Os vícios dos produtos essenciais pelo CDC: Os direitos do consumidor frente aos vícios em produtos essenciais

10/02/2025 às 16:29

Resumo:


  • O artigo visa orientar sobre os vícios dos produtos essenciais e como reclamar nos órgãos de defesa do consumidor.

  • Discute-se a diferença entre vícios de qualidade do produto e o fato do produto, bem como a responsabilidade solidária dos fornecedores.

  • Os prazos para reclamações de produtos duráveis e não duráveis são de 90 e 30 dias, respectivamente, mas há exceções para produtos essenciais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Resumo: o artigo visa orientar operadores do Direito, juristas e os consumidores brasileiros a respeito dos vícios dos produtos essenciais. Ver-se-á como reclamar nos órgãos de defesa do consumidor, os Procons, sobre os vícios que acometes os produtos, os prazos para reclamações, sobre a responsabilidade solidária dos fornecedores e, adicionalmente, nas compras efetuadas pela internet.


Introdução

O consumo faz parte da vida diária dos cidadãos mundiais. A todo momento se consome, pois as pessoas precisam consumir para sua sobrevivência (por exemplo, indo ao mercado e comprando a "feira do mês"). Ocorre, no entanto, que o consumidor se vê desorientado, pela falta de educação a respeito de seus direitos (direito esse à educação sobre seus direitos como consumidor consagrado na Política Nacional das Relações de Consumo, PNRC, do art. 4°, IV, CDC), quando um "defeito" acomete seu produto. Ele, o consumidor, simplesmente não sabe o que fazer!

Por isso, o intuito do presente trabalho: orientação. O autor do artigo que se escreve orientará, nos tópicos ou capítulos seguintes, o consumidor brasileiro médio, considerado vulnerável pelo CDC e pela PNRC em seu art. 4°, I, a buscar seus direitos e ser bem informado quanto a eles.

No primeiro tópico, discutir-se-á o que são os vícios de qualidade do produto e a diferença entre os vícios de qualidade do produto e o fato do produto. No capítulo seguinte, discutir-se-á a questão dos prazos do art. 26 do CDC para efetuar a reclamação e suas exceções, dialogando com o § 3° do art. 18 do CDC a respeito dos bens considerados essenciais, bem como do critério da vida útil do produto. No último capítulo, discutir-se-á a reclamação dos consumidores acerca dos bens considerados essenciais para a sobrevivência do reclamante, bem como sua dignidade e seu mínimo existencial (instituídos pelo art. 6°, XII, CDC), e a exceção do art. 18, § 3°, CDC, que, diz-se, "passa por cima" do § 1° do art. 18 do mesmo diploma legal.

O método utilizado pelo autor deste trabalho é o qualitativo, com análise da Lei 8.078/1990 e pesquisas bibliográficas de doutrinas consumeristas.


Vício do produto: diferença do fato do produto e os direitos do consumidor caso o vício seja evidenciado

Como leciona TARTUCE (2024), o vício, diferente do fato ou defeito do produto, ele é um problema inerente ao produto, ficando adstrito apenas a ele, enquanto o fato ou defeito do produto causa danos à integridade físico-psíquica do consumidor, causando danos a este.

Tem-se a primeira definição de vício do produto: descomplicando, o vício, que coloquialmente chama-se de "defeito", é um problema do próprio produto, ou seja, ele não causa danos aos consumidores. Como forma de exemplo, tem-se um liquidificador que, mesmo ligado na tomada e com energia elétrica, ele não funciona e nem liga.

O vício pode ser de quantidade ou de qualidade. Os vícios de quantidade estão estatuídos no art. 19 do CDC, enquanto os de qualidade estão positivados no art. 18 do mesmo diploma legal. Transcreve-se abaixo o art. 18 da Lei 8.078/90:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

A primeira coisa que se vê no artigo citado é a chamada responsabilidade solidária pelo dano material causado ao consumidor. Responsabilidade solidária significa que todos os envolvidos na cadeia produtiva do bem (o comerciante, fabricante e o distribuidor) respondem pelo dano material, o vício no produto (que não funciona, por exemplo), causado ao consumidor que adquiriu o produto.

Também, cabe citar o art. 12 do CDC abaixo, a fim de explicar outro conceito que se coaduna com a solidariedade na responsabilidade civil no Direito do Consumidor:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

O artigo acima diz a respeito da responsabilidade objetiva ou sem culpa do fornecedor, ou seja, o fornecedor, no Código de Defesa do Consumidor e sua seara, responde independente da existência de culpa, não devendo esta ser comprovada pelo consumidor, mas pelo comerciante, fabricante ou distribuidor.

Os conceitos apresentados nos arts. 12 e 18 do CDC, a solidariedade e a responsabilidade civil objetiva nos vícios do produto, decorrem da Teoria do Risco. Esta diz que o fornecedor, ao produzir e colocar um produto no mercado, assume o risco inerente à atividade empresarial. O consumidor, por outro lado, está exposto ao riscos dos produtos e serviços, sendo a parte vulnerável a relação de consumo. Então, por isso a escolha do legislador no CDC em responsabilizar objetivamente e solidariamente os fornecedores, visto que a atividade empresarial possui riscos inerentes a ela mesma, devendo a Lei 8.078/90 defender a parte mais vulnerável e equilibrar a relação naturalmente desigual de consumo, como consta na PNRC no art. 4°, III, CDC.

Há ainda outra diferença dentro da concepção do vício no produto: o vício aparente e o vício oculto. TARTUCE (2024) diz que o vício aparente é de fácil constatação, ou seja, percebe-se ele de primeiro momento; já o vício oculto aparece posteriormente e com o uso do produto em si, ou seja, não se percebe ele de primeiro momento.

Em caso de vícios no produto, não sendo sanados em 30 dias pelo fornecedor, o art. 18, § 1°, I, II e III do CDC diz:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

O consumidor tem o direito à livre escolha entre um dos três incisos, não sendo de escolha do fornecedor, visto a Teoria do Risco citada anteriormente.


Prazos para reclamações: os §§ 1° e 3° do art. 18 e o art. 26, I e II do CDC

As reclamações sobre os vícios do produto não são absolutas! Elas possuem prazo, visto que o Código de Defesa do Consumidor não visa auferir vantagens para o consumidor, mas harmonizar a relação de consumo, defendendo aquele perante o fornecedor que está em situação de vantagem naturalmente.

O prazo para a reclamação de bens não duráveis (como alimentos) é de 30 dias e o prazo para os produtos duráveis é de 90 dias, como denota o art. 26, I e II da Lei 8.078/1990:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

Entretanto, o § 1° do art. 18 do CDC diz que o fornecedor tem o dever de reparar o vício do produto em 30 dias, devendo o consumidor procurar, primeiramente, o fornecedor, conforme abaixo:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

Mas, e se tratando de bem essencial, como uma geladeira, um fogão ou uma máquina de lavar roupas? Como ficaria a questão do prazo? Seria de 30 dias? Mesmo tendo dado o defeito novamente pós-reparo pelo fornecedor, o consumidor ainda teria que procurar este pelo prazo de 30 dias até efetuar uma reclamação no Procon?

O § 3° do art. 18 do CDC estabelece as exceções à regra do § 1° do mesmo dispositivo, ao dizer que em produtos essenciais, o consumidor não precisa aguardar o prazo, podendo reclamar após o primeiro reparo técnico:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 3º O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1º deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

Sendo assim, o consumidor pode fazer uso das alternativas, ressaltando a livre escolha dele, do § 1°, I, II e III do art. 18 do CDC, caso se trate de bem essencial.


Os bens essenciais, a vulnerabilidade do consumidor e seu mínimo existencial: os §§ 1° e 3° do art. 18 e a análise constitucional da vulnerabilidade do consumidor

Os bens essenciais são, como o próprio nome diz, fundamentais para a vida cotidiana do consumidor. Por exemplo, ninguém sobrevive sem uma geladeira, sem um fogão, sem uma máquina lavadora de roupas e, até, sem um celular ou telefone (considera o presente autor este um bem essencial, tendo em vista a digitalização e a globalização da sociedade, mas não irá o autor aprofundar neste tópico).

Fez bem o legislador pátrio ao criar o § 3° do art. 18 do CDC, merecendo o poder legislativo brasileiro elogios! O consumidor, pelos arts. 5°, XXXII e 170, V, da CF/1988 é protegido pela Constituição brasileira! Transcreve-se abaixo os artigos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

V - defesa do consumidor;

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Então, é um mandamento constitucional, de hierarquia superior da pirâmide kelseniana, que defende os interesses dos consumidores! A PNRC diz no CDC:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

O consumidor é o vulnerável, por excelência, na relação de consumo, tendo em vista que possui menos poder econômico que as grandes empresas, menos informações (visto que a sociedade se encontra na era digital) e menos poder de escolha, visto a standardização contratual! O consumidor, como a parte pressuposta como vulnerável legalmente, pela Teoria da Qualidade (MARQUES, 2021), é protegido em dois sentidos diversos: patrimonialmente ou materialmente e fisicamente e psicologicamente. A Teoria da Qualidade, adotada pelo Código de Defesa do Consumidor, defende a incolumidade físico-psíquica do consumidor, pelo art. 6°, I e VI, CDC, e a patrimonial, consagrada pelo art. 6°, VI, ou princípio da reparação integral dos danos. Este princípio será transcrito abaixo:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

Pelo princípio ora citado, os bens patrimoniais do consumidor devem ser protegidos! Em caso de produtos defeituosos ou com vício, é dever do fornecedor acatar a decisão do consumidor entre os inc. I, II e III do § 1° do art. 18 do CDC. E se tratando dos bens essenciais? O CDC também consagra a preservação do mínimo existencial no art. 6°, XII, corolário este da dignidade da pessoa humana do art. 1°, III da CF/88:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

Desse modo, se tratando de bem essencial, nada mais justo do que "quebrar" a regra do § 1° do art. 18 do CDC, tendo em vista que este parágrafo do artigo citado fere, sim, o mínimo existencial do consumidor, pois um máquina lavadora de roupas, um celular ou telefone e uma geladeira são necessárias a quaisquer indivíduos, sendo parte do desenvolvimento da personalidade, consagrado este na Constituição Federal brasileira, do indivíduo médio brasileiro, porquanto não há possibilidade de desenvolvimento pleno da personalidade do homem ou mulher sem o acesso aos bens básicos!


Conclusão

Conclui-se, ante o exposto, que o legislador pátrio agiu acertadamente, de forma louvável, ao instituir a exceção do art. 18, § 1° do CDC instituindo o § 3° no mesmo artigo. Para que o consumidor se desenvolva como cidadão brasileiro, com o desenvolvimento pleno de sua personalidade, seu mínimo existencial, no art. 6°, XII do CDC, ele precisa do devido acesso aos bens mais básicos para tanto!


Referências Bibliográficas

Código de Defesa do Consumidor: Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. 39ª ed. São Paulo: Editora Edipro, 2024.

Constituição da república Federativa do Brasil. 59ª ed. São Paulo: Editora SaraivaJur, 2024.

MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman Vasconcellos; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 9ª ed. São Paulo: Editora Thomson Reuters Brasil, 2021.

TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor: direito material e processual. 13ª ed. São Paulo: Editora Método, 2024.

Sobre o autor
Erick Labanca Garcia

Graduando em Direito, estagiário jurídico, escritor e cronista.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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