RESUMO
Alguns dilemas da modernidade se tornaram um gigantesco buraco negro de significados no mundo contemporâneo, particularmente a tangência e interação dos cidadãos com Estado, que, inclusive, não estão alheios a novos paradigmas de otimização da gestão pública. Nessa quadra, recoberta por um manto de névoas, enjambra-se a seletividade penal e o populismo penal ao inculcar no inconsciente coletivo falsa realidade, notadamente quando o paradigma do proibicionismo mira extirpar da sociedade, cidadãos etiquetados como sendo inimigos do Estado. Na busca de embasamento ético e pragmático para nossas inquietações profissionais, nada obstante, no presente erigimos aspectos refutando a demonização de algumas condutas, que, de forma velada, busca se fazer crer que tais tipos, são os únicos causadores de todos os problemas sociais, e, disso decorre à aplicação de um direito penal do inimigo. Longe de qualquer patrulhamento ideológico, de início saliento que os apontamentos que aqui faço são observações das quais verifico mais eficazes e constitucionalmente adequadas, ante fatos e suas consequências, tal qual renovando o mister deslinde da eleição e rotulação de detidas condutas com status de crime, que em nosso ponto de vista não deveria ser tratado como ilícito penal.
Palavras-chave: Populismo penal; Iniquidades; Direito a Saúde; cannabis medicinal
Introdução.
Há alguns anos atuando na procuradoria tenho trocado lentes concernentes alguns conceitos, com vista da separação dos poderes, o poder legislativo compostos de representantes eleitos pela sociedade civil por meio do sufrágio universal, tem a função principal de materializar a convenção da maioria sobre o que entendem corretos, e desse padrão geral, tipificam-se as condutas que são consideradas proibidas, ou seja, exteriorizam-se taxativamente em rol escrito as condutas que a sociedade não tolera.
Adrede, se praticada a conduta reprovável por um de seus membros, aquela atitude do “cidadão” que à pratica é entendida como um ato de desrespeito à coletividade, e, de ora em diante nasce para o Estado-poder o dever de aplicar de modo incondicional o papel de protetor da sociedade, por meio do ius puniend”. Portanto, o Estado deve usurpar o poder individual para fim de tutelar o interesse público da coletividade.
Nesse rumo, quando praticada conduta que se amolda ao preceito primário da norma penal incriminadora, de ora em diante, toca ao Estado exercer o poder de punir, retribuindo castigo àquele que violou a regra geral, pois o indivíduo descumpriu o que a sociedade valoriza e não tolera! Ensejo, a este cidadão infrator deve-lhe ser retribuída uma pena, daí a expressão direito penal.
Da Coercetividade penal.
Há tempos, desde Hamurabi em 1.700 AC, escrito em uma pedra basáltica, um dos documentos jurídicos mais antigos, passando pela lei das XII tábuas, pelo TALIÃO e doutras normas até os dias atuais, o direito penal é marcado pela coercitividade (pontualmente intimidatória) destinada a dirimir violações individuais fruto das interações da coletividade.
Nessa toada, a prática de um delito possui uma representação ou mensagem (carga de cognição). O tipo penal (ex: Matar alguém, ou subtrair para si coisa alheia móvel mediante grave ameaça) é a expressão taxativa de conduta abstrata da qual determinado grupo não tolera que seja praticada.
Assim, o preceito primário do tipo penal é a expressão notória e publica da conduta a qual determinada sociedade espera que não seja praticada, e quiçá, se praticada, doravante é dado automaticamente o aval (autorização) ao Estado, para que este aplique o preceito secundário do tipo penal (“erga omines”), ou seja para todos. O tipo é a mensagem da coletividade de que será punido todo o indivíduo que eventualmente pratique o ato reprovável por determinada sociedade.
A expressão “em tese reprovável é feita adrede”, posto que a tipicidade de algumas condutas, muitas vezes torna-se inócua, aliás, a tese central de presente artigo, refuta a discrepância de se manter tipificado algo que nunca foi um problema historicamente, mas que por outros aspectos maquiavélicos são mantidos com rótulo de crime, e pior, são tratados como sendo o monstro responsável por todos os problemas sociais e criminalidade decorrente.
Inobstante a isso, destaco que, para algumas tipificações mesmo que aplicada à pena, a violação do bem jurídico em tese protegido, permanecerá intacto, de modo que a punição preceituada não possui condão prático de reparar o mal injusto (justiça real). Todavia, de fato carrega tão somente o ranço cultural de vingança e com alto grau de subjetividade, fim de agasalhar a seletividade penal e função retributiva da pena.
O Direito penal e o estado de direito.
Alguns tipos penais e sanções são notadamente inócuas (exemplo: nos crimes de mera conduta que encarcera um cidadão portador de enfermidades e que, agasalhado de orientação médica é flagrado em posse de cannabis para fim de produção medicamento) pois, inexiste o condão de reparar o resultado da infração. “In casu”, é totalmente incongruente ao princípio da ofensividade ou lesividade (crimen sine injúria), a qual o fato para ser considerado crime, mister se faz a lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico tutelado.
Nessa toada, a finalidade do direito penal visa proteger bens jurídicos fundamentais, temos o exemplo do crime de furto, cujo resultado se materializa pela subtração da res furtiva. Assim neste caso, há um bem jurídico a tutelar, evidentemente o "patrimônio" ou seja, a coisa furtada. Doutro exemplo, no crime de homicídio quando consumado há violação a uma "vida humana", ou seja, o bem jurídico protegido é a VIDA e assim por diante.
Conceito de tipo
Nosso texto constitucional estabelece e deixa a cargo da lei ordinária e/ou especiais a competência exclusiva para definição dos crimes, razão pela qual abordo a teoria do tipo. O tipo penal nada mais é que a descrição abstrata da conduta humana literalmente pormenorizada, ou seja, é a descrição taxativa de um comportamento, que, é reconhecida pela sociedade como fato criminoso, também chamado de tipo penal incriminador
Outrossim, pode se afirmar que tipo é o modelo de conduta positivada pela casa legislativa, a qual é feita a narrativa minuciosa da conduta tida como criminosa, esclarecendo para coletividade os seus elementos, ou seja, o tipo é a materialização contextualizada e vontade geral, que rotula o padrão de comportamento individual na sociedade, e, por conseguinte, o Estado soberano deve zelar incondicionalmente pela sua observância.
Da adequação típica e suas formas
O tipo penal descreve conduta considerada proibida, ou seja, é a narrativa fática do não agir, e, uma vez praticada, de ora em diante é dada autorização ao Estado para promover aplicação do ius puniend e ius persequent vez que se materializou a adequação típica, logo, havendo o comportamento humano positivo ou negativo nos termos do que está preceituado na lei, diz-se que ocorreu o fato típico.
A doutrina faz distinção e considera a tipicidade mera correspondência formal entre a conduta humana e o que se encontra descrito no tipo, por outro lado, no que se refere à adequação típica exige-se uma abordagem mais pontual, invés de uma simples análise subjetiva, posto que na adequação a autoridade competente deve investigar se houve vontade do agente (dolo específico) de produzir o resultado, fim de só então efetuar o enquadramento.
Tipicidade material
A conduta do Homem em sociedade é determinada em dois pêndulos, de um lado sua natureza material (corpo físico) e de outra sua natureza psicológica ou subjetiva, assim, em relação à tipicidade material, para a configuração do delito se faz necessário não apenas adequação da conduta ao preceito primária da norma, mas também que ação tenha conteúdo de reprovabilidade coletiva.
Nessa toada, a tipicidade material ocorre quando a conduta consumada tenha além da tipicidade formal, um conteúdo cujo comportamento configure uma ideia de crime. Aqui a conduta para se considerada crime, não basta apenas à tipicidade formal, é necessário que o comportamento tenha conteúdo crime dentro do Estado democrático de Direito.
No pensamento contemporâneo, necessário um resultado naturalístico, ou seja, a conduta para ser considerado crime, precisa alterar o mundo exterior, e, que, tal conduta traga efetivamente prejuízo a um bem tutelado pela norma penal.
Ensejo, para essa corrente para que a conduta seja considerada crime, além da tipicidade formal (nexo causal + elemento subjetivo do tipo + resultado) deve necessariamente ter um conteúdo de crime, aliás, existe precedente no sentido de reconhecer a inexistência de crime, se ausente à tipicidade material.
O elemento subjetivo.
O delito não se resume apenas da soma de ação ou omissão e o resultado danoso, pois só poderemos afirmar que se configurou um crime, se no momento da ação ou omissão o agente detinha a potencial consciência de ilicitude, ou seja, deve haver o desejo de provocar o resultado previsto no tipo penal, para subsunção do caso concreto.
Concernente à estrutura do tipo penal, há quatro espécies ou classe de elementos subjetivos: os crimes dolosos e culposos, ativos e omissivos, que oportunizam para dar origem aos tipos dolosos ativos, tipos dolosos omissivos, tipos culposos ativos e tipos culposos omissivos.
Os tipos dolosos são maioria, se afigura proibições de condutas penalmente relevante, e, podem ser apresentados sob dois aspectos: elementos objetivos e subjetivos, conforme ensina Zaffaroni:
“ (...) significa que a lei, mediante o tipo, individualiza condutas atendendo a circunstância que ocorrem no mundo exterior e as circunstâncias que se encontra no interior, pertencentes ao psiquismo do autor” 2 ”.
Consoante aos escritos do notável penalista argentino, o tipo não deve ser entendido apenas da análise do preceito primário da norma ou limitada ao comportamento exterior do agente, mas também sobre a ótica dos aspectos cognitivos que não pode ser ignorado.
Nessa esteira, para a materialização do tipo penal, além do aspecto externo, também deve estar presente o aspecto interno, ou seja, o elemento subjetivo, que é oportunizado do querer de agente em provocar o resultado:
“ (...) “O aspecto externo do tipo doloso, isto é, a manifestação da vontade no mundo físico exigido pelo tipo, chamamos aspecto objetivo. Ao aspecto interno, ou seja, à vontade em si, chamamos aspecto subjetivo do tipo legal, ou, de forma mais sucinta, tipo subjetivo”3”.
Resultado naturalístico.
Na estrutura do crime o tipo penal descreve a conduta que pode provocar lesão a um bem tutelado pela ordem jurídica, e, para consumação o autor ao praticar a elementar (verbo) do tipo, deve provocar alteração no mundo exterior por meio de um agir. Nesse aspecto situa-se a especialidade da norma pena, vez que trata de manifestações tidas como graves no mundo físico, conforme o magistério de Zaffaroni, verbis:
“ (...) “Antes da conduta, as coisas estavam num estado diferente daquele que se encontravam depois dela. Antes de acender um cigarro, o fósforo não estava queimado; antes de falar, as ondas não haviam transmitido meus sons e não haviam provocado uma reação no tecido nervoso do ouvinte; antes de sentar-se não se havia deslocado uma massa de ar que agora ocupa outro lugar 4”.
Ora, pois, se o fim da norma penal é tratar de ações humanas que resulte em lesão a um bem jurídico que a sociedade valoriza, observe-se conduta do cidadão que que planta, semeia e cultiva erva fim de extrair medicamento fitoterápico, de rigor, inexiste crime ante atipicidade material.
Tipicidade material.
Alguns tipos penais de mera conduta inexiste o resultado material, e, conforme ensina Zaffaroni a elaboração do preceito primário do tipo penal incriminador deve conter taxativamente conduta que causa uma mudança no mundo externo; ou seja, um resultado material.
Assim, todavia, para se cogitar a ideia de crime é necessário destacar a tipicidade material na estrutura do crime. Ou seja, consoante princípios constitucionais, o crime só pode ser considerado como tal, quando provoca lesividade concreta para a sociedade.
Consequências da atipicidade material.
Nossa carta política, em seu art. 1º, exara que República Federativa optou por um estado democrático de direito com inúmeros princípios. A teoria constitucional do direito penal assevera, que, para a configuração do tipo penal não basta somente o aspecto formal, e, para conduta ser considerada típica, o tipo deve ter conteúdo de crime.
Nesse contexto, vivenciamos um quadro nada agradável, vez que alguns tipos além de eleitos por meio seletividade penal, foram definidos pela cleptocracia administrada por plutodelinquentes, que nos últimos 4 quatro anos, notadamente atuaram para resguardar primeiro o interesse “dos seus familiares” e conchavos de modo que a “res pública “ vêm sendo colocado em segundo plano.
Princípio da intervenção mínima.
Conforme digo alhures, o poder de punir do Estado é exercido por meio da lei penal, quando esgotadas todas as possibilidades disponíveis em outros ramos do direito, ou seja, é o último recurso do Estado para fim de resolver lide, de que seja capaz de produzir lesões à um bem jurídico protegido. Oportunamente, o princípio da intervenção mínima erige o poder disciplinar do Estado que por meio do direito penal não pune o indivíduo, mas sim a conduta. Assim, a intervenção mínima é destinada ao poder legislativo, estabelecendo premissa quando da criação de leis penais, devendo haver moderação na eleição das condutas.
Ora, se outros meios de controle social se revela suficiente para tutelar o bem jurídico protegido, sua criminalização é inadequada e não recomendável, Trocando em miúdos, se para dirimir lide e ordem jurídica violada, for suficiente medida civil ou administrativa, são estas que devem ser empregadas e não as penas.
É por isso, que direito penal deve ser a “última ratio”, isto é, deve atuar somente quando os demais ramos do Direito se revelarem incapazes de tutelar (proteger) os bens relevantes da vida e da própria sociedade. Enfim, o Legislador no momento de eleição dos tipos penais, não pode perder de vista princípio da intervenção mínima.
Princípio da lesividade ou ofensividade do evento.
Nesse contexto, se não houver lesão a um bem tutelado pelo ordenamento jurídico, inexiste crime, ou seja, por este princípio o crime materializa-se com destruição ou alteração do Estado inicial do bem protegido, salientando que se exige o chamado resultado material.
Ensejo, já adentrando em tese principal de nossa obra direito penal do inimigo, que em breve publicada 2ª edição, questiono, Será que existe lesão concreta em alguns crimes de mera conduta? Exemplo: Será que plantar uma muda em seu jardim destinado produzir efeitos medicinais em tratamento médico provoca lesão a algum bem jurídico? Na minha humilde opinião creio que não.
Seletividade penal afronta princípio da isonomia.
Seguindo o raciocínio alhures, mister se faz salientar que consabida seletividade penal afronta o princípio constitucional da isonomia ou igualdade, inolvidável no Estado Democrático de Direito, em ações efetivadas por suas instituições.
Nessa esteira, o que estamos assinalando é a circunstância detida que paira sobre classes sociais menos favorecidas, e que, de longe tem se observado o princípio da isonomia. ― aliás, diverso do que se observa para as elites, acabam sendo processadas e apenadas, superlotando as cadeias com pessoas advindas das classes menos abastadas, incidindo assim nesses estratos sociais, a sensação de que o sistema penal pátrio somente atua em seu desfavor.
Repisando nota inicial deste subscritor, recobertas por um manto de névoas, enjambra-se a seletividade penal ao inculcar falsa realidade, visando extirpar da sociedade cidadãos etiquetados como sendo inimigos do Estado.
Nódoas e meandros do sistema penal.
Sobre tal aspecto as nódoas e meandros do sistema penal, é todo oportuno trazer à colação o excelente magistério de preclaro Patrick Mariano Gomes, que traça profícua explanação, obtempera “ad litteram:
“(…) acreditar nas promessas da democracia e de um direito penal mínimo e racional no atual estado das coisas se constitui profissão de fé diante da realidade concreta, (…) a oportunidade de conhecer as nódoas do sistema penal pode redundar em sono profundo da razão. E o sono da razão, parafraseando o pintor Francisco Goya, produziu e produzirá monstros. 5 (GN).
Trocando em miúdos, o que refuto é a demonização de algumas condutas, buscando se fazer crer que tais tipos, são os únicos causadores de todos os problemas sociais. Temos que à seletividade penal é uma afronta ao princípio da isonomia, e disso decorre, a incidência de um direito penal do inimigo a determinados grupos etiquetados de modo equivocado.
Nesse diapasão, sobre seletividade e o endosso do mundo social ao etiquetamento de indivíduos, com propriedade o festejado Prof.º CLÓVIS DE BARROS FILHO preleciona, de modo esclarecedor:
“(…) Porque a sociedade não só patrocina os elementos identitários como controla e vigia com rigor o uso que fazemos deles. De maneira que nossa identidade é uma negociação permanente com o mundo que nos circunda. (…) Cada um de nós tem uma definição de si mesmo e acaba circunscrevendo a vida em função disso. Como todos temos esse mesmo problema, construímos entre nós uma espécie de pacto de cumplicidade ,(…) ou seja, cada um de nós, precisamos do endosso do mundo social, acaba também endossando as definições dos demais .”. 6 (GN)
Plantação para consumo pessoal.
Nesse particular, passo a refutar a constitucionalidade da criminalização da conduta de cultivar para consumo pessoal cannabis. Em assonância com os ensinamentos do eminente Min. Luís Roberto Barroso, na introdução de seu voto no julgamento no colendo STF- RE 635.659:
“ Estamos no domínio das escolhas trágicas. Todas têm custo alto. Porém, virar as costas para um problema não faz com que ele vá embora. Por isso, em boa hora o Supremo Tribunal Federal está discutindo essa gravíssima questão. Em uma democracia, nenhum tema é tabu. Tudo pode e deve ser debatido à luz do dia. Estamos todos aqui em busca da melhor solução, baseada em fatos e razões, e não em preconceitos ou visões moralistas da vida (...) 7 (gn)
Para melhor compreensão, é de todo oportuno gizar as palavras do Exmo. Ministro Barroso, em breves palavras promove o deslinde de terminologias descriminalizar, despenalizar e legalizar diferenciando-as, nos ensina que:
Descriminalizar significa deixar de tratar como crime;
Despenalizar é deixar de punir com pena de prisão;
Legalizar é considerar fato normal e insuscetível qualquer sanção;
Pois bem, alinhada na diferenciação de terminologia, rechaço a constitucionalidade do tipo que mantém criminalizada em abstrato a conduta de plantar com finalidade medicinal cannabis. Saliento que plantação e porte para consumo de um erva (cannabis) “de per si” não ofende qualquer bem jurídico protegido.
Nesse passo, relativo à conduta de quem planta cannabis, seja ela para consumo pessoal, seja para finalidade medicinal, de rigor digo eu que inexiste dolo específico de produzir qualquer resultado prejudicial à coletividade, tampouco de causar prejuízo à saúde pública, o que afasta a incidência da tipicidade material.
Digo eu, são completamente baldos de maior razão ter o cidadão que ingurgitar impertérrita coerção de agentes públicos, sobretudo ante inextricável imbróglio jurídico que se arrasta há tempos, em especial a despicienda lacuna de norma e cristalina atipicidade material.
Em assonância com a lição sempre precisa do Min. Luís Roberto Barroso ao justificar seu insigne voto, STF - RE nº 635.659:
“É preciso não confundir moral com direito. Há coisas que a sociedade pode achar ruim, mas que nem por isso são ilícitas. Se um indivíduo, na solidão das suas noites, bebe até cair desmaiado na cama, isso não parece bom, mas não é ilícito. Se um indivíduo fumar meia carteira de cigarros entre o jantar e a hora de ir dormir, tampouco parece bom, mas não é ilícito . Pois digo eu: o mesmo vale se, em lugar de beber ou consumir cigarros, ele fumar um baseado. É ruim, mas não é papel do Estado se imiscuir nessa área. ” (GRIFO NOSSO). 8
Nesse diapasão, inextricável à atipicidade material da conduta e deletéria inércia da ANVISA ante lacuna normativa, razão não assiste criminalização da conduta, que proporciona aos cidadãos ingurgitar arbitrariedade legal. Como bem observou o Min. Barroso: “Para poupar a pessoa do risco, o Estado vive a vida dela. Não parece uma boa ideia” 9