Erros judiciários: prisões cautelares baseadas em reconhecimento fotográfico

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14/04/2025 às 18:00
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RESUMO

O presente artigo visa analisar a deficiência do Poder Judiciário, mostrando as falhas no andamento processual, especificamente em relação a utilização de um elemento informativo como único meio para fundamentar uma prisão cautelar. A prova em questão é o reconhecimento fotográfico, sendo amplamente utilizada e que recentemente foram noticiadas em grandes mídias televisivas, devido a prisões de pessoas inocentes, como é o caso do jovem Tiago Vianna Gomes, acusado injustamente nove vezes como autor de crimes através de reconhecimento fotográfico e ainda recolhido em estabelecimento penal pelo período de 10 meses. Buscou-se fazer um estudo sobre decisões pautadas nessa prova, em virtude de prisões cautelares baseadas nessa espécie de prova e sua duvidosa eficácia dentro do sistema processual penal, notadamente, no tocante a observância do garantismo penal, seja em prol dos acusados, seja em prol da sociedade. Por intermédio de documentos, como artigos, casos concretos, jurisprudências e julgados, será feito uma breve abordagem de fatos históricos de erros judiciários noticiados, da falibilidade da memória humana, das provas ilegais e julgados do Tribunal da Cidadania e do Superior Tribunal de Justiça.

Palavras-chave: prisão ilegal; reconhecimento fotográfico; prisão cautelar


INTRODUÇÃO

Observando em nosso contexto histórico e atual, fez-se importante uma análise acerca de decisões judiciais fundamentadas em reconhecimento pessoal da autoria ou participação no âmbito do processo penal que incorreram em, muitas vezes, erro judiciário. Ao falar de erro podemos conceituá-lo como relacionado ao vício sanável ou insanável. Quando o erro é judiciário, trata-se de um confronto com o princípio da legalidade e procedimentos processuais que já estão pré-estabelecidos, qualquer contradição ao previsto resultará em erro judiciário. Ele destaca a falha do direito para o cumprimento da justiça.

Segundo Médici (2000, p.215): [...] “considera-se erro judiciário a má aplicação do direito ou a deficiente apreciação dos fatos na causa, por parte do órgão jurisdicional, que resulta em decisão contrária à lei ou à verdade material”.

De acordo com Prof. Luíz Flávio Borges D'Urso, o erro judiciário é uma manifestação viciada do Estado, realizada através do magistrado e ecoando efeitos seja na esfera penal ou civil, não podendo negar que uma decisão equivocada ensejará uma série de prejuízos a quem foi condenado. Porém será no campo penal onde o erro será mais visado, tendo em vista que atinge valores inalienáveis do ser humano, razão pela qual o constituinte previu a obrigação de indenizar do Estado, conforme artigo 5º, LXXV, c/c art. 37, § 6º, da CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)......

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

O erro, apesar de advir de uma falha humana, não pode ser considerado comum, pois quando se trata de um erro judiciário vai de encontro com a busca da solução do conflito, entra em contradição com o que o sistema deve proporcionar: a justiça. A partir do momento no qual surge a pretensão punitiva, as partes envolvidas desejam a resolução da sua ação, com a vítima sendo ressarcida e o réu devidamente punido, portanto, no momento que isso ocorre de modo inverso, haverá uma dupla vitimização, com o sujeito ativo impune e com uma nova vítima o réu que foi preso de forma ilegal.

Dentre os erros judiciários, temos falsas acusações, perícias imprecisas, abusos de agentes estatais e pena desproporcional ao crime. Segundo pesquisa realizada no âmbito do Tribunal da Cidadania, a respeito dos processos que sofreram reformas no âmbito do referido Sodalício, indica que quase 15% dos acórdãos possuem erros que podem destruir a vida de uma pessoa de forma indevida. Sendo em números de processos pesquisados (68.944), são, nada mais, nada menos, do que 10.320 processos julgados com algum tipo de erro (Coordenadoria de gestão da informação, superior tribunal de justiça, período de 1/9/2015 a 31/8/2017).

Percebe-se que são muitos os erros cometidos pelo poder judiciário, assim focaremos na prova falha, sensível, relativa, abordaremos o reconhecimento fotográfico como meio de prova para fundamentar uma prisão cautelar. Como discorre a Coordenadora de Defesa Criminal da DPRJ, Lúcia Helena Barros:

A condenação baseada única e exclusivamente no reconhecimento fotográfico, colhido na fase de inquérito policial, vem se pautando por violações de direitos e garantias. Muitas das vezes, estes reconhecimentos fotográficos colhidos na fase policial não são confirmados em Juízo, no entanto, já produziram sérios danos, pois pessoas foram presas indevidamente ou responderam a processo penal, injustamente. Inegavelmente, o procedimento denominado de reconhecimento fotográfico dá lugar a uma série de erros, revelando, muitas das vezes, a seletividade penal. Para condenar alguém temos que ter produção de provas com total observância à ampla defesa e contraditório. Não se pode condenar com base em suposições, ao contrário, a prova deve ser firme e sólida, sob pena de violar garantias e direitos constitucionais.

Como visto, além de revelar um atestado de que o verdadeiro suspeito não foi submetido ao devido processo penal, há sérias consequências deletérias a pessoas que tenham contra si acusações equivocadas por erro derivado de reconhecimento fotográfico ou pessoal. Entretanto, a sequela de ficar recolhido no cárcere por tempo indevido é realmente a pior possível para a pessoa atingida, conforme veremos na sequência.


1.PRISÕES

No contexto de erro judiciário, o presente artigo analisará exclusivamente o erro judiciário em prisões cautelares baseadas em reconhecimento fotográfico.

Existem três tipos de prisões cautelares: a prisão em flagrante, a prisão temporária e a prisão preventiva. A prisão cautelar é uma forma de prisão não definitiva efetuada antes do trânsito em julgado, por isso há a necessidade de ser bem fundamentada, caso contrário estaríamos diante de uma antecipação condenatória, não sendo respeitados os direitos fundamentais do acusado.

A prisão preventiva consta nos artigos 311 a 316 do CPP, no qual é cabível apenas em três hipóteses: garantir a ordem pública e ordem econômica; conveniência da instrução penal, para que o acusado não dificulte as investigações criminais e para assegurar a aplicação da lei penal.

Requer também, consoante art. 313, seja crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; condenação anterior irrecorrível por outro crime doloso; ou crime envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, como garantia da execução de medidas protetivas de urgência.

Vale anotar que a decisão que decretar a prisão preventiva deverá ser motivada e fundamentada, com a indicação pelo magistrado de forma concreta acerca da existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da cautelar máxima.

Por sua vez, a prisão temporária está normatizada em uma lei especifica a nº 7.960/89, ela tem uma singularidade, pois só é possível executá-la na fase de investigação policial, devendo ser realizada apenas diante dos requisitos previstos na lei, a saber, imprescindibilidade para eficácia das investigações criminais e fundadas razões de autoria ou participação em crimes previstos em rol taxativo da referida lei.

Mencionadas as balizas autorizadoras, diante do perigo da irreversibilidade para a vida do cidadão, constata-se que a decisão judicial deve evitar a decretação da medida cautelar extrema fundamentada exclusivamente em reconhecimento fotográfico, divorciado de outros meios aptos a embasar sua escolha, uma vez que pode evidenciar futuramente ser extremamente temerária.


2.PROVAS

Quando se fala em prisão baseada em reconhecimento fotográfico, nota-se que tal reconhecimento é uma das provas aceitas de maneira geral. No âmbito do processo penal, as partes podem produzir provas para provar a verdade dos fatos, desde que seja lícita e legítima. Há produção de provas na fase de inquérito policial, sendo recebido em juízo com caráter de elemento informativo, pois não passa pelo contraditório e ampla defesa. A prova na ação penal será valorada pelo magistrado devido a um juízo de valor e convencimento.

Registre-se que, devido ao status de presunção de inocência, regra de tratamento dos acusados em geral, consoante previsão constitucional (art. 5º, LVII, CF), vige a regra de que o ônus da prova dos fatos delituosos, de forma convincente e suficiente, a dar suporte a acusação, é do órgão acusador. Diante disso, caso o órgão ministerial não consiga se desincumbir de seu ônus processual, impõe-se a absolvição do acusado.

Vale destacar que as provas produzidas na fase pré-processual não terão o mesmo valor das produzidas na fase processual, onde estará previsto o princípio do contraditório e da ampla defesa. Com exceção das provas cautelares, que são aquelas que possuem um risco de desaparecer pelo decorrer do tempo, como a interceptação telefônica. Das não repetíveis que são as que não podem ser novamente feitas, como o exame de corpo de delito em vítimas de lesões corporais. E das provas antecipadas, onde devido a uma situação de urgência pode ser realizada previamente, como a oitiva de testemunhas.

A respeito do tratamento e seu valor ao processo penal, verificamos que o art. 157. do CPP dispõe que são inadmissíveis, no processo penal, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais, e as provas delas derivadas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras ou quando as derivadas puderem ser obtidas por fonte independente.

Necessário esclarecer a distinção entre as espécies não aceitas pelo ordenamento pátrio. A prova ilegal ocorre quando sua obtenção caracterize violação de normas legais ou princípios gerais do ordenamento, de natureza processual ou material. Portanto, prova ilegal é gênero, da qual a prova ilícita e ilegítima são espécies. Nessa toada, quando a vedação for albergada por uma lei processual, a prova será ilegítima, ou melhor, ilegalmente produzida; já em sentido contrário, em se tratando de proibição de natureza material, a prova será ilicitamente obtida.

Mais além da mera distinção de qual direito violado, se de ordem material ou processual, necessário se faz a menção de seus efeitos ou sanção aplicável ao caso, se inadmissibilidade ou nulidade da prova. A inadmissibilidade da prova ilícita impede o seu ingresso no processo, caso já produzida, impõe-se sua exclusão. Por sua vez, a prova ilegítima será apenada com sua nulidade. Destaque-se que as provas produzidas com violação das normas procedimentais serão nulas e não produzirão resultados no processo, contudo, não impedirão o refazimento dos atos, em conformidade legal, de modo a possibilitar, portanto, o aproveitamento da fonte de prova.

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Verificou-se atualmente, em sua boa maioria, a inobservância do procedimento de reconhecimento de pessoas, seja pessoal ou por meio de fotografias, quanto à ordem prevista no artigo 226, do CPP. Portanto, como meio de prova típico que é, de rigor seguir o rito legalmente imposto para a sua produção. Embora o dispositivo preveja que a forma deve ser atendida “se possível”, essa mitigação somente pode ser admitida em casos raros, quando se verificar total inviabilidade de seguir o modelo legal e exauridas as diligências da autoridade policial para cumpri-lo, justificando-se por escrito sua impossibilidade para posterior controle judicial.

Assim, o desrespeito ao rito do artigo 226, do CPP, caracteriza-a como prova ilegítima, logo, impondo-se sua nulidade e admitindo-se seu refazimento. De outro lado, caso não obtido outro meio fundado e legal autorizador de eventual condenação, será necessário e imprescindível a absolvição do investigado, como mais à frente veremos na solução dada pelo STJ.

2.1. Falsas memórias e a colheita de provas

O reconhecimento de pessoa efetuado pela vítima na seara extrajudicial não traz robusta segurança quanto à autoria do delito, dada a suscetibilidade de erro da memória humana, a qual incorre em esquecimento, devido a emoções e até mesmo, grife-se, sugestões oferecidas ou impostas por outras pessoas, o que acarreta o fenômeno das falsas memórias.

Necessário trazer à discussão a possibilidade de corrosão do reconhecimento preciso de pessoa por conta do tempo de duração do fato criminoso; eventual trauma gerado à vítima; o tempo decorrido entre o contato com o criminoso e a realização da prova de reconhecimento; condições ambientais como a visibilidade do local no momento dos fatos; assim também eventuais estereótipos culturais, como é o caso da cor, classe social, sexo e etnia.

A memória se torna frágil diante de acontecimentos impactantes, ela pode se auto enganar acreditando que viu o que de fato não ocorreu, podendo ser facilmente influenciada. Conforme relata o Dr. Aury Lopes Junior em um dos seus artigos que diante de uma arma a vítima será distraída das características físicas do delinquente. É chamado de efeito do foco da arma, onde a vítima não se fixa nas feições do autor, pois o fio que se estabelece é em relação a arma.

Assim, as chances de a vítima reconhecer o criminoso diminuíram consideravelmente. Além disso, deve analisar as expectativas da vítima, tendo em vista que elas tendem a ver e ouvir aquilo que querem. O que faz com que os estereótipos culturais (como cor, classe social, sexo etc.) tenham uma interferência, acarretando uma tendencia a reconhecer em função desses estereótipos.

Pode ocorrer também o fenômeno do “efeito compromisso” (Gorenstein e Ellsworth) que acontece quando uma pessoa analisa várias fotos e escolhe erroneamente o autor do delito e por conseguinte realiza o reconhecimento pessoal. Nesse episódio a vítima tende a persistir no erro, mesmo estando com dúvidas quanto ao reconhecimento.

Outras vezes, ocorre uma influência quando a vítima analisa o álbum de suspeitos na Delegacia, acontecendo uma indução pelas fotografias já vistas, contaminando o processo de reconhecimento pessoal. Sendo essa uma influência externa, tornando a memória manipulável.

Deste modo, verifica-se frágil e temerária a prova decorrente de reconhecimento pessoal quando realizada por exibição a vítima de fotografia do eventual autor do delito, na totalidade das vezes previamente indicada por agentes de investigação policial, com base em registros da unidade policial ou por imagens encontradas na internet ou até mesmo nas redes sociais.

Ressalva-se, contudo, a hipótese de uma prova de reconhecimento derivada de filmagens de um crime por câmeras de segurança ou de um aparelho celular, o que se permitiria, com maior precisão e segurança, identificar o envolvido no momento do fato delituoso, aliado, é claro, com provas outras a firmar a autoria e materialidade criminosa.

Em relação às falsas memórias, elas significam uma falsa percepção da realidade, onde a pessoa se recorda de fatos que não ocorreram, sendo na verdade uma interpretação da memória e não um acesso direto a elas.

Cabe destacar que as falsas memórias não são mentiras, pois elas são semelhantes às memórias verdadeiras. Conforme consta no livro de STEIN, Lilian Milnitsky. Falsas memórias: Fundamentos científicos e suas aplicações clínicas e jurídicas, diz que as falsas memórias versavam sobre as características de sugestionabilidade da memória, ou seja, a incorporação e a recordação de informações falsas sejam de origem interna ou externa, que o indivíduo lembra como sendo verdadeiras.

Elas são a recuperação de memórias nunca vividas, lembrança de inventos, não se trata de mentira, mas que pensa estar dizendo a verdade, mas está informando fatos que nunca ocorreram.


RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO

Dado a evolução da sociedade, evoluiu por consequência os procedimentos adotados diante do processo jurídico. A prova de reconhecimento em nosso ordenamento jurídico, contém apenas previsão do reconhecimento pessoal, não tendo a concepção do realizado através de fotografias, porém esse procedimento vem tomando forma e sendo utilizado amplamente para basear prisões cautelares.

Observa-se que no nosso Código de Processo Penal, em seu artigo 226, consta a previsão de reconhecimento de pessoas e coisas, sendo esse realizado de forma presencial, onde consta como tal procedimento que deve ser realizado. Observe:

“Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma: I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida; Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la; III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela; IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.”

Já o reconhecimento fotográfico não encontra preceito legal, tratando-se de uma adaptação, uma construção doutrinária e jurisprudencial, sendo uma espécie de prova inominada, a jurisprudência aceita o reconhecimento feito através de fotografia, mas é preciso ser corroborado com outras provas, com o reconhecimento presencial ou depoimentos. Não é de fato uma prova absoluta, é preciso que tenha um conjunto de provas para ser aceita.

“A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que é possível a utilização das provas colhidas durante a fase inquisitiva – reconhecimento fotográfico – para embasar a condenação, desde que corroboradas por outras provas colhidas em Juízo – depoimentos, nos termos do art. 155. do Código de Processo Penal.” (AgRg no HC 497.112/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 10/09/2019).

Conforme entendimento jurisprudencial, essa prova nova no âmbito jurídico pode ser aceita, mas com condição, não devendo ser irrestritamente aceita e deve ter seu valor relativizado, pois se trata de uma prova frágil, sendo baseada em uma palavra da vítima ou testemunha. Portanto, não é cabível uma prisão baseada exclusivamente em uma prova que não tenha observância dos princípios constitucionais.

2.2.Reconhecimento da fragilidade probatória

Conforme visto anteriormente, as provas devem ser providas de um conjunto de princípios e normativas, respeitando o devido andamento processual. Quando não existe a obediência aos termos necessários, ela se torna vulnerável, assim, levando a uma condenação improcedente.

Diante disso, conforme demonstrado no levantamento realizado pelo Condege e pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPE-RJ), pode demonstrar que entre dez estados nos anos 2012 a 2020, noventa das pessoas presas eram inocentes e foram levadas ao encarceramento por reconhecimento fotográfico errôneo.

Analisando alguns julgados, observa-se o reconhecimento da fragilidade probatória e por consequência a devida absolvição do acusado. Vejamos:

Conforme ementa abaixo do processo 1502673-33.2019.8.26.0548 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, onde foi acolhido os embargos infringentes com a oportuna absolvição do acusado, que teve desrespeitado o procedimento de reconhecimento nos termos do artigo 226 do CPP.

Embargos infringentes. Roubo impróprio. Reconhecimento policial feito sem a observância do disposto no artigo 226 do Código de Processo Penal – Reconhecimento em juízo feito por fotografia - Acusado detido sem a res subtraída – Álibi não infirmado por qualquer indício de prova – Insuficiência de provas em relação à autoria – Ocorrência – Embargos infringentes acolhidos para absolver o embargante.

( TJSP; Embargos Infringentes e de Nulidade 1502673-33.2019.8.26.0548; Relator (a): Luís Geraldo Lanfredi; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Criminal; Foro de Valinhos - 1ª Vara; Data do Julgamento: 12/09/2022; Data de Registro: 12/09/2022)

Também em sede do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no processo 0000016-34.2015.8.26.0355, cuja ementa segue adiante, no qual o acusado foi reconhecido por fotos e ficou e evidenciado a fragilidade probatória, não sendo suficiente para ensejar uma condenação, restando, portanto, a absolvição.

APELAÇÃO CRIMINAL – ROUBO TRIPLAMENTE ORNAMENTADO – ABSOLVIÇÃO DECRETADA – RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO OBJETIVANDO A CONDENAÇÃO, NOS EXATOS TERMOS DA PEÇA MATRIZ – IMPROCEDÊNCIA – PROVA CLAUDICANTE – RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO REALIZADO FASE POLICIAL NÃO CONVALIDADO EM JUÍZO – DÚVIDAS RAZOÁVEIS ACERCA DO ENVOLVIMENTO DO RECORRIDO NO EVENTO CRIMINOSO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO.

O processo 1504552-46.2021.8.26.0050 do TJSP, onde foi verificado que houve descumprimento dos procedimentos observados no art. 226. do CPP, restando dúvidas em relação a autoria do delito, portando deve-se absolver com respeito ao princípio pro reo. Segue ementa:

APELAÇÃO. ROUBOS MAJORADOS PELO CONCURSO DE PESSOAS. Pleito absolutório acolhido. Reconhecimento fotográfico efetuado na Delegacia de Polícia, com base na exibição de álbum de fotografias de pessoas previamente selecionadas, que coloca em dúvida os reconhecimentos pessoais realizados posteriormente tanto perante a autoridade policial quanto em juízo. Inobservância inicial ao procedimento do artigo 226, do Código de Processo Penal, indispensável no caso concreto. Precedentes. Dúvida que se resolve em favor do acusado. Aplicação do brocardo in dubio pro reo. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO. (TJSP; Apelação Criminal 1504552-46.2021.8.26.0050; Relator (a): Camargo Aranha Filho; Órgão Julgador: 16ª Câmara de Direito Criminal; Foro Central Criminal Barra Funda - 2ª Vara Criminal; Data do Julgamento: 08/09/2022; Data de Registro: 08/09/2022)

Por fim, em julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no processo 0224531-37.2018.8.19.0001 01, que baseou a prisão preventiva em reconhecimento fotográfico, feito pelo depoimento de uma das vítimas, sendo posteriormente o réu absolvido em virtude da retratação da vítima.

APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO ADMINISTRATIVO - AÇÃO INDENIZATÓRIA - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - PRISÃO CAUTELAR BASEADA EXCLUSIVAMENTE EM RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO - DESRESPEITO AO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ARTIGO 226 DO CPP - RÉU ABSOLVIDO POR RETRATAÇÃO DA VÍTIMA, ALEGANDO ERRO NO RECONHECIMENTO - PRISÃO PREVENTIVA QUE DUROU CINQUENTA E NOVE DIAS - FOTOGRAFIA INDEVIDAMENTE INSERIDA EM ÁLBUM POLICIAL - DANO MORAL CONFIGURADO - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA QUE DEVE SER REFORMADA.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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