Rescisão contratual de planos fixos e móveis das operadoras brasileiras e a multa de permanência ou "fidelidade"

10/02/2025 às 16:17

Resumo:


  • O vício no serviço é uma reclamação frequente dos consumidores brasileiros, principalmente em relação aos maus funcionamentos dos serviços de telefonia e internet.

  • A multa de permanência ou "fidelidade" por rescisão contratual em casos de vício no serviço é considerada injusta para o consumidor, violando seus direitos básicos de reparação de danos patrimoniais e morais.

  • A Resolução n. 477 da Anatel e a Nota Técnica n. 32/2009 do DPDC garantem ao consumidor o direito de rescindir o contrato sem multa em casos de vício no serviço, protegendo a parte mais vulnerável da relação de consumo.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Resumo: o presente trabalho é uma orientação aos consumidores brasileiros, aos juristas e operadores do Direito sobre a seguinte questão: cabe multa de permanência ou "fidelidade" (como é conhecida) em casos de mau funcionamento do serviço de internet fixa ou móvel por parte da operadora? Far-se-á uma análise amparada em resoluções, notas técnicas, o Código de Defesa do Consumidor e a doutrina consumerista.


O vício no serviço

Muitas reclamações nos Procons brasileiros versam sobre os maus funcionamentos dos serviços por parte das operadoras de telefonia e internet. Diversos consumidores procuram os órgão de defesa do consumidor, integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), a fim de tentar a solução pela via administrativa de seus litígios na seara do Direito do Consumidor, obtendo bons êxitos (dizendo o presente autor por experiência própria pelo trabalho por ele efetuado no Procon como atendente).

Uma das principais reclamações no que tange às operadoras telefônicas é: o mau funcionamento ou funcionamento inadequado do serviço prestado por elas como, a exemplo, queda de internet constante e lentidão nesta.

A terminologia dada para o que os leigos denominam de "defeito" no serviço é o vício do serviço. O que é o vício? Este compreende um defeito ou mau funcionamento do serviço prestado, mas, diferente do defeito (na linguagem jurídica), ele fica adstrito apenas ao produto, não causando periculosidade à saúde físico-psiquíca dos consumidores como no defeito do produto ou do serviço.

O vício de qualidade no serviço se encontra no art. 20 do CDC, podendo requerer o seguinte em seus incisos I, II e III:

Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.
§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade (BRASIL, 1990).

No caso do vício das operadoras, vários consumidores relatam, em reclamações nos Procons, que seus serviços de internet funcionam com excessiva lentidão e com quedas constantes de sinal. Estes problemas relatadas se encaixam como vícios dos serviço? Sim, encaixam-se! Entram nos vícios de qualidade dos serviços! O inc. II do art. 20 do CDC, deixa explícito que pode o consumidor solicitar, à sua livre escolha (frise-se), a restituição da quantia paga por ele no serviço, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos (a depender estes últimos do caso concreto).


A multa de permanência ou "fidelidade" por rescisão contratual quando há vício no serviço: é justo para o consumidor ou vantagem para o fornecedor?

Muitas operadoras, ao firmarem o contrato adesivo com o cliente/consumidor, fazem uma permanência, chamada também de "fidelidade", por, em média, dose meses e, além disso, na renovação do contrato (nem sempre, mas ocorre também). A questão é: é justo essa prática quando há vícios no serviço prestado pelas operadoras de internet fixa ou móvel? Viola direitos do consumidor, é justo para este ou traz uma vantagem manifestamente excessiva para o fornecedor, deixando o consumidor preso ao serviço enquanto durar o contrato?

Compreende o presente autor que é injusto para o consumidor! Explica-se: o art. 6°, VI do CDC diz:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

Tal artigo da Lei 8.078/1990 consagra o princípio da reparação integral dos danos. Este princípio se coaduna com os vícios do produto e do serviço! Os vícios, como explicado anteriormente, ficam adstritos ao produto ou ao serviço prestado, ou seja, causam prejuízo materiais aos consumidores, perdas e danos (o que efetivamente se perdeu) e os lucros cessantes (o que efetivamente se deixou de ganhar), nas palavras de TARTUCE (2023). No caso das perdas e danos, seria o dinheiro gasto pelo consumidor no serviço mau prestado; no caso dos lucros cessantes, pelo que ele deixou de ganhar, por exemplo, por não conseguir utilizar a internet sendo que estava trabalhando em home office.

A Nota Técnica n. 32/2009 do DPDC e a Resolução n. 477 da Anatel dizem:

"Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (Nota Técnica n. 32 - DPDC/SDE/MJ, de 31 de agosto de 2009): Em caso de vício no serviço móvel pessoal, o consumidor tem direito à rescisão do contrato, sem a cobrança de multa ou qualquer outro ônus, ainda que esteja submetido a contrato de fim caso de (prazo de permanência), nos termos do Código de Defesa do Consumidor e da Resolução n. 477 da Anatel. Caracteriza vício no serviço móvel o descumprimento pela prestadora de qualquer obrigação prevista em lei, regulamento ou contrato, ou a frustração das legítimas expectativas do consumidor quanto à qualidade do serviço. Nesse caso, cabe à empresa o ônus de comprovar a improcedência da inadequação alegada pelo consumidor’’.

Como o CDC é norma de ordem pública, como dito em seu art. 1°, as normas são de interesse social por mandamento constitucional (arts. 5°, XXXII e 170, V da CF/1988), a garantia legal, do art. 20 do CDC, se sobrepõe, até, na visão do presente autor, sobre os contratos, visto que a Política Nacional de Relações de Consumo (PNRC), de ordem pública, em seu art. 4°, III, institui a boa-fé objetiva como norte e fundamento do microssistema consumerista, além da função social do contrato em seu art. 47 do CDC, mitigando o pacta sunt servanda ou força obrigatória do contrato em prol do consumidor. Citando os artigos:

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

Visto isso, pode-se argumentar, como é a visão do escritor deste trabalho, que a força obrigatória do contrato é mitigada pelos preceitos de ordem pública, a boa-fé e a função social do contrato, em prol da parte mais vulnerável da relação de consumo: o consumidor. Por esses motivos, é justificável a Resolução da Anatel e a Nota Técnica do DPDC, porquanto os arts. 18, 19, 20 e 21 protegem o patrimônio do consumidor, a parte mais fraca da relação de consumo, contra os abusos dos fornecedores, a parte mais forte da relação ora citada.


Conclusão

Conclui-se, ante o exposto, que é justo e equitativo, pelo princípio da igualdade material (guiador do CDC), a rescisão do contrato com isenção da multa de permanência de operadoras de internet fixa ou móvel pelo consumidor por causa dos vícios dos serviços, maus prestados.


Referências

Código de Defesa do Consumidor. Decreto Presidencial nº 2.181, de 20 de março de 1997, Brasília, DF, 1997.

Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (Nota Técnica n. 32 - DPDC/SDE/MJ, de 31 de agosto de 2009).

TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor: direito material e processual. 13ª ed. São Paulo: Editora Método e Grupo Gen, 2024.

Sobre o autor
Erick Labanca Garcia

Graduando em Direito, estagiário jurídico, escritor e cronista.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos