RESUMO: O presente artigo visa analisar as implicações da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a possibilidade de fracionamento da repartição dos honorários sucumbenciais para meses subsequentes quando o teto constitucional for alcançado em determinado mês. Busca demonstrar o entendimento recente do TCE/SC acerca da matéria, bem como o posicionamento da OAB/SC. Aponta os benefícios dessa sistemática, cita as principais decisões judiciais e menciona casos semelhantes de outros entes federativos.
Palavras-chave: Procuradores. Honorários Sucumbenciais. Fracionamento. Teto Constitucional. Isonomia. Eficiência.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Situação legal no Município de Joinville. 3. O Inquérito Civil. 4. Processo no TCE e discussão quanto ao mérito. 5. Fracionamento como medida isonômica e de eficiência administrativa. 6. O entendimento da OAB/SC acerca do tema. 7. Conclusão. Referências Bibliográficas.
1.INTRODUÇÃO.
O presente trabalho visa verificar se é possível a Administração Pública realizar o pagamento de saldos de honorários advocatícios existentes após respeitar o teto remuneratório constitucional (art. 37, inciso IX, da CF/88), em momento futuro, de forma fracionada, quando a remuneração ordinária dos procuradores municipais eventualmente não atinja o teto em determinado mês.
Em termos práticos, sabendo-se que a carreira de procurador do município (no caso, de Joinville) recebe, além do seu vencimento ordinário, prêmio de produtividade condizente com a percepção de honorários de sucumbência pagos pelas partes que são vencidas nos processos, pode ocorrer, por vezes, que os valores dessa premiação, somados ao vencimento ordinário, ultrapasse o teto constitucional de 90,25% do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal1.
Considerando se tratar de uma verba que não provém, em última análise, do orçamento público, mas da parte contrária sucumbente no processo, poderia o saldo ser acumulado para ser distribuído no futuro, em mês cuja remuneração ficasse abaixo do teto constitucional?
Essa é a proposta do presente estudo, no intuito de contribuir como subsídio a outras procuradorias municipais que eventualmente passem pela mesma situação.
2. A SITUAÇÃO LEGAL NO MUNICÍPIO DE JOINVILLE.
No caso do Município de Joinville, regula o recebimento de honorários advocatícios pelos procuradores municipais a Lei Municipal n. 3.737/982. No que interessa ao presente estudo, cita-se o seguinte dispositivo:
Art. 1º Nos processos judiciais em que o Município seja parte, os honorários incluídos na condenação, por sucumbência, serão recebidos pelo Tesouro Municipal e rateados, em partes iguais, entre os Procuradores do Município em exercício na data de seu recebimento.
[...].
§ 3º - Os valores referentes aos honorários por sucumbência a que se refere o caput do presente artigo serão recolhidos em conta própria do Tesouro Municipal, e na eventualidade de saldos ao final do exercício, permanecerão naquela conta para o exercício subseqüente, assegurando-se-lhes a mesma destinação prevista nas disposições precedentes.
Denota-se que a verba ingressa nos cofres públicos e depois é rateada entre os procuradores municipais, em partes iguais, conforme autorização legal. Além disso, expressamente já é previsto, desde 1998, que na eventualidade de saldos, deveriam estes permanecer na conta própria do Tesouro Municipal, assegurada a mesma destinação aos procuradores municipais nos períodos subsequentes.
Assim, existe norma legal expressa determinando a forma de recolhimento e destino da verba sucumbencial.
Não há dúvida de que os honorários advocatícios incluídos na condenação, por sucumbência, em razão da vitória do ente estatal nas ações contra ele ou por ele ajuizadas, fruto do trabalho de representação judicial3 exercido, com exclusividade, pelos procuradores municipais (nesse sentido, por simetria, ADI 4.843/PB-MC-ED-Ref4), lhes pertence, em partes iguais, considerados aqueles em exercício à data do recebimento.
O pagamento ocorre em relação a cada procurador em exercício, respeitado o rateio em partes iguais, mediante inclusão em folha de pagamento do mês subsequente ao recebimento pelo Tesouro Municipal.
No caso do Município de Joinville, verifica-se que o dispositivo alude ao vocábulo “saldos”, no plural, a significar que o acúmulo pode ocorrer em mais de um mês, e na eventualidade de persistirem valores não pagos em razão da observância do teto remuneratório, estes permanecerão na conta própria criada para o recebimento dos honorários advocatícios, para distribuição no exercício subsequente – e, portanto, durante os meses que o compõem –, assegurando-se-lhes a mesma destinação prevista nas disposições precedentes, vale dizer: rateio, em partes iguais, entre os procuradores municipais em exercício na data de seu recebimento.
E quando se alude a exercício, está-se a referir a exercício financeiro, o qual, segundo o art. 34. da Lei Federal n° 4.320/19645, coincide com o ano civil, àquele (ao exercício financeiro) pertencendo “as receitas nele arrecadadas” (art. 35, I6).
Já ano civil, de acordo com a Lei Federal n° 810, de 06/09/19497, corresponde ao período de 12 (doze) meses, contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte, que, em regra, compreende 1°/01 a 31/12.
Não há nenhum pronunciamento jurisdicional – quer em controle difuso, quer em controle concentrado – no sentido da eventual inconstitucionalidade da lei municipal joinvilense, razão pela qual sua aplicação é mandatória, dada a presunção de constitucionalidade ínsita à própria Lei n° 3.737/1998 (arts. 2º e 6º, da LINDB8).
Esta presunção de constitucionalidade da referida lei municipal decorre de algo singelo, como nos ensina Paulo Brossard9, eis que elaborada pelo Poder Legislativo e sancionada pelo Poder Executivo, isto é, por dois dos três poderes, situados no mesmo plano que o Judiciário.
Mesmo assim, no ano de 2020, fruto de denúncia junto ao TCE, os Procuradores do Município de Joinville foram instados a responder (i) processo (TCE-20/0000020110) para eventual devolução de valores recebidos a título de honorários de sucumbência recebidos em alguns meses do ano de 2012, ao fundamento de que haveria “burla” ao teto remuneratório ao se permitir o fracionamento de valores remanescentes e (ii) inquérito civil (Notícia de fato n. 01.2020.00006568-0) junto ao Ministério Público de Santa Catarina (MP/SC), sob suposta prática de ato de improbidade administrativa decorrentes dos fatos apurados pelo TCE/SC, tudo conforme detalhado a seguir.
3. O INQUÉRITO CIVIL.
Conforme aventado, o MP/SC recebeu denúncia de fato para apurar suposta prática de ato de improbidade administrativa pelo Procurador-Geral do Município de Joinville à época, decorrentes dos fatos apurados pelo TCE/SC.
O procedimento foi arquivado sob o fundamento de que o Supremo Tribunal Federal (STF) teria entendimento de que somente seria possível a responsabilidade pessoal do parecerista jurídico nas hipóteses de comprovação de dolo, erro grave inescusável ou culpa em sentido amplo, bem como que a diversidade de interpretações possíveis diante de um mesmo quadro fundamenta a inviolabilidade do advogado11.
Nessa linha, não vislumbrou a suficiente demonstração, no caso, da ocorrência de dolo, erro grave inescusável ou culpa em sentido amplo na elaboração do parecer 359/PGM/2012, que permitiu o fracionamento dos honorários sucumbenciais com base na legislação vigente, ainda que tenha prevalecido no TCE/SC entendimento em sentido contrário.
Também não vislumbrou o elemento subjetivo necessário para a configuração de ato de improbidade administrativa, na medida em que não demonstrados indicativos de que a orientação em referência teria sido firmada com dolo, mediante a finalidade específica de causar dano ao erário municipal.
Finalizou colacionando decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido da impossibilidade de exigência da devolução de valores recebidos de boa-fé por servidor público, em decorrência de erro administrativo:
Quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público (Tema 531/STJ)12
Por isso, a instauração de inquérito civil ou procedimento preparatório foi indeferida e a denúncia de fato arquivada.
4. PROCESSO NO TCE/SC E DISCUSSÃO QUANTO AO MÉRITO.
Historicamente cumpre mencionar que já vigorou entendimento no TCE/SC de que a percepção de honorários de sucumbência por advogados públicos era vedada13.
Não se pretende avançar sobre o acerto ou desacerto desse entendimento (mérito), mas apenas apontar que esse fato já existiu.
Esse entendimento foi superado em 2013, quando do julgamento do Prejulgado 2135, já citado e posteriormente avalizado pelo STF no julgamento da ADI 6053/DF, em 2020:
POSSIBILIDADE DO RECEBIMENTO DE VERBA DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA POR ADVOGADOS PÚBLICOS CUMULADA COM SUBSÍDIO. NECESSIDADE DE ABSOLUTO RESPEITO AO TETO CONSTITUCIONAL DO FUNCIONALISMO PÚBLICO. 1. A natureza constitucional dos serviços prestados pelos advogados públicos possibilita o recebimento da verba de honorários sucumbenciais, nos termos da lei. A CORTE, recentemente, assentou que “o artigo 39, § 4º, da Constituição Federal, não constitui vedação absoluta de pagamento de outras verbas além do subsídio” (ADI 4.941, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Relator p/ acórdão, Min. LUIZ FUX, DJe de 7/2/2020). 2. Nada obstante compatível com o regime de subsídio, sobretudo quando estruturado como um modelo de remuneração por performance, com vistas à eficiência do serviço público, a possibilidade de advogados públicos perceberem verbas honorárias sucumbenciais não afasta a incidência do teto remuneratório estabelecido pelo art. 37, XI, da Constituição Federal. 3. AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE14.
Verifica-se que o STF, exercendo a competência que lhe foi conferida pela Constituição Federal de seu guardião último, julgou – e vem julgando – bloco significativo de ações de controle concentrado e também de controle difuso, com afetação à Repercussão Geral, onde tem reiterado: (i) o direito ao percebimento de honorários advocatícios pelos procuradores federais, estaduais ou municipais; (ii) que o recebimento de honorários advocatícios é compatível com o regime de subsídios previsto no art. 39, § 4°, da Constituição Federal15; e, (iii) que a remuneração desta imprescindível categoria, alçada ao altiplano de carreira de Estado e função essencial à justiça, está limitada ao teto previsto no art. 37, XI16, da Constituição Federal, qual seja: 90,25% do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal17.
Avançando na linha do tempo, permitida a percepção de honorários sucumbenciais por parte dos advogados públicos – até mesmo por força do art. 85, § 19, do CPC18 – bem como estabelecido qual o teto que deveria ser seguido, passou-se à discussão da possibilidade ou não de fracionamento da verba que ultrapassasse o teto para pagamento em períodos futuros.
No processo TCE-20/00000201 os procuradores do município de Joinville foram notificados a responder o feito porque os técnicos primeiramente entenderam que essa percepção fracionada seria vedada e, por isso, irregular.
Os procuradores do município de Joinville apresentaram sua defesa e, dentre seus argumentos, apontaram o entendimento do STF acerca do fracionamento de honorários sucumbenciais.
No contexto do julgamento da ADI 6.159/PI19, por meio do voto do relator Ministro Luis Roberto Barroso, consignou-se, sobre a forma de aplicação do teto remuneratório previsto no art. 37, XI, da Constituição Federal, presente o recebimento de honorários advocatícios pelos procuradores:
Como se sabe, os honorários são verbas de natureza variável, que dependem do êxito do ente federado nas ações judiciais. Por esse motivo, embora seja possível que, em determinado mês, as parcelas remuneratórias somadas aos honorários superem aquele limite, também há a possibilidade de esse montante total, em outro mês, permanecer muito aquém do teto constitucional. 6. Para prevenir eventuais desequilíbrios e evitar injustiças, penso ser razoável permitir que, nos meses em que haja percepção de honorários acima do teto, o valor residual seja distribuído entre os advogados públicos nos meses seguintes, desde que se respeite mensalmente, como limite máximo, o subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. Esse mecanismo permitiria um maior equilíbrio na distribuição dos honorários, buscando conciliar a correta aplicação do teto constitucional com o incentivo à atuação dos advogados públicos proporcionado pelos honorários sucumbenciais. Assim, a incidência do teto não prejudicaria o recebimento de uma justa retribuição pelo trabalho exercido pelos advogados públicos na defesa dos interesses da União, dos Estados e dos Municípios.
A mesma ressalva veio também reiterada no julgamento da ADPF 596/SP, bem como na ADPF 597/AM e nas ADIs 6.053/DF, 6.163/PE, 6.165/TO, 6.178/RN, 6.181/AL, 6.197/RR20.
Diante disso, houve reconsideração do corpo técnico do TCE/SC, que apontou pela regularidade da percepção fracionada de honorários sucumbenciais, mas destacou que não estava a permitir a liberação geral de fracionamentos na Administração Pública quando se tratar de teto remuneratório. Isso porque, caso contrário, tornaria inócua a própria razão de ser do limite remuneratório.
Permitiu, apenas, o pagamento posterior exclusivamente de honorários de sucumbência, tendo em vista seu caráter sui generis.
Citou casos análogos, de outras instituições que têm a previsão de pagamento de valores residuais que porventura não tenham sido pagos anteriormente por causa do limite remuneratório previsto no art. 37, inciso XI, da CF/88, a exemplo da PGE-ES (Resolução CPGE 315/2020)21, PGE-SE (Resolução CDPGE/APESE 001/2020)22 e PGE-RS (Resolução 151/201923).
Apontou, ainda, que a citada Resolução PGE-RS 151/2019 foi alvo de ação direta de inconstitucionalidade e o STF decidiu por atestar a constitucionalidade normativa, asseverando que os pagamentos devem respeitar o teto remuneratório, sem, no entanto, considerar que o pagamento fracionado posterior de verbas residuais fosse irregular:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.298/1994 DO RIO GRANDE DO SUL, DECRETOS ESTADUAIS NS. 45.685/2008 E 54.424/2018, E RESOLUÇÃO N. 151/2019 DA PROCURADORIA-GERAL DO RIO GRANDE DO SUL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA DEVIDOS A PROCURADORES ESTADUAIS. COMPATIBILIDADE COM O REGIME DE SUBSÍDIO. LIMITAÇÃO AO TETO REMUNERATÓRIO CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE PARA DAR INTERPRETAÇÃO CONFORME AOS DISPOSITIVOS FIXANDO QUE OS HONORÁRIOS E O DENOMINADO PRÊMIO DE PRODUTIVIDADE DOS PROCURADORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SUBMETEM-SE E LIMITAM-SE PELO TETO REMUNERATÓRIO CONSTITUCIONALMENTE DEFINIDO (STF, ADI 6183/RS. Rel. Min. Cármen Lúcia. J. 04/11/202024).
Por fim, destacou que os honorários sucumbenciais são adimplidos pela parte vencida em processo judicial e são posteriormente pagos aos procuradores, ou seja, não advém de recursos públicos arrecadados por meio de tributos, v.g.
Esse tema entrou em pauta de discussão também porque junto com a percepção dos honorários sucumbenciais se discutiu a possibilidade ou não de pagamento acima do teto constitucional por médicos a título de plantão ou caso análogo:
Ademais, conforme se infere dos julgados analisados neste processo, há que se fazer distinção entre as verbas recebidas a título de honorários de sucumbência pelos Procuradores Municipais e aquelas recebidas pelos médicos a título de hora plantão ou caso análogo, tendo em vista que, mesmo se revestindo de caráter público, os valores relativos à sucumbência são adimplidos pela parte vencida em processo judicial, e são pagos diretamente aos Procuradores, ao contrário dos valores pagos aos médicos, que advém de recursos públicos arrecadados por meio de tributos (TCE/SC, Processo 20/00000201, Acórdão 113/2024, Rel. Con. Wilson Rogério Wan-Dall. J. 10/04/2024).
Sob essa perspectiva, abra-se, aqui, um rápido parêntese, para trazer o que contido na Nota SAJ n° 04/2019/AESP/SAJ-CC-PR, da Presidência da República:
Em resumo, os honorários advocatícios são considerados uma contraprestação meritória que não implica em qualquer ônus ao erário, pois paga pelas partes sucumbentes aos Advogados Públicos Federais em decorrência da atuação exitosa e efetiva destes profissionais em favor dos cofres públicos federais. Trata-se, portanto, de política de fomento ao princípio da eficiência (art. 37, caput, da CF), norma jurídica elevada ao status constitucional pela Emenda Constitucional n° 19, que incentiva o agente público a ser mais diligente e combativo, sem, contudo, exigir dispêndio por parte do poder público, porquanto tal parcela será paga pela parte vencida (Nota SAJ n° 04/2019/AESP/SAJ-CC-PR).
A constatação vale para os procuradores municipais que, com a percepção dos honorários advocatícios, atuam de maneira mais diligente e combativa, sem, todavia, onerar, por isso, o cofre municipal.
É dizer, não se retira um centavo sequer do orçamento público para custear esta parcela da remuneração dos procuradores municipais, eis que paga pela parte contrária, sucumbente, muito embora o cofre municipal e a sociedade, portanto, sejam absolutamente beneficiados com esta atuação diligente e combativa.
Há, portanto, um duplo benefício à Administração Pública.
Fechado esse rápido parêntese, o processo restou arquivado e atualmente a legislação municipal vem sendo cumprida, consoante entendimento do STF e TCE/SC acerca da possibilidade de fracionamento de honorários sucumbenciais que eventualmente venham a extrapolar o teto remuneratório constitucional em um determinado mês, presente a remuneração dos procuradores municipais.
O percebimento de honorários advocatícios pelos procuradores federais, estaduais ou municipais constitui modalidade de remuneração por performance, diretamente ligada aos resultados dos trabalhos do órgão de representação jurídica, estando em tudo e por tudo alinhado ao princípio da eficiência, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal25, conforme afirmado e enfatizado pelo STF em bloco significativo de ações de controle concentrado e também de controle difuso, com afetação à Repercussão Geral:
[...] a propósito, estabelece o referido art. 22. da Lei 8.906/1994, segundo o qual é ‘a prestação de serviço profissional’ que assegura aos profissionais inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil ‘o direito aos honorários […] de sucumbência’; aplicável, integralmente, à Advocacia Pública. Destaque-se, ainda, como bem demonstrado pela Advocacia-Geral da União (doc. 158), que a Emenda Constitucional 19/98 não assentou qualquer objeção explícita à transposição dessa garantia profissional para o contexto da advocacia pública, cuja disciplina constitucional encontra-se junto com a advocacia privada no mesmo Título IV, Capítulo IV, da Constituição Federal, distinguindo-se somente em termos de Seção, respectivamente II e III. A possibilidade de aplicação do dispositivo legal que prevê como direito dos advogados os honorários de sucumbência também à advocacia pública está intimamente relacionada ao princípio da eficiência, consagrado constitucionalmente no artigo 37, pois dependente da natureza e qualidade dos serviços efetivamente prestados. No modelo de remuneração por performance, em que se baseia a sistemática dos honorários advocatícios (modelo este inclusive reconhecido como uma boa prática pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE), quanto mais exitosa a atuação dos advogados públicos, mais se beneficia a Fazenda Pública e, por consequência, toda a coletividade.
Os honorários decorrem do êxito na defesa dos interesses da Fazenda Pública em contraprestação de serviços realizados, vinculando-se, indissociavelmente, à própria natureza e qualidade dos serviços efetivamente prestados pelos profissionais da advocacia, estimulando, dessa forma, o constante aperfeiçoamento da atuação profissional e institucional.
Conforme levantamento realizado no âmbito da Advocacia Geral da União, a percepção de remuneração por performance estimulou um maior comprometimento com as atividades do órgão, diminuindo o índice de evasão, estimulando a condução de projetos de longo prazo, especialmente dos que demandam a concretização de ideias inovadoras, permitiu a geração de um ambiente propício à inovação e, como resultado, incrementou substancialmente a recuperação do crédito público26.
A primeira interpretação dada pelo TCE/SC ao notificar os procuradores do município de Joinville, no sentido de considerar irregular o recebimento de valores de honorários em meses posteriores ao fato gerador, além de ter ido contra ao entendimento do STF, violou norma expressa existente no município de Joinville ao desconsiderar, no primeiro momento, texto do § 3º, do art. 1º, da Lei Municipal n. 3.737/9827.
A interpretação do texto normativo, objetivando, assim, dele extrair a norma jurídica (ou as normas jurídicas), não pode ser feita de forma isolada, decotada, desprezando-se os demais dispositivos e a ambiência do contexto no qual inserido. A advertência há muito feita pelo ex Ministro do Supremo Tribunal Federal Eros Grau, em sede doutrinária, ainda hoje é atual:
Não se interpreta o direito em tiras, aos pedaços. A interpretação de qualquer texto de direito impõe sempre ao intérprete, em qualquer circunstância, o caminhar pelo percurso que se projeta a partir dele – do texto – até a Constituição. Por isso, insisto em que um texto de direito isolado, destacado, desprendido do sistema jurídico, não expressa significado normativo algum28.
A interpretação sistemático-teleológica é aquela que melhor atende os objetivos pretendidos ao se interpretar um texto normativo ou mesmo e sobretudo a Constituição Federal.