pode-se dizer que o ECA inaugurou uma etapa de responsabilização, em que a família, a comunidade, a sociedade em geral e o Poder Público são os corresponsáveis na efetivação dos Direitos Fundamentais das Crianças e Adolescentes, devendo assegurar com absoluta prioridade, “a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária” (BRASIL, 1990).

Conhecendo mais o ECA que foi sancionado no Brasil em 13 de julho de 1990, pela Lei nº 8.069, a qual se baseia na proteção integral das crianças e adolescentes, garantindo-lhes o direito a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio, harmonioso e em condições dignas de existência, define as crianças e os adolescentes como sujeitos de direito, sendo-lhes garantida a proteção integral. Dispostos conforme os artigos abaixo:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

O ECA dispõe ainda que, nos casos de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsáveis, a autoridade judiciária poderá afastar o agressor da moradia comum. Com relação aos alcoólatras e toxicômanos, as medidas de proteção são diversas, entre elas a orientação, apoio e acompanhamento temporário, a inclusão em programas comunitários ou oficiais de auxílio à família, crianças e adolescentes, o requerimento de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico e até a colocação em família substituta.

Portanto, o Estatuto corrobora com uma nova fase a partir da Lei nº 8.069/90, trazendo segurança e proteção integral a crianças e adolescentes no Brasil. Tudo que fora arrolado é um aparato significativo as vítimas de abuso sexual infantil, porém, ainda não é o suficiente para resolver a questão e diminuir os casos de violência contra essas crianças que vivem em constante vulnerabilidade.

2.3 A ADOÇÃO DE POLITICAS PUBLICAS DE PREVENÇÃO CONTRA O ABUSO SEXUAL INFANTIL

A adoção de politicas publicas para a prevenção é essencial para combater a crescente do crime de estupro de vulneravél, assim o decreto vigente tem a missao de mudar esse cenário que o brasil vem enfrentando.

O Decreto nº 10.701, de 17 de maio de 2021, que instituiu o Programa Nacional de Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes, previu a criação do Plano Nacional de Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes, cujo processo de construção tem demandado um intenso diálogo e articulação com os atores e parceiros governamentais e da sociedade civil, a fim de que possam discutir a política de enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes sob as óticas da multidisciplinariedade, regionalização e intersetorialidade (PLANO NACIONAL, 2022).

O plano de enfrentamento da violencia contra a criança e adolescentes, 2022 ativo via decreto supracitado é uma via do governo para combater o crime de estupro de vulneravel, é baseado em 05 pilares de organização: 1. Prevenção; 2. Atendimento; 3. Defesa e Responsabilização; 4. Protagonismo e Mobilização Social; 5. Estudos e Pesquisas.

Então, detalhando o item 1, segundo as diretrizes da prevençao do plano de enfrentamento atual de 2022 a 2024, capacitar acerca da prevenção do abuso sexual, observando temas transversais como gênero, raça/etnia, dignidade humana, sexualidade, dentre outros, promover ações educativas e/ou formativas nos espaços de convivência de crianças, adolescentes, grupos familiares e comunidade, Fortalecer os mecanismos de proteção no nível comunitário;

Conforme aponta o (PLANO NACIONAL, 2022), todos esses fatores de prevenção dentro das escolas e comunidades, são essencias para diminuir a partica do abusador, além de descobrir novos casos nas regioes por onde passar, com parceria publica e privada esse plano de enfrentamento vai buscando melhorar e diminuor os casos corriquiqueiros e de tão dificil acesso que é o caso do abuso intrafamiliar, o governo precisa dessas parcerias para aumentar o foco na informação, prevenção, união da sociedade como um todo, além de mobilizar e articular o fortalecimento do Orçamento da Criança (OCA) junto aos Gestores Públicos e empresas privadas. Pois, a violencia sexual infantil é tema para todos, perpassa o governo, o capital, o juridico, a escola e a familia, é naturalmente um dever de todos.

A violência intrafamiliar contra meninas estabelece uma relação que transgride os limites do poder familiar conferidos aos cuidadores. Tal transgressão pode se dar por meio de um ato violento que se utiliza da força física para realizar os propósitos do abusador. Ou ainda por meio do emprego abusivo do próprio poder simbólico familiar, na medida em que o cuidador se utiliza deste poder “naturalmente legítimo” para constranger, explorar, dominar e oprimir o outro. Esta última forma é mais sutil e silenciosa, pois ela se realiza sem que seja percebida como violência, mesmo por quem a sofre, já que ela se insere em tramas de relações de poder naturalizadas (JARDIM, 2008, p. 100-101).

Uma das fomas de combate a impunidade é o disque 100, entre outros. O Disque 100, que é o Disque Direitos Humanos, um canal disponibilizado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) que consiste em um serviço de disseminação de informações sobre direitos de grupos vulneráveis e de denúncias de violações aos direitos humanos. Funciona 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados; após feita a queixa, de forma anônima ou não, caberá ao próprio órgão analisar e encaminhar as denúncias aos outros. (CONJUR,2021)

Resta, denunciar e procurar a delegacia especializada mais próxima da sua cidade chamados DPCAs.

Lembrando (JARDIM, 2008) sobre apontamento da violência intrafamiliar contra meninas estabelece uma relação que transgride os limites do poder familiar conferidos aos cuidadores.

Tal transgressão pode se dar por meio de um ato violento que se utiliza da força física para realizar os propósitos do abusador. Ou ainda por meio do emprego abusivo do próprio poder simbólico familiar, na medida em que o cuidador se utiliza deste poder “naturalmente legítimo” para constranger, explorar, dominar e oprimir o outro. Esta última forma é mais sutil e silenciosa, pois ela se realiza sem que seja percebida como violência, mesmo por quem a sofre, já que ela se insere em tramas de relações de poder naturalizadas (JARDIM, 2008, p. 100-101).

Dessa forma, a prevenção tem que ser iniciada urgente e alcançada unindo políticas públicas assertivas dentro da escola, adentrando os bairros mais carentes, interiores, pois lá existem as crianças mais vulneráveis.

Destarte, as escolas ainda são peças fundamentais na descoberta de casos de violência sexual contra crianças os professores percebem comportamentos diferentes das crianças, ou as próprias vítimas procuram os educadores para contar situações de assédio (Braz, 2022).

Portanto, a escola é a instituição onde deve ser ensinado a educação sexual, além de ser um canal muito importante de denúncia.

Sobre o Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes, sob o enfoque do atendimento e saúde das vítimas;

O programa ainda apresenta dificuldades Inter setoriais no que tange a articulação com a rede assistencial, processos de referência e contra referência e interlocução dos profissionais envolvidos. Os indicadores de avaliação do atendimento são precários, inviabilizando o monitoramento adequado das ações realizadas. Por sua vez, as capacitações oferecidas aos profissionais que atuam no Sentinela não são sistemáticas, ocasionado uma falta de padronização de condutas de atendimento. (PAIXÃO, DESLANDES, 2010)

Nota-se que o desafio é enorme, as políticas públicas existem, mas não são eficazes por uma série de fatores intrínsecos e extrínsecos.

Desse modo, buscar sempre variadas formas existentes de prevenir, sendo umas delas através da informação que transpõe barreiras; Conforme (CONJUR, 2021) alguns estudos voltados ao tema, nos auxiliam a identificar quando os pequenos estão sofrendo algum tipo de abuso sexual, sendo recomendado:

1) Acreditar no que eles dizem, acolhendo-os, sem jamais fazê-los sentirem responsabilizados pelo ocorrido;

2) Analisar grandes mudanças comportamentais, hábitos foras do comum, como, por exemplo: passarem a ter medo de ficarem sozinhos ou, quando perto de certas pessoas, manterem uma proximidade excessiva de outro alguém; adultos com interesses fora do normal em situações em que ficam sozinhos com os mais novos, oscilações de humor;

3) Atenção a possíveis traumatismos físicos: partes do corpo roxas, inchaços, odores, entre outros;

4) Identificar se esses estão, de alguma forma, estimulando a sexualidade, isto é, usando termos eróticos em suas conversas, fazendo desenhos sexuais, dando nomes diferentes as suas partes íntimas, chamando outras crianças, adolescentes ou jovens para brincadeiras de cunho sexual — "brincar de namoradinhos";

5) Observar regressões comportamentais — voltar a chupar o dedo, fazer xixi na calça, passar a isolar-se.

A manipulação feita pelo agressor que se beneficia do vínculo de confiança e da relação afetiva que já possui com a criança pode fazê-la acreditar que se trata de uma manifestação de carinho especial, o que torna o crime silencioso por, geralmente, não deixar marcas físicas expostas. (SILVA, LUCENA, 2022).

Conquanto, o estupro de vulnerável, trata-se de crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, homem ou mulher. O sujeito passivo é a vítima, do sexo masculino ou feminino, menor de 14 (quatorze) anos, ou quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tenha o necessário discernimento para a prática do ato, ou, ainda, quem, por qualquer motivo, não possa opor resistência. O objeto jurídico é a dignidade sexual do vulnerável, e não a liberdade sexual, afinal, neste crime, não se discute se a vítima consentiu ou não com o ato sexual e o objeto material é a pessoa vulnerável, a vítima. A Vítima é comum afirmar que o crime de estupro de vulnerável consiste em violência sexual contra crianças, o que não é verdade, afinal, segundo o ECA (art. 2o), criança é quem ainda não tem 12 (doze) anos completos. No estupro de vulnerável (art. 217-A) a vítima é menor de 14 (quatorze) anos. Portanto, podem ser vítimas tanto crianças quanto adolescentes. Ademais, frise-se que a vítima pode ser tanto do sexo masculino quanto feminino (CASTRO, 2013).

Contudo, mesmo com a notória dificuldade no enfrentamento, prevenir é a saída, são mais de 4 meninas de menos de 13 anos estupradas por hora no Brasil. (ANUÁRIO, 2022). As crianças precisam dos adultos para romper o silêncio, pois as vozes serão capazes de provocar consciência e impulsionar a discussão para construção de políticas públicas mais eficazes para mudar essa realidade.

Sobre a autora
Marcella Oliveira da Fonseca

Bacharel em Direito, Advogada Especializada em Direito Previdenciário e MBA em Direito Público na PUC-RS

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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