Online dispute resolution (ODR) no poder judiciário brasileiro: uma perspectiva sobre os meios alternativos de solução de conflitos e a justiça digital

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RESUMO

Este artigo analisa a regulamentação dos Meios Alternativos de Solução de Conflitos (MASC) no contexto da Resolução de Conflitos Online (ODR), destacando suas características e aplicabilidade na justiça digital. O objetivo principal é examinar o uso da ODR no cenário jurídico brasileiro, considerando sua integração com os MASCs, e compará-la com a jurisdição tradicional, avaliando suas vantagens. O estudo utiliza como exemplos a plataforma Modria e o caso eBay no comércio eletrônico, ilustrando os benefícios da ODR na resolução de conflitos. O artigo também aborda a importância da ODR no Direito brasileiro, evidenciando seu potencial para melhorar a eficiência e reduzir a burocracia. Para isso, é adotado o método dialético, com análise de dados específicos e formulação de conceitos gerais, além de métodos bibliográficos, documental e clínico, combinados com uma abordagem exploratória. A pesquisa utiliza estudos de casos para embasar os fundamentos do tema. Os resultados indicam que a implementação da ODR no Direito representa uma inovação necessária para a resolução mais eficiente de disputas no contexto digital, proporcionando um ambiente jurídico mais acessível e menos burocrático, alinhado ao avanço tecnológico da sociedade.

Palavras-chave: Meios Alternativos de Solução de Conflitos. Resolução de Conflitos Online (ODR). Caso Ebay. Jurisdição brasileira.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO

2 MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS (MASC) E SEU DESLINDAR NA EVOLUÇÃO JURÍDICA BRASILEIRA

2.1 O conflito como início do aprimoramento das soluções: Da autotutela aos meios alternativos de solução de conflitos

2.1.1 Lei nº 13.140, de 26 de Junho de 2015: A Lei da Mediação

2.1.2 Meios alternativos de solução de conflitos (MASC): Aspectos e aplicação

3 A TRANSFORMAÇÃO DO DIREITO COMO TECNOLOGIA, A PARTIR DA APLICAÇÃO DE ONLINE DISPUTE RESOLUTION (ODR)

3.1 Breve contextualização histórica e conceituação da Online Dispute Resolution (ODR)

3.1.1 O uso da Online Dispute Resolution (ODR) no comércio eletrônico: Uma perspectiva sobre o caso eBay

3.1.2 A importância da Online Dispute Resolution (ODR) na atual conjuntura do direito brasileiro: A implementação da plataforma Modria

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS


1 INTRODUÇÃO

O Presente Artigo, Intitulado "Online Dispute Resolution (ODR) no Poder Judiciário Brasileiro: Uma Perspectiva Sobre os Meios Alternativos de Solução De Conflitos e a Justiça Digital", apresenta como objetivo precípuo evidenciar a importância do emprego de Online Dispute Resolution (ODR) no direito brasileiro, pontuando para isso as eminentes características que proporcionam sua aplicação.

No que se refere ao procedimento metodológico usado neste artigo, será utilizado o método dialético, que analisará dados específicos para chegar a noções gerais sobre o conteúdo abordado. Isso permitirá a organização do raciocínio de forma breve e compreensível, por meio da sua confirmação e verificação. Além disso, serão utilizados os métodos bibliográfico, documental e estudo de casos na elaboração da pesquisa. Será empregado também o método exploratório, no que diz respeito aos objetivos, com o intuito de desenvolver o tema em questão. No que diz respeito às técnicas, serão adotados conceitos e estudo de caso para a construção dos fundamentos que compõem a pesquisa.

No Direito, assim como em todas as áreas que compõem a sociedade, verifica-se a mister do imediatismo, de modo que, em todas as suas vertentes é sentida a veemente necessidade em experienciar a celeridade, garantindo acima de tudo a devida aplicação de direitos e deveres.

No mais, esse como sistema que atua a todo momento buscando a sutileza das relações interpessoais e máxime às soluções de conflitos entres estas, é apreciável como a evolução diária agracia, tanto profissionais que nele atuam, como aqueles que o buscam para dirimir seus reveses, com isso, buscando oferecer um cenário progressivamente maior de métodos de solução de conflitos.

Face a isso, discorre-se acerca do emprego dos Meios de Solução de Conflitos (MASC), mediação, conciliação e arbitragem, através da aplicação de Online Dispute Resolution (ODR) de modo gradativamente mais automatizado, consequência do tão estimado imediatismo e da Era tecnológica em que estamos inseridos, na qual o contato é substituído pela máquina, a qual a cada nova atualização fornece a impressão de resposta a todos os problemas, através de programas construídos por indivíduos em uma sociedade sedenta por respostas, buscando gradualmente atender as mais distintas necessidades apresentadas.

Mesmo tendo conhecimento acerca da aplicação da ODR, a exemplo do caso Ebay que ficara mundialmente conhecido- sendo abordado no decorrer desse artigo e, tornando-se gradualmente assídua no futuro do meio judiciário, ainda assim há uma constante indagação a respeito das razões pelas quais regem o interesse em seu emprego em meio aos constantes conflitos declarados, com a finalidade de expressar veemente os avanços dispostos ao Direito.

Diante disso, questiona-se: Por que a aplicação de Online Dispute Resolution (ODR) deve se fazer paulatinamente mais presente no Direito brasileiro como meio alternativo de solução de conflitos jurídicos?

Para responder a esse questionamento, levanta-se a seguinte hipótese: a aplicação da ODR como meio de solução alternativo de justiça, concede agilidade a resolução do litígio, bem como viabiliza o alcance de uma maior eficácia em relação às soluções, contribuindo assim, tanto às partes da discussão quanto ao próprio Judiciário.

Como é declarado por diversas mentes do Direito, a exemplo de Flávio Tartuce, isso introduz, portanto, uma inovação nesse âmbito, considerando que trata-se de um avanço em sua adaptação à atual realidade, com um foco expressivo na utilização dos meios tecnológicos.

Além disso, essa abordagem demonstra uma redução significativa nos custos em comparação com a resolução de questões de maneira tradicional e presencial, o que contribui para a acessibilidade de um número cada vez maior de pessoas. Podemos afirmar que isso implica na integração de novas abordagens que viabilizarão o enfrentamento dos desafios apresentados.

Outrossim, por não exigir necessariamente o exercício de juízes sobre a lide, contribui para uma imensidão de mecanismos que possibilitem soluções decisivas e assertivas, utilizando-se não somente de novas figuras para premeditar a decisão, através de mediadores e conciliadores, além das próprias partes que também ficarão responsáveis por encontrarem a melhor saída para a divergência, como insere aqui as mais variadas ferramentas digitais. Algumas destas, proporcionando o afastamento da necessidade da apresentação presencial das partes do conflito, bem como, proporcionando-lhes a resolução de suas controvérsias de qualquer lugar em que estiverem, sem que haja necessidade do contato direto, evitando qualquer tipo de óbice psicológico que essa relação pudesse vir a acarretar.

Todavia, mesmo havendo conhecimento sobre todos os pontos supracitados e outros que serão destrinchados neste artigo, ainda assim observa-se uma carência de fato no tocante a profusa aplicação desta resolução, ficando esta ainda restringida a determinados casos ou a apenas uma parte do processo, como segunda opção ou até mesmo como primeiro, porém havendo apesar disso que passar pela vista de um juíz, retornando ao sistema comumente utilizado.

À vista disso, partindo de uma discussão pré-direcionada a compreender como esta se fará, com o propósito prior de sua adoção incisiva no cenário do Direito brasileiro, é que deve-se analisar o uso da ODR no ponto de vista jurídico, comparando-a com a atual jurisdição utilizada, de maneira a ponderá-las e, dessa forma, apontando os benefícios de seu emprego para a solução de conflitos, juntamente a sua importância no Direito nacional e no Direito como segmento tecnológico.

No mais, concernente a escolha do tema, como instrumento de estudo, justifica-se pela autora ter acompanhado as aulas da disciplina "Meios Alternativos de Solução de Conflitos", ministradas pelo Prof. Me. Harrison Targino, o que a fez perceber que se trata de um tema de grande pertinência para o mundo do Direito, principalmente no atual cenário de tecnologias em que vivemos, o qual nos concede a cada dia, mais inovações e portanto, exige-nos a frequente premência de estarmos atualizados em meio aos contextos presentes e futuros.

Ademais, a autora mesmo ciente da presença de materiais que discutem essa questão, demonstrou igualmente um interesse ainda mais aguçado, isso deve-se ao fato de que estamos diante de uma questão de completa relevância a qual tornou-se essencial para o debate hodierno, ampliando seu impacto para o futuro que nos aguarda. Futuro este que não apresenta-se tão distante quanto podemos imaginar, tornando iminente o aprofundamento e pesquisa cada vez maior sobre essa temática. No mais, sua relevância inquestionável demanda uma análise e estudos mais desenvolvidos e frequentes, dadas as complexidades e desafios que ele ainda apresenta.

A notória significância científica e social que envolve esse estudo está pautada em justificar e evidenciar os benefícios do emprego da ODR, utilizando-se para isso da difusão dessa nova faceta de resolução de conflitos no âmbito do Direito, no sentido primordial de garantir maior agilidade, proporcionando um alívio à justiça atual, que encontra-se por assim dizer, "afogada" em uma imensidão de processos que aumentam ostensivamente, segundo dados estatísticos do site Justiça em Números a frente apontados.

Por fim, os resultados alcançados podem assegurar uma perspectiva mais positiva sobre a utilização da ODR no âmbito do Direito, não apenas pelas características que evidenciam de forma inegável essa assertiva aplicação, afastando as abordagens convencionais que tornaram-se ultrapassadas frente ao cenário em que nos encontramos, como pelo fato de contribuir com a superação as barreiras que, com certa frequência, restringem a evolução na forma como são desenvolvidas as resoluções de litígios.

Dessa forma, deve ser considerado, assim como em outras áreas, o Direito adequando-se e inserindo-se a esfera em que situa-se, remodelando-se ao que lhe é proposto e transmutando-se ao que lhe é revelado. Logo, o vigente projeto expressa a facilidade que as soluções em ODR trarão para essa área e todos os sujeitos que dela fazem parte, tendo como público-alvo aqueles que buscam solucionar seus problemas jurídicos de maneira ágil, menos custosa e conflituosa possível, denotando maior conforto e menos burocracia aos operadores do Direito e a toda sociedade.


2 MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS (MASC) E SEU DESLINDAR NA EVOLUÇÃO JURÍDICA BRASILEIRA

Neste primeiro tópico, será apresentado um esclarecimento sobre os Meios Alternativos de Solução de Conflitos (MASC). Embora utilizemos essa nomenclatura ao longo do artigo, é importante ressaltar que esses meios também são conhecidos por outros termos, os quais também serão mencionados. De modo a demonstrar sua passagem durante a história, até sua mais atual utilização, elucidando sua importância para o futuro do Direito brasileiro no cenário de tecnologias e premência, que nós como sociedade somos diariamente inseridos.

É sabido que, com o passar do tempo, a justiça brasileira passou por diversos períodos de transformação e revolução, os quais mudaram sua perspectiva no país e demonstraram o poder metamorfósico que lhe perpetua, possibilitando-lhe moldar-se diante dos mais variados eventos históricos, buscando acima de tudo a satisfação da coletividade.

Sabendo disso, apresentam-se os MASCs, como um digno exemplo de evolução no plano do Direito brasileiro ao longo do tempo, desde os primórdios dos conflitos até a atual jurisdição, ressaltando a definição de conflito, termo este que será utilizado constantemente no decorrer deste artigo. Sendo adiante abordadas suas características e desenvolvimento ao longo do tempo, o que permitirá justificar a ideia de progresso que frequentemente lhe é atribuída.

Dividindo-se em três subtópicos, teremos uma melhor exposição acerca de toda a representação desses meios e seu mérito para a formação diária do "novo" Direito que cada dia mais estamos conhecendo, evidenciando o pensamentos dos mais diversos estudiosos e especialistas em diferentes áreas do Direito, perpetuando e confirmando essa valia.

Além disso, serão igualmente notabilizadas as fontes do Direito, Códigos, Resoluções e Leis, além de decisões de Instituições Públicas como o conselho nacional de justiça (CNJ), acerca da utilização e melhoramento para aplicação destes meios, acentuando em especial a discussão acerca da Lei de Mediação, a qual será devidamente examinada em um subtópico específico.

Finalmente, serão apresentados os Meios Alternativos de Solução de Conflitos (MASCs), com o objetivo de fornecer uma explicação detalhada sobre cada um deles, solidificando seus diferentes aspectos, designando-os para os mais diversos e distintos litígios apresentados. Comprovando, mais uma vez e acima de tudo, sua significativa aplicação no meio jurídico brasileiro, a fim de aliviar a atual jurisdição que encontra-se sobrecarregada de processos, como será demonstrado por meio de dados atualizados.

Dessa forma, essa parte do artigo será dividida em três tópicos que abordarão as seguintes temáticas: o conflito como início do aprimoramento das soluções: da autotutela aos meios alternativos de solução de conflitos; Lei nº 13.140, de 26 de Junho de 2015: a lei da mediação; e meios alternativos de solução de conflitos (MASC): aspectos e aplicação.

2.1 O conflito como início do aprimoramento das soluções: Da autotutela aos meios alternativos de solução de conflitos

A princípio, é importante abordar o conceito de "conflito", termo originado do latim conflictus e derivado do verbo confligere. No âmbito jurídico, a expressão mais comumente utilizada é "litígio". Nesse contexto, para Plácido e Silva (1967, p. 256, apud Tartuce, 2008, p. 24), o termo é empregado para descrever uma situação em que ocorre um choque de ideias ou interesses, resultando em um confronto ou desacordo entre eventos, indivíduos ou elementos. Assim, podemos identificar um conflito sempre que houver choque de ideias e opiniões, causando obstáculos aos objetivos individuais.

É de conhecimento universal que os conflitos permeiam nossa sociedade desde seus primórdios, exprimindo-se como uma característica inerente à condição humana, exaltando a ideia cada vez mais marcante de que viver em sociedade é vivenciar e acompanhar os mais variados conflitos. O confronto pode manifestar-se desde guerras até a troca de ofensas entre os indivíduos, observando-se sempre a presença de um vitorioso sobre a parte derrotada.

No entanto, percebe-se com a presença dessas dissidências, sejam estas internas (interpessoal) e externas (interpessoal, intragrupal e intergrupal), como o homem com o passar das estações busca também soluções cada vez mais efetivas que elucidem ou pelo menos amenizem seus antagonismos, soluções estas que se adequam tanto à época quanto ao conflito levantado.

Conforme assentado por Cintra; Grinover; Dinamarco (2012, p. 29), em sociedades antigas onde a presença de um Estado forte o suficiente para conter os impulsos individualistas dos cidadãos e estabelecer um sistema legal que prevalecesse sobre as vontades individuais era inexistente, as leis estatais a serem aplicadas aos indivíduos também estavam ausentes. Nesse contexto, aqueles que tinham suas pretensões confrontadas ou impedidas por terceiros eram muitas vezes compelidos a buscar a satisfação de suas pretensões por meio da força física.

Logo, como determinam os autores, a repressão contra atos criminosos era realizada mediante a vingança privada, em outras palavras, sendo conceituada e intitulada como autotutela ou autodefesa.

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Pela autotutela (ou autodefesa), o contendor resolve o conflito por sua própria força, agindo de per si obter uma posição de vantagem em relação à situação desejada. Costuma ser mau vista por trazer em si a ideia de violência e por ser reputada um resquício de justiça privada. (Tartuce, 2008, p. 37).

Com o tempo, as pessoas passaram a buscar uma resolução pacífica e imparcial para seus conflitos, muitas vezes recorrendo a árbitros. Em muitos casos, essa intervenção era confiada aos sacerdotes, pois se acreditava que sua conexão com as divindades favoreceria decisões mais acertadas, ou aos anciãos, que detinham conhecimento dos costumes do grupo ao qual as partes envolvidas pertenciam.

Menciona-se aqui a lição de Grinover; Cintra; Dinamarco (2005):

Autotutela significa a imposição de determinada resolução ao conflito por uma das partes, à outra, independente da anuência desta à solução escolhida. As formas pertencentes a esta categoria valem-se da força física para sua realização, como no caso da vendetta (aplicação de uma sanção a um infrator por parte do ofendido ou de seus familiares). A “autocomposição”, por seu turno, diz respeito às formas de solução de conflitos obtidas a partir do consenso entre as partes. Pertencem a esse grupo a desistência, a submissão e a transação (respectivamente, a renúncia à pretensão, a conformação com a resistência oposta, e a realização de concessões mútuas). Por fim, a “heterocomposição” abrange os mecanismos de solução de conflitos de que participam terceiros, como a defesa de terceiro, a conciliação, a mediação, o processo estatal (judicial) e a arbitragem (Cintra; Grinover; Dinamarco, 2005, p. 25).

Nas sociedades primitivas, além da autotutela, observamos a presença do sistema de autocomposição - o qual veremos melhor mais adiante- que continua a ser relevante até os dias de hoje. Nesse contexto, uma ou ambas as partes em conflito renunciam, total ou parcialmente, aos seus interesses, a fim de alcançar uma resolução satisfatória, ressalta-se, no entanto, que não há consenso na doutrina quanto à extensão dessa renúncia. Alguns autores defendem que a autocomposição é viável mesmo na ausência desses elementos, incluindo a submissão e a desistência, que serão abordados posteriormente.

A autocomposição pode ocorrer por meio da desistência ou renúncia de uma parte em favor da outra, pela aceitação da pretensão da outra parte, pela abdicação da resistência inicial, ou pela negociação, na qual ambas as partes fazem concessões mútuas, sendo esta a maneira mais comum de solucionar conflitos.

Na autotutela, aquele que impõe ao adversário uma solução não cogita de apresentar ou pedir a declaração de existência ou inexistência do direito; satisfaz simplesmente pela força (ou seja, realiza sua pretensão). A autocomposição e a arbitragem, ao contrário, limitam-se a fixar a existência ou inexistência do direito: o cumprimento da decisão, naqueles tempos iniciais, continuava dependendo da imposição de solução violenta e parcial (autotutela) (Cintra; Grinover; Dinamarco, 2010, p. 34).

Sobre o microssistema conciliatório em nosso país, fazendo um pequeno regresso no tempo, podemos observar que a discussão e até mesmo incorporação desses métodos não se data necessariamente do contemporâneo, isso porque, desde a Constituição Política do Império do Brazil de 1824, em seus arts. 161. e 162, era abordado sobre a "reconciliação", como era chamada, discorrendo que não havendo a tentativa desta, nenhum processo teria início.

Outrossim, o Código de Processo Civil (CPC) de 1973, em especial em seu art. 331, propunha a aplicação da conciliação em audiência preliminar "O CPC/1973 não fazia qualquer menção à mediação e referia-se à conciliação basicamente como integrante de um dos atos do processo de conhecimento, a audiência preliminar, a ser realizada, em regra, pelo próprio juiz.” (Kabral; Kramer, 2017, p. 284).

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) em seu inc. XXXV do art. 5º, de modo indireto, ao falar que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito", amplia o conceito de acesso à justiça para abranger os meios alternativos, que se integram em um contexto mais amplo de políticas judiciais.

Tendo em vista que, por visar “contribuir para que a prestação jurisdicional seja realizada com moralidade, eficiência e efetividade, em benefício da sociedade”, contribuiu de maneira substancial para facilitar o acesso do cidadão à justiça, com ênfase em suas diretrizes que incluem a expansão do acesso à justiça, a promoção da pacificação e da responsabilidade social, que se relacionam diretamente com os métodos alternativos de resolução de conflitos, além da atualização tecnológica do sistema judiciário.

Desse modo, levando em consideração o entendimento de Cintra; Grinover; Dinamarco (2012):

Em relação à mediação e à conciliação, a exposição de motivos da Res. N. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça deixa claro que o inc. XXXV do art. 5º da Constituição, que literalmente trata apenas do acesso ao Poder Judiciário, deve ser interpretado como garantia de acesso à justiça por qualquer meio adequado de solução de conflitos, como a mediação e a conciliação. (Cintra; Grinover; Dinamarco, 2012, p. 44).

A conciliação é amplamente reconhecida como um meio eficaz de solucionar conflitos e encontra respaldo em diversos instrumentos legais. O Código de Ética da OAB, no contexto da advocacia, estabelece princípios que promovem a busca de acordos como um caminho preferencial na resolução de disputas. Nos Juizados Especiais, regidos pela Lei nº 9.099/1995, e nos Juizados Especiais da Justiça Federal, conforme a Lei nº 10.259/2001, a conciliação é valorizada como um método eficaz para a resolução ágil e amigável de litígios. Em contrapartida, a arbitragem, outra via para solucionar controvérsias, tem suas raízes no sistema jurídico das Ordenações Filipinas, que vigorou durante o período colonial no Brasil, refletindo a influência jurídica de Portugal.

Além disso, encontramos referências à arbitragem em documentos históricos, como a já citada Constituição do Império de 1824, o Código Comercial de 1850, o Código Civil de 1916, bem como no CPC de 1939 e seu sucessor de 1973. Esses marcos legais e históricos evidenciam a evolução dos métodos de resolução de conflitos no Brasil, destacando a importância da conciliação e da arbitragem ao longo da história jurídica do país.

No entanto, fora apenas no ano de 2010 por meio da Resolução nº 125, de 29 de Novembro de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual discorre sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências, alterada pelas Emendas nº 2, de 8 de Março de 2016 e nº 1, de 31 de janeiro de 2013, que começaram gradativamente a serem externados.

Isso porque, essa resolução trouxe em seu texto, em razão do crescente número de conflitos na sociedade, o devido tratamento que devia ser dado a esses métodos, incluindo-os como alternativas viáveis e relevantes como recurso contra esse gradativo número. No mais, trazia ainda a ideia de criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC)2 e dos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC)3 para a devida realização das audiências de conciliação e mediação, consolidando ainda mais esses mecanismos.

Nessa Resolução foram também abordadas as regras para a aplicação desses métodos, intencionando sua devida aplicação, através da informação, autonomia da vontade, ausência de obrigação de resultado, desvinculação da profissão de origem e compreensão. Enfim, discutia-se ainda acerca dos mediadores e conciliadores, suas capacitações e devidas funções.

Hodiernamente, mesmo após certa dificuldade por parte desses métodos em serem devidamente apresentados e efetivamente utilizados em meio ao direito brasileiro, tendo em vista ainda haver uma certa hesitação e amarra ao antigo meio jurídico, sendo principiada de maneira mais congruente apenas posteriormente, no atual Novo Código de Processo Civil (NCPC), destacando as várias facetas dos métodos de resolução de conflitos, detalhando-os em diversos artigos para enfatizar sua importância nas relações jurídicas. Além disso, introduz a autocomposição como um conceito que será explorado posteriormente; e da Lei de Mediação, ambos objetivando a continuidade e eficácia da Resolução do CNJ.

O NCPC, trouxe uma abordagem inovadora aos MASCs no sistema jurídico brasileiro. Reconhecendo a importância desses, considerando-os valiosas ferramentas para a resolução de litígios, oferecendo alternativas mais ágeis, econômicas e eficazes para as partes envolvidas nas mais variadas disputas judiciais.

Uma das mudanças mais notáveis é a ênfase dada à autocomposição e heterocomposição, incentivando fortemente as partes a buscar a resolução de suas divergências de maneira amigável, inclusive por meio de terceiros neutros, como mediadores e conciliadores. Além disso, o Código estabelece prazos específicos para a realização de audiências de conciliação e mediação, tornando esses métodos uma etapa obrigatória em processos judiciais.

Essa abordagem inovadora do NCPC visa fomentar uma cultura de solução pacífica de conflitos, aliviando a sobrecarga do Judiciário e oferecendo às partes a oportunidade de encontrar soluções mais satisfatórias. Assim, ele integra os MASCs de forma mais substancial no sistema judicial brasileiro, para tornar a justiça mais acessível, eficiente e alinhada com as necessidades das partes envolvidas em litígios no Brasil.

Outrossim, foi através da Lei nº 13.140, de 26 de Junho de 2015 conhecida como Lei de Mediação, que o propósito principal de regulamentar a prática da mediação entre indivíduos e no âmbito da administração pública foi concretizado. Distinta do Novo Código de Processo Civil e da Resolução nº 125/2010, a Lei de Mediação se concentra, principalmente, na regulamentação da Mediação Extrajudicial.

2.1.1 Lei nº 13.140, de 26 de Junho de 2015: A Lei da Mediação

Conhecida como Lei da Mediação, sancionada em 26 de junho de 2015, tendo sua vigência após 180 dias de sua publicação. Objetivando a devida regulamentação da mediação como resolução de litígios particulares e administrativos. No mais, diferencia-se da regulação no Novo Código de Processo Civil e na Resolução nº 125/2010, em especial por seu enfoque maior na normalização da Mediação Extrajudicial, ou seja, a resolução de conflitos de modo externo aos tribunais.

Braga Neto (2015, p. 146) destaca a relevância da Mediação Extrajudicial, especialmente no contexto de relações empresariais, pois ela contribui para a reestruturação de questões controversas e fortalece os laços entre os empreendedores.

Sejam decorrentes de crédito/débito, transações comerciais, financeiras ou imobiliárias, empreitadas, relações de franquia [...], operações com seguro, questões societárias, fornecedor/cliente, prestador de serviço/usuário, quer contratuais, quer informais sem a existência de um contrato que o regule, o mediador o faz oferecendo elementos de reflexão baseados em fatos daquela relação no passado e no presente, cm vistas a construir um futuro seja com a continuidade daquela relação, seja com o fim (2015, p. 146).

No contexto de suas disposições gerais, a lei estabelece princípios que orientam o procedimento de mediação, os quais guardam semelhança com os princípios descritos nos outros dois instrumentos legislativos, Novo Código de Processo Civil e da Resolução no 125/2010. Esses princípios abrangem a imparcialidade do mediador, a igualdade das partes, a comunicação oral, a informalidade, a autonomia das partes em suas decisões, a busca pela concordância, a confidencialidade e a conduta baseada na boa-fé.

Demonstrando, portanto, uma revolução trazida por essa Lei, a Mediação Extrajudicial proporciona a aplicação do deslindar de problemas levantados, aplicando-se fora dos tribunais. Nesse caso, a mediação pode ser formal, quando conduzida por uma entidade privada especializada em mediação, ou informal, quando é conduzida por um mediador sem qualquer vínculo institucional e escolhido pelas partes, como, por exemplo, um advogado particular com treinamento em mediação. Neste último caso, conforme o artigo 172 do Código de Processo Civil, o advogado fica impedido de atuar, assessorar, representar ou patrocinar qualquer uma das partes. Importante notar que a mediação extrajudicial pode ser aplicada independentemente da existência ou não de um processo judicial.

Crespo (2012) destaca a importância do aprimoramento da legislação que sustenta os Meios Alternativos de Solução de Conflitos (MASC), visando à proteção dos sujeitos em situação de maior vulnerabilidade e à garantia de um nível mínimo de equidade.

Isso pode ser obtido proporcionando-se às partes uma Batna (melhor alternativa para um acordo negociado, que seria o sistema judiciário) durante as negociações, o que permitiria que as partes deixassem a mesa de negociações, caso a proposta de acordo não fosse melhor que sua Batna” (Crespo, 2012, p. 71).

Desse modo, percebe-se que a normatização da mediação, favorece não somente a aplicação desta em si, como também de todos os MASCs reconhecidos, melhorando sua percepção e aceitação perante a sociedade jurídica, demonstrando a importância desses como solução mais prática para os litígios levantados pelo corpo social no geral.

À vista disso, serão abordados nessa lei todos os requisitos necessários para a devida execução da mediação e dos outros meios de autocomposição de conflitos, determinando como por exemplo as exigências para o ofício de mediador, agente de muita relevância para o devido cumprimento da mediação no processo litigioso.

A primeira seção da Lei regula a atuação de mediadores, dividindo-os em judiciais e extrajudiciais. A legislação estabelece que qualquer pessoa capaz, desde que confiável e capacitada, pode ser mediador extrajudicial, independentemente de filiação a órgãos profissionais. Para mediadores judiciais, são necessários requisitos mais rigorosos, como diploma de curso superior reconhecido há pelo menos dois anos e treinamento em instituições reconhecidas pela A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM) ou tribunais, conforme critérios do CNJ e Ministério da Justiça.

No mais, o mediador judicial é selecionado por sorteio, enquanto o mediador extrajudicial é escolhido pelas partes. Ambos os mediadores estão sujeitos às mesmas regras de impedimento e suspensão que se aplicam aos juízes, e devem revelar qualquer fato que possa questionar sua imparcialidade na mediação, conforme estipulado no artigo 5º.

Além disso, a Lei de Mediação coloca em destaque a autonomia das partes e a construção de um procedimento baseado em acordo mútuo. Isso se reflete na obrigatoriedade da aceitação do mediador judicial sorteado (conforme definido no artigo 25), na escolha conjunta do mediador extrajudicial e na necessidade de aprovação das partes para agendar sessões subsequentes à primeira, segundo estabelecido no artigo 18.

A lei também dedica uma seção específica à questão da confidencialidade, com exigências rígidas para que o mediador, partes, prepostos, advogados, assessores técnicos e outras partes envolvidas no procedimento respeitem integralmente a confidencialidade. No entanto, é importante observar que a confidencialidade não abrange informações relacionadas a crimes de ação pública, conforme estipulado no artigo 30, parágrafo 3º.

O segundo capítulo desta estabelece as diretrizes para a autocomposição de conflitos envolvendo entidades de direito público. Isso permite que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estabeleçam câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos dentro de seus órgãos de Advocacia Pública, com o propósito de solucionar disputas entre órgãos e entidades da administração pública.

No mais, ela prevê a criação de um banco de dados que reúne boas práticas em mediação, sob a responsabilidade da Escola Nacional de Mediação e Conciliação. Além disso, a regulamentação se aplica a outras formas de resolução de conflitos, abrangendo práticas de mediação comunitária e escolar.

Além disso, essa Lei também carrega à abordagem acerca do uso de tecnologias, em seu art. 46. fora trazida a possibilidade de aplicação destas, ao afirmar que:

Art. 46. A mediação poderá ser feita pela internet ou por outro meio de comunicação que permita a transação à distância, desde que as partes estejam de acordo.

O Brasil já avançou significativamente nesse aspecto, com inúmeras iniciativas voltadas para a promoção de métodos de Online Dispute Resolution (ODR). Essas iniciativas têm origem em diversas fontes, incluindo o Poder Judiciário, profissionais do direito, universidades e a sociedade civil. Acompanhando a tendência não apenas da proliferação dos ODRs, mas também da digitalização do Judiciário e, de maneira mais ampla, da vida cotidiana, várias iniciativas desses têm se tornado evidentes.

Enfim, vale evidenciar que, mesmo antes da sua formal institucionalização no Novo Código de Processo Civil Brasileiro, em seu artigo 3º, §§ 2º e 3º, alguns tribunais e órgãos essenciais do Poder Judiciário já haviam introduzido projetos que abraçavam esse conceito, demonstrando que a implementação de soluções online para resolução de controvérsias simboliza a consolidação de uma cultura de diálogo que se expande para todos os aspectos da vida cotidiana do indivíduo em sociedade.

2.1.2 Meios alternativos de solução de conflitos (MASC): Aspectos e aplicação

Em seu discurso de posse como Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o Ministro Ricardo Lewandowski afirmou a eficiência e a premência de se incentivar o uso desses meios alternativos para a solução de controvérsias: “Procuraremos, igualmente, estimular formas alternativas de solução de conflitos, compartilhando, na medida do possível, com a própria sociedade, a responsabilidade pela recomposição da ordem jurídica rompida, que, afinal, é de todos os seus integrantes. Referimo-nos à intensificação do uso da conciliação, da mediação e da arbitragem, procedimentos que se mostram particularmente apropriados para a resolução de litígios que envolvam direitos disponíveis, empregáveis, com vantagem, no âmbito extrajudicial.”

É notório gradativamente uma evolução no Direito a qual trouxera ainda, novas figuras responsáveis pela busca das mais diversas soluções para os mais variados conflitos, tendo em vista que anteriormente apenas o juiz carregava essa áurea de competência suficiente para lidar com essa responsabilidade, agora conciliadores, árbitros e juízes leigos vieram para mostrar a capacidade de ocupar-se igualmente dessa incumbência.

Ulteriormente, analisando agora acerca dos meio da autocomposição, também conhecida como composição amigável, prevista no Código de Processo Civil (Lei nº 13.105 de 16 de Março de 2015), entende-se que essa refere-se a uma técnica de resolução de conflito em que as partes chegam a um acordo de vontades de maneira independente, ocorrendo nas imediações de qualquer atividade estatal, atuando como substitutivo jurisdicional, ou seja, tendo como escopo a prevenção da instauração de um litígio heterocomposto (arbitragem e jurisdição), apesar de que, nada impede que se chegue a ele a posteriori.

Dividida em autocomposição unilateral ou bilateral, no primeiro caso uma das partes expressa sua vontade, e desse modo, a parte contrária renuncia, desiste ou reconhece juridicamente essa. A renúncia ocorre quando o indivíduo desiste completamente de sua reivindicação, sem impor quaisquer condições, e não requer a concordância da outra parte. Podendo ocorrer essa prática tanto fora da esfera de um processo judicial como no decurso deste. De acordo com a lei, essa renúncia é o momento em que o autor abdica do direito subjacente à ação (Calmon, 2015, p. 58).

No que tange a desistência, esta advém quando o autor expressa sua intenção de não continuar com o processo, apresentando uma petição no tribunal para encerrá-lo. Nesse caso, o processo é encerrado sem uma análise do mérito da questão, permitindo que o autor possa entrar com a mesma demanda novamente (Tartuce, 2016, p. 38).

Finalmente, no reconhecimento jurídico, como a própria nomenclatura expressa, o réu reconhece a validade da solicitação do autor, a situação controversa passa por uma reconfiguração, sendo estabelecidas novas premissas. Nesse contexto, é fundamental que haja intervenção do judiciário para validar o desfecho final (Tartuce, 2016, p. 40).

No caso da autocomposição bilateral, ambas as partes manifestam suas vontades, chegando intrinsecamente a soluções ou por meio da delegação de um terceiro imparcial para simplificar a chegada a um acordo ou até mesmo a comunicação entre as partes, utilizando-se de Meios Alternativos de Solução de Conflitos (MASC), apresentando outras nomenclaturas como chamados Métodos Consensuais de Solução de Conflitos ou Meios Adequados de Solução de Conflito, porém no presente trabalho, será utilizada a nomenclatura MASC, abrangendo a Negociação, Mediação e Conciliação.

Objetivando a busca pela solução ideal que agrade as partes, de modo que, no caso ímpar da mediação, essa satisfação, será adquirida por elas por meio, como já dito anteriormente, da renúncia de direito de um ou de todos em face do outro. Entre as diferenças básicas dos métodos consensuais estão:

QUADRO DE DIFERENÇAS ENTRE OS MÉTODOS DE AUTOCOMPOSIÇÃO

Negociação

Conciliação

Mediação

Autocomposição Bilateral Direta (busca da solução pelos envolvidos).

Autocomposição assistida – presença de um terceiro – o conciliador.

Autocomposição assistida – presença de um terceiro – o mediador.

Relação entre as partes para a produção do acordo.

Busca-se o acordo.

Acordo não é meta, mas um dos resultados possíveis.

Abordagem distributiva visa o ganha-ganha. Abordagem Integrativa – visa ganhos mútuos.

Limitada ao objeto do processo, os conciliadores são mais ativos e diretivos – propõem soluções.

Trabalha-se com profundidade os conflitos e os interesses das partes (até os emocionais).

Fonte: Elaborado pela autora a partir da compilação entre (Gabbay, 2013 e Sampaio e Braga Neto, 2007).

Em face do que fora brevemente abordado sobre as formas de autocomposição, deixo aqui minha filiação à compreensão da autocomposição bilateral, essa por sua vez carregada de um grande sentimento de democracia, tendo em vista, a possibilidade de satisfação por ambas as partes envolvidas no conflito, onde, mesmo que não haja o total consentimento do requerido, é sabido que haverá para ambas o recebimento de parte de seu interesse, através acima de tudo, da tentativa de acordo, não sendo necessário abrir mão, de modo total do que lhe é desejado.

Pormenorizando os métodos da autocomposição bilateral, iniciando a compreensão sobre o método da mediação, esta possui como terceiro sujeito responsável o mediador, que intervém no litígio almejando resolvê-lo de maneira rápida e cortês, não podendo ter relação com a causa e muito menos com o interesse final que trará sua atuação, impondo-se tão somente com a finalidade de sincronizar os interesses demonstrados pelas partes, notando-se que nesse meio estas operam em primeiro plano no que diz respeito a busca pela solução. É prudente afirmar então, que o mediador será apenas uma figura de aproximação, por conversa e discussão, ouvindo e sugerindo soluções às partes para que essas utilizem desta atuação como modo de apurar seus pleitos. Segundo o entendimento de Gabbay:

Mediação é o meio consensual de abordagem de controvérsias em que uma pessoa isenta e devidamente capacitada atua tecnicamente para facilitar a comunicação de modo que os envolvidos possam encontrar formas produtivas de lidar com as disputas (2013, p. 45).

Adequada para conflitos em que haja vínculos de caráter mais permanente ou ao menos mais prolongados, isto é, aqueles em que há a presença de vínculos anteriores entre as partes ou há o interesse de continuarem essa relação.

Diferenciando-se do método da mediação, que mesmo objetivando igual finalidade possui em face da figura do terceiro a referida distinção, na conciliação, nos moldes do art. 165, §2º do CPC, é buscado diretamente um resultado sem que haja precisão da influência das partes, utilizando-se do convencimento em razão das soluções apresentadas. Podendo ocorrer extrajudicialmente e no decorrer do processo, em todas as suas fases.

Nesse método, o conciliador atua em regra em casos em que não houve conflito anterior entre as partes, ou seja, não há relação anterior entre os sujeitos, sendo assim, uma técnica voltada para pleitos mais objetivos, garantindo que o conflito se resolverá naquele mesmo momento, sem indispensabilidade de continuarem a relação. No entanto, há casos em que existe relação entre os participantes, porém mesmo assim, se a finalidade desses é de encontrar uma solução pontual, elegem também esse método. Na definição de Sampaio e Braga Neto:

Trata-se de mecanismo muito eficaz para conflitos em que inexiste entre as partes um relacionamento significativo no passado ou contínuo a futuro, portanto preferem buscar um acordo de forma imediata para pôr fim a controvérsia ou a processo judicial (2007, p. 18).

É essencial que as partes possuam a capacidade de chegar a um acordo, que tenham plena autonomia para decidir se desejam ou não fazê-lo e que estejam envolvidas no processo de elaboração do acordo, com plena consciência de que devem abordar seus próprios interesses. Dessa maneira, os envolvidos tornam-se responsáveis pela criação e execução do acordo.

Importante destacar que a conciliação demanda a aplicação de técnicas e princípios éticos que devem ser rigorosamente observados. O conciliador nunca deve impor um acordo às partes, podendo oferecer sugestões, desde que feitas com sensibilidade e dentro dos parâmetros éticos. Sua atuação é pautada por princípios éticos, sendo a imparcialidade um dos mais relevantes, de modo que suas sugestões devem ser colaborativas, considerando a situação específica e equilibrando os interesses de ambas as partes.

Por conseguinte, a heterocomposição como solução de conflitos, verifica-se quando as partes não logram por si resolver a lide, sendo portanto necessária a presença de um órgão ou agente, através da figura de um juiz ou árbitro, externos a essa relação, agirem com o fito de alcançarem uma decisão positiva a essa, utilizando-se de uma atuação coercitiva e imperativa.

Outrossim, da mesma maneira que a autocomposição comporta meios de solução, a heterocomposição compreende a arbitragem e a jurisdição como suas subdivisões, por envolver sujeitos que mesmo não tendo vínculo algum com o conflito, tem participação fundamental para deliberar soluções para o mesmo, sabendo que sua decisão é de extrema preponderância em cima da dissidência.

À vista disso, a arbitragem, regida pela Lei nº. 9.307, de 23 de Setembro de 1996 e pelo Código Civil, em seus Arts. 841. e 851 a 853, possui a atuação de um terceiro ou um órgão estranho à relação e neutral, previamente escolhidos ou consentidos pelas partes ou por nomeação do juiz, para que solucionem o conflito de maneira definitiva.

Além disso, ela é um meio que possibilita uma maior agilidade para a solução dos conflitos, afora que o árbitro poderá ser um profissional diretamente direcionado ao litígio sobreposto, o que favorece uma análise mais profunda do caso e assim uma facilidade em encontrar veredito que alcance equidade para as partes.

Ressaltando que esta para suceder deve ser baseada no acordo de vontades entre pessoas, maiores e capazes, que ao invés de se submeterem a decisão em âmbito judicial, preferem que um ou mais árbitros, que serão escolhidos através de convenção das partes, por meio de cláusula expressa e devidamente especificada, resolvam o litígio.

Por último, e como método mais utilizado no mundo do Direito apresenta-se a jurisdição, trazendo a figura do juiz como protagonista para a resolução de antagonismos exprimidos, atribuindo ao Estado a possibilidade de incorrer em determinado conflito consumando a solução jurídica necessária. Comumente, a via jurisdicional soluciona os conflitos mediante sentença, quando um juiz decide a lide entre as partes num processo, aplicando o direito ao caso concreto colocado em exame.

Talvez por ser o método mais “reconhecido” e também mais afamado, a jurisdição é portanto o caminho mais procurado por parte dos indivíduos para resolverem suas divergências, segundo dados do site Justiça em Números, em 2022, o Poder Judiciário atingiu um recorde, registrando um total de 31,5 milhões de casos novos, demonstrando assim uma excessiva carga de processos para sua responsabilidade, o que ainda resulta em uma dilação em face do deslinde desses e assim, infelizmente, vemos processos “parados no tempo” trazendo para a justiça o inditoso padrão de morosidade.

Em suma, os Meios Adequados de Solução de Conflito são acima de tudo relevantes pois favorecem agilidade a solução do litígio, contribuindo para questões que certamente durariam um prazo bem maior se direcionadas apenas à Judicialização, corroborando assim, tanto às partes do litígio quanto o próprio Judiciário. Além disso, o custeio para utilização desses meios é menor- salvo quando tratamos acerca da arbitragem- do que se comparado à justiça propriamente dita, o que angariaria ainda mais seu emprego.

Através da apreciação desses métodos, ainda é evidente a imensidão de mecanismos capazes de paulatinamente proporcionarem soluções decisivas e assertivas em meio aos gradativos conflitos apresentados, exprimindo constantemente os avanços dispostos ao Direito. Contribuindo para a expansão diária do horizonte de soluções com a presença de diferentes métodos que beneficiam diferentes demandas, aperfeiçoando o sistema e progressivamente a obtenção de soluções eficientes.

Desse modo, compreende-se que a mediação não se confunde com a conciliação e tampouco com a arbitragem, pois é forjada a partir da voluntariedade, confidencialidade, participação ativa das partes e ausência de poder decisivo de um terceiro, e visa, prioritariamente, o restabelecimento das relações.

Acrescenta-se a esse conjunto de fatores o acolhimento como pedra de toque do atendimento e a disposição do agente mediador ou conciliador em ouvir e ter sensibilidade no trato com as pessoas, pois, busca-se, em uma última análise, a promoção da cidadania, o que exige que os interlocutores sejam tratados de forma legítima.

De acordo com o advogado e desembargador aposentado Kazuo Watanabe (Watanabe, 2014, p.1).

[...] hoje essa mentalidade, que eu chamo de mentalidade da cultura da sentença, começa a ceder lugar para a cultura da paz. A Resolução 125, do CNJ, fala da criação de disciplinas voltadas para a conciliação e a mediação nas faculdades. Na USP criamos uma disciplina que já está sendo ministrada desde o semestre passado; outras faculdades também já estão criando novas disciplinas. Com isso acredito que a mentalidade dos futuros profissionais do Direito tende a mudar. (Watanabe, 2014, p.1)

A transição da mentalidade da cultura da sentença para a cultura da paz é um sinal de mudança significativa no campo do Direito. Isso é evidenciado pela Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que promove, dentre outras iniciativas, a inclusão de disciplinas sobre conciliação e mediação nas grades curriculares das faculdades de Direito. Essa iniciativa, como exemplificada pela Universidade de São Paulo (USP) e outras instituições de ensino, está contribuindo para a formação de futuros profissionais do Direito com uma perspectiva mais orientada para a resolução pacífica de conflitos, enfatizando a importância da conciliação e da mediação como alternativas viáveis à litigação tradicional.

Essa mudança na formação dos estudantes de Direito tem o potencial de impactar positivamente o sistema judiciário, tornando-o menos sobrecarregado e promovendo uma cultura de resolução pacífica de conflitos, o que pode beneficiar tanto as partes envolvidas em disputas legais quanto a própria sociedade como um todo.

Sobre o autor
Maria Fernanda Almeida Tiburtino

Graduada em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB); Especialista em Direito Previdenciário e Direito Digital pela LEGALE; Advogada OAB/PB 33143.︎

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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