Resumo: O presente artigo tem como intuito analisar o programa Big Brother Brasil (BBB) à luz do direito da personalidade à imagem na esfera do ordenamento jurídico brasileiro.
Palavras-chave: BBB; Direitos da personalidade; Direito à honra; Direito à imagem; Direito Civil.
1. BBB e o uso da imagem dos participantes
O programa de teve Big Brother Brasil (BBB) foi criado nos anos 2.000, supostamente inspirado na obra 1984, de Goerge Orwell. No programa, os participantes são vigiados 24h, estando submetidos à opinião pública, sendo eliminados conforme esta. O último participante que sobrar, por eliminação por meio de votação do público do programa, ganha um prêmio pecuniário, em torno de R$1.000.000,00.
A grande questão é saber se o programa BBB fere os direitos da personalidade, à honra, dignidade, intimidade e à imagem, dos participantes, visto que são monitorados 24h, sendo seus erros inescusáveis pela opinião pública, sendo esta mortífera para a reputação dos participantes do programa televisivo.
2. O que são os direitos da personalidade?
Os direitos da personalidade, remontando à sua origem e fundamento, tem como embasamento o princípio basilar do Estado Democrático de Direito: a dignidade da pessoa humana. Segundo o art. 1º, III, da Constituição Federal (CF/88):
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
Este princípio é uma cláusula geral para a tutela dos direitos fundamentais, incluindo os da personalidade. Direitos da personalidade são, segundo a concepção de TARTUCE (2023), aqueles direitos tutelados pelo Código Civil (CC/2002) inerentes à pessoa humana. Possuem, portanto, amparo constitucional. Estão eles elencados dos arts. 11 ao 21 do CC/2002.
Vejamos alguns deles, enumerados a seguir:
Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.
Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.
Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.
Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.
Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.
Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.
Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.
Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória.
Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial.
Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome.
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.
Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.
A questão a saber se encontra nos arts. 20 e 21 do CC/2002: pode-se dispor onerosamente da própria imagem, quiçá da honra e da intimidade, o titular do direito personalíssimo, de forma consensual?
3. O direito à imagem, honra, intimidade e à dignidade e a exposição pelo programa televisivo BBB
A opinião pública muitas vezes pode ser fatal à honra objetiva de um sujeito. Devido à informatização e à digitalização da vida, ganhou força a exposição das pessoas por meio das mídias sociais. Apesar de o programa BBB ter sido criado na era jurássica da internet, esta aumentou a exposição dos participantes do programa, tendo suas vidas privadas vasculhadas, sua intimidade violada e, desse modo, sua dignidade e honra objetiva.
O programa se embasa na exposição dos participantes submetidos à opinião pública. Quaisquer palavras ditas, são gravadas. Quaisquer comportamentos e condutas tomadas, também são registrados. Desse modo, como conciliar a proteção aos direitos da personalidade com a exposição consensual da vida privada dos participantes?
O CC/2002, em seu art. 20, caput, diz:
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Entendo que, nos termos do art. 20, CC/2002, o programa deve responder na esfera cível pela exposição dos participantes. Em primeiro lugar, o direito à imagem é constitucional, enunciado no art. 5º, X e XI da CF/88; ademais, é um direito da personalidade, sendo irrenunciável e inalienável.
A Súmula n. 403 do STJ diz: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais. (SÚMULA 403, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 24/11/2009).
Outrossim, deve-se salientar que os “memes” utilizados de forma excessiva e com prejuízo à imagem dos participantes pelos fãs também cabe indenização por danos morais decorrentes de uso indevido da imagem dos participantes do BBB. Responde, portanto, a emissora por essa questão, visto que ela utiliza a imagem dos participantes com intuito comercial, ou seja, de lucro.
Por fim, ressalte-se que a autonomia privada e a força obrigatória dos contratos não são princípios absolutos, sendo mitigados pela relatividade dos efeitos contratuais perante terceiros, a função social dos contratos e, principalmente, a boa-fé objetiva. Todos os princípios são relativos, nos termos da Teoria Geral dos Direitos Fundamentais, não existindo hierarquia entre eles, devendo ser ponderados no caso concreto.
4. Conclusão
Ante o exposto, conclui-se que o BBB e a emissora detentora de seus direitos podem ser responsabilizados na esfera cível, visto que o direito à imagem é um direito personalíssimo, irrencunciável e inalienável, e de ordem pública, cabendo indenização por danos morais caso sejam violados, inclusive respondendo a emissora por terceiros, fãs do programa, caso utilizem a imagem do participante indevidamente.
Referências bibliográficas
Código Civil. 1 ed. São Paulo: Edipro, 2024.
Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 59 ed. São Paulo: Saraiva Jurídica, 2024.
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 13 ed. São Paulo: Método, 2023.